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December 18, 2024

Gostava de saber o que significa isto

 

Finalmente, a ascensão da Inteligência Artificial (IA) generativa apresenta novas oportunidades e desafios na educação e não estamos claramente preparados para esta recente explosão da IA. Num dos muitos recentes estudos sobre o uso de IA na educação, concluiu-se que 94% dos trabalhos académicos nas universidades foi produzido por AI generativa e não foi detectado pelos professores. No ensino pré-universitário, a percentagem será semelhante, mas num cenário mais complicado, porque a impreparação dos professores é maior. Há um novo mundo à nossa frente, onde todos os alunos se tornaram competentes no uso do CTRL+C/CTRL+V em qualquer chatbot, mas os professores, de um modo geral, continuam a ignorar essa nova “competência” e insistem em pedir trabalhos de pesquisa para casa cuja integridade nunca é verificada. Não ensinam a fazer pesquisa com IA e de forma eticamente correcta, porque é mais fácil ignorar essa integridade e validar o trabalho como realizado. 

(Carlos Ceia)


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Em primeiro lugar, já não conheço nenhum professor que continue a pedir trabalhos de pesquisa feitos em casa, mas admito que haja quem ainda o faça. Agora, o que não entendo é essa frase tão repetida de ensinar os alunos a fazer pesquisa com IA de forma eticamente correcta. 

Quando este senhor informa que 94% dos trabalhos académicos universitários são feitos por um bot qualquer e não por si mesmos, isso significa que na universidade não ensinam os alunos a usar eticamente a IA ou significa que os alunos universitários sabem como fazer os trabalhos e ter boas notas sem terem que ter o trabalho de aprender?

A ética não é uma técnica que se ensine, a ética refere-se a princípios de moralidade dos comportamentos. Não é ético copiar e isso não tem nada que ver com a IA. Antes da IA os alunos já copiava da internet e antes disso copiavam dos livros. Só que agora a fraude é mais fácil e o proveito é maior. Os alunos sabem muito bem fazer uma pesquisa sem copiar, mas podendo não ter de ter o trabalho de investigar, estudar e aprender, escolhem esse caminho.

Os alunos estão numa fase de aprendizagem de conteúdos e processos, físicos e mentais. A IA é muito interessante para quem já tem estas aprendizagens consolidadas, mas não é pedagógica se for usada para substituir o próprio processo de aprendizagem, que é o que está a acontecer.

S.TO.P. - Protesto contra o uso exclusivo de manuais digitais

 


II) Protesto contra o uso exclusivo de manuais digitais 

O S.TO.P. junto com o movimento Menos Ecâs, Mais Vida e encarregados de educação saíram em protesto em defesa da saúde dos nossos alunos e de melhores condições de trabalho dos professores: MANUAIS DIGITAIS, COMO COMPLEMENTO, NADA MAIS!

Educação - concordo, no geral, com este artigo

 


Os rankings e a avaliação pedagógica que temos


Se não alterarmos o actual quadro curricular e o sistema de avaliação pedagógica que praticamos nas nossas escolas desde 2016, o ensino superior terá de começar a ser menos superior e mais inferior.

Carlos Ceia


As soluções do governo para a educação: pedir que trabalhem sem receber

 


O dinheiro é para contratos de meio milhão com primos.


Governo pede a professores reformados que reforcem apoios nas escolas de forma voluntária

JN

December 16, 2024

Educação - todos os dias isto





Mais um articulista que reduz o problema da educação às greves, logo aos professores e concluiu que se calhar isto da escola pública é uma narrativa dogmática e que o melhor é pôr tudo privado (não diz, mas é o que quer dizer) porque aí os professores andam todos a toque de caixa, caladinhos que o respeitinho ao patrão é muito bonito.

Entretanto, todos os problemas -reais- que enumera não têm causa nem solução. Só que eu e mais uma data de gente há muito tempo que predizemos exactamente o que se esta agora a passar. Andamos há quinze anos a explicar que as políticas de educação são erradas e porquê e que iriam acabar com a decadência do ensino e da aprendizagem e com a escola a não ter professores. 

Agora que lá chegámos, as soluções dos que nunca quiseram ouvir e pensar no assunto são, acabar com a escola pública. É à portuguesa: não queres encarar os problemas e quando eles te batem na cara como uma onda da Nazaré gritas que é preciso uma revolução. Porém, havia muitas reformas possíveis que nunca foram feitas.

Agora, que (quanto a mim) essa luta já está perdida, ando há uns quatro anos noutra de males que ainda se vai a tempo de evitar: a de se perder uma geração inteira ou mais, por causa do uso dos telemóveis e das redes sociais na infância e na adolescência.  Esta é, actualmente, a maior causa de problemas de aprendizagem (e de outros problemas sociais e mentais) que incluem, foco, atenção, motivação, estimulação, linguagem, resistência à frustração, capacidade de empenho, perseverança e outros. 

No entanto, os 'especialistas' da educação e os que vão atrás deles dizem que é preciso as crianças usarem as tecnologias ao seu alcance, como se uma tecnologia, só por ser tecnologia, fosse uma virtude. Daqui a 10 anos os 'especialistas' vão dizer que se perdeu uma geração porque os professores não souberam ensinar as crianças e adolescentes a usar os telemóveis responsavelmente, como se pudéssemos empurrar uma criança ou adolescente para um antro de pedófilos, criminosos, manipuladores gananciosos, proxenetas ou só idiotas profissionais e dizer-lhe, "entra e vai lá para dentro fazer amigos e aprender a ser como eles, mas enquanto por lá andares vê se te portas responsavelmente". Sendo as mesmas pessoas que vão pôr os filhos à escola, de carro, mesmo quando já andam no secundário, por receio dos perigos da sociedade actual. É uma anedota. Só que não dá vontade de rir.


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A análise que o DN faz neste dia sobre o estado das escolas públicas no final do primeiro período de aulas é muito mais do que uma listagem de horrores. Vejamos: um número não revelado, mas na casa das dezenas de milhares, de alunos sem pelo menos um professor três meses depois de o ano letivo começar; dezenas de milhares de computadores avariados e empilhados nas salas; números recorde de docentes a sair da profissão sem serem repostos; centenas de escolas com obras prometidas, mas nunca feitas. Das 446 greves de funcionários públicos registadas este ano, 279 são no setor da educação. O que significa que as possibilidades de os alunos da escola pública chegarem e esta estar fechada são exponencialmente maiores do que no privado.

