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October 16, 2024

Uma lição para as mulheres: nunca abandonem estudos por nenhuma relação, por mais segura que pareça; e não fiquem a depender financeiramente de maridos

 


Vamos lá falar de pensão de alimentos e de compensação pelo trabalho doméstico


Toda a miríade de tarefas que cai em cima das mulheres num casamento, sobretudo quando há filhos, tem custos financeiros para elas – e ganhos financeiros para eles.

Maria João Marques

(...) o divórcio do jogador de futebol João Palhinha e a sua proposta de pagar uma pensão de alimentos ao filho de quase dois anos de 500€, valor que arrepia tendo em conta que o atual ordenado de Palhinha se situará à volta do milhão de euros mensais.

Porém, mesmo com a informação incompleta, este caso é ótima matéria-prima para se voltar a debater quer a questão das pensões de alimentos quer das compensações financeiras às mulheres por todo o trabalho não pago de que se ocupam em casamentos e uniões de facto, sobretudo quando existem filhos. E as estatísticas são claras e avassaladoras: segundo o já famoso estudo da FFMS sobre as mulheres em Portugal, de 2015, 72% das tarefas domésticas e 69% das tarefas de cuidado dos filhos ficam a cargo das mulheres nos casamentos e uniões de facto.

Sobre a pensão de alimentos aos filhos (também conhecidos como sorvedouros de dinheiro): as despesas não param. E dentro da pensão de alimentos não cabe só a alimentação. Cabem todas as despesas quotidianas com uma criança. Roupa, remédios, fraldas, produtos de higiene, brinquedos, material para atividades desportivas e extracurriculares, um sem fim de gastos. Claro que pode haver acordo para pagamentos à parte. Mas, do que observo, é uma forma de criar atrito e penalizar as mães (as estatísticas também falam aqui: 87,3% das famílias monoparentais em Portugal são encabeçadas por mães, pelo que as despesas são primeiramente suportadas por elas). Muitos pais fogem a pagar a sua parte das faturas que lhes são apresentadas. Muitos contestam-nas e pagam com atraso (por vezes só por ordem do tribunal), sobrecarregando as finanças das mães.

Que um homem com um ordenado mensal milionário, ganhando mais num mês do que muita gente recebe durante toda a vida ativa, pague só para as despesas correntes do seu filho de menos de dois anos uns magros 500€ – é indefensável. Que um pai rico procure manter a vida do filho com tostões contados, espremendo punitivamente a vida financeira da ex-mulher, bem, deve ser sinal da decadência moral dos tempos. Que tal coisa seja celebrada nas redes sociais pela direita conservadora e extrema-direita, alegadamente defensoras da família, só mostra a hipocrisia destes lados políticos.

Estes casos não são novos em jogadores de futebol. Já Simão Sabrosa também cortou o financiamento aos dois filhos do primeiro casamento quando estes fizeram 18 anos. Outro pai rico deixando de sustentar filhos que ainda estão a estudar – imoral. (Talvez haja um texto a escrever sobre os modelos fornecidos pelos jogadores de futebol aos jovens adeptos que os idolatram.)

Outro ponto: a compensação financeira a uma mulher em caso de divórcio. Patrícia Palhares não concluiu o curso de medicina dentária e deixou de trabalhar em prol do casamento. Neste momento está grávida, sem possibilidade de encontrar trabalho (dificilmente alguém contrata uma mulher que calhando nem vai cumprir o período experimental antes de se ausentar por meses) e sem meios de sustento. Claro que esta historieta também é uma lição às mulheres: nunca abandonem estudos por nenhuma relação, por mais segura que pareça; e evitem ficar na dependência financeira de maridos.

Desde a lei do divórcio de 2008, desse grande feminista José Sócrates, as mulheres ficaram penalizadas no pós-casamento, considerando-se que cada um dos ex-cônjuges deve prover ao seu sustento – e já se viu que, havendo filhos, é uma fórmula francamente castigadora das mulheres. Também se previu, nessa lei, compensação para o cônjuge que desproporcionalmente desempenhe as tarefas domésticas e de cuidado no casamento, renunciando excessivamente aos seus interesses próprios. O princípio é bom, mas vago e insuficiente.

Após anos de juízes marimbando-se nisto (incluindo no STJ) e persistindo na interpretação social das mulheres serem criadas não pagas dos maridos (e cara alegre por isso se faz favor), uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça de 2021 veio fixar um acórdão da Relação de Guimarães que estipulava uma compensação de 60.000€ pelo trabalho domésticofeito por uma mulher durante o casamento, segundo a fórmula um terço do ordenado mínimo por cada ano de casamento (ou união de facto). Considerou-se (e bem) que a divisão não equitativa das tarefas constitui um empobrecimento da parte que as desempenha e um enriquecimento de quem delas usufrui.

De facto, toda a miríade de tarefas que cai em cima das mulheres num casamento, sobretudo quando há filhos, tem custos financeiros para elas – e ganhos financeiros para eles. Limpezas, cozinhar, o planeamento de refeições e as compras de supermercado, o tratamento e compra das roupas, organização das festas dos miúdos, o acompanhamento junto de médicos e professores e educadores de infância, faltar quando os petizes estão doentes, compra de presentes e material escolar, e um quilométrico etc. Mesmo nos casais que partilham tarefas equitativamente, ou tenham ajuda doméstica, a gestão organizacional familiar está usualmente a cargo das mulheres. O que lhes retira tempo, energia e recursos financeiros para se dedicarem à carreira ou valorização própria. Do mesmo modo, beneficia os homens: têm quem faça trabalho familiar gratuitamente e dá-lhes tempo e estabilidade para ganhos profissionais. Além, em certos meios, do cachet social de ter uma mulher que "não trabalha".

Ora a fórmula de 2021 também não é suficiente. Toda a divisão de tarefas não equitativa tem de entrar nas contas de um divórcio. Algo que legisladores e juízes parecem não entender.

