September 07, 2024

Educação - acordar para a realidade




O ministro da Educação, Fernando Alexandre, admitiu esta sexta-feira que o novo ano letivo vai arrancar com "milhares de alunos sem aulas", sublinhando que se trata de uma "falha grave" da escola pública que o Governo quer resolver até ao final da legislatura.

O governante disse, no entanto, que o concurso de professores lançado pelo anterior Governo "não resolveu o problema, provavelmente agravou-o".

"O compromisso do Governo é até ao final da legislatura resolvermos o problema dos alunos sem aulas. Isto é uma falha grave da escola pública que nós temos de corrigir, mas que nos últimos anos foi simplesmente ignorada", disse ainda.

"não é aceitável que em 2024 haja milhares de alunos sem aulas em Portugal",

Ministro admite que carreira de professor foi desvalorizada durante muitos anos


O ministro da Educação afirmou ainda que a carreira de professor em Portugal foi "desvalorizada durante muitos anos", o que levou milhares docentes a abandonar a profissão e a optar por outras atividades mais compensadoras financeiramente.

"Para ganharem mil e tal euros, ficam perto de casa e fazem outra coisa", referiu.


Fernando Alexandre referiu-se, concretamente, a "milhares de professores" que nos últimos anos deixaram o ensino e enveredaram pela mediação imobiliária.

"O que o país fez aos professores é um bocadinho inexplicável, a carreira foi mesmo desvalorizada. Temos hoje uma carreira que não faz sentido nenhum", sublinhou.

O resultado é que, ao contrário do que aconteceu durante muitos anos, hoje as pessoas já não querem ser professores, lamentou.

Para inverter essa situação, o Governo vai começar, em outubro, a rever a carreira de professor.

Na sua intervenção, Fernando Alexandre disse ainda que Portugal continua a ter "falhas graves" na universalização do acesso à educação, um problema que o Governo quer corrigir.

O ministro sublinhou ainda a necessidade de as escolas saberem acolher e incluir os alunos imigrantes.

Lembrou que o número de alunos em Portugal está a aumentar por causa dos imigrantes e que isso é um fator positivo.


September 06, 2024

Russismo

 

2001 - Putin mandou invadir a Chechénia com as mentiras do costume ao modo estalinista. Fizeram então na Chechénia, exactamente o que estão a fazer agora à Ucrânia: invadir, destruir, violar mulheres, roubar. Tudo com o apoio dos russos e a conivência da comunidade internacional.


Índia tem acordo secreto de negócio de peças de armas com Putin

 


The Kyiv Independent

@KyivIndependent

Documentos divulgados revelam que a Índia e a Rússia têm acordos comerciais secretos para que o Kremlin possa adquirir componentes necessários ao seu esforço de guerra, segundo o Financial Times de 5 de setembro.

Fawzia Kofi, ex-deputada do Parlamento afegão (quando existia um Parlamento, antes dos talibãs)


 

Fawzia Kofi, agora mesmo, numa entrevista no programa da BBC, Hard Talk, defende que a suposta ajuda humanitária da ONU ao Afeganistão, uma ajuda que todas as semanas põe nas mãos do talibãs, sem nenhuma contrapartida, dezenas de milhões de dólares, é um erro muito grande, na verdade, é um apoio à continuação dos talibãs no poder. Quando olhamos para o que se passou na Palestina, onde milhões e milhões de dólares e euros nunca chegaram ao povo e foram usados pelas autoridades do Hamas para se armarem, construirem túneis e redes de terroristas em países amigos de terroristas, vemos que ela tem razão. O que devia acontecer era a ajuda humanitária estar diretamente ligada a evidências dessa ajuda ser usada, exclusivamente, para ajudar a alimentar os pobres e nomeadamente as mulheres que foram deixadas sem meios de auto-subsistência com as leis dos talibãs que as proíbem de aceder ao mercado de trabalho - 30 anos de conflitos e guerras deixaram a maioria das afegãs viúvas.

Paralelamente, tem de ser criado um mecanismo internacional de acção imediata -seja com sanções, mandatos de captura, etc.- sempre que um país suprimir os direitos humanos de parte do seu povo, seja por motivos de misoginia, religião, raça, etc. Neste momento, segundo Fawzia Kofi e relatórios internacionais, as raparigas e as mulheres afegãs estão num estado mental quase suicida: não comem, não dormem, perderam a esperança e com ela o interesse pela vida.

Os talibãs, tal como o Boko Harem, o ISIS, o Hamas, o Estado Islâmico iraniano e outros movimentos terroristas teocráticos de ganância de poder absoluto e culto da morte que odeiam mulheres, são uma voz de minoria entre os povos que escravizam e aterrorizam, não têm legitimidade para falar ou agir em seu nome e isso tem de ser reconhecido internacionalmente com as devidas consequências.


Uma entrevista com Andreas Eshete (1942-2024)



(excerto)


WOUBSHET: Apresentou argumentos incisivos a favor da fraternidade: a fraternidade como um ideal público, uma virtude que permite e reforça a vida cívica. No seu ensaio Sobre a Fraternidade, fiquei impressionado com dois pontos que se sobrepõem: por um lado, a forma como desmistifica a nossa perceção da fraternidade como uma forma doméstica de relação e, por outro, a forma como, apesar de tudo, insinua o tipo de impulsos afectivos e íntimos da fraternidade para pensar as questões da esfera pública. Pode dizer-nos mais sobre estas pretensões que se sobrepõem?

ESHETE: Relativamente à primeira questão, sobre o facto de se retirar do lar, penso que há muitas virtudes, como a fraternidade, que consideramos domésticas, mas que as pessoas, por exemplo, no mundo antigo, não consideravam domésticas. 
Para os gregos, a amizade era uma relação entre iguais e uma relação perfeccionista, uma relação que tem a ver com valores partilhados, pelo que era muito mais uma virtude pública. A casa, dada a sua composição antiga com escravos, não era considerada um domínio para cultivar a virtude, como se vê muito claramente em Aristóteles e dramaticamente em Platão. Por isso, era suposto a virtude ser exibida na cidade. 
E não é verdade, se pensarmos no patriotismo, se pensarmos em todo o tipo de coisas pelas quais as pessoas morrem e que moldam as suas vidas, que sejam virtudes domésticas, mesmo no mundo moderno.
Maquiavel é outra pessoa que pensou nesta virtude de uma forma muito pública. 
A outra coisa é que tem a ver com o mundo moderno. Estava a dizer antes, por exemplo, que a amizade para os gregos se restringia, em primeiro lugar, aos cidadãos, não há uma idealização da amizade com escravos, entre escravos ou com mulheres. Mas uma virtude da vida moderna é que temos algo como a amizade de carácter, o que significa que, em princípio, o domínio da amizade é agora muito maior. Podemos ser amigos de qualquer pessoa. O mesmo acontece com a fraternidade, podemos ter um sentimento de solidariedade com pessoas muito distantes, em torno de ideais partilhados e assim por diante.
Portanto, há uma certa liberdade que falta ao mundo clássico e que o mundo moderno tem.

WOUBSHET: Elaine Scarry, no seu maravilhoso livro On Beauty and Being Just, refere que é um dos poucos filósofos que atribui à fraternidade o lugar que lhe é devido como uma das virtudes que sustentam as teorias liberais da justiça. Porque é que, na sua opinião, da tríade revolucionária (liberdade, igualdade e fraternidade), a fraternidade é negligenciada enquanto tanta atenção filosófica é dada à liberdade e à igualdade?