Neste cenário, que qualidade de Ensino pode dar a escola pública, mesmo nos grandes centros urbanos? Portugal já se transformou num país em que só os filhos de pais com mais rendimento têm a garantia de poder ter um ano completo de aulas. É um facto. E o elevador social na escola pública está, desgraçadamente, mais dias parado do que a funcionar. Noutros não se lhe pode chegar, porque o portão está fechado a cadeado

Por mim, acho que há demasiados portugueses - não sei se influenciados pelas narrativas dos partidos em que votam - que se enquistaram em torno dos dogmas das qualidades intrínsecas, inabaláveis e inquestionáveis do SNS e da Escola Pública em Portugal. São, como é evidente para todos, falíveis. E precisam não de continuidade, mas de reformas profundas face ao modelo com que foram fundadas, o que existiu e que ainda existe. Mesmo que isso seja doloroso para o Governo do momento.

Nuno Vinha in Diário de Notícias

December 11, 2024

Concluir antes de sequer analisar

 


Este é um artigo enorme que compara a realidade portuguesa com a de outros países onde os adultos, em vez de declinarem nas competências de compreensão de linguagem e de cálculo, progridem. Fala de imensas variáveis e, sem ter sequer analisado metade das variáveis a que alude, conclui logo que os alunos precisam de mais contacto com dispositivos digitais sobretudo de competências numéricas.

Uma coisa interessante de notar é que os países onde os alunos não começam o seu declínio precocemente, não têm o ensino obrigatório até aos 18 anos como nós, mas até aos 16. 

Outra coisa interessante foi que, países que notaram uma decadência nos desempenhos e que nos últimos anos voltaram a melhorar, tiraram os dispositivos digitais da educação escolar (manuais digitais, tablets em vez de cadernos, etc.) e só permitem o seu uso em situações muito controladas e orientadas pelo professor.

Hoje ouvi uma conversa na sala de profs entre dois colegas que falavam dos resultados de uma turma do 8º ano. O professor de português dizia que a maioria dos alunos se queixa por ter que estudar 4 verbos. Dá muito trabalho. A professora de matemática dizia que uma grande porção das más notas que tem nos testes deve-se a que os alunos não compreendem o que lêem no enunciado e portanto não percebem o que têm de fazer. É a mesma linguagem que a professora usa nas aulas, mas como eles ouvem as palavras e aquele tipo de construção frásica, apenas nas aulas, não retêm nada. Não há nenhum reforço extra aulas porque a vidas deles é a internet medíocre das redes sociais. O professor de matemática de uma turma do secundário, que é supostamente uma das melhores, dizia que tinha feito uma boa porção dos exercícios do teste com exercícios do manual escolar que usaram nas aulas e mesmo assim falharam quase todos. 

Temos uma cultura de muitos anos de desleixo no trabalho: os alunos sabem que não têm de estudar e nem sequer têm de ir às aulas para passar de ano. São educados pela internet, pelas redes sociais, de maneira que têm uma linguagem conceptual muito pobre, sem elementos lógicos de ligação dos termos, com frases simples, quase sempre com os verbos no indicativo, no futuro simples ou no passado simples e tudo o que sai fora desse esquema não compreendem. Chegam ao secundário a turmas científicas sem nunca terem conseguido uma positiva a matemática e tendo tido 10% no exame de matemática do 9º e chegam às turmas de humanidades sem nunca terem lido um livro na sua vida. Até mesmo os livros obrigatórios dos currículos são substituídos por resumos da internet - obrigada João Costa por esta mediocridade. (leio por aí que isto já chegou às universidades e que a maioria dos alunos universitários também fazem o curso sem nunca lerem um livro) Porque é que o número de alunos interessados em cursos de ciências está a declinar? Porque obriga a estudar qualquer coisinha e não estão para ter nenhum tipo de trabalho.

Como é que se pensa ser possível, continuando nesta senda (e agora com professores que sairam antes de ontem do secundário ou estão a estudar biologia e vão ensinar português) melhorar as suas competências?

Penso que já disse aqui que um colega novo que anda a fazer formação para se profissionalizar como professor me disse há dois anos que a formadora só fala das emoções, da meditação e das questões de género... as pessoas que estão à frente das instituições vivem numa realidade alternativa e acreditam em magias, como aquela situação do Rui Tavares defender que os alunos à saída do secundário, fossem passear um ano à universidade para 'absorverem' conhecimentos e cultura... absorver...  tipo... não sei, pensos higiénicos...? É abaixo da crítica séria.

Hoje um colega disse-me que a proposta do ME para orientadores de professores novos, nas escolas, não só não contempla nenhuma redução do horário lectivo como propõe pagar ao orientador 28 euros por mês por cada formando que orienta...???   O que pensarão ser um trabalho de orientar professores novos? Dizer olá nos intervalos e falar com ele uma vez por mês numa horinha? Não percebo se isto é a gozar... mas olha, boa sorte com isso de arranjarem professores experientes (ou não experientes) nas escolas que queiram orientar colegas novos.

Portanto, penso que já o disse aqui, estamos nesta senda de destruir os alunos (vai para 10 anos) e a carreira de professor (vai para 20 anos) e cada governo que entra faz mais do mesmo, de maneira que não acredito que isto tenha volta atrás nos próximos 30 ou 50 anos. Passou-se um rubicão e estamos a caminhar para uma escola de elites e de pobrezinhos, à maneira americana. Não é possível sermos uma democracia plena, nem pouco mais ou menos, nestas condições.


Declínio das competências dos adultos portugueses começa logo aos 25 anos


Cerca de 40% da população adulta tem dificuldades em ler e escrever, utilizar números e resolver problemas, o que pode ser explicado por um “histórico atraso” nas qualificações dos portugueses.

Público


December 09, 2024

O que não se vê é com se não existisse

 


Quase metade dos alunos do 5.º ao 12.º anos dormem menos de oito horas por noite nos dias de semana. São os alunos mais novos que dizem descansar mais durante a semana, dormindo mais de oito horas, ao passo que os mais velhos dormem menos de sete horas por noite, revelam os dados do estudo mais recente do Observatório da Saúde Psicológica e do Bem-Estar.

Ao fim-de-semana, o cenário é, contudo, diferente: 76,9% dos estudantes dizem dormir oito ou mais horas. A psicóloga Margarida Gaspar de Matos, coordenadora do observatório, faz notar a relevância que o sono tem no desenvolvimento das crianças e jovens, admitindo que, nestas idades, deviam dormir entre oito e nove horas. E alerta para esta discrepância “preocupante” nas horas de sono entre a semana e o fim-de-semana: “Quando há uma diferença de mais de três horas entre as horas de sono à semana e ao fim-de-semana, consideramos que a criança ou o adulto está em privação de sono. E está muito ligado ao insucesso escolar, ao desinteresse pela escola, ao consumo de substâncias, à violência, às dores de cabeça.”