Público

September 05, 2024

A guerra mais antiga a decorrer no planeta é a dos homens contra as mulheres

 


Morreu a atleta olímpica queimada pelo companheiro. Rebecca Cheptegei foi brutalmente atacada à frente das filhas menores

A maratonista ugandesa Rebecca Cheptegei morreu na sequência de queimaduras, anunciou hoje o presidente do Comité Olímpico do Uganda, quatro dias depois de ter sido queimada viva pelo companheiro no oeste do Quénia.

Em abril de 2022, o corpo de uma atleta do Bahrein de origem queniana, Damaris Mutua, foi encontrado morto em Iten, nos planaltos do vale do Rift. O companheiro é suspeito do crime.

Antes dela outra atleta de 25 anos Agnes Tirop, dupla medalha de bronze mundial nos 10 mil metros (2017, 2019) e 4.ª nos Jogos Olímpicos de Tóquio nos cinco mil metros, foi encontrada esfaqueada em casa, pelo marido, Emmanuel Ibrahim Rotich,

Nos últimos anos, o atletismo no Quénia foi marcado por casos semelhantes de feminicídio.


September 04, 2024

As violações de Mazan

 

Por estes dias decorre um julgamento, em França, de um caso abjecto e repugnante de um homem que durante dez anos drogou a mulher até à beira do coma (como hoje em dia muitos violadores fazem) e convidou desconhecidos internautas para virem a sua casa violá-la. Tem dezenas de vídeos e fotografias. São 51 arguidos, o número de homens 'bons pais de família' que respondeu imediatamente 'sim' a esta proposta deste marido que os psiquiatras dizem não ter nenhuma anomalia mental, apenas uma personalidade perversa e voyerismo. Isto dá muito que pensar.

liberation.fr conta o caso:


O caso das violações de Mazan

Durante nove anos, Gisèle P. foi drogada pelo marido, que depois recrutou homens para a violarem. 51 pessoas estão a ser julgadas a partir desta segunda-feira, em Avignon.

par Marlène Thomas et Juliette Delage

Por vezes, o caminho para o inferno é pavimentado com sonhos comuns: desfrutar de uma reforma solarenga, deixar o ritmo agitado da região de Paris por uma vida quotidiana mais suave.

Em março de 2013, Gisèle P., de 60 anos, e o marido Dominique P. mudaram-se para uma casa alugada com piscina em Mazan, uma comuna de 6000 habitantes no departamento de Vaucluse. É por detrás das grossas paredes desta casa vulgar que se esconde a abjeção. Será dissecada perante o tribunal penal do departamento de Vaucluse, num julgamento extraordinário que terá início em Avignon na segunda-feira, 2 de Setembro, e se prolongará até 20 de dezembro. 

51 homens, incluindo Dominique P., serão julgados - a grande maioria por “violação agravada”, um crime punível com vinte anos de prisão. 

Entre 2011 e 2020, drogada pelo marido até à inconsciência “próxima do coma”, segundo o despacho do juiz de instrução que conduziu a investigação, Gisèle P. foi violada por uma multidão de homens recrutados no site Coco.gg. pelo marido, que documentou o horror: 20.000 fotografias e vídeos - com títulos inequívocos (como “ABUSO /noite de 09 06 2020 com charly 6eme fois”) - foram encontrados no computador deste reformado de 71 anos. Estas imagens revelaram 92 violações, a maioria das quais cometidas no seu quarto.

Gisèle e Dominique P. conheceram-se em 1971 e casaram dois anos mais tarde. Tiveram três filhos, atualmente com idades compreendidas entre os 34 e os 47 anos. Vivendo nos subúrbios de Villiers-sur-Marne (Val-de-Marne), a família era, segundo a filha, “unida”.

Dominique P., antigo funcionário da EDF, teve várias profissões antes de se tornar vendedor de material informático; quanto a Gisèle P., fez carreira como representante comercial na EDF. As suas duas noras descrevem-na como “prestável”, “generosa” e “jovial”. 

Durante os seus últimos anos na região parisiense, Gisèle P. começou a ter “ausências”. O marido, como ele próprio admite, começou a drogá-la, utilizando sobretudo Temesta. O reformado relata, no decurso do inquérito judicial, uma mudança de atitude aos sessenta anos. Afastado das suas “responsabilidades familiares” e “sozinho” com a mulher, tornou-se “mais exigente nas suas fantasias sexuais”. 

Gisèle P. fala de uma “sexualidade normal”; não faz ideia que ele utiliza a submissão química para se entregar a “certas práticas sexuais que ela recusava”. O marido afirma também “sentir prazer ao ver a sua mulher ser tocada por outra pessoa”, uma “prática” que descobriu na Internet nos seus cinquenta anos. O seu exame psicológico concluiu que não existia “nenhuma patologia ou anomalia mental, mas sim um desvio sexual ou parafilia de tipo voyeurismo” e “uma personalidade perversa”.

A perda de memória e o cansaço de Gisèle P. acentuaram-se à sua chegada a Mazan. “Uma manhã, acordou em pânico, com um novo corte de cabelo, sem perceber como é que isso era possível. Foi ao cabeleireiro, que lhe disse 'sim, Sra. P., esteve aqui ontem'”, relata Stéphane Babonneau, um dos seus advogados, acrescentando que o casal, rodeado de amigos, não vivia ‘à porta fechada’, mas ‘saía e viajava’. 

Durante esta década de violência, consultou vários médicos, sempre acompanhada por Dominique P., que lhe atribuíam os sintomas ao excesso de trabalho devido aos cuidados com os netos na região parisiense. Nenhum dos médicos se deu conta dela estar sujeita a uma submissão química. 

Os familiares suspeitavam do aparecimento de Alzheimer, enquanto Gisèle P. se mostrava ansiosa e até tinha dificuldade em deslocar-se. “Ela vive com os sintomas de uma doença que ninguém consegue explicar e tem-se isolador”, diz Stéphane Babonneau.

