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August 28, 2021

Uma palavra - Afeganistão





Vários países asiáticos terminam em «-istão». Nas línguas mais faladas nessa região do mundo, como o hindi, o persa e o quirguiz, «-istão» quer dizer “lugar de morada” de um determinado povo ou etnia. De acordo com esse princípio, Cazaquistão, por exemplo, significa “território dos cazaques”; Quirguistão, “território dos quirguizes”. Assim, Afeganistão significa, “território dos afegãos”.

É algo equivalente a adicionar os sufixos «-lândia», que vem de land, «terra», nas línguas germânicas ou polis πόλις «cidade», «território» em grego) ao final de nomes. «Petrópolis» é a cidade ou terra de Pedro, «Indianapolis», a terra dos Índios. «Suazilândia» é a terra dos suázis – recentemente, o país mudou de nome para Essuatíni , que significa, “terra dos suázis” na língua local.

A forma «-stão» deriva de uma antiga raiz linguística indo-europeia. Esse sufixo carregava a ideia de «parar» ou «permanecer» e deu origem, por exemplo, aos verbos stare, em latim, e stand, em inglês.
Do stare latino, inclusive, vem o verbo «estar» em português. 
Pensando na raiz etimológica dos sufixos, podemos traduzir os nomes desses países, literalmente, como «onde estão os afegãos», «onde estão os cazaques» e assim por diante.

A única exceção a essa regra é o caso do Paquistão, baptizado cerca de vinte anos antes de o território do país ser constituído, em 1947. “Rahmat Ali, um idealizador da independência paquistanesa, juntou ao termo «-istão» o vocábulo paki, surgido a partir de uma combinação das iniciais das áreas territoriais  reivindicadas pela futura nação. O 'p' representava a província do Punjab, enquanto o 'k' equivalia à região da Caxemira, no noroeste da Índia.

Note-te que os nomes de países islâmicos localizados no Oriente Médio e no norte da África não carregam o sufixo «-istão». Nesses territórios a língua predominante é o árabe, que não possui raízes indo-europeias – pertence a outro tronco, o semítico, compartilhado com o hebraico e o aramaico.

Fonte: @revistasuper, via Viajando com Arte (adaptado)

August 25, 2021

Uma palavra, ou melhor, uma expressão - «Carga alostática»

 



"Carga alostática é a razão psicológica do nosso cérebro pandémico enevoado" lê-se na manchete de uma história de 27 de Abril de Emily Baron Cadloff para a Vice
Cadloff traduz a expressão: "Estou a fazer muito menos do que estou habituado e estou tão cansada..." Está longe de estar sozinha durante este período de isolamento e ansiedade.

Diagrama de carga alostática via ResearchGate


Nunca tinha encontrado «carga alostática» antes da pandemia, e agora vejo-a, assim como «sobrecarga alostática» um pouco por todo o lado. É uma forma de dizer "stressada" que foi cunhada, sem surpresa, por um par de académicos, Bruce McEwen e Eliot Stellar. 
Em 1993, McEwen (um neurocientista) e Stellar (um psicólogo) publicaram um artigo no Journal of the American Medical Association que descrevia "o custo oculto do stress crónico para o corpo durante longos períodos de tempo" e definia a carga alostática como "o custo da exposição crónica a uma resposta neural ou neuroendócrina flutuante ou elevada resultante de um desafio ambiental repetido ou crónico a que um indivíduo reage como sendo particularmente stressante".

McEwen e Stellar cunhavam a expressão a partir de um termo mais antigo, «alostasia», que tinha sido introduzido em 1988 por Peter Sterling e Joseph Eyer da Universidade da Pensilvânia. 