E esse é um dos efeitos mais negativos que a exposição aos ecrãs pode ter nestes adolescentes: “Quando o sono não é de qualidade é um grande preditor associado ao mal-estar.”

Alunos passam quatro horas por dia em frente a ecrãs

Mais de metade (52,8%) destes alunos do 5.º ao 12.º anos admitem passar quatro ou mais horas por dia em frente a um ecrã. São os do 12.º que mais horas lhes dedicam (quase cinco), ao passo que os do 5.º ano são os que dizem passar menos tempo em frente a ecrãs — ainda assim quase três horas. Ao fim-de-semana o tempo de ecrã é consideravelmente maior: quase dois terços (63,3%) dos alunos passam cinco ou mais horas por dia com ecrãs à frente.

Para a psicóloga, seja na escola, seja em casa, este deve ser um tema discutido com os jovens. “Sabemos que a punição e a proibição não são uma estratégia educativa maior.

Olhando para os estilos de vida destes alunos (...) Já em relação aos consumos, a grande maioria dos alunos diz não fumar (91%) nem beber (76,4%). São os mais velhos os que mais o fazem: 9,9% dos alunos do 12.º ano fumam todos os dias e 26,2% bebem pelo menos uma vez por semana, mas não todos os dias.

Cristiana Faria Moreira, publico.
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"A punição e a proibição não são uma estratégica educativa maior", mas a questão que se trata aqui não é a da educação mas a do consumo de uma droga viciante. As redes sociais são uma droga viciante que os alunos consomem durante 4, 5 ou mais horas por dia. Quando se proibiu o fumar em quase todo o lado isso foi considerado uma má estratégia educativa? Não, porque se tratava de acabar com um consumo viciante que que provoca doenças graves. Só porque as consequências do consumo de redes sociais não são visíveis como um cancro no pulmão, não quer dizer que não existam. Existem e são muito graves.

Há estudos nos países nórdicos desde os anos 90 que mostram que o uso precoce das tecnologias fez descer o QI das pessoas em níveis preocupantes. Operações matemáticas que mais de 90% dos alunos sabia fazer no fim da escola primária, agora só 4% o consegue. Não chega a 2 dois alunos por turma. Há estudos que mostram que as redes sociais são causa de depressão, ansiedade, reforço de comportamentos agressivos, desmotivação e desinteresse pelo estudo, incapacidade de concentração, perda de foco, perda de vocabulário, excesso de estimulação sensorial, vício na pornografia e sei lá mais o quê, mas continua a dizer-se que temos de educar as crianças a usar o telemóvel para estar 4, 5 ou mas horas por dia na internet responsavelmente.

December 06, 2024

Há 15 ou 20 anos que estes artigos de jornal aparecem recorrentemente

 


Já eram recorrentes muitos anos antes de haver falta de professores, quando já havia problemas a agravar-se na carreira docente, desmotivação a crescer e pessoas a desaparecer das escolas e continuam na mesma senda, mesmo já depois de não haver professores - coisa que há-de agravar-se nos próximos anos. 

A não-solução dos problema já nos custou os professores e vai-nos custar a qualidade do ensino porque agora, ao contrário do que acontecia, já não é possível ir escolher bons profissionais. Agora é mais, 'tudo o que vem à rede é peixe'. Pois mesmo assim, em vez de se resolver os problemas que assolam a educação, faz-se queixa das greves.

Sim, as greves prejudicam as aulas e os alunos - embora nós, professores, tenhamos estratégias preparadas para eventualidades e percalços - mas o que mais tem prejudicado os alunos nestes anos todos é o total desprezo a que a educação foi votada para poupar dinheiro. 

Fizeram esta cama mas não se querem deitar nela...

Ainda na semana passada li que a IL defende aulas online para combater falta de professores. Se não há professores onde se vão arranjar professores para as aulas online? O que é que a IL pensa que são aulas online? Como se fala muito em «dar aulas», as pessoas pensam que ser professor é «dar» palestras que temos decoradas na cabeça. Como é que as aulas online diferem das outras? Não implicam avaliações, fichas de trabalho, testes, discussão com os alunos, preparação diferenciada de aulas à distância, preenchimento de burocracia para cada aluno, etc? Quem é que vai dar aulas online? Os professores que dão aulas presenciais e já têm o horário cheio e com horas extra? Cada turma a mais representa uma enorme quantidade de trabalho de horas não lectivas, isto é, noites e fins-de-semana.

No mesmo artigo, a IL diz que, segundo as contas do seu líder, a redução de número de funcionários públicos pouparia entre 1500 a 2 mil milhões de euros. Lá voltamos à mesma de fazer contas de diminuir, em vez de dar qualidade aos serviços. Temos falta de professores, falta de médicos, de enfermeiros, de funcionários administrativos... mas a IL quer reduzi-los ainda mais. Se calhar devia ir ver onde estão esses funcionários públicos excedentários: nas administrações locais e central, vá ver os adjuntos, os assessores, os estagiários filhos de amigos do partido e todos esses que pedem aos amigos da política, "dá-me aí uma merda qualquer a ganhar 11 mil euros por mês, de preferência no estrangeiro". 

O dinheiro dos salários dos funcionários públicos são uma gota no oceano de desperdícios do Estado, da banca e das empresas públicas que são na ordem das dezenas de biliões.

Portanto, há 15 ou 20 anos que estes artigos de jornal aparecem recorrentemente, com as mesmas queixas e as mesmas não-soluções, mas parece que todo o mal são os funcionários públicos que o fazem e, em particular, os professores.

A educação em suspenso: falta de professores, greves e alunos sem aulas


A instabilidade crescente no sistema educativo já deixou milhares de alunos sem aulas. Esta realidade não só limita a aprendizagem dos alunos, como também acentua as desigualdades já existentes.



December 01, 2024

Este tipo de opiniões tem muito que ver com o radicalismo de direita

 

Tânia Gaspar, directora do Instituto de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade Lusíada de Lisboa, o trabalho tem de começar mesmo pelos adultos. “Eu não estou de acordo com proibições. O que temos é de promover coisas sustentáveis e que potenciem a auto-regulação. Quando se proíbe, na primeira oportunidade [o jovem] vai arranjar um esquema para contornar essa proibição e fazer coisas ainda mais perigosas, fora de qualquer controlo. Por isso não se vai proibir, mas criar condições para se fazer as coisas de forma segura. 