Esta aparente normalidade desmoronou-se a 12 de setembro de 2020, quando Dominique P. foi detido pelos seguranças do supermercado Leclerc, em Carpentras, por ter filmado por baixo das saias de várias mulheres. A análise do seu material informático revelou o horror: milhares de fotografias de Gisèle P. inconsciente a ser violada, vídeos de violações, trocas de mensagens no Skype e na Coco, numa sala digital chamada A l'insu. “Ela não suspeita de nada?”, pergunta um internauta. “Não, ela atribui isso ao cansaço”, responde o marido. “És como eu, adoras o modo de violação”, escreveu a um terceiro. 

Dominique P. confessou rapidamente os factos à polícia. Confrontado com uma fotografia da sua filha Caroline Darian nua, que admitiu ter tirado sem o seu conhecimento, Dominique P. negou tê-la drogado. 

Mais adiante na história de terror, a correspondência do ADN do reformado permitiu à unidade de casos arquivados de Nanterre, no outono de 2022, acusar Dominique P. pelo homicídio precedido ou seguido de violação de uma mulher de 23 anos, em dezembro de 1991, em Paris, e pela tentativa de violação com arma de uma outra mulher de 19 anos, em 11 de maio de 1999, em Villeparisis.

Gisèle P., e os seus filhos, estão de luto de um marido (de quem pediu agora o divórcio) que ela descreveu na sua primeira audição como “um tipo fantástico”; de um pai descrito pela filha como “super presente”, que a acompanha à escola e ao baile. O luto de uma vida inteira de uma fachada de felicidade. 

Estas revelações cataclísmicas, seguidas de uma cobertura mediática no Le Monde e no Le Parisien em 2023, desestabilizaram o núcleo familiar, que voltou a unir-se com a aproximação do julgamento. “Depois de uma vida de trabalho, uma vida sem dramas, [Gisèle P.] aspirava a passar dias felizes com o marido. Quando o caso rebentou, o seu mundo desmoronou-se. A sua vida foi destruída”, insiste o seu advogado. 

Gisèle P. sofre de quatro doenças sexualmente transmissíveis e de “perturbação de stress pós-traumático grave, bem como de danos sexuais graves”, segundo o relatório psicológico. “O perito [concluiu] que as lesões que sofreu são directa, inquestionável e exclusivamente imputáveis aos acontecimentos a que foi sujeita”, constata o juiz. Abatida, pensou em suicidar-se.

Pela sua dimensão, duração e número de arguidos, este processo vertiginoso destrói a imagem do monstro, e do “louco”, os pressupostos da cultura da violação que tentam desumanizar os autores da violência. 

Os 51 arguidos são “pessoas comuns”, na sua maioria sem qualquer patologia mental ou psicológica. A sua idade varia entre os 26 e os 74 anos e provêm de todos os sectores da vida. Trabalham como jornalistas, militares, guardas prisionais, operários, informáticos, camionistas, etc. 

“Cada um dos seus percursos é único: o seropositivo que voltou seis vezes sem nunca se proteger, o homem que queria imitar Dominique P. e fazer o mesmo à sua mãe, o bombeiro, etc. 

Será possível encontrar um factor comum entre todos eles?”, afirma o advogado Stéphane Babonneau. Embora alguns dos arguidos tivessem um historial de violência doméstica ou sexual, a maioria era vista como pais empenhados, companheiros “carinhosos” e “amorosos” e amigos que “se preocupavam com os outros”, segundo as pessoas que lhes eram próximas.

Todos eles sabiam que Gisèle P. estava fortemente drogada, diz Dominique P. Apenas um terço das pessoas contactadas recusou a sua proposta de violar a sua mulher. 

A maioria dos violadores recusa ter tido conhecimento do seu estado de submissão química, uma questão-chave no processo. Quase em uníssono, testemunharam que pensavam estar a participar num “jogo libertino”. No entanto, o modus operandi não deixa dúvidas quanto ao facto de estarem bem informados da situação. Dominique P. pediu aos homens que estacionassem longe da casa, para não chamar a atenção dos vizinhos, e que não fumassem cigarros nem usassem perfume [para a mulher não estranhar o cheiro quando acordasse]. Quando chegavam, tinham de se despir na cozinha, lavar as mãos e até aquecê-las no radiador antes de entrarem no quarto sobreaquecido.

Os vídeos mostra Gisèle, a ressonar, a sua letargia e os avisos de Dominique P. “Não! Usa as mãos, não com as unhas, porque isso vai acordá-la, ela tem cócegas”, disse ele a Mathieu D., de 49 anos, em Outubro de 2020. O seu “hóspede” ficou espantado: “É uma loucura que ela não acorde”. “A sonofilia, a um tal grau de sedação, pode fazer lembrar a necrofilia”, diz um perito. 

Nalgumas gravações, a vítima mostra “engasgamentos e pausas na respiração durante certas sessões de felação”. Confrontados com as suas próprias contradições, vários dos arguidos tentaram desresponsabilizar-se de uma forma ignóbil: “Desde que o marido esteja presente, não há violação”, dizem vários deles.   

Jean-Pierre M., de 63 anos, propôs repetidamente “virem violar a sua mulher”. Entre 2015 e 2020, os dois homens terão cometido uma dúzia de tentativas de violação e violações contra a mulher de Jean-Pierre M., também com sedação química, que estão a ser investigadas.

No decurso deste processo, Gisèle P. terá de enfrentar pela primeira vez “estas 50 pessoas que a violaram e que ela não conhece”, como salienta o seu advogado. “É uma provação que nunca ninguém viveu. Nunca ninguém teve de lidar com tantos alegados violadores e com a descoberta dos factos em tribunal”, acrescentou. Não se prevê que as audiências se realizem à porta fechada. Gisèle P. espera um “julgamento social” para sensibilizar a opinião pública para a violação induzida por substâncias químicas. Para que nunca mais a ilusão da normalidade prenda as vítimas à violência durante tanto tempo.


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philomag comenta:

Estes 51 homens, são mais, “bons pais de família” do que monstros à espreita no fundo de um parque de estacionamento - como repetem desesperadamente os especialistas em violência sexual e doméstica.