ESHETE: Em parte, é uma questão histórica. Por exemplo, quando os americanos defendiam a liberdade e a igualdade, tinham a escravatura e por isso, não podiam incluir facilmente a fraternidade como um valor público importante, a não ser que esta também fosse restringida. Além disso, admitir a importância da fraternidade teria dramatizado o facto de a liberdade e a igualdade estarem limitadas aos brancos, basicamente aos homens brancos proprietários. 
Noutras tradições, há outras razões históricas. O fracasso da comuna em França, por exemplo, tem muito a ver com o facto de a fraternidade não ter sido sustentada como um valor público da mesma forma que a liberdade e a igualdade o foram, mesmo em França. É claro que a França, mais do que outras nações ocidentais, presta atenção à fraternidade.
A outra coisa, ligada ao progresso moral no mundo é o facto de o âmbito da liberdade, o alcance da liberdade e da igualdade, se ter alargado dentro das sociedades e entre elas. Para mim, o que explica isto, não causalmente, mas moralmente, é o poder da fraternidade. 
É quando reconhecemos que os negros têm alma, as mulheres têm alma, as crianças têm alma, talvez os animais tenham alma, que estendemos os outros ideais políticos a pessoas que até agora estavam excluídas deles. 
No entanto, queremos esquecer isto, queremos esquecer o facto de que isto foi restringido. Ninguém admite que muitas sociedades - sociedades modernas que se orgulham da modernidade - eram sociedades esclavagistas. 
Também nós, na Etiópia, faz parte da nossa auto-imagem fazer que a escravatura seja esquecida; parte deste esquecimento envolve também o esquecimento do poder da fraternidade. Porque queremos dizer que sempre estivemos na mesma família humana, o que é falso. Portanto, essa é outra razão pela qual a fraternidade foi desvalorizada.
A terceira razão é que a solidariedade/fraternidade, pelo menos no século XX, em parte após a Revolução Francesa, mas definitivamente após a Revolução Russa, ficou associada a políticas socialistas radicais. Assim, a solidariedade da classe trabalhadora é uma ideia muito familiar, mesmo a solidariedade no seio do movimento operário é uma ideia familiar, pelo que a hostilidade à política radical, ao socialismo, se espalha para a solidariedade/fraternidade como um ideal.

WOUBSHET: Se eu puder continuar com o livro de Scarry para fazer mais uma pergunta. Ela defende que “o empreendimento criativo em nome da beleza e em nome da justiça estão alinhados”.
E sublinha este assunto específico quando se refere ao seu trabalho, embora seja um filósofo que tem dado bastante atenção a outras virtudes como a fraternidade e a integridade, vê a beleza como uma forma de virtude? E, além disso, vê a relação que Scarry estabelece entre beleza e justiça?

ESHETE: Penso que a ligação que ela faz é demasiado forte (...) mas penso que há muitas ligações. É claro que esta ideia não é nova. Kant é muito famoso por pensar na beleza como um símbolo da moralidade. Há uma frase muito grande e famosa no seu ensaio sobre os Fundamentos da Metafísica dos Costumes, em que começa a falar de duas coisas que, segundo ele, não podem ser demasiado elogiadas: “o céu estrelado sobre nós e a lei moral dentro de nós.” O que é que estas coisas têm em comum para além do sublime? É a beleza, penso eu.
E o facto de as admirarmos dessa forma. Quero dizer, o céu estrelado é, de uma forma ou de outra, admirado por toda a gente e não só pela sua beleza. A moral tem o mesmo tipo de caraterística. A relação de parentesco é clara; a relação de parentesco de Iris Murdoch entre beleza e moralidade, que Scarry discute, é vigorosa. 
Iris Murdoch, como se lembram, diz que é na beleza que as pessoas se esquecem de si próprias, se desinteressam. Kant defende o mesmo ponto de vista, mas com mais força. Diz que mesmo a pessoa mais egoísta, quando olha para uma flor, um pássaro, etc., deixa de pensar em si própria. Assim, se o que nos motiva para a moralidade não é cuidar de toda a gente, o que é muito ambicioso, ou, à maneira cristã, amar toda a gente, amar alguém ou cuidar de alguma coisa pode ser suficiente e, nesse aspecto, ser absorvido por uma flor, um pássaro, etc., pode ser um passo subestimado na motivação moral. Esta é uma ligação.
Outra ligação, a que se relaciona com a questão da fraternidade, é o facto de a moralidade, durante muito tempo, pelo menos na tradição anglo-americana, ter sido pensada como uma questão de resultados que tornam o mundo melhor, preocupando-se com a forma como o mundo como um todo funciona - ou como uma questão de princípios. 
Entre Kant e os utilitaristas, estas são as duas visões dominantes sobre o que é a moralidade. Mas ambas foram consideradas, de uma forma ou de outra, insuficientes, porque não dizemos simplesmente que uma pessoa é moral se torna o mundo melhor ou melhora a forma como o mundo funciona.
Consequentemente, não acreditamos apenas em princípios como Kant. Acreditamos na importância da motivação e acreditamos que a motivação tem de ser de um determinado tipo. Assim, se eu fizer o bem ao meu amigo e se agradar ao meu amigo, a motivação tem de ser apenas essa. Tudo o resto seria uma motivação extra ou errada.
Digo tudo isto para explicar por que razão as virtudes são importantes, porque insistem no contexto emocional das nossas acções e na forma como este influencia o valor moral da conduta. 
Voltando ao caso da beleza e da moralidade, a beleza é claramente algo que tem de envolver os nossos sentimentos. Os nossos sentimentos têm de estar empenhados de forma correcta  para que sejamos morais e para que a nossa conduta seja moral - penso que esta é uma ligação muito forte entre a moralidade e a beleza, não directa mas forte.

fonte: jstor.org

O que torna uma fotografia artística, poética, filosófica? (um post sem guerra 🙂)

 


Conseguir captar uma situação universal, uma 'verdade' universalmente sentida e reconhecida, a partir de uma situação, uma composição particular, seja pessoa, paisagem, objecto, etc.


Fotografias de Alfred Stieglitz (1864-1946)

a caminho da salvação

linhas de ferro e fumo ou o outro lado do conforto 

"the life of man, solitary, poor, nasty, brutish, and short." Hobbes



September 05, 2024

Uma entrevista com Andreas Eshete (1942-2024)

 


Andreas Eshete foi um pensador etíope que morreu na semana passada. Foi um estudante de topo do ensino secundário na Etiópia que ganhou uma bolsa para estudar no Williams College. Foi um académico pioneiro da Etiópia em línguas semíticas e filosofia.
Em 1970,  concluiu a sua tese de doutoramento, A Estrutura Social da Liberdade, no departamento de filosofia de Yale. Nela, já podemos ler o seu projeto de vida de reconciliar as tradições liberais e socialistas, uma tensão criativa que ele expressou no seu enfoque filosófico na fraternidade - o elemento negligenciado na tríade revolucionária - e na sua contraparte activista, a solidariedade. Depois de Yale, Andreas leccionou na Universidade de Brown, UCLA, UC Berkeley, Universidade da Pensilvânia e Haverford College; é recordado com carinho por estudantes e colegas.