Allostasis - de grego prefixo ἄλλος, (Állos), outro, diferente + o sufixo στάσις, (estase), ficar parado - é a contrapartida da homeostasis -do grego antigo ὁμοιοστάσις (homoiostásis) igualdade, empate, equilíbrio-, termo dos anos 20 do século passado. Em fisiologia, a «homeostase» é a manutenção de condições constantes, como a temperatura corporal; a «alostase», de acordo com Sterling e Eyer, é um processo contínuo de reacção e adaptação às mudanças no ambiente. Quando as mudanças são demasiado frequentes ou demasiado severas, a carga torna-se desequilibrada.

O prefixo alo- aparece em muitos contextos científicos, embora nem sempre seja claro que significa "diferente do habitual". A alopatia, por exemplo, do prefixo grego ἄλλος, (állos), outro, diferente + o sufixo πάϑος, (páthos), sofrimento, são termos criados no início do século XIX por Samuel Hahnemann, o fundador da homeopatia, como sinónimos de medicina convencional; a homeopatia (a prática de "curar com o semelhante") é a mais antiga, pelo menos nos EUA.

Na linguística, um alofone é um de um conjunto de possíveis sons falados (telefones) usados para pronunciar um único fonema. Um alónimo ("outro nome") é um tipo de nom de plume que é emprestado a uma pessoa histórica. (Exemplo: Alexander Hamilton, John Jay, e James Madison escreveram os Federalist Papers sob o alónimo Publius "em honra deste oficial romano pelo seu papel na criação da República Romana").

Allo- também se esconde em alergia, a forma inglesa de palavra alemã, que foi cunhada em 1906 pelo médico austríaco Clemens Peter Freiherr von Pirquet para descrever "uma reacção acentuada a um antigénio ao qual um indivíduo foi anteriormente exposto". A parte -érgica da palavra vem de uma raiz grega que significa "actividade", como em "energia".

Bruce McEwen, que cunhou a expressão, «Carga alostática», em 1993, morreu aos 81 anos de idade em 2 de Janeiro de 2020, pouco antes da pandemia a ter vulgarizado. O obituário de McEwen no NYT dizia que no final da sua carreira o Dr. McEwen tinha expandido a sua pesquisa para analisar o impacto do stress nas comunidades, descobrindo que o stress crónico afecta desproporcionalmente as pessoas marginalizadas e aumentava o seu risco de doenças.

fonte: /nancyfriedman. (com adaptações)

Para ler mais sobre a Carga Alostática:  https://estudogeral.pdf (páginas 23, 24)

August 06, 2021

Privacidade - realidade muito preocupante

 


Há umas semanas encontrei num hospital uma amiga da escola que já não via há quarenta anos mas que tenho na lista de amigos no FB. Falámos, estivemos a tentar lembrar das pessoas da turma (andámos juntas 5 anos, desde o 1º ano do ciclo até ao 5º ano - agora 9º)  e ela disse-me que tinha pena de não ter fotografias desses tempos. Como eu tenho fotografias -os meus pais ofereceram-me uma Kodak quando fiz 11 anos- disse-lhe que ia desenterrá-las e enviar-lhe. Assim fiz. No dia a seguir, enviei meia dúzia de fotografias de quando tínhamos 11 e 12 anos. Fotografias de turma e de uma viagem de estudo. Passado um dia de enviar recebo uma mensagem do FB a dizer que tenho uma publicação suspensa e que violei as normas do FB... nem me passou pele cabeça que pudessem ser aquelas fotografias, nem liguei nenhuma. Mas foram, porque essa amiga, passados uns dias mandou-me uma mensagem a lembrar das fotografias. Só aí percebi. Voltei a mandar e desta vez chegaram ao destino, mas não ficaram visíveis para outros. A semana passada recebi uma mensagem do FB a dizer que a publicação já estava visível e que afinal era um engano e não tinha violado nenhuma regra do FB. 