Os jornalistas presentes ontem no segundo dia do julgamento relataram que as náuseas com os vídeos na sala de audiências alastraram-se de tal forma que o juiz presidente decidiu interromper a audiência por alguns minutos. 

Os homens, mas mesmo aqueles que são apanhados como coelhos nos faróis das provas, tentam minimizar-se e ilibar-se. É uma estratégia clássica que consiste em fazer do violador a anomalia, sempre o outro, no seio de um grupo de homens que nunca fariam mal a uma mosca.

É o mesmo mecanismo que o jornalista Félix Lemaître identifica num ensaio publicado hoje, La Nuit des Hommes. Une enquête sur la soumission chimique (JC Lattès)  [A Noite dos Homens. Um inquérito sobre a submissão química]

Numa festa techno, numa discoteca da Avenue Foch, nos arquivos de revistas de informação ou em fóruns de discussão, Félix Lemaître analisa o que leva muitos dos homens a fantasiar as mulheres “como mortas”. O seu trabalho leva-o ao cerne de um mal que não afecta apenas alguns pervertidos, antes são angustiantemente comuns. A sua conclusão: “Comecei esta investigação como uma caça ao desequilibrado; tornou-se uma perseguição interna às minhas memórias, para compreender por que razão cerca de 70% dos actos de submissão química e mais de 90% das agressões baseadas na vulnerabilidade química são cometidas por homens contra mulheres. [...] 

Encontrei em mim algumas das vítimas, mas também vi uma história partilhada com os agressores. Não gostei disso. Agora tenho medo porque sei que agredir mulheres não é apenas obra de criaturas desequilibradas mas está em todo o lado, entre nós”.

E dizer isto não é acusar cada homem individualmente, mas salientar que existe um continuum de violência, que vai desde a piada sexista até à agressão criminosa, tal como identificado pela pensadora americana Rebecca Solnit em Ces hommes qui m'expliquent la vie (L'Olivier, 2018). 

Este continuum tece uma teia de insegurança, e ansiedade em torno das mulheres, da qual, sim, todos os homens se aproveitam. Qual é o homem heterossexual que alguma vez se preocupou em proteger a sua bebida num bar? 

Não se trata de essencializar um grupo e os indivíduos que o compõem, submetendo-os a uma condenação colectiva automática, mas sim de pôr em evidência as estruturas institucionais patriarcais de permissividade de violência contra as mulheres em que estão confortavelmente imersos. Em Avignon, e publicamente graças à coragem de Gisèle Pélicot, é esse patriarcado que também está a ser julgado.

August 31, 2024

Outras guerras - a da representatividade dos orgãos de soberania



A um ano e meio de distância, vemos já vários dedos no ar. Sem surpresas, são todos de homens, com mais de 55 anos, cabelo grisalho, experiência política e/ou mediática e níveis confortáveis de confiança. Em 2026 arriscamo-nos a comprar mais 5 anos da mesma História: aquela em que é uma miragem ver uma mulher como primeira figura do Estado.

António Costa, Mário Centeno, Santos Silva, Passos Coelho, Marques Mendes, António Guterres - sucedem-se os nomes masculinos, ora com legitimação dentro de um dos dois grandes partidos, ora com um histórico robusto de promoção pública. E é aqui que residem duas das razões para o vazio feminino. Em Portugal, depois de Maria de Lourdes Pintasilgo, em 1986, só houve mulheres candidatas à Presidência da República em 2016 e 2021. Concorreram Maria de Belém Roseira, Marisa Matias das duas vezes e Ana Gomes - ora como independentes, ora sem a gigante máquina partidária de um PS ou PSD. A todas faltava as longas horas multiplicadas por 15 anos de antena televisiva em horário nobre do “Professor”, divididas entre a TVI e a RTP, e que tornaram Marcelo Rebelo de Sousa como o expectável vencedor.

O mesmo protagonismo que tem agora Marques Mendes, todos os domingos na SIC, também há mais de 10 anos. Um privilégio aparentemente masculino: as mulheres representam apenas um quarto dos comentadores televisivos portugueses (24%), revela um estudo do ISCTE de março.

Para formar opinião e votar, é preciso conhecer as figuras e o seu discurso, e para isso é preciso dar voz. Mas para se ser uma voz apetecível para colocar em ecrã, nas páginas dos jornais ou nos microfones da rádio, é preciso também ir adquirindo protagonismo político (e vice-versa). E aqui, elas também estão a perder: a Lei da Paridade ainda não resolveu a misoginia, nem a eternização masculina nos lugares - neste momento as mulheres representam apenas um terço dos deputados, um número inferior a 2022. A lei atual permite que se possam seguir dois candidatos do mesmo sexo, sendo que em várias listas a composição é de dois homens, uma mulher, e assim sucessivamente.

Sem oportunidade de fazer política, não há oportunidade de implementar mudanças, de brilhar e de marcar a agenda. O mesmo se pode dizer em outras áreas da política: apenas cerca de um terço do corpo diplomático português é constituído por mulheres (de resto, na nossa História só houve uma Ministra dos Negócios Estrangeiros, e foi já há 20 anos). Elas próprias cresceram a acreditar que têm de cumprir uma lista infindável de requisitos para serem hipótese para o lugar, e somam-se estudos que mostram que as mulheres só se chegam à frente para uma determinada posição se sentirem que cumprem todos os itens da lista, ao passo que aos homens basta-lhes alguns dos tópicos e algum atrevimento.

Num país com metade de mulheres, muitas qualificadas e competentes, além de nunca ter havido nenhuma mulher Presidente da República, nunca houve nenhuma presidente do Tribunal Constitucional, nenhuma presidente do Supremo Tribunal de Justiça, nenhuma presidente da Câmara de Lisboa ou da Câmara do Porto.