Uma Entrevista com ANDREAS ESHETE

por Dagmawi Woubshet

WOUBSHET: Andreas, obrigado por esta oportunidade de dialogar consigo; é um prazer e um privilégio.
Talvez pudéssemos começar por falar da sua escrita como filósofo; depois, falar sobre o seu trabalho como intelectual público, as formas como ligou a filosofia à prática política e terminar com as suas ideias sobre a cultura etíope.
Escreveu que a perceção geral da filosofia como “um inquérito de incubação” é errónea. O que quer dizer com isso e que tipo de metáfora acha que caracteriza corretamente a investigação filosófica?

ESHETE: Penso que a ideia de incubação vem da história da filosofia. A filosofia costumava ser uma espécie de disciplina abrangente e a maioria dos famosos tratados de ciências naturais chamavam-se tratados de filosofia natural.
Assim, muitos dos grandes cientistas ingleses - Newton, Bacon, etc. - eram filósofos naturalistas. Assim, normalmente, a ideia era que um assunto atingisse um certo nível de maturidade em filosofia e depois
se tornasse uma ciência independente. É claro que este fenómeno ainda se verifica, talvez de forma mais significativa e mais recente, nas Ciências Cognitivas.
Durante muito tempo ninguém estudou a mente, excepto as pessoas da psicologia, que tinham uma inclinação muito comportamentalista - Skinner, claro e muitos outros. Mas quando as pessoas se aperceberam que não sabíamos muito sobre a mente, e continuamos a não saber, particularmente os aspectos mais interessantes da nossa vida mental - por exemplo, a consciência ou o que é experimentar o amarelo ou a dor, sobre os quais ainda não temos uma ideia clara - essa procura tomou a forma de um inquérito de incubação ou de ciência.
Voltando à sua pergunta, com todos os progressos das ciências naturais, se quisermos avaliar o nosso conhecimento científico, temos ainda de colocar questões filosóficas. O mesmo se passa com o espírito.
Se quisermos conhecer, por exemplo, os desenvolvimentos nas ciências cognitivas, temos de fazer perguntas filosóficas. Mesmo as pessoas que são profissionais - profissionais clínicos que lidam com a vida e a doença mental - acabam, pelo menos os melhores, por colocar questões filosóficas.
Por isso, o meu pensamento é que o trabalho da filosofia nunca está terminado. E o facto de ter toda esta descendência nas ciências, não só nas ciências naturais mas também nas ciências sociais, não significa que a filosofia seja suplantada por outras ciências mais rigorosas.

WOUBSHET: É interessante o facto de colocar a filosofia dentro das ciências. Mas, ao mesmo tempo, escreveu que “o que torna a filosofia um campo de investigação muito especial é que nenhuma área da atividade intelectual é estranha à filosofia”, o que me faz lembrar a observação de Terêncio - “Sou um ser humano, nada do que é humano me é estranho ”. 
Esta caraterização da filosofia fala-nos do esforço da literatura. Pode dizer-nos mais sobre as formas como a filosofia, por um lado, se situa nas ciências e, por outro, se insere no domínio das humanidades? Parece que a filosofia é única por se situar entre estes dois domínios.

ESHETE: O seu parentesco com a literatura é provavelmente o mais importante, na minha opinião - e porquê? 
Porque, em primeiro lugar, tal como a literatura, a filosofia aborda, por um lado, questões muito profundas e difíceis e, por outro, questões que toda a gente faz como, o que é ser moral, o que é fazer o que está certo, etc. 
Não se trata apenas de questões técnicas, mas de questões que toda a gente faz. O que é belo é uma preocupação de toda a gente. Por isso, de certa forma, a literatura e a filosofia partilham essa preocupação. E é muito importante que a investigação se baseie em questões que exercitem o senso comum. Esta é, portanto, uma área de afinidade. 
Em segundo lugar, acredito que a literatura é uma infinidade de coisas, mas, pelo menos para mim, uma das coisas moralmente importantes que a literatura faz é explorar mais possibilidades imaginativas, e digo isto num sentido muito lato.
Os escritores que admiro, por exemplo, o meu escritor de contos preferido é V. S. Pritchett e o que mais admiro na sua escrita, independentemente das suas capacidades, é o facto de se centrar em pessoas perfeitamente comuns. Ele mostra a complexidade da vida de pessoas inglesas perfeitamente comuns, como lojistas e idosos que são monumentos de um bairro.
Toda a gente defende a ideia de que cada vida humana é valiosa e tão valiosa como qualquer outra vida mas, normalmente, temos dificuldade em captar esta ideia. 
Este importante pensamento é transmitido e exemplificado na literatura e a filosofia aspira a fazer o mesmo. 
O outro ponto sobre as possibilidades imaginativas é que todos nós nos tornamos vítimas das circunstâncias, dos hábitos, das práticas, que são naturalmente facilitadoras, uma vez que não podemos passar sem elas, mas ao mesmo tempo somos prisioneiros delas; elas são, de uma forma ou de outra, restritivas.
E o que a literatura faz e, de uma forma muito importante, é mostrar as possibilidades imaginativas de ir para além delas.
A literatura mostra-nos novas formas de viver e novas formas de experienciar a vida. E isto é verdade, penso eu, não só nos romances mas em todos os géneros, na poesia, nos contos, até na história narrativa. E, de certa forma, a filosofia também o faz.
Por exemplo, uma das grandes tradições da filosofia é o cepticismo. E a força do cepticismo é fazer-nos questionar aquilo que consideramos completamente garantido. Por isso, este é um ponto importante de afinidade entre os dois projectos.

WOUBSHET: O que me leva a perguntar: o que o levou a estudar filosofia, tendo em conta a sua afinidade com possibilidades que também orientam a literatura?

ESHETE: Sabe, andei na escola há muito tempo e as pessoas, especialmente de países como a Etiópia, estudavam economia, medicina, qualquer coisa útil, sabe. 
Lembro-me de uma vez em que um polícia me mandou parar em Vermont. Eu estava a estudar em Williams e Vermont fica do outro lado da fronteira e eu passei algum tempo em Bennington. E então ele mandou-me parar e foi um bocado desagradável, provavelmente porque não se tinha cruzado com muitos negros. 
Esta é uma zona muito rural de Vermont, sabe, então eu expliquei-lhe que era estudante e que ia para Bennington e que era possível que estivesse a acelerar e que pedia desculpa e assim por diante. Ele perguntou-me o que estava a estudar em Williams e eu disse filosofia; de onde era, disse ele, e eu disse Etiópia. Para que é que precisas de filosofia? 
Penso que esta é uma reacção muito comum. Lembro-me que muitas pessoas, incluindo etíopes, me faziam a mesma pergunta. 
Uma das razões para estudar filosofia era que, nessa altura, as ciências sociais eram realmente desanimadoras. Tentei ler e não aguentei.  A única disciplina que falava dos meus interesses, e não de uma forma falsamente disciplinar ou académica, era a filosofia.

WOUBSHET: Fez os seus estudos de licenciatura em Williams e continuou a estudar filosofia como estudante de pós-graduação em Yale. Pode dar-nos uma ideia de quais eram as correntes filosóficas quando estava na pós-graduação? E o que é que o levou a dedicar-se à filosofia política em particular?