Já a minha conta do Twitter, onde não publico nada, foi suspensa por violar as regras do Twitter... essa, não sei o que lhe aconteceu porque abandonei a conta, não estou para me chatear com isso... mas quer dizer, é um abuso dessas tecnologias de detectar automaticamente imagens e palavras que o Zuckerberg ou o Dorsey ou outro qualquer consideram «más». E decidem, esse donos de plataformas, quem pode falar, quem não pode, quem pode ter conta, quem não pode... e isto sou que sou uma pequena pessoa no quadro geral das coisas, mas a verdade é que cada um de nós, sendo pequenos no quadro geral das coisas (com excepções, claro), todos juntos somos toda a gente e, portanto, um, dois ou três indivíduos, porque cheios de dinheiro e de poder tecnológico, calam toda a gente consoante entendem e lhes interessa, como reais ditadores ou autocratas - que são. Isto é preocupante. Muito preocupante.


Autokrator (Aὐτοκράτωρ) 
From Tower 16 of the Marmara Sea Walls



August 03, 2021

Uma palavra - Vírgula, coma

 


Coma ou vírgula, a mais breve pausa que nos permitem os sinais de pontuação dentro de uma frase. Do latim, virgula, «pequena vara», de onde deriva também, virgultum, atirar.

A vida que corre -linfa- dentro de um raminho arrancado de um abeto, de cor branca virginal. Vergola, a franja de remate da manga de um vestido de mulher, o fio de seda ou ouro cosido numa casa de botão como ornamento.

Giacomo Leopardi, em carta a Pietro Giordani em 1820:

No que me diz respeito, sabendo que a clareza é o dever primeiro do escritor, nunca elogiei a avazera da pontuação e vejo que muitas vezes, uma única coma, bem posta, ilumina toda uma frase

Parece que o primeiro a usar este sinal de pontuação foi Quintiliano, o orador romano - que foi também o primeiro a receber um salário por conta do fiscus Caesaris que corresponde a todo aquele que vive da escrita, obra que certamente não é um hobby de preguiçosos.

No seu Institutio Oratoria propôs substituir pela vírgula o sinal diacrítico introduzido pelos filólogos de Alexandria, o obelós, a linha horizontal. Este vocábulo, por sua vez, deriva do grego antigo όβολός (/obolós/) que, literalmente, significava, «espigão», «espeto». Um dracma valia seis óbolos, essa moeda que se punha sobre os olhos dos defuntos para evitar que suas almas penassem desvalidas sem poderem entrar no Hades.

Também na Idade Média, o óbolo valia «meio denário», do mesmo modo que hoje usamos esta palavra para designar uma pequena oferta ou doação espontânea. Mais surpreendente ainda a mesma raíz grega dá origem a «obelisco».

Na matemática, a vírgula serve para separar a parte inteira da parte decimal de uma expressão numérica (os países anglo-saxões preferem o ponto em vez da coma). Na música utilizava-se, nos séculos XVII e XVIII para expressar certas fórmulas de ornamentação melódica. Na bacteriologia, «vírgula» é o nome dado ao bacilo da cólera, devido à sua forma.

Para usar as palavras de Rebeca West, uma das maiores escritoras do século XX, quando se fala de questões de comas, o que está em jogo é a subtil vantagem da elegância.


do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)


July 09, 2021

Uma palavra - prestígio

 


Prestígio - 1650s, "truque, ilusão, impostura", do francês, prestige (séc. XVI) "engano, impostura, ilusão" (em francês moderno, "ilusão, magia, glamour"), do latim praestigium "ilusão" - de onde vem o termo, «prestidigitador» = ilusionista.