Catarina Marques Rodrigues in a-formula-da-presidencia/

August 25, 2024

Ter o poder durante milénios e agora ter de o partilhar ou até largar

 


Este filme (colorido com IA) foi feito mesmo no fim do período Otomano que governou Jerusalém  (e não só) desde o início do século XVI. Durante todo o século XIX assistiu-se a um repovoamento de Jerusalém por parte dos judeus e dos cristãos, com a construção de igrejas e algumas guerras de permeio. Quando se chega ao final do século, como se vê neste filme, verdadeira 'máquina do tempo', árabes, muçulmanos, judeus e ocidentalizados (pelo menos nas roupas), talvez cristãos, misturam-se na rua sem atritos. O que não vê são mulheres. Nem uma para amostra. Até há muito pouco tempo, uma parte grande do mundo -não apenas o Médio Oriente mas o também o Oriente e o Extremo Oriente bem como o Norte de África islamizado- estava habituado a ter as mulheres presas em casa, não-escolarizadas, dependentes, infantilizadas e submissas. No Ocidente e em outras partes do mundo, a situação das mulheres era um bocado melhor porque pelo menos não estavam presas, fechadas em casa, impedidas de poderem usufruir do planeta, de que os homens se apoderaram como se fosse sua propriedade exclusiva. 

Jerusalem, 1897, colorized




Os homens não se estão a adaptar bem a uma sociedade em que as mulheres são mais instruídas, competem com eles por empregos e não querem ter filhos com eles.


Conheça os incels e os anti-feministas da Ásia
Ameaçam agravar ainda mais o declínio demográfico da região


Kim woo-seok, um cozinheiro de 31 anos de Seul, cresceu a questionar a forma como a sociedade trata as mulheres. Tinha pena da sua mãe que ficava em casa. Considerava-se um feminista mas, nos últimos anos, as suas opiniões mudaram. 

Quando se deparou com mulheres activistas na Internet, ficou chocado ao ver que algumas delas faziam comentários humilhantes sobre os homens, incluindo gozar com pénis pequenos. “Senti que a minha masculinidade estava a ser atacada”, diz Kim. Acredita que, desde a década de 2010, a sociedade coreana se tornou mais discriminatória contra os homens do que contra as mulheres. Embora tenha uma namorada, muitos dos que partilham as suas convicções na região não a têm.

Nos países avançados, o fosso entre os sexos aumentou, com os homens jovens a tenderem a ser mais conservadores e as mulheres jovens a tenderem a ser mais liberais. Esta tendência é particularmente notória na Ásia Oriental. 

Os homens não se estão a adaptar bem a uma sociedade em que as mulheres são mais instruídas, competem com eles por empregos e não querem ter filhos com eles. De acordo com um inquérito realizado em 2021, 79% dos homens sul-coreanos na casa dos 20 anos consideram que são vítimas de “discriminação inversa”. No vizinho Japão, um inquérito realizado no mesmo ano revelou que 43% dos homens com idades compreendidas entre os 18 e os 30 anos “odeiam o feminismo”.

À primeira vista, isto pode não parecer assim tão invulgar. Grande parte da Ásia Oriental tem tendência a ser bastante patriarcal. O Japão e a Coreia do Sul são os países com pior desempenho no índice “glass-ceiling” da revista The Economist, que mede o grau de compatibilidade do ambiente de trabalho com as mulheres em 29 países ricos. 

Na OCDE, um clube de países maioritariamente ricos, a Coreia do Sul tem a maior diferença salarial entre homens e mulheres. As mulheres ganham menos 31% do que os homens. No Japão, essa diferença é de 21%. Num inquérito realizado em 2023 pela ipsos, uma empresa de sondagens, 72% dos sul-coreanos concordaram que “um homem que fica em casa a cuidar dos filhos é menos homem”, a taxa mais elevada entre os 30 países inquiridos.

Mesmo assim, a vida das mulheres melhorou em grande parte da região. A “preferência pelo filho” da Ásia Oriental está a desaparecer, esperando-se que tanto os rapazes como as raparigas tenham um bom desempenho escolar. 

A taxa de inscrição das raparigas na universidade é agora mais elevada do que a dos rapazes na Coreia do Sul, China e Taiwan. No Japão, continua a ser mais elevada para os rapazes, mas apenas em três pontos percentuais. 

As mulheres estão a entrar cada vez mais na força de trabalho: no Japão, a taxa de emprego das mulheres com idades compreendidas entre os 25 e os 39 anos ultrapassou os 80% pela primeira vez em 2022. Na Coreia do Sul, 74% das mulheres com idades entre os 25 e os 29 anos estão empregadas.
Este sucesso é a primeira causa da reação adversa. Os jovens estão “rodeados de mulheres que se saem melhor na escola ou que se destacam no trabalho”, afirma Lee Hyun-jae, da Universidade de Seul. 
Muitos homens sentem que “a igualdade de género já foi alcançada”, diz Lee. Num mundo que acreditam já ser igualitário, muitos jovens sentem que as políticas suplementares destinadas a promover as mulheres são injustas. A maioria não quer confinar as mulheres ao lar. Mas, mesmo assim, sentem-se frustrados.

Outro fator é o facto de os homens da Ásia Oriental viverem em tempos económicos menos optimistas do que os dos seus pais. O Japão assistiu ao rebentar da sua “economia de bolha”, pondo fim a décadas de crescimento notável, em 1991. A Coreia do Sul foi duramente atingida por uma crise económica em 1997. Os jovens nascidos desde então viveram numa época marcada por um crescimento lento. O modelo de trabalho “assalariado” a tempo inteiro foi-se desgastando, com o aumento dos empregos precários ou a tempo parcial. 

No ano passado, no Japão, a inflação atingiu o nível mais elevado das últimas quatro décadas (cerca de 3%, ou seja, ainda baixo para os actuais padrões do mundo rico). Os salários reais diminuíram nos últimos dois anos. Na Coreia do Sul, a percentagem de homens jovens que não estudam, não trabalham nem seguem qualquer formação (neet) aumentou de 8% em 2000 para 21%. Em contrapartida, a percentagem de mulheres que não estudam, não trabalham e não seguem uma formação (neet) diminuiu de 44% para 21% durante o mesmo período

Entretanto, o mercado dos encontros está a tornar-se mais brutal. Há cada vez menos pessoas a casar: mais de 60% das mulheres japonesas com vinte e poucos anos não são casadas, o que representa o dobro da taxa registada em meados da década de 1980. 