ESHETE: Foi na altura em que a filosofia analítica estava realmente em ascensão e a filosofia analítica na altura, significava filosofia linguística. Sob a enorme influência de Wittgenstein, toda a gente estava convencida de que a forma de progredir em filosofia era estudar a linguagem de uma forma muito restrita. Se nos sentimos atraídos por Austin, estudamos palavras e frases, e se nos sentimos atraídos por Wittgenstein, então estudava-se a linguagem de uma forma mais alargada. 
Esta era a ortodoxia, o que significava que a filosofia substantiva, a filosofia sobre questões de substância, era completamente marginalizada. E mais marginalizada era a filosofia prática. A ética era praticamente inexistente. A filosofia política estava morta. 
De facto, se alguma coisa se escrevia sobre filosofia política, era sobre a morte desta disciplina. E, felizmente para mim, houve uma exceção famosa, Hart. 
Hart tinha acabado de publicar o seu livro The Concept of Law. Pela primeira vez, havia uma pessoa que abordava um tema substantivo, o direito. E alguém o designou como livro para o exame final dos alunos de honra, e eu li Hart e e fiquei completamente apanhado por ele. 
Acabei por escrever em Yale uma boa parte da minha dissertação sobre Hart. E Hart continua a ser, na minha opinião, um dos filósofos práticos mais importantes, não apenas na filosofia do direito; por exemplo, a sua influência em John Rawls é enorme. 
Depois, claro, apareceu Rawls. Assim, os dois, mais ou menos sozinhos, foram responsáveis, juntamente com alguns outros - Bernard Williams é outro - por fazer a filosofia falar às questões de que falávamos antes, às questões que diziam respeito às pessoas e às instituições do quotidiano. 
Por isso, como eu tinha muita fome desta forma de investigação, dada a aridez desta área durante anos, estava desejoso de a seguir. E, de facto, em New Haven não havia ninguém que trabalhasse muito nestas
coisas. Por isso, fi-lo mais ou menos sozinho. E pude fazê-lo porque Yale era, de certa forma, um pouco resistente à filosofia analítica. Em Yale falava-se de Heidegger e de outros luminares continentais da filosofia do século XX.

(continua)

Se não fosse a arte este mundo era difícil de suportar

 


Como as nuvens se confundem com as pedras do chão, as manchas da parede da casa e a forma das ramagens da árvore. Os ramos negros e retorcidos como raios a criar tensão na harmonia mágica da paisagem - abandonada aos liquens.



Juan Brufal


A guerra mais antiga a decorrer no planeta é a dos homens contra as mulheres

 


Morreu a atleta olímpica queimada pelo companheiro. Rebecca Cheptegei foi brutalmente atacada à frente das filhas menores

A maratonista ugandesa Rebecca Cheptegei morreu na sequência de queimaduras, anunciou hoje o presidente do Comité Olímpico do Uganda, quatro dias depois de ter sido queimada viva pelo companheiro no oeste do Quénia.

Em abril de 2022, o corpo de uma atleta do Bahrein de origem queniana, Damaris Mutua, foi encontrado morto em Iten, nos planaltos do vale do Rift. O companheiro é suspeito do crime.

Antes dela outra atleta de 25 anos Agnes Tirop, dupla medalha de bronze mundial nos 10 mil metros (2017, 2019) e 4.ª nos Jogos Olímpicos de Tóquio nos cinco mil metros, foi encontrada esfaqueada em casa, pelo marido, Emmanuel Ibrahim Rotich,

Nos últimos anos, o atletismo no Quénia foi marcado por casos semelhantes de feminicídio.


Porque é que o TPI ainda não se moveu contra os talibãs?

 


Não há nenhuma dúvida que os talibãs estão a enterrar as mulheres afegãs, ainda vivas. Estão até proibidas de olhar para pessoas se não forem mulheres! E é evidente que não podem escudar-se na questão da tradição cultural dado que as pessoas a quem se dirigem estas violações grosseiras de direitos humanos são metade da população, estão contra a suposta 'tradição' e pedem ajuda internacional - e muito provavelmente haverá muitos homens afegãos também contra estas medidas que transformam as mulheres em escravas sexuais dos homens.

Penso que a petição de que fala o artigo do El País devia ser internacional e não devia ser só em nome de mulheres pois é evidente que qualquer homem minimamente decente também a assinaria.

O facto é que, desde que Guterres chegou à ONU os direitos das mulheres recuaram 500 anos. Países onde há muito se tinha legislado a proibição da mutilação genital feminina voltaram atrás: pois se os afegãos podem manter toda a população feminina como escravas sexuais, desde a mais tenra infância e serem recebidos com honras pela ONU, porque não podem os outros machos que andam por aí pelo mundo com esses anseios fazer o mesmo?

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Um grupo de mulheres espanholas iniciou uma recolha de assinaturas para instar o governo a iniciar um processo junto do Tribunal Penal Internacional para declarar o tratamento dado às mulheres e raparigas afegãs como um crime contra a humanidade. 

No dia 23 de agosto, o regime talibã ratificou uma lei que endurece a repressão social, poucos dias após três anos de regresso ao poder. 

Entre os 35 artigos contidos numa centena de páginas está a proibição do som da voz das mulheres em público, o que inclui actividades como cantar, recitar ou falar para um microfone. São mesmo proibidas de olhar para homens que não sejam seus familiares. São também proibidas de usar cosméticos ou perfumes, com o objetivo final de as impedir de imitar “os estilos de vestuário das mulheres não muçulmanas”.

A ideia de escrever uma carta com a recolha de assinaturas surgiu após a publicação dos artigos de opinião de Mariam Martínez Bascuñán -La voz de las mujeres afganas- e Soledad Gallego Díaz -Persecución de mujeres en Afganistán: ¿que esperamos? 

A antiga diretora do EL PAÍS interroga-se sobre a razão pela qual o TPI (Tribunal Penal Internacional) ainda não deu o passo de declarar as acções do regime talibã como um crime contra a humanidade. 

E mais ainda depois de Richard Bennett, relator especial da ONU para os direitos humanos no Afeganistão, ter afirmado que a institucionalização da opressão das mulheres e raparigas naquele país “deveria chocar a consciência da humanidade”.

“Nós, enquanto sociedade civil, não podemos dar início a um processo no TPI, o governo é que teria de o fazer. Enviámos a carta ao Ministério da Igualdade e estamos à espera que eles se pronunciem. A iniciativa ainda é muito recente, apesar de ter sido muito rápida”. Veremos se o governo reage e se o exemplo é seguido noutros países europeus. Sei que haverá acções mais específicas por parte das associações de mulheres. 

A carta que recolhe as assinaturas diz: “Nós, mulheres de todo o mundo, de diferentes áreas e profissões, nós que temos uma voz, estamos chocadas e queremos levantar a nossa voz em apoio às mulheres e raparigas do Afeganistão”. 

O documento recorda ainda a sua situação: “Estão sob um regime repressivo que viola os seus direitos humanos mais básicos, onde sofrem opressão, violência, repressão, assédio e humilhação constante. As mulheres e as raparigas afegãs não precisam de proteção ou de ser salvas, o que elas precisam é de direitos. Precisam que os seus direitos sejam garantidos e que não lhes seja permitido serem constantemente violados.