A partir de cerca de 1815, foi utilizado no sentido de "uma ilusão quanto ao mérito ou importância pessoal, uma ilusão lisonjeadora", daí, positivamente, "uma reputação de excelência, importância, ou autoridade", sentidos provavelmente introduzidos pelo francês, frequentemente em referência a Napoleão:

Quando a mesma pergunta foi colocada àqueles que o conheciam melhor e à França, responderam, 'que uma paz ditada em França o teria desfeito;' e 'que o seu trono estava fundado na opinião pública,' e 'que se o prestígio (a ilusão),' pois assim o chamavam, 'da sua glória fosse destruído, o estado dos seus assuntos, e o carácter do povo francês proibia-o de esperar que o seu poder sobrevivesse por muito tempo'. ["Memórias do Depósito de Bonaparte", Quarterly Review, Oct. 1814]


Vem isto a propósito de um filme/documentário que estou a ver, chamado, Operation Varsity Blues: The College Admissions Scandal que como se percebe relata o recente escândalo do subornos para admissão nas universidades da Ivy League nos EUA. Era tudo orquestrado por um indivíduo que começou por ser um 'coach' que preparava alunos para a faculdade e cujo sucesso o fez fundar uma firma e organizar subornos de milhões para enfiar alunos pela 'porta do lado' -subornos aos da administração das faculdades- como ele lhe chama, das universidades. 

Ele enfiava ser de 175 alunos por ano e pedia desde meio milhão a um milhão e meio mas avisando que certas universidades pediam doações de 50 milhões dependendo da universidade onde queriam entrar. Algumas das pessoas das universidades recebiam 20 mil dólares por semana... Os filhos, na maioria das vezes nem sabiam. Os pais diziam-lhes que tinham contratado um 'coach' para ajudar e que de facto os acompanhava. As universidades lucravam centenas e centenas de milhões. Punham rapazes com um metro e meio a entrar pela equipa de basketball, raparigas que mal sabem nadar a entrar pela equipa de waterpolo e coisas do género...

Entretanto montes alunos de muito mérito que fartaram-se de trabalhar ficam de fora de todas estas universidades e  a sentir-se insuficientes. O Kushner marido da Ivanka, um aluno mediano na escola, entrou porque o pai dou milhões para uma ala inteira de um edifício. 

 A certa altura um dos indivíduos de uma universidade diz que entrar em certas faculdades tornou-se, não um meio de ter uma melhor educação, porque não têm grande diferença nisso de outras, mas um fim em si mesmo. Uma questão de prestígio que depois abriria muitas portas. E ele acrescenta, 'a piada é que a palavra prestígio vem do francês e quer dizer, «impostura, ilusão»'. 

Ainda vou a meio do documentário mas é chocante, apesar de sabermos que é assim e que na América quem tem dinheiro compra vantagens -bem, já não é só lá- é sempre chocante ver a facilidade com que uns corrompem e outros se deixam corromper e como toda a conversa de educação de elites é uma treta para as universidades enfiarem dinheiro nos bolsos. 

Para os que entram pela porta da frente sem cunhas nem subornos -sim, porque ainda há a porta de trás, como o 'coach' lhe chama para as cunhas sem suborno-, o que na prática é muito difícil porque as duas outras categorias têm prioridade, a educação tem mérito, mas esses são uma minoria.



July 05, 2021

Duas palavras - 2ª - Culpa

 


Carência de discernimento, falta de diligência, em contraposição com «dolo» que significa a intenção de causar prejuízo. 

Termos sido culpados não quer dizer que se possa sempre atribuir a «culpabilidade». «Delito culposo» como se diz na linguagem jurídica. Mais outro termo de origem imprecisa.

«Culpa» deriva, indubitavelmente, do latim, culpa, que equivale a «pecado» - como aparece na confissão católica latina quando a meio da oração se bate três vezes no peito enquanto se diz, mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa, «por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa».

Se em italiano encontramos, colpa e em português e espanhol temos a forma docta (cultismo) do latim, culpa, no francês antigo vemos a forma coupe, substantivo feminino, transformar-se, hoje-em-dia em, faute. Mas atenção! Se, em Paris, os convidarem para tomar uma coupe, um «copo» ou quando vos der na gana de mudar de penteado com une coupe de cheveux, um «corte de cabelo» ou ainda, se quiserem comprar um automóvel, coupé, não está em jogo nenhuma «culpa» etimológica. São outros os caminhos seguidos por estas palavras: coupe, no sentido de «taça, copo», deriva do latim copa, de onde vem o inglês cup, a «taça» levantada pelo vencedor, enquanto couper, «cortar», «separar com um golpe», vem do latim, colpus.