No Japão, a idade em que os homens perdem a virgindade sempre foi elevada. E continua a sê-lo: em 2022, 42% dos homens na casa dos 20 anos afirmaram nunca ter tido relações sexuais, enquanto 17% dos homens na casa dos 30 anos também eram virgens. Um relatório governamental de 2022 concluiu que 40% dos homens nunca tinham tido um encontro.

As tendências matrimoniais são semelhantes na Coreia do Sul e em Taiwan, enquanto os partos fora do casamento continuam a ser raros. Isto significa que os países estão a envelhecer e que não estão a nascer bebés suficientes para sustentar a população. 

A taxa de fertilidade da Coreia do Sul é a mais baixa do mundo, com 0,72. A de Taiwan é de 0,87, enquanto a do Japão é de 1,2. Na Coreia do Sul, algumas mulheres abandonaram completamente as relações heterossexuais. 

Em 2019, surgiu ali um movimento marginal “4b”. Trata-se de mulheres que se abstêm não só do casamento e do parto, mas também de encontros e de relações sexuais com homens. Acreditam que uma vida com um homem é uma vida sem liberdade. “Nem sequer estou a lutar contra o patriarcado - decidi afastar-me dele”, diz Kim Jina, uma praticante do 4b.

Outro fator é que a raiva contra as mulheres está a ser alimentada online. Kim, o cozinheiro, segue Bae In-gyu, um influenciador no YouTube que lidera o New Men on Solidarity, um grupo de defesa dos direitos dos homens. Bae afirma que “o feminismo é uma doença mental”. Na Coreia do Sul, um insulto online popular entre os homens é kimchinyeo ou “kimchi bitch”, um termo que implica que as jovens coreanas são materialistas, controladoras e dispostas a viver parasitariamente à custa dos homens. No Japão, tsui-femi, que é a abreviatura de “Twitter feminists”, tornou-se um termo depreciativo.


À semelhança dos incels (ou celibatários involuntários) no Ocidente, surgiu um grupo de homens japoneses conhecidos como jakusha-dansei ou “homens fracos”. “Quando se trata de encontros, as mulheres têm um poder de decisão esmagador”, diz Horike Takeshi, um japonês de 25 anos que nunca teve uma namorada. Ele identifica-se como um “homem fraco” devido ao seu baixo rendimento e à falta de sex appeal para as mulheres.

Os políticos da Coreia do Sul estão a ceder a estes jovens eleitores masculinos zangados. Yoon Suk Yeol, o actual presidente, fez campanha há dois anos com a promessa de abolir o ministério da igualdade de género. Afirmou que o feminismo está a prejudicar “as relações saudáveis entre homens e mulheres”. 

O serviço militar obrigatório de 18 meses é um ponto de inflamação especial. Ao contrário dos seus pais, que cumpriam o serviço militar sem questionar, os jovens coreanos estão cada vez mais desencantados. De acordo com um inquérito realizado em 2021 pela Hankook Research, uma empresa de estudos de mercado, 62% dos homens coreanos com idades compreendidas entre os 18 e os 29 anos, a idade de alistamento, consideram que o serviço militar é uma “perda de tempo”.

A vizinha Taiwan enfrenta desafios semelhantes. Os seus homens também têm de cumprir o serviço militar, embora por um período muito mais curto. Mas, segundo Huang Chang-ling, da Universidade Nacional de Taiwan, não existe ali um movimento anti-feminista organizado. A frustração dos jovens taiwaneses, ao contrário da dos sul-coreanos, “não se tornou suficientemente forte para ser explorada por qualquer político”, diz Huang. Da mesma forma, no Japão, onde não existe serviço militar obrigatório, os políticos ainda não decidiram estimular o voto incel.


O aumento do sentimento anti-feminista é um mau presságio para as taxas de natalidade da região. Na Coreia do Sul, um inquérito governamental revelou que mais de 60% dos homens coreanos na casa dos 20 anos acreditam que casar e ter filhos é “necessário” para as suas vidas. 

Apenas 34% das mulheres do mesmo grupo etário concordam. Mas será que os homens e as mulheres da Ásia Oriental conseguem encontrar um terreno comum? Um inquérito realizado por uma aplicação de encontros no ano passado revelou que, entre os solteiros divorciados, 37% das mulheres coreanas afirmaram que um homem “patriarcal” seria o seu par menos preferido. Uma percentagem semelhante de homens disse que não queria sair com feministas. ■

economist.com/asia/meet-the-incels-and-anti-feminists-of-asia

August 21, 2024

A 'machização' do desporto feminino interessa a quem senão aos machistas?

 



O ano em que o desporto feminino de alta competição se tornou paródia

Não é doença, não é um tema “trans”, nem nenhuma condição esquisita. Pouco frequente, apenas. Têm cromossomas XY, são homens com DSD (diferenças de desenvolvimento sexual).

Maria João Marques

No fundo, percebo. São crianças que nascem em países pobres, com cuidados de saúde materno-infantis deficitários. As mães, grávidas, não tiveram acesso a ecografias onde se diagnosticassem condições pouco frequentes. Quando nascem, as crianças exibem exteriormente o que parece uma vagina. E crescem como raparigas. Depois chegam à puberdade e, ao invés de menstruarem e desenvolverem as especificidades femininas, pelo contrário: o corpo torna-se masculino. Em muitos casos, finalmente respondendo à testosterona (em níveis de puberdade masculina), o pénis finalmente desenvolve-se, enfim, brota para fora do corpo que anteriormente se pensava ser de uma rapariga.

É o caso de uns tantos rapazes na República Dominicana, conhecidos como ‘guevedoces’, porque o pénis lhes aparece só por volta dos 12 anos. A maioria, em adultos, vivem como homens, apesar de, em crianças, terem sido socializados como raparigas. Praticamente todos são heterossexuais: homens atraídos por mulheres.