Vejamos: antes da proibição do tabaco e já depois dos pais saberem que o tabaco era causa de dependência grave e doenças graves (as tabaqueiras sabiam quais os ingredientes que deviam incluir nos cigarros para criar dependência) toda a gente continuava a fumar desde muito cedo: 12, 13 anos era a idade de iniciação. Depois da proibição de fumar o que aconteceu? Quase ninguém fuma e não há nenhuma revolução em marcha por causa da falta do vício. Quem fumava e foi proibido, habituou-se ou durante um tempo fumou às escondidas, mas as novas gerações que já nasceram nessa proibição não sentem falta de um vício que nunca tiveram. Quem diz que é contra a proibição não vê a dependência das redes sociais como um vício, tal como o tabaco ou o álcool, que causa estragos físicos e mentais, mas é. Há muitos estudos já que mostram a correlação entre o uso desregrado da tecnologia digital na infância e adolescência e a diminuição da inteligência. Desde quando uma criança ou adolescente, com 10 ou 15 anos, sabe auto-regular o seu vício? Nem os adultos sabem fazê-lo!

O ideal era haver um psicólogo de família que acompanhasse o desenvolvimento [das crianças e jovens] em todas as suas etapas, e mesmo antes do nascimento, porque há determinadas competências que devem ser adquiridas em determinadas idades e os pais não têm noção, fazem incorrecções”, afirma.

Esta afirmação de que devia haver um psicólogo por família para corrigir a educação dos pais tem muito que ver com o radicalismo da direita que se revolta contra a arrogância dos pseudo-pedagogos de entenderem que sabem a verdade sobre o ser humano e a sua educação e que devia haver maneira de corrigirem os pais com a última moda da Psicologia... à ciência da Psicologia cabe-lhe mostrar os resultados da últimas investigações, mas não corrigir a opinião dos outros adultos. Aí é que deve haver educação e não imposição porque não se lida com crianças e adolescentes mas com adultos que têm opções de vida próprias, por muito que custe aos outros as suas opiniões e escolhas de vida. 

São estas pessoas que andam nas Universidades de Psicologia a orientar a Psicologia da Educação para os disparates que hoje em dia norteiam as políticas educativas, como por exemplo, entender que as crianças e adolescentes têm conhecimento e desenvolvimento para saberem auto-educar-se sem a necessidade de educadores e que os adultos é que têm que ser corrigidos nas suas opiniões.

Jovens e redes sociais: “Sou sempre contra a proibição pura e dura”



November 29, 2024

Quando não se percebe que os pressupostos são condicionantes

 


Neste artigo, o reitor da Universidade de Aveiro, apesar de citar os pressupostos dos benefícios das competências digitais -utilização até 1 hora diária- desenvolve todo um raciocínio baseado na ideia de que não existe essa condicionante e que, se os professores das escolas ensinarem competências digitais avançadas, tudo se resolve e os alunos ficam magicamente habilitados a resolver problemas, criativamente e de modo estruturado. Para que os alunos cumpram esse pressuposto de utilizar os dispositivos digitais até uma hora diária, é necessário, desde logo, intervir juntos dos pais que são quem ensina os miúdos a usarem a tecnologia para se manterem entretidos e, mais tarde, conseguirem resultados sem terem de aprender. Pensar que os alunos nas escolas aprenderiam muito se tivessem competências digitais avançadas, ignorando o factos dos seus hábitos (constantemente reforçados pelos pais e pela sociedade em geral), serem os de usar a tecnologia durante mais de 6 horas diárias e para não ter que aprender, parece-me que é não perceber que os pressupostos citados são condicionantes da aprendizagem.


A tecnologia e o ensino

Paulo Jorge Ferreira

O relatório do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), terminado este mês, analisa o impacto dos dispositivos digitais na aprendizagem, especialmente em Matemática. Os dados dizem respeito aos países da OCDE e a análise considera o perfil socioeconómico dos alunos e das escolas.

Os alunos que utilizam dispositivos digitais na aprendizagem até ao limite de uma hora diária têm um desempenho melhor em Matemática, com uma diferença de 14 pontos, e o acesso a este tipo de ferramentas em casa está positivamente correlacionado com a motivação e proatividade dos alunos. No entanto, o estudo também conclui que o uso excessivo destes dispositivos pode comprometer os benefícios.

O acesso a competências digitais avançadas promove o pensamento computacional e desenvolve a capacidade de resolver problemas de forma estruturada, lógica e criativa. Contudo, o impacto do digital na escola ainda é limitado. Apenas 8,6% dos alunos da OCDE têm contacto frequente com programação nas aulas. Em Portugal, a percentagem é ainda mais baixa (6%).

Estes resultados mostram que é urgente repensar a forma como as escolas integram a tecnologia e como estão a preparar os jovens para o futuro, que será cada vez mais digital. Não basta dotar as escolas com recursos tecnológicos. É fundamental assegurar que esses recursos sejam usados de forma equilibrada e eficaz na aprendizagem. A importância do papel do professor nessa integração é um dos pontos sublinhados no documento.

A inclusão de competências digitais avançadas nos planos curriculares é indispensável para assegurar a relevância do ensino no futuro.

JN

November 27, 2024

Oportunidades estragadas e oportunidades agarradas

 


A nossa educação está cheia delas. Houve momentos cruciais de crise, no país e na educação que podiam ter sido, como acontece em todas as crises, oportunidades de evolução. Não foram e demasiado foi estragado para que essas oportunidades se apresentem de novo - pelo menos nos tempos mais próximos - porque ainda estamos na inércia descendente e ainda há muito caminho no declive. Vem isto a próximo de hoje ter tropeçado numa conversa de uns colegas sobre alguém que se reformou este ano - é a segunda vez que 'apanho' uma conversa sobre este assunto. "Foi-se embora um grande cancro", disse uma das pessoas. Ao que eu acrescentei, 'E levou atrás um par de metásteses'. Riram. Uma das pessoas comentou, 'Notou-se imediatamente uma diferença no ambiente da escola. Parece outra realidade'. Não comentei. Acho que agora é indiferente porque houve oportunidades que foram completamente envenenadas, como aqueles tumores grandes -como o meu- a que crescem patas (que os fazem parecer caranguejos, cancers) que se estendem e cobrem os orgãos saudáveis, enrolam-se à volta dos nervos e já não se conseguem extirpar sem ferir os orgãos e os nervos e matar o doente. Mas isso já não disse. Já não interessa. Agora é tarde.