Segundo Pianigiani, os etimologistas antigos propunham, para a palavra «culpa», uma descendência do grego κελλό (/kéllo/), isto é, «incitar» (a provocar dano); porém, este resultado é rejeitado por linguistas modernos em favor da raíz do sânscrito kalp-, «causar», que no antigo gótico e no alto alemão deu origem a hilpan ou hilfan, «tenciono ajudar-te», acrescentado, tacitamente, «perdoa se não consegui e não me saí lá muito bem».

Tal como no lituano, szelpti; literalmente, «tinha tudo preparado mas correu tudo mal» ¿também vêem nesta palavra algo do help inglês?

Culpar, desculpar, culpabilidade... ou exculpar, «tirar as culpas». Étimo preciosíssimo este último para encerrar os nossos tribunais interiores. No que respeita à lei, já lá está a justiça, mesmo que faltem séculos para que se torne efectiva.

Quanto ao respeito por nós mesmos, escreve Ésquilo na sua tragédia, Agamenon, Παθέι μάθος (/páthei máthos/), «aprendizagem através da dor». Nas dificuldades e no sofrimento é onde o ser humano amadurece o conhecimento, a consciência de si mesmo e das suas possibilidades. 

Apesar de sermos sempre «culpados», podemos fazer as pazes com as nossas sombras para não corrermos o risco de nos convertermos (etimologicamente) em carpideiros, inimigos de nós mesmos e dos que connosco estão.

E quem não aceita este étimo que «atire a primeira pedra.»


do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)


June 27, 2021

Árvores






flor do eucalipto -  imagem daqui u/[deleted]
                                         

ÁRVORE – do Latim arbor, de onde saiu também, arbusto.

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EUCALIPTO – seu nome foi feito a partir do Grego 'eu'-, “bem”, mais kalyptós, “coberto”, de kalyptein, “cobrir, tapar”, devido à cobertura dos seus frutos, que se apresentam como que protegidos por uma tampa em seus pequenos alojamentos.

CARVALHO – vem possivelmente de uma raiz ibérica gar-, “pedra”, ligando a árvore a terrenos pedregosos.
A nossa palavra robusto liga-se a esta árvore. Ela vem do Latim robustus, “forte e duro”, originalmente “feito de carvalho”, de robur, ”tipo de carvalho”, derivado de ruber, “vermelho”, porque a madeira dele tem um tom avermelhado.

CEDRO – vem do Latim cedrus, por sua vez do Grego kedron, o nome da árvore.

SALGUEIRO – do Latim salicarius arbor, de salix, “salgueiro” propriamente dito. Outro nome atual é chorão ou salgueiro-chorão, pois os seus galhos pendem até o chão, como se a árvore estivesse a lamentar-se.
É interessante saber que pelo menos desde o século V aC se extraía do interior da casca do salgueiro uma medicação de grande efeito no tratamento de dores em geral e para reduzir a febre.

Acabou-se descobrindo nessa casca o produto responsável por essas ações farmacológicas, que foi chamado salicina, a partir do nome latino. A partir daí se obteve o ácido salicílico, de grande uso hoje.

BUXO – do Latim buxus, possivelmente relacionado ao Francês antigo busche, “madeira para queimar, lenha”.

CIPRESTE – do Latim cypressus, do Grego kypárissos. A origem não é conhecida com certeza, mas há quem diga que seu nome veio da ilha de Chipre, onde essas árvores abundavam.