Infográfico deste dia - Incapacidade de pagar uma semana de férias ao ano, fora de casa na UE, 2023

 


Como de costume, somos os melhores dos piores quando se trata de economia e nível de vida.


u/gorillaz0e

September 04, 2024

Biden e Scholz - uma lástima

 


Maria Avdeeva

@maria_avdv

Hoje é difícil respirar. Estas belas almas - Yevhenia, Yaryna, Daria e Emilia Bazylevych - foram mortas pela Rússia em Lviv. E não, não é apenas Putin; são todos os russos que montam mísseis Kinzhal, que os lançam contra cidades adormecidas, que apoiam a guerra e que se mantêm em silêncio.



🇺🇦 EUA, Inglaterra, França e Alemanha, podem escolher salvar a Ucrânia ou deixá-la morrer

 

E estamos todos a ver a vossa escolha.


As violações de Mazan

 

Por estes dias decorre um julgamento, em França, de um caso abjecto e repugnante de um homem que durante dez anos drogou a mulher até à beira do coma (como hoje em dia muitos violadores fazem) e convidou desconhecidos internautas para virem a sua casa violá-la. Tem dezenas de vídeos e fotografias. São 51 arguidos, o número de homens 'bons pais de família' que respondeu imediatamente 'sim' a esta proposta deste marido que os psiquiatras dizem não ter nenhuma anomalia mental, apenas uma personalidade perversa e voyerismo. Isto dá muito que pensar.

liberation.fr conta o caso:


O caso das violações de Mazan

Durante nove anos, Gisèle P. foi drogada pelo marido, que depois recrutou homens para a violarem. 51 pessoas estão a ser julgadas a partir desta segunda-feira, em Avignon.

par Marlène Thomas et Juliette Delage

Por vezes, o caminho para o inferno é pavimentado com sonhos comuns: desfrutar de uma reforma solarenga, deixar o ritmo agitado da região de Paris por uma vida quotidiana mais suave.

Em março de 2013, Gisèle P., de 60 anos, e o marido Dominique P. mudaram-se para uma casa alugada com piscina em Mazan, uma comuna de 6000 habitantes no departamento de Vaucluse. É por detrás das grossas paredes desta casa vulgar que se esconde a abjeção. Será dissecada perante o tribunal penal do departamento de Vaucluse, num julgamento extraordinário que terá início em Avignon na segunda-feira, 2 de Setembro, e se prolongará até 20 de dezembro. 

51 homens, incluindo Dominique P., serão julgados - a grande maioria por “violação agravada”, um crime punível com vinte anos de prisão. 

Entre 2011 e 2020, drogada pelo marido até à inconsciência “próxima do coma”, segundo o despacho do juiz de instrução que conduziu a investigação, Gisèle P. foi violada por uma multidão de homens recrutados no site Coco.gg. pelo marido, que documentou o horror: 20.000 fotografias e vídeos - com títulos inequívocos (como “ABUSO /noite de 09 06 2020 com charly 6eme fois”) - foram encontrados no computador deste reformado de 71 anos. Estas imagens revelaram 92 violações, a maioria das quais cometidas no seu quarto.

Gisèle e Dominique P. conheceram-se em 1971 e casaram dois anos mais tarde. Tiveram três filhos, atualmente com idades compreendidas entre os 34 e os 47 anos. Vivendo nos subúrbios de Villiers-sur-Marne (Val-de-Marne), a família era, segundo a filha, “unida”.

Dominique P., antigo funcionário da EDF, teve várias profissões antes de se tornar vendedor de material informático; quanto a Gisèle P., fez carreira como representante comercial na EDF. As suas duas noras descrevem-na como “prestável”, “generosa” e “jovial”. 

Durante os seus últimos anos na região parisiense, Gisèle P. começou a ter “ausências”. O marido, como ele próprio admite, começou a drogá-la, utilizando sobretudo Temesta. O reformado relata, no decurso do inquérito judicial, uma mudança de atitude aos sessenta anos. Afastado das suas “responsabilidades familiares” e “sozinho” com a mulher, tornou-se “mais exigente nas suas fantasias sexuais”. 

Gisèle P. fala de uma “sexualidade normal”; não faz ideia que ele utiliza a submissão química para se entregar a “certas práticas sexuais que ela recusava”. O marido afirma também “sentir prazer ao ver a sua mulher ser tocada por outra pessoa”, uma “prática” que descobriu na Internet nos seus cinquenta anos. O seu exame psicológico concluiu que não existia “nenhuma patologia ou anomalia mental, mas sim um desvio sexual ou parafilia de tipo voyeurismo” e “uma personalidade perversa”.

A perda de memória e o cansaço de Gisèle P. acentuaram-se à sua chegada a Mazan. “Uma manhã, acordou em pânico, com um novo corte de cabelo, sem perceber como é que isso era possível. Foi ao cabeleireiro, que lhe disse 'sim, Sra. P., esteve aqui ontem'”, relata Stéphane Babonneau, um dos seus advogados, acrescentando que o casal, rodeado de amigos, não vivia ‘à porta fechada’, mas ‘saía e viajava’. 

Durante esta década de violência, consultou vários médicos, sempre acompanhada por Dominique P., que lhe atribuíam os sintomas ao excesso de trabalho devido aos cuidados com os netos na região parisiense. Nenhum dos médicos se deu conta dela estar sujeita a uma submissão química. 

Os familiares suspeitavam do aparecimento de Alzheimer, enquanto Gisèle P. se mostrava ansiosa e até tinha dificuldade em deslocar-se. “Ela vive com os sintomas de uma doença que ninguém consegue explicar e tem-se isolador”, diz Stéphane Babonneau.

Esta aparente normalidade desmoronou-se a 12 de setembro de 2020, quando Dominique P. foi detido pelos seguranças do supermercado Leclerc, em Carpentras, por ter filmado por baixo das saias de várias mulheres. A análise do seu material informático revelou o horror: milhares de fotografias de Gisèle P. inconsciente a ser violada, vídeos de violações, trocas de mensagens no Skype e na Coco, numa sala digital chamada A l'insu. “Ela não suspeita de nada?”, pergunta um internauta. “Não, ela atribui isso ao cansaço”, responde o marido. “És como eu, adoras o modo de violação”, escreveu a um terceiro. 

Dominique P. confessou rapidamente os factos à polícia. Confrontado com uma fotografia da sua filha Caroline Darian nua, que admitiu ter tirado sem o seu conhecimento, Dominique P. negou tê-la drogado. 

Mais adiante na história de terror, a correspondência do ADN do reformado permitiu à unidade de casos arquivados de Nanterre, no outono de 2022, acusar Dominique P. pelo homicídio precedido ou seguido de violação de uma mulher de 23 anos, em dezembro de 1991, em Paris, e pela tentativa de violação com arma de uma outra mulher de 19 anos, em 11 de maio de 1999, em Villeparisis.

Gisèle P., e os seus filhos, estão de luto de um marido (de quem pediu agora o divórcio) que ela descreveu na sua primeira audição como “um tipo fantástico”; de um pai descrito pela filha como “super presente”, que a acompanha à escola e ao baile. O luto de uma vida inteira de uma fachada de felicidade. 

Estas revelações cataclísmicas, seguidas de uma cobertura mediática no Le Monde e no Le Parisien em 2023, desestabilizaram o núcleo familiar, que voltou a unir-se com a aproximação do julgamento. “Depois de uma vida de trabalho, uma vida sem dramas, [Gisèle P.] aspirava a passar dias felizes com o marido. Quando o caso rebentou, o seu mundo desmoronou-se. A sua vida foi destruída”, insiste o seu advogado. 