Numa nota positiva, para os alunos ainda existem oportunidades, antes das salas de professores se encherem de professores estrangeiros que não falam português mas querem o emprego, sobretudo se vier associado a oportunidade de cidadania. Hoje comecei o tema do Conhecimento e levei uma ficha com tarefas para introduzir o tema a partir da reflexão dos alunos sobre conceitos e problemas desse tema. O tema é muito complexo de maneira que a ficha não é fácil e obriga a reflexão e discussão. Era essa a intenção. Foi uma ficha que fiz para a minha avaliação numa das formações de Filosofia que fiz este período. Melhorei-a um bocadinho. Pensei que os miúdos fizessem as tarefas em 45 minutos e nos outros 45 minutos fazíamos a  discussão das suas respostas. Pois, não. Passados 90 minutos ainda estavam a discutir -o trabalho foi em grupos- os conceitos e os problemas. Para cada resposta, havia sempre um do grupo que encontrava objecções - já há ali, em muitos deles, maleabilidade de pensamento e capacidade crítica :) Mas esta é uma turma interessada, no geral e, interessante. São alunos editáveis e auto-editáveis. Logo, aproveitam as oportunidades de aprender e evoluir. Vai sendo raro, assim em grupos grandes. Muito raro. Quando os alunos são assim e se envolvem com entusiasmo nas coisas tudo faz sentido e é muito gratificante.


Não concordo com Filinto Lima e penso que o esclarecimento dos números é muito importante

 


O anúncio público da passada semana relativo ao cumprimento (antecipado) do objetivo do Ministério da Educação, e que foi manchete de um semanário, trouxe à luz da atualidade o problema da escassez de professores. A ganhar densidade ano após ano, qual vírus implacável, prevê-se a contaminação ao resto do país, em breve a viver (mais) uma pandemia à qual as escolas do Centro e Norte não estão imunes, bem como o ensino privado.

Divergentes nos critérios utilizados, e na respetiva quantificação, as discussões (apaixonadas) estão intensas, assistindo-se a uma guerra de números que não interessa às escolas. Estas anseiam pela celebração de um acordo entre o Ministério e os sindicatos representativos dos assistentes técnicos e operacionais (e também técnicos especializados), por mais professores de Educação Especial, pela realização de obras no edificado escolar, pela revisão do estatuto da carreira docente e a atualização do Estatuto do Aluno e Ética Escolar, entre outros constrangimentos que em nada valorizam e dignificam a escola pública.

Filinto Lima in JN

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O ME vir anunciar que resolveu o problema da falta de professores e dos alunos sem aulas em 90% dos casos, dá a impressão que afinal a falta de professores é um falso problema que se resolve bem, quando é o oposto e é um problema que vai agravar-se com consequências muito negativas para o futuro da nossa educação pública e, por consequência, também do país. Por outro lado, o ME manipular os números para parecer que fez um brilharete, não o tendo feito, parece-me um mau indicador no que respeita à competência para resolver problemas e à intenção de pôr a educação ao serviço das estatísticas de sucesso - nisso de aldrabar, o seu antecessor era catedrático e o resultado foi este de não haver professores nem pessoas que queiram a profissão e de os alunos piorarem nos testes internacionais. Portanto, sim, o esclarecimento dos números desta «guerra», como lhe chama Filinto Lima, importa muito.

November 20, 2024

À atenção das editoras escolares

 


Cada vez temos mais alunos que entram nas escolas sem falar português. A maioria fala inglês. As editoras têm que actualizar-se e fazer versões dos manuais, mesmo que apenas digitais, por causa dos custos, em inglês. Contratem um tradutor para que os alunos estrangeiros tenham acesso ao manual escolar da disciplina e possam acompanhar os trabalhos. Neste momento, não fora o YouTube estar cheio de vídeos em língua inglesa sobre todos os temas e em todos os graus de complexidade, os meus alunos estrangeiros teriam dificuldade em acompanhar minimamente o trabalho - mas em disciplinas como a matemática ou a física, isso não serve.


November 17, 2024

Um alerta aos pais II

 





Um alerta aos pais

 





Quem pensa que resolve o problema da falta de professores só por conseguir arranjar professores engana-se redondamente

 


Conseguir arranjar professores é só o primeiro passo porque depois é preciso arranjar maneira deles não se irem embora. Isso vai ser extremamente difícil. Os jovens de hoje não são como as pessoas da minha geração ou até aquelas que andam agora nos 40 anos. Não. Hoje-em-dia há muita falta de mão-de-obra especializada em todo o lado e uma facilidade muito grande em ir trabalhar para outro sítio ou país.

Os jovens dos dias de hoje mudam facilmente de trabalho e às vezes nem têm uma razão específica, só querem variar. Vivem em casa dos pais e não têm encargos com rendas, alimentação e outros custos que nós tínhamos. Não fazem sacrifícios pelo trabalho. Por isso, não os vejo a aturar muito tempo alunos indisciplinados, pais mal educados e agressivos, direcções de escolas autoritárias, horários de trabalho esgotantes e mal pagos, falta de perspectivas de carreira, etc. Coisas que nós aguentámos, até porque saíamos de casa dos pais e não nos podíamos dar ao luxo de ficar sem trabalhar.

Portanto, o problema não é idêntico ao que tínhamos nos anos 80 quando havia milhares de estudantes a quererem ter acesso à educação e havia um país cheio de optimismo e vontade de educar a população num sistema democrático e de qualidade. Agora já não há esse espírito de optimismo nas virtualidade da educação e da democracia. Pelo contrário. Mesmo a esquerda, usa a educação para preencher tabelas de sucesso e desenvolver ideologias. A direita quer privatizar o ensino para manter privilégios.

Portanto, o meu prognóstico é muito negativo. Largou-se no sistema de educação um Cérbero mortal e as suas três cabeças foram, a destruição dos professores, a instrumentalização dos currículos para efeitos políticos (estatísticas de sucesso, reduzir custos) e a ossificação das direcções rodriguistas. Tudo isto num contexto de descrédito da educação, de degradação do ensino universitário e de desvalorização do esforço, do trabalho e dos conhecimentos científicos em geral e utilização errada da tecnologia.

(os alunos estão a recusar áreas científicas porque têm disciplinas onde têm de fazer algum trabalho fora da sala de aula, como seja estudar ou fazer exercícios, que roubam tempo às redes sociais, de que não abdicam. E, de qualquer modo, já não sabem concentrar-se num trabalho e persistir. Se propomos actividades que eles gostam, dizem que gostavam de fazer mas não querem se implica algum trabalho)

Na minha modesta opinião passou-se o rubicão e a situação já não tem volta atrás, até porque os políticos não estão dispostos a planos de longo prazo. De maneira que a educação vai continuar a degradar-se bastante e acabará na situação de antigamente de sistema de elitismo e é aí que vai estacionar. 

Na escola pública o ensino será um sistema baseado na sorte. A sorte dos alunos diferentes e interessados -que os haverá sempre- encontrarem-se com professores diferentes e empenhados, que também hão-de sempre haver mas, uns e outros, serão pequenas ilhas no meio do deserto. Os nossos políticos, vendo a escola pública como custos e querendo acabar com o insucesso e o elitismo por decreto, enraizaram ainda mais o problema.