Em alguns casos mantêm os órgãos sexuais femininos externos, tendo desde sempre órgãos sexuais masculinos – testículos normais, produtores de espermatozoides – internos. Como Caster Semenya, que ganhou medalhas de ouro olímpicas pelos 800 metros – femininos – em 2012 e 2016, bem como em vários campeonatos do mundo.

Não é doença, não é um tema "trans", nem nenhuma condição esquisita. Pouco frequente, apenas. São homens com deficiência de 5-alfa reductase. Têm cromossomas XY e, apesar da aparência dos órgãos sexuais externos, crescem para ter corpos masculinos. Comummente: são homens com DSD (diferenças de desenvolvimento sexual). E, ao contrário do que tantos afiançaram, homens com DSD não são mulheres.

Repetindo: percebo. Ninguém deseja ter uma condição que baralhe a nossa existência sexual. Quem vive com estas condições merece empatia e compaixão. Por outro lado, são países pobres, famílias pobres. Havendo uma rapariga (pensa-se) com talento para o desporto, ganhando facilmente competições, bem, aproveita-se a sorte. O desporto tem este lado bonito de ser um caminho de mobilidade social ascendente para miúdas e miúdos de meios pobres. Quem vai desperdiçar a oportunidade de carreira no desporto feminino, de ganhar dinheiro e fama, só porque na adolescência não menstrua e o corpo se torna igual aos rapazes? Melhor manter-se oficialmente como mulher e ser uma estrela desportiva.

Sucede que do outro lado estão mulheres desportistas, que se esforçam para obter os melhores resultados, têm a mesma expectativa de sucesso profissional com o desporto e merecem justiça desportiva ao invés de competirem com homens com DSD e a sua injusta vantagem física.

A questão dos homens com DSD no desporto de alta competição não é nova. O próprio Comité Olímpico finge querer controlar ao impor limites máximos de testosterona, para dar a ideia (mas só a brincar) de garantir justiça. Ora não garante. A documentação científica é abundante: um corpo que passou por puberdade masculina ganha vantagens desportivas – massa muscular mais volumosa, maior força, maior coração, maior capacidade pulmonar, mais densidade óssea – sobre as mulheres, que não são eliminadas se, mais tarde, se tomarem fármacos para reduzir testosterona.

Antes do folclore dos jogos, Lundberg et al publicaram no Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports, este ano, o estudo The International Olympic Committee framework on fairness, inclusion and nondiscrimination on the basis of gender identity and sex variations does not protect fairness for female athletes, constatando-o. A vantagem desportiva existe a partir do momento em que se passa pela puberdade masculina – que é o caso dos homens com DSD no desporto feminino.

Por tudo isto, foi com perplexidade (e horror) que vi tanta gente abandonar critérios científicos para aplaudir corpos masculinos dando olimpicamente socos em mulheres. Nem sequer pediam mais dados físicos sobre Lin Yu-tang ou Imane Khelif antes de subirem para o ringue para bater em mulheres.

Por azar, todos os indícios vão no sentido de Imane Khelif e LinYu-tang terem corpos masculinos. O grego ex-chefe do departamento médico da IBA afirmou publicamente em conferência de imprensa que Khelif e Lin eram homens biológicos segundo dois testes em dois laboratórios reputados em dois países diferentes. Nenhum recorreu para o tribunal arbitral do desporto da desqualificação pela IBA com base no resultado dos testes. Um vice-presidente da World Boxing(aceite pelo Comité Olímpico), então na IBA, também já afirmou que Khelif e Imane tinham cromossomas XY.

O jornalista americano de desporto Alan Abrahamson viu os testes e confirmou os resultados. Os comités olímpicos da Argélia e de Taiwan ameaçaram a IBA caso divulgasse os resultados. O preparador físico de Imane Khelif, George Cazorla, assumiu ao Le Point que Khelif e a sua equipa sabia da "anormalidade" cromossomática há anos e tomou medicação para baixar a testosterona. A boxer nigerianp-búlgara Joana Nwamerue também relatou que a equipa de Imane lhe disse que a vida nas montanhas alterara a argelina biologicamente (além de que Khelif tem força e técnicas de homem). Imane Khelif processou um rol de gente por ciberbullying, mas curiosamente não processou os que afirmaram institucionalmente os resultados dos testes da IBA.

Do outro lado tivemos o presidente do Comité Olímpico defendendo Khelif e Lin com os argumentos bestialmente científicos de assim estar no passaporte, viverem como mulheres e terem competido nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Além de sugerir genialmente que não há definição científica do que é uma mulher.

O selecionador espanhol Rafa Lozano falou à Marca da injustiça de ter Khelif e Lin no boxe feminino e como Khelif era um perigo a combater mulheres. De facto, foi um bom indicador da tolerância da violência sobre mulheres aplaudir corpos masculinos a bater em mulheres como desporto olímpico. Foi um momento escuro de que não se sai.

Mas não é só uma questão de boxe e segurança. É também sintoma de como se despreza o desporto feminino. Desde logo, por que diabo o desporto feminino não está reservado a mulheres? Porque é só uma brincadeira, afinal, e é o local para despejar quem não se qualifica para a excelência do desporto – masculino, claro.

Público


October 08, 2023

Completamente de acordo

 


O facto de um homem dizer que sente que é uma mulher ou vice-versa, é perfeitamente legítimo. O que não é, nem devia ser legítimo é a sociedade aceitar que esses trans substituam as mulheres e lhes retirem direitos em todas as áreas. Aliás, não vemos o oposto, quer dizer, pessoas que tendo nascido mulheres mas dizem sentir-se homens, a querer invadir o espaço e os direitos dos homens. São só os nascidos homens é que querem apagar os direitos das mulheres e substituí-los pelos seus. What else is new...?
Se os trans querem entrar em concursos de beleza, que o façam com outros trans num concurso próprio.
A mim o que mais me espanta é ver tantas mulheres e muitas que se dizem feministas, aceitarem alegremente ver diminuídos os seus direitos e ainda pensarem que isso é o progresso.