Gisèle P. sofre de quatro doenças sexualmente transmissíveis e de “perturbação de stress pós-traumático grave, bem como de danos sexuais graves”, segundo o relatório psicológico. “O perito [concluiu] que as lesões que sofreu são directa, inquestionável e exclusivamente imputáveis aos acontecimentos a que foi sujeita”, constata o juiz. Abatida, pensou em suicidar-se.

Pela sua dimensão, duração e número de arguidos, este processo vertiginoso destrói a imagem do monstro, e do “louco”, os pressupostos da cultura da violação que tentam desumanizar os autores da violência. 

Os 51 arguidos são “pessoas comuns”, na sua maioria sem qualquer patologia mental ou psicológica. A sua idade varia entre os 26 e os 74 anos e provêm de todos os sectores da vida. Trabalham como jornalistas, militares, guardas prisionais, operários, informáticos, camionistas, etc. 

“Cada um dos seus percursos é único: o seropositivo que voltou seis vezes sem nunca se proteger, o homem que queria imitar Dominique P. e fazer o mesmo à sua mãe, o bombeiro, etc. 

Será possível encontrar um factor comum entre todos eles?”, afirma o advogado Stéphane Babonneau. Embora alguns dos arguidos tivessem um historial de violência doméstica ou sexual, a maioria era vista como pais empenhados, companheiros “carinhosos” e “amorosos” e amigos que “se preocupavam com os outros”, segundo as pessoas que lhes eram próximas.

Todos eles sabiam que Gisèle P. estava fortemente drogada, diz Dominique P. Apenas um terço das pessoas contactadas recusou a sua proposta de violar a sua mulher. 

A maioria dos violadores recusa ter tido conhecimento do seu estado de submissão química, uma questão-chave no processo. Quase em uníssono, testemunharam que pensavam estar a participar num “jogo libertino”. No entanto, o modus operandi não deixa dúvidas quanto ao facto de estarem bem informados da situação. Dominique P. pediu aos homens que estacionassem longe da casa, para não chamar a atenção dos vizinhos, e que não fumassem cigarros nem usassem perfume [para a mulher não estranhar o cheiro quando acordasse]. Quando chegavam, tinham de se despir na cozinha, lavar as mãos e até aquecê-las no radiador antes de entrarem no quarto sobreaquecido.

Os vídeos mostra Gisèle, a ressonar, a sua letargia e os avisos de Dominique P. “Não! Usa as mãos, não com as unhas, porque isso vai acordá-la, ela tem cócegas”, disse ele a Mathieu D., de 49 anos, em Outubro de 2020. O seu “hóspede” ficou espantado: “É uma loucura que ela não acorde”. “A sonofilia, a um tal grau de sedação, pode fazer lembrar a necrofilia”, diz um perito. 

Nalgumas gravações, a vítima mostra “engasgamentos e pausas na respiração durante certas sessões de felação”. Confrontados com as suas próprias contradições, vários dos arguidos tentaram desresponsabilizar-se de uma forma ignóbil: “Desde que o marido esteja presente, não há violação”, dizem vários deles.   

Jean-Pierre M., de 63 anos, propôs repetidamente “virem violar a sua mulher”. Entre 2015 e 2020, os dois homens terão cometido uma dúzia de tentativas de violação e violações contra a mulher de Jean-Pierre M., também com sedação química, que estão a ser investigadas.

No decurso deste processo, Gisèle P. terá de enfrentar pela primeira vez “estas 50 pessoas que a violaram e que ela não conhece”, como salienta o seu advogado. “É uma provação que nunca ninguém viveu. Nunca ninguém teve de lidar com tantos alegados violadores e com a descoberta dos factos em tribunal”, acrescentou. Não se prevê que as audiências se realizem à porta fechada. Gisèle P. espera um “julgamento social” para sensibilizar a opinião pública para a violação induzida por substâncias químicas. Para que nunca mais a ilusão da normalidade prenda as vítimas à violência durante tanto tempo.


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philomag comenta:

Estes 51 homens, são mais, “bons pais de família” do que monstros à espreita no fundo de um parque de estacionamento - como repetem desesperadamente os especialistas em violência sexual e doméstica.

Os jornalistas presentes ontem no segundo dia do julgamento relataram que as náuseas com os vídeos na sala de audiências alastraram-se de tal forma que o juiz presidente decidiu interromper a audiência por alguns minutos. 

Os homens, mas mesmo aqueles que são apanhados como coelhos nos faróis das provas, tentam minimizar-se e ilibar-se. É uma estratégia clássica que consiste em fazer do violador a anomalia, sempre o outro, no seio de um grupo de homens que nunca fariam mal a uma mosca.

É o mesmo mecanismo que o jornalista Félix Lemaître identifica num ensaio publicado hoje, La Nuit des Hommes. Une enquête sur la soumission chimique (JC Lattès)  [A Noite dos Homens. Um inquérito sobre a submissão química]

Numa festa techno, numa discoteca da Avenue Foch, nos arquivos de revistas de informação ou em fóruns de discussão, Félix Lemaître analisa o que leva muitos dos homens a fantasiar as mulheres “como mortas”. O seu trabalho leva-o ao cerne de um mal que não afecta apenas alguns pervertidos, antes são angustiantemente comuns. A sua conclusão: “Comecei esta investigação como uma caça ao desequilibrado; tornou-se uma perseguição interna às minhas memórias, para compreender por que razão cerca de 70% dos actos de submissão química e mais de 90% das agressões baseadas na vulnerabilidade química são cometidas por homens contra mulheres. [...] 

Encontrei em mim algumas das vítimas, mas também vi uma história partilhada com os agressores. Não gostei disso. Agora tenho medo porque sei que agredir mulheres não é apenas obra de criaturas desequilibradas mas está em todo o lado, entre nós”.

E dizer isto não é acusar cada homem individualmente, mas salientar que existe um continuum de violência, que vai desde a piada sexista até à agressão criminosa, tal como identificado pela pensadora americana Rebecca Solnit em Ces hommes qui m'expliquent la vie (L'Olivier, 2018). 

Este continuum tece uma teia de insegurança, e ansiedade em torno das mulheres, da qual, sim, todos os homens se aproveitam. Qual é o homem heterossexual que alguma vez se preocupou em proteger a sua bebida num bar? 

Não se trata de essencializar um grupo e os indivíduos que o compõem, submetendo-os a uma condenação colectiva automática, mas sim de pôr em evidência as estruturas institucionais patriarcais de permissividade de violência contra as mulheres em que estão confortavelmente imersos. Em Avignon, e publicamente graças à coragem de Gisèle Pélicot, é esse patriarcado que também está a ser julgado.

Educação: tem de haver uma articulação entre o individualismo social e o societal comum

 


Alguns pensadores atribuem ao liberalismo levado ao extremo o surgimento do individualismo social. A auto-afirmação do indivíduo, o direito dos indivíduos permanecerem diferentes e de escolherem à sua vontade os seus próprios modelos de felicidade e de vida adequados às suas diferenças exacerbadas. Todos têm liberdade de definir as suas orientações e referências: sexuais, de identidade, de género, de vida. 