Como vemos agora com a eleição de Trump, as lideranças têm muita importância. Trump ainda não entrou em funções e já ameaça toda a gente de que não gosta, Elon Musk já diz que vai acabar com o FBI (não querem ser investigados...), Trump diz que ele vai cortar 2 triliões nas despesas (não para beneficiar os pobres, mas para aumentar as suas fortunas) escolhe pessoas que querem acabar com as vacinas para a saúde, etc. Mas eles vêem-se como salvadores da pátria e os seus seguidores acreditam piamente que ele é o 'homem forte' que vai resolver tudo.

Nós tivemos um Trump na educação que foi a Lurdes Rodrigues. Dividiu os professores, pois os pais contra os professores, premiou as más práticas, sempre com um discurso populista contra os professores e uma acção de agregação de controlo total através das direcções. Tenho a certeza que ela não se vê como um Trump e até se julga muito competente e sabedora - tal como Trump se julga. Calculo que seja contra o Trump e tudo. 

Tivemos umas gerações de professores muito bons que ela não deixou florescer, não deixou desenvolver, fez questão de assediar, discriminar, envenenar com campanha públicas e, pior, exportou as suas práticas para as escolas. Tudo pelo controlo e poder.

Na minha escola os professores estão todos a reformar-se. Todos os anos vai uma dezena embora. Tivemos ali, durante uns vinte anos, muito professores muito bons. E se formos ver os resultados dos alunos nos exames até há uns 15 anos, havia sempre disciplinas que tinham resultados muito bons, não só em termos do Concelho mas em termos nacionais e havia outras disciplinas que tinham bons resultados com muita frequência. Pois quem for ver agora os resultados dos exames da minha escola destes últimos 15 anos só vê coisas más - havendo sempre aquelas excepções dos alunos que são muito bons, auto-motivados e têm pais com a perceção correcta da educação e dos professores que também são bons e resistem a tudo. 

Isto que se passou na minha escola, passou-se nas outras escolas públicas também e pelas mesmas razões. A Maria de Lurdes Rodrigues tirou a vida democrática às escolas e transformou-as em telenovelas de mau gosto. E, à medida que os alunos se deslocaram para as escolas privadas, dados os estragos nas públicas, o problema agravou-se. Como ninguém está disposto a pensar nos problemas ou a encarar os factos, havemos de ir decaindo até estacionarmos naquela situação de sistema elitista que tivemos em outros tempos. Se será por umas décadas apenas ou definitivamente, não sei, já cá não estarei. Quem cá ficar é que saberá.

Uma entrevista com Esther Cyna, especialista no sistema educativo dos EUA ( a propósito da eleição de Trump)

 


Uma entrevista muito interessante. Os que defendem a regionalização na educação talvez pudessem aprender com o que esta especialista diz sobre os efeitos da regionalização da educação nos EUA, apesar de serem um país rico e não remediado, como nós.


O sistema de educação dos EUA é o culpado pela reeleição de Trump?


Esther Cyna, entrevista por Virgile Ackah-Miezan

Vista do Velho Continente, a reentrada de Donald Trump na Casa Branca gera perguntas: “Como é que isto é possível? E de quem é a culpa?” A resposta fácil é que muitos eleitores americanos são simplesmente “estúpidos” porque não têm educação. O culpado é óbvio - a culpa é de um sistema educativo desastroso, que produz milhões de americanos cuja ignorância crassa os torna incapazes de fazer escolhas esclarecidas.

Esther Cyna, especialista no sistema educativo dos EUA, desafia este velho cliché. Não, os eleitores de Trump não são tão estúpidos como as pessoas nos EUA pensam! E este estereótipo, perpetuado do outro lado do Atlântico pelos opositores de Trump, também prejudica a franja democrata do país, perpetuando a sua imagem de uma elite desdenhosa.

Diz-se que os padrões educativos americanos são baixos. É verdade ou apenas um cliché?

Esther Cyna: É um pouco das duas coisas. De facto, é comum que alguns estudantes nos Estados Unidos, e mesmo adultos, não saibam colocar os países da Europa num mapa. Mas eu desafio os franceses a reproduzirem o mapa da América do Sul! E, no entanto, isto reflecte uma realidade: os programas escolares nos Estados Unidos não mencionam certas coisas. Não existem expectativas semelhantes às que temos em França, como o baccalauréat ou o brevet. Estes exames não existem tal como são e de forma tão normalizada nos Estados Unidos. No entanto, o nível esperado para aceder à universidade, com o teste SAT como pré-requisito para as candidaturas ao ensino superior, por exemplo, é comparável entre os Estados Unidos e a Europa. Culturas diferentes conduzem a abordagens educativas diferentes. Se os estudantes americanos são menos bons, por exemplo, em geometria ou em certos domínios da matemática, têm frequentemente um melhor domínio da expressão oral ou do debate.

Qual é a diferença entre o sistema educativo americano e o nosso?

Esther Cyna: Os dois não têm nada em comum. É difícil para uma pessoa em França imaginar até que ponto a educação nos Estados Unidos é descentralizada. Cada Estado define as suas próprias expectativas e programas. Além disso, dentro de um mesmo Estado, existem centenas de distritos escolares com poder de decisão em matéria de orçamento, de recrutamento e remuneração dos professores, etc., e que decidem os seus próprios programas. 

Estes distritos são geridos por cidadãos comuns, muitas vezes eleitos pelos habitantes. O seu número, a duração do seu mandato e a forma como são eleitos são variáveis. Têm um poder que nos parece desproporcionado. Existem 14 000 distritos escolares nos Estados Unidos. A maioria segue um programa normal, com o objetivo de ajudar os alunos a entrar na universidade. Recentemente, um movimento conservador começou a tentar orientar o currículo, introduzindo orientações religiosas ou censurando certos temas como a história do racismo, a identidade de género e a orientação sexual...

Alguns grupos conservadores podem ser muito intervencionistas. Um exemplo é a organização Moms for Liberty, que faz campanha contra os currículos escolares que mencionam os direitos LGBT ou a teoria crítica da raça. No Oklahoma, a Bíblia tornou-se um texto escolar padrão para todas as disciplinas. Isto não significa que não possa haver outros livros, pois é difícil imaginar um ano inteiro de matemática só com a Bíblia, mas que esta tem de ser mencionada pelo menos uma vez em cada disciplina. Na Florida, os professores de história são obrigados a ensinar uma versão revisionista da história, incluindo os benefícios da escravatura; as obras literárias que tratam de questões como a homossexualidade ou a não-binaridade são excluídas do programa.

Qual é a relação entre descentralização e desigualdade de oportunidades?