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Um homem ganhou o concurso de Miss Portugal. Um homem disfarçado de mulher, ou mascarado, ou operado. Mas um homem. Alguém que nasceu com os cromossomas XY e que, por mais estética que aplique, por mais cirurgias a que se submeta, morrerá XY.
(...)
Qual Patrícia Mamona, qual Telma Monteiro, qual Vanessa Fernandes, qual quê. Fernanda Ribeiro? Rosa Mota? Já foste. Não tarda nada e as mulheres acabarão acantonadas nos becos sem saída das nossas sociedades, emparedadas, reduzidas a restos porque os homens usurparam o seu lugar. Ficarão remetidas ao papel de prenhas e parideiras. Barrigas de aluguer de borla. Nem para relações sexuais servirão. E isto enquanto não chegam os úteros artificiais, claro. Depois, nem isso. Serão apagadas, silenciadas, enfiadas em alguma cozinha, porão ou cave.

E não venham com tentativas de silenciamento e exclusão, insultando quem isto denuncia de homofóbico, transfóbico, intolerante, anacrónico. Se a invasão dos homens nas esferas das mulheres e se o esbulho dos nossos talentos, méritos ou dons não é machismo, patriarcado, opressão, então o que será?!

Não se trata de discurso de ódio. Aliás, há mais ridicularização das mulheres por homens que se fazem passar por nós, apresentado-se em modo caricatura e cravejados de maneirismos e meneios disformes, do que em qualquer problematização desta agenda. Aliás, é evidente que martelar esta ideologia serve sobretudo para dividir e reinar. Eis os orgulhosamente anti-mulher. Orgulhosamente Sós. Só eles. Os neófitos orgulhosamente sós. Ao pé disto, qualquer ficção de Margaret Atwood parece um históriazinha. Para meninas.

Joana Amaral Dias


September 20, 2022

Texas, USA




@LbudisaLila

Levei a minha filha de 17 anos ao médico por causa de uma infecção sinusal. A enfermeira mediu-lhe a tensão arterial e fez algumas perguntas, uma das quais, a data do seu último período...


Replying to @LbudisaLila
Uma amiga da mulher do meu filho candidatou-se a um emprego. Mandaram-na fazer um teste de urina. O laboratório ligou-lhe a dizer dizer que não estava grávida. Os Recursos Humanos ligaram-lhe a dizer que tinha passado no teste. Ela recusou o emprego depois de lhe terem dito que teria de repetir o teste a cada 3 ou 4 meses. Tx.

O que se segue? Isto:

Daqui para a frente é preciso votar tendo em conta a posição dos partidos/pessoas nestas questões que são mais importantes que as económicas e outras porque retiram às mulheres a liberdade de viverem de acordo com a sua consciência, o seu interesse e os seus direitos.


September 13, 2022

Está tudo errado neste vídeo

 


Um homem, um idoso de idade e de cabeça, a falar pelas mulheres, com as mulheres atrás dele a deixarem que ele fale por elas, a dizer baboseiras estúpidas acerca do mundo concordar com ele... a uma mulher que descreve uma experiência devastadora. Ele não quer saber. As mulheres para estes tipos são como galinhas ou vacas reprodutoras que têm de ser postas com trela e dono. No Alabama, agora prendem as mulheres grávidas se as vêem fumar e depois não as soltam porque alegam que não tomam conta dos fetos e têm de ser guardadas à vista. Isto não tem que ver com humanidade mas com controlar as mulheres. Tem a ver com poder. São os Putins das mulheres, estes trogloditas que infligem a maldade às mulheres, por serem broncos ao modo de Trump.


June 26, 2022

O direito ao seu próprio corpo

 


Se as mulheres não podem decidir por si mesmas, no que respeita à sua saúde e ao seu corpo, por causa de engravidarem, então os homens devem ser obrigados a fazer vasectomias (que são reversíveis) e os que não fazem e engravidam alguém devem ser criminalizados como elas e, assim que uma mulher está grávida deles, os homens devem pagar pela saúde dela -visitas ao obstetra, pensão para os gastos futuro do filho e da saúde da mulher durante a gravidez e o pós-parto em tudo que for consequência da gravidez, seja física, seja psicológica, seja material, como ter de mudar de casa, sustentá-la se não tiver trabalho ou o perder por ter ficado grávida, ter de desistir dos estudos, da carreira ou o que for que lhe aconteça, etc.




September 18, 2021

Ode às mulheres erradas

 


As que não são jovens, magras, bonitas, submissas, burras, mansas, fracas, dependentes o suficiente para o macho e que um dia desconfiam que afinal o homem é que é errado e vão ser a mulher certa noutro lado. Força nisso!




Massimo Rongaroli

August 21, 2021

"On aurait dû obliger les hommes réfractaires à porter des talons, jupes et porte jarretelle"

 


André Corrèges e Pierre Cardin discutem se as mulheres podem/devem usar calças. Como se vê pela discussão, o tempo/espaço e o contexto podem legitimar certos discursos machistas só até certo ponto. André Corrèges fala das mulheres como seres humanos e Pierre Cardin como bonecas. São ambos do mesmo tempo.


April 14, 2021

Num mundo governado por homens...

 


apenas-metade-mulheres-sao-donas-proprio-corpo-onu


Apenas metade das mulheres são donas do seu próprio corpo, segundo o novo relatório das Nações Unidas publicado esta quarta-feira, que recolheu dados de 57 países situados, na sua grande maioria, na África Subsariana.

O relatório My body is my own do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) revela que apenas 55% das mulheres são plenamente autónomas no que diz respeito ao seu próprio corpo, sem serem alvo de “violência ou coerção”. Os três parâmetros tomados em conta para chegar a essa conclusão é se são livres de decidir sobre as suas relações sexuais (se querem ter ou com quem), se usam métodos contraceptivos e se têm acesso a cuidados de saúde sexual e reprodutiva.