As instituições que serviam de quadro de referência deram lugar ao mercado e aos meios de comunicação social que instigam, paradoxalmente, a realização da individuação do ego e das suas práticas, a partir de referências de consumo massificado e normalizado.

Numa sociedade assim, não há interesse em ler Crime e Castigo ou outra obra do género que obrigue a pessoa a ver-se a partir de um ponto de vista crítico, na sua humanidade comum. Uma personagem negra só pode ser representada por um actor negro, uma mulher lésbica só pode ser representada por uma actriz lésbica, numa negação da nossa matriz humana comum.

É neste contexto que os pais querem que os seus filhos sejam vistos como indivíduos excepcionais, querem que os professores vejam neles as mais pequenas diferenças que os tornam únicos em vez de pugnarem para uma educação que lhes permita integrar-se na sociedade. Não perder a voz própria na integração social é diferente de perder a integração social para afirmar todas as suas diferenças, mesmo as negativas e/ou irrelevantes. 

O discurso dos pedagogos actuais há muito que segue esta tendência de uma maneira também paradoxal que é a de exigir, simultaneamente, que a escola eduque cada aluno individualmente, que se dedique a desenvolver a sua diferença e o seu direito a impor a sua diferença, escolhida em total liberdade e que o eduque para a cidadania, para a colaboração, para a vida em comum, para a responsabilidade para com os outros, para a continuidade dos valores da comunidade, para o pensamento crítico.

Tem de haver uma articulação entre o individualismo social e o societal comum. A escola pública existe para a construção do comum e não para a miriadização das personalidades, idiossincrasias e diferenças até ao absurdo e à desagregação social.

Elogio da leitura



Crime e Castigo ilustra o funcionamento do processo criativo, os benefícios que a ficção proporciona à sociedade e a razão pela qual lemos romances (e vemos teatro e cinema) em primeiro lugar. Também expõe a ignorância cultural por detrás das tentativas de todo o espectro político de cancelar livros e autores pelas suas alegadas falhas ideológicas e morais. Estes ataques - especialmente chocantes quando vêm de leitores, colegas romancistas, departamentos de Inglês e outros que deveriam saber melhor - visam o valor central das Humanidades.

As histórias levam-nos para fora de nós próprios para que nos possamos ver a nós mesmos. Quando reflectem as nossas vidas, trazem-nos conforto, lembrando-nos que não estamos sós. Quando tratam de assuntos difíceis, ajudam-nos a explorar os nossos medos e traumas passados a partir da distância segura de um espaço imaginado. Quando nos divertem e iluminam, enriquecem a nossa imaginação. Aprofundam a nossa compaixão pelos que não amamos e revelam as facetas ocultas da nossa natureza.

Quem poderia, por exemplo, planear matar outro ser humano? Ou continuar os seus vícios à custa do seu filho? Só monstros. Não pessoas como nós. No entanto, quanto mais lemos Crime e Castigo, mais sentimos o sofrimento do assassino, Raskolnikov e do bêbado, Marmeladov. As suas escolhas e comportamentos repugnam-nos, mas reconhecemos o medo, a culpa e a vergonha em nós próprios e perdoamo-los como queremos ser perdoados pelos nossos próprios pecados.

A empatia - a base das artes - assenta numa verdade evidente, ainda que fora de moda - que, por baixo da pele, todos partilhamos uma humanidade comum. Independentemente da nossa raça, género, orientação, idade ou outra diferença, cada um de nós já sentiu todas as emoções e conheceu a graça e o desespero. As nossas circunstâncias individuais e expressões culturais podem ser radicalmente diferentes, mas a experiência universal de sermos humanos é a forma como conseguimos relacionar-nos com personagens e histórias escritas através de continentes e séculos.

Para compreender os outros, temos de nos compreender a nós próprios. Para criar personagens credíveis e psicologicamente complexas - especialmente quando essas personagens são repelentes e quebram tabus sociais - é necessário um auto-exame implacável. Esta investigação manifesta as obsessões, os defeitos e a capacidade de fracasso moral do romancista. Por vezes, essa exposição é literal, outras vezes é indirecta.

Allan Stratton

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Em "Crime e Castigo", Dostoiévski explora o dilema psicológico entre a culpa e o arrependimento, um caos que ressoa nas profundezas da condição humana. Raskolnikov, um estudante que se vê imerso numa espiral de justificativas e racionalizações, encarna a tensão entre uma moralidade que se baseia nas suas teorias sobre o homem extraordinário e a realidade brutal das suas acções criminosas.

A culpa, nesse contexto, emerge como uma força que não apenas o condena, mas que o transforma em prisioneiro da sua própria consciência refletindo a incapacidade de Raskolnikov de reconciliar as suas crenças filosóficas com a gravidade dos seus actos.

Por outro lado, o arrependimento surge como uma forma de reconhecimento do erro, uma possibilidade de restaurar a unidade quebrada e evitar transformar os erros em preconceitos cegos. No entanto, para Raskolnikov, o arrependimento não é imediato; é uma construção gradual, um processo que se desenrola por intermédio das suas conversas com Sonia e outras personagens que simbolizam a compaixão e a redenção. 

O arrependimento, portanto, não é apenas uma resposta emocional, mas uma força que o impulsiona a uma jornada de auto-descoberta e transformação. Eventualmente, à busca de um perdão.

A tensão entre culpa e arrependimento leva Raskolnikov a um estado de paralisia existencial, onde a acção se torna impossível e a reflexão se transforma em tortura. Essa dualidade não é apenas uma luta interna; é uma representação do conflito humano universal entre razão e emoção, entre o desejo de se afirmar como um ser superior e a realidade de ser um ser falível. 

Dostoiévski, ao explorar essa dinâmica, não apenas cria um retrato vívido da psique de Raskolnikov, mas também oferece uma meditação sobre a condição humana, sobre como os indivíduos navegam nas complexidades da moralidade, da responsabilidade e da busca por significado no meio do desequilíbrio e d caos.

A obra de Dostoiévski convida-nos a refletir sobre a natureza do arrependimento como um caminho para a redenção, enquanto a culpa, se não confrontada, pode levar à auto-destruição. O dilema de Raskolnikov permanece relevante, pois ilustra a luta incessante que todos enfrentamos ao buscar um sentido nas nossas acções e as consequências que advêm das nossas escolhas. É um lembrete poderoso de que o caos da mente humana, repleto de incertezas e contradições, é uma parte complexa da experiência de viver.

Oliver Harden

🇺🇦 De onde vem a autoridade da NATO e da UE?

 


Um porta-voz da NATO, em resposta à sugestão do Ministro dos Negócios Estrangeiros polaco, Radoslaw Sikorski, de abater os mísseis russos sobre a Ucrânia, advertiu que tais acções poderiam ter consequências para toda a Aliança, de acordo com comentários feitos à agência Europa Press.
O porta-voz sublinhou que a NATO tem a responsabilidade de evitar uma nova escalada da guerra russa e reiterou que a Aliança “não é parte no conflito e não se tornará uma” na Ucrânia. Embora reconhecendo o direito de cada membro a defender o seu espaço aéreo, o porta-voz advertiu que as acções tomadas por Estados individuais em apoio à Ucrânia “também podem afetar a NATO como um todo”.
“É por isso que os aliados devem continuar a consultar-se estreitamente”, acrescentou o porta-voz.
United24

Entretanto, a UE, apesar de ter anunciado com grande pompa, por diversas vezes, a decisão do G7 de congelar os bens russos e transferi-los para a Ucrânia, para que se possa defender-se, fez zero. Houve eleições, os novos deputados estão a tratar das suas novas vidinhas, estiveram de férias, há muita burocracia:

O facto de a UE não ter agido em relação aos activos russos congelados diz tudo sobre a política da UE e o fracasso institucional... Ninguém no comando, nada mais do que divisão e burocracia... (Guy Verhofstadt)

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A autoridade da NATO e da UE não vem das armas e do dinheiro, como se vê pela actuação desafiante da Rússia e de outros países. Esses factores, só por si, não valem absolutamente. Têm um valor relativo ao modo como são usados.