Esther Cyna: Existe uma grande disparidade entre bairros, sobretudo no que diz respeito ao acesso à universidade. Se alguém vem de um subúrbio abastado com um bairro de renome, tem acesso a muitos recursos, a um ensino de qualidade e a uma vasta gama de actividades extracurriculares. As pessoas provenientes de localidades muito pobres são particularmente desfavorecidas. 

Durante muito tempo, as universidades tiveram a possibilidade de compensar estas desigualdades com aquilo a que em França se chama discriminação positiva (o ato de favorecer ou desfavorecer certas pessoas com base na sua origem étnica, a fim de melhorar a igualdade de oportunidades), mas esta prática foi proibida por um acórdão do Supremo Tribunal no ano passado. 

É difícil imaginar que possa existir uma verdadeira igualdade nos Estados Unidos, onde os recursos escolares estão intimamente ligados à riqueza dos bairros. Os distritos escolares são financiados, em grande parte, pelo valor dos imóveis nas respectivas zonas. Se viver num bairro rico, o seu distrito escolar terá um grande orçamento, porque os impostos sobre a propriedade geram somas consideráveis. Por outro lado, num bairro mais pobre, mesmo que os bairros decidam consagrar uma parte significativa do imposto predial às escolas, os montantes continuam a ser irrisórios. Isto conduz a um círculo vicioso que amplifica o fosso de riqueza e a segregação.

Um estudo de 2018 concluiu que os distritos escolares maioritariamente brancos recebem mais 23 mil milhões de dólares em financiamento do que os distritos com um número equivalente de alunos maioritariamente negros e latinos. Embora alguns estados estejam a tentar atenuar esta situação através da redistribuição de fundos, a situação permanece praticamente inalterada. Por último, as actividades extracurriculares também ilustram as desigualdades. Estas actividades, muito valorizadas na cultura americana, exigem recursos financeiros consideráveis. Os bairros mais ricos podem pagar aos treinadores desportivos e financiar os clubes, enquanto os pais dos bairros mais ricos contribuem generosamente para estas actividades. As escolas das zonas desfavorecidas encontram-se numa situação muito diferente.

Qual é a divisão republicano-democrata, Trump-Harris, no que respeita à educação?

Esther Cyna: Nos Estados Unidos, a educação não é verdadeiramente uma responsabilidade presidencial. O assunto surge muitas vezes timidamente nas eleições presidenciais porque é mais um assunto dos Estados. O Departamento de Educação dos EUA, que existe a nível federal, desempenha um papel importante na ajuda às crianças com deficiência e às que vivem em condições de pobreza extrema, graças às decisões do Supremo Tribunal e às leis aprovadas na década de 1960. Estas garantem a proteção federal da educação das crianças com deficiência, o que não acontece com as outras crianças.

Nos Estados Unidos, a educação não é, de facto, uma responsabilidade presidencial. O assunto é frequentemente abordado de forma tímida durante as eleições presidenciais, uma vez que se trata de um assunto que diz mais respeito aos Estados. O Departamento de Educação dos EUA, que existe a nível federal, desempenha um papel na ajuda às crianças com deficiência e às crianças que vivem em condições de pobreza extrema, graças a decisões do Supremo Tribunal e a leis aprovadas na década de 1960. Estas garantem a proteção federal para a educação das crianças com deficiência, o que não acontece com as outras crianças.

Isto deve-se, em parte, ao facto de a deficiência transcender as distinções de classe e raça e ter sido, por isso, uma causa unificadora nos Estados Unidos. No entanto, Donald Trump planeia abolir este departamento, o que poria fim a esta ajuda federal. No seu primeiro mandato, nomeou Betsy DeVos, que defendia a privatização total da educação. Parece que Trump pretende continuar nessa direção, visando enfraquecer o sistema de ensino público a favor do sector privado. Um exemplo é o sistema de vouchers, que permite que os pais recuperem parte dos seus impostos para financiar o ensino privado dos seus filhos. Isto enfraquece as escolas públicas, porque o imposto redistribuído não beneficia todas as crianças.

Este sistema, experimentado desde os anos 90 em certas cidades como Milwaukee, contribui para as desigualdades, acentuando a concentração de alunos com deficiência ou pertencentes a minorias linguísticas nas escolas públicas. Em contrapartida, Harris e os democratas defendem a importância da educação pública, embora as suas medidas sejam muitas vezes simbólicas, como a proposta de Biden de nomear um coordenador contra a censura dos livros. Os democratas também se comprometeram a manter o apoio federal às crianças deficientes e desfavorecidas. No entanto, seria errado retratar os democratas como defensores incondicionais das escolas públicas. Eles apoiam formas híbridas de escolas, como as delegadas a grupos privados, uma política também promovida por Obama. Desde os anos 80, as políticas educativas dos dois partidos, republicano e democrata, têm sido semelhantes, com prioridades centradas no desempenho, na concorrência e na desregulamentação. Trump está a radicalizar estas tendências.

O que pensa da ideia de que a vitória de Trump está relacionada com o baixo nível de educação do eleitorado americano?

Isto pressupõe que o conservadorismo está associado à estupidez e que a inteligência se inclina necessariamente para a esquerda. Esta visão condescendente contribui para a imagem elitista do Partido Democrata, que repele parte do eleitorado americano. A ideia de que os eleitores de Trump são menos inteligentes é uma mistura de diferentes elementos. As sondagens mostram claramente uma correlação entre o nível de educação e as escolhas políticas: os licenciados votam maioritariamente nos democratas, enquanto os não licenciados tendem a apoiar os republicanos. 80% dos jovens brancos sem qualificações votam em Trump. Esta correlação pode ser parcialmente explicada pela classe social: nos Estados Unidos, um diploma é um marcador de classe porque o custo da educação é elevado. Existe também uma correlação semelhante entre rendimento e orientação política, com rendimentos mais elevados associados aos democratas. 

Os trabalhadores pobres aderem por vezes a um discurso que justifica a sua pobreza ou frustração apontando bodes expiatórios, como os migrantes ou os democratas, acusados de só falarem com as elites. No entanto, dizer que os conservadores são “incultos” é simplista. A vitória de Trump tem mais a ver com uma falta de pensamento crítico no que respeita à informação. 

A exposição à educação, nomeadamente às ciências e às humanidades, desenvolve competências que nos permitem desconstruir o discurso populista e distinguir entre o que é verdadeiro e o que é falso, entre o que tem base científica e o que não tem. Estas competências são, em grande parte, adquiridas na escola.

No entanto, desde há vários anos que assistimos ao triunfo da desinformação. Há também uma crise da importância da educação nos Estados Unidos, com um desprezo pelo intelectualismo e pela universidade que se tornou endémico no seio do partido republicano. Os campus universitários, vistos pelos republicanos como bastiões de ideologias progressistas, são associados a valores que eles rejeitam. Este desprezo pelo intelectual reforça as divisões sociais, particularmente num contexto em que as teorias da conspiração atraem indivíduos que procuram uma legitimidade alternativa à do sistema educativo tradicional. As teorias da conspiração dão poder às pessoas, persuadindo-as de que possuem conhecimentos superiores aos ensinados nas instituições tradicionais.

O Partido Republicano também está a tomar medidas para limitar a exposição dos jovens a questões de desigualdade e discriminação. Afirmam que os querem proteger, mas esta é também uma estratégia para construir um eleitorado mais receptivo à retórica conservadora. Ao mesmo tempo, os jovens que seguem influenciadores conservadores nas redes sociais são cada vez mais atraídos pelo partido republicano. Ao contrário do que se pensa, os jovens não votam necessariamente nos democratas, como as eleições de 2024 acabam de demonstrar.


November 14, 2024

Os alunos portugueses mostraram no PISA a virtude do anti-dogmatismo: Montenegro vai já destruí-la

 

O primeiro-ministro anunciou esta semana que pretende dar “a cada aluno um tutor educativo de inteligência artificial (…) para o ajudar a compreender o mundo”, no que parece ser uma visão de futuro, mas não passa de uma parolice. Não vem longe o tempo em que os envelhecidos professores de hoje, que alguns parecem querer ver partir, serão profissionais vintage invejados ou desejados, em especial pelos alunos que consigam perceber as diferenças, para além das aparências.

Paulo Guinote, dn


Os alunos portugueses destacam-se internacionalmente por terem espírito critico e entenderem que deve ouvir-se várias perspectivas antes de se comprometerem com uma. Atrevo-me a dizer que isso se deve aos professores portugueses e, talvez, à disciplina de Filosofia, uma disciplina onde se pensa sobre o ser humano, os seus problemas e o mundo e se aprende a compreender, investigando crenças e abordando várias perspectivas sobre os problemas. Pois, Montenegro vai destruir essa formação e substitui-la por uma aplicação digital que diz aos alunos o que devem pensar sobre cada coisa do ser humano e do mundo. Uma espécie de cidadania ideológica, mas vinda da direita.

November 09, 2024

Não sei o que entendem por apoio

 


Porque o ME, por vezes, em vez de ajudar ainda atira mais areia para a engrenagem. Em meu entender o importante são as horas lectivas que o cargo deve ter face ao trabalho que implica; o apoio das direcções nos casos de pais agressivos e inadequados (cada vez há mais casos desses e cada vez mais isso sobra para os directores porque os pais pensam que meter medo aos professores, passando por cima deles é um trunfo e passam o tempo a bater à porta deles); redefinir o cargo do Coordenador dos DT no apoio aos DT novos (o perfil da pessoa neste cargo é muito importante) e dar-lhes horas adequadas para esse trabalho; ter um ME que não assuma sempre que os pais e alunos são uns coitados; não dificultar o trabalho dos DT em particular (e da comunidade escolar em geral) atribuindo privilégios, como se fossem direitos, a serviços públicos que querem trabalhar numa bolha como se fossem privados e que acabam a desenvolver tiques de autoritarismo e má-vontade contra os DTs e a dificultar bastante o seu trabalho. 

Depois há outras medidas como ter psicólogos (plural) nas escolas porque há muitos casos de alunos que vêm ter com o DT ou com outros professores que os encaminham para o DT com problemas de violência doméstica, abandono dos pais, auto-mutilação, falecimento de vários familiares, imigrantes que estão aqui quase sozinhos, problemas de saúde (teria de haver um enfermeiro na escola a tempo inteiro), depressões suicidas, miúdos que entram em total ruptura com as famílias porque abandonam a religião da comunidade e ficam completamente desamparados, etc. 

Há situações de alunos difíceis porque os próprios pais têm problemas psicológicos. São situações que requerem apoio especializado. A minha escola tem duas psicólogas, uma educacional, muito boa, que tem imenso jeito para lidar com os miúdos e que trabalha em colaboração com o DT, a quem envio casos destes mencionados e noto grandes melhorias nos alunos ao fim de pouco tempo. Faz imensa diferença. A outra, psicóloga vocacional, no ano passado ajudou-me com uns pais que estavam num grande conflito com o filho porque não aceitavam que ele quisesse mudar de um curso de ciências para letras. Ter esses apoios faz muita diferença.

O trabalho de DT é muito exigente e desgastante porque levamos o trabalho para casa. Estamos à noite a pensar como resolver problemas complexos e a ler, falar com pessoas, etc. A quantidade de vezes em que estamos cheios de trabalho e passamos fins-de-semana em grande stress a ter que responder a queixas sem sentido nenhum de pais com problemas que em vez de colaborarem com os professores acham que o melhor é hostilizar os professores que são as únicas pessoas que se preocupam com os seus filhos, para além deles. 

Enfim. ainda nos dias de hoje acontece, ex-alunos de há anos que tenho no FB, mandarem-me mensagens a pedir ajuda porque estão em depressão, porque estão desempregados e com ideias suicidas... é um trabalho que gosto de fazer e acho que faço bem, porque sei exactamente o que ando a fazer e tenho aprendido muito com os erros ao longo do tempo, mas é muito exigente do ponto de vista emocional porque requer autoridade sem autoritarismo, coragem moral, tacto e grande capacidade de resolução de conflitos - entre alunos, entre alunos e pais, pais e professores, alunos e professores, professores e professores e até com outro pessoal das escolas que trabalha lá mas não compreende o desgaste físico, psicológico e emocional do trabalho dos professores.





November 08, 2024

Os alunos têm mau desempenho nas provas de aferição - isso só surpreende quem não está nas escolas

 

E quem não sabe dos estragos que se tem feito ao ensino, aos currículos, à possibilidade de maturação das estruturas da língua e cognitivas dos alunos com a infantilização da educação e o deslumbramento com a tecnologia a substituir a formação de estruturas sólidas de aprendizagem e conhecimentos.

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Os resultados das provas de aferição foram maus mas piores no 5.º e 8º ano. Por exemplo, apenas 1,9% dos alunos do 8.º respondeu bem às questões de Leitura e 1,6% dos do 5.º aos exercícios sobre Números. O relatório divulgado esta quinta-feira alerta para o decréscimo na qualidade das aprendizagens.

De acordo com o relatório do Instituto de Avaliação Educativa (Iave), foi nas disciplinas de Matemática, Ciências (provas do 5.º) e de Português (8.º) que os alunos revelaram maiores "dificuldades em atingir desempenhos dentro do esperado". Os resultados pioraram em relação às aferições realizadas em 2023, chegando ao ponto de serem classificados como de "pobres" no caso de Ciências Naturais.