A NATO e a UE só têm um efeito dissuasor da agressão e da violência se forem consequentes e estiverem à altura das suas palavras. Fazer constantemente ameaças vãs e olhar para o outro lado enquanto os criminosos cometem crimes sabendo que os vêem perfeitamente mas não agem, tem o efeito de anular a autoridade que a força das armas parecia poder, e pode, exercer. Dá uma imagem de fraqueza e medo que é o alimento mais forte dos ditadores, dos bullies e dos criminosos.

Todo o professor sabe isto. Quando lidamos com alunos delinquentes ou bullies -e já todos tivemos a nossa conta deles- o pior que se pode fazer é fingir que não se vê o seu comportamento ou tolerá-lo com ameaças a que não se seguem as devidas acções. Esses alunos percebem imediatamente que o professor tem receio dele -e/ou do grupo- e que vai aguentar tudo o que lhe fizerem. Daí para a frente vão sempre a escalar na agressividade e o quando professor, a certa altura, quiser agir, já é tarde demais.

A 'des-escalada' das situações faz-se nos primeiros desafios, apelando à racionalidade, mas há alunos, os tais que são delinquentes e bullies, com quem a racionalidade, a argumentação e a psicologia não funcionam e, nesses casos, uma pessoa tem que não recuar no confronto e agir logo imediatamente no sentido de impor o cumprimento das regras, porque a segurança de todos os outros alunos da turma depende desse aluno conter-se e passar a agir dentro das regras e leis comuns. O que acontece, desde que a o DT e a direcção da escola apoiem o professor na sua autoridade legítima.

Foi o que a Ucrânia fez à Rússia: aguentou o confronto e não recuou. Depois pediu ajuda à autoridade: a ONU, a NATO e a Europa, para que a apoiassem na sua defesa legítima. Infelizmente, nenhum apoio foi rápido, decisivo, indubitável e consequente. A ONU dá uma no cravo e outra na ferradura: ora apoia a Ucrânia, ora deixa a Rússia, a entidade agressora, no comando do seu Conselho de Segurança; a NATO mostra ter medo de ser consequente e aconselha a que os seus membros não confrontem o bully e a UE ameaça com sanções que nunca mais vêm.

Putin não é um bully com quem se possa argumentar racionalmente. Vejo muito elementos de discurso e mentalidade comuns ao nazismo, ao russismo e ao islamismo. Há bocado vi na BBC uma entrevista ao ex-padre representante da Igreja Ortodoxa russa em Madrid, Rev. Dr. Andrei Kordochkin. Foi afastado depois de ter assinado, em 2022, uma carta conjunta com mais 300 padres contra a invasão da Ucrânia. Vive agora na Alemanha.

Quando o entrevistador lhe pergunta se a Igreja russa é um fantoche de Putin e se Putin é mesmo religioso ou apenas hipócrita, ele responde que na Rússia há duas crença enraizadas na população: a 1ª é a de que a Rússia define-se por ser uma potência expansiva. Tem muito orgulho em dizer que é algo que está no seu ADN e não podem evitar; a 2ª é a de que são um povo moralmente superior e que lhes cabe a eles serem o reservatório dos valores tradicionais que o Ocidente está a destruir. No entender de Putin e dos russos em geral, Deus é um homem, os homens são os protectores das mulheres, seres fracos e emocionais e daí a autoridade religiosa e política ser masculina. Portanto, Putin é religioso neste sentido de ir à religião buscar um quadro de valores tradicionais mas não é cristão porque não age como tal: defende a acção pela violência e não acredita nos Direitos Humanos. É isto o 'russismo'.

O 'russismo' é muito parecido, na sua mentalidade, com o nazismo e com o islamismo: todos têm o mesmo discurso de superioridade moral, misoginia a homofobia e salvaguarda dos valores tradicionais do mundo e nenhum deles acredita nos Direitos Humanos. O 'trumpismo' dos MAGA já está nos arredores deste discurso. Não são grupos sensíveis a argumentação racional e quanto mais o Ocidente os evitar ou tentar apaziguar, mais crescem em ousadia e agressividade e quando os ocidentais despertarem, compreenderem o perigo e quiserem fazer qualquer coisa já será tarde demais. 

Neste momento continua a haver decisores nos EUA e na Alemanha que acreditam que se pode reverter a situação ao tempo em que Putin era um parceiro económico e estão cegos para os custos políticos que essas falsa parceria teve e tem. Parecem os professores que, apesar dos alunos lhes chamarem estúpidos, bestas, os mandarem à merda, lhes atirarem coisas para os agredir, etc., normalizam tudo, convencidos que é possível manter a paz na turma e apaziguar o delinquente com conversas amenas e ameaças vãs.

As obras de referência (ajudam muito a compreender os planos de existência)

 


As obras de referência são expressões descontínuas do que se sabe ou acredita na altura em que são publicadas. Pense-se na ainda muito apreciada 11ª edição da Britannica (1910-1911), que contém artigos de uma série de escritores famosos, de T.H. Huxley a G.K. Chesterton. A alteração de livros de referência físicos após a sua publicação é incrivelmente dispendiosa, implicando normalmente a introdução manual de notas de errata.

Em contrapartida, as obras digitais podem ser editadas e os factos inconvenientes apagados da memória, mais ou menos por capricho editorial. A Enciclopédia Britânica (agora exclusivamente online) e a maioria dos dicionários 
online (incluindo o Merriam-Webster, também exclusivamente digital) são revistos com frequência e normalmente sem grande ou nenhum reconhecimento, devido não a erros de omissão mas à captação de audiências e às exigências da 'vibeoepistemologia', ou conhecimento derivado das ondas do momento. Estas já não são obras de referência no sentido tradicional; são antes expressões de um zeitgeist. Como se precisássemos de mais.
(...)
Bem conservados, organizados de forma lógica, ilustrados com diagramas e mapas adequados, os livros de referência podem ser uma alegria. E suspeito que são uma alegria que muitos de nós partilhamos, mesmo que não queiramos dizê-lo publicamente por receio de sermos rotulados de anormais.

Aprendi imenso com os livros de referência, muitas vezes de formas inesperadas e presumo que muitas pessoas muito bem sucedidas, inteligentes e eruditas tenham tido encontros semelhantes com esses livros. Talvez devêssemos normalizar o prazer de folhear livros de referência como um esforço intelectual pelo menos tão válido como a leitura de uma boa biografia ou romance.

DANIEL M. ROTHSCHILD in https://www.discoursemagazine
(excertos)

Complexity for breakfast


What level are you at? And for how long? And why? And you still know how to get to the next level? And you think the passage is external?



da net


Hopper was here

 

Edimburgo, 2024, por Craig McIntosh