PAU-BRASIL – é uma árvore que produz uma madeira nobre, de cor avermelhada, chamada brasil por lembrar a brasa das fogueiras; e brasa viria do Germânico brasa, “fogo”.
Vale aprender que o adjetivo brasileiro foi por muito tempo um pejorativo. Inicialmente ele designava a profissão de extrator de pau-brasil. E estes eram geralmente degredados, condenados por crimes em Portugal e enviados para pagar as suas penas nos trópicos, não sendo assim grandes exemplos de uma vida recta.

LOURO – do Latim laurus, o nome da planta. Dela eram feitas as coroas de louros que sempre estiveram associadas à vitória. Isso porque o louro era um atributo do deus conhecido como Ares entre os gregos e Marte entre os romanos que costumavam ser representados usando uma coroa dessas.
Nos triunfos, festejos dedicados a um general romano por suas vitórias, este desfilava pelas ruas num carro, com uma pessoa segurando uma coroa de louros sobre a sua cabeça; a partir daí, ele tinha o direito a usar a coroa quando quisesse.
Dizem as fofocas que Júlio César usava a sua quase sempre, para disfarçar a sua calvície.

SEQUOIA – esta é uma árvore altíssima, chegando a ultrapassar os cem metros. Ela recebeu o nome de um índio norte-americano que viveu entre 1770 e 1843, Sequoya. Nosso amigo era um pensador; chegou à conclusão de que o poder do homem branco vinha da sua capacidade de usar um idioma escrito. E provavelmente tinha razão. Vai daí que Sequoya passou doze anos fazendo um alfabeto com 86 letras para representar os sons do idioma Cherokee. Foi um sucesso, pois em seguida começou-se um jornal nesse idioma e foi feita uma Constituição para o seu povo. Agora ele está merecidamente eternizado naqueles enormes vegetais.


June 24, 2021

Duas palavras - 2ª estrela

 


– Os romanos tinham três palavras para dizer estrela: aster, stella e sidum

Aster vinha directamente do Grego, αστήρ (astír). E parece que o Grego a tinha recebido, após várias voltas, de uma raiz Indo-europeia ster, que significava “espalhar”, já que as estrelas se encontram espalhadas pelo céu.

Seja como for, essas três palavras deram origem a um grande número de outras no nosso vocabulário.

Por exemplo, o verbo considerar vem de 'con', “junto”, em Latim, mais sidus, “estrela”. Os romanos pensavam que, para avaliar uma situação, era necessário analisar a disposição das estrelas (considerar), já que estas lhes definiriam o destino.

Daí a Astrologia, que é uma palavra derivada justamente desse aster. Foi desse estudo dos astros que derivou a Astronomia, de aster mais nomos, uma palavra grega que significa 'lei', 'ordem', pois as descobertas nesse campo precisavam ser ordenadas num sistema científico.

O famoso folheto de Galileu Galilei chamava-se, Sidereus Nuncius - O mensageiro das estrelas.

'Constelação' tem uma formação igual à de 'considerar', só que em vez de sidum se usou stella. Significa o desenho que certos grupos de estrelas parecem formar no céu.

Outra palavra que se usa muito vem do Latim dis, “mau, inadequado, ruim” disaster = disaster. Conforme os antigos – e muitos crédulos modernos – se os astros não forem favoráveis, pode acontecer um 'dis-aster', 'um desastre'.

'Asterisco', aquele sinal que parece uma estrelinha, que se vê nos textos para remeter a uma nota de pé de página vem do Grego, ἀστερίσκος (asterísko = estrelinha), diminutivo da palavra estrela (astér)

– A palavra antiga ster, no Anglo-Saxão, virou steorra, que acabou virando o Inglês star. Em tempos, os ingleses usavam uma moeda onde havia uma pequena estrela desenhada. Daí chamarem-lhe 'esterlina', sterling, o que resultou na Libra Esterlina, que depois passou a ser a moeda do Reino Unido.

fonte: https://origemdapalavra.com.br/palavras/estrela/

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Tudo o que há dentro de mim tende a voltar a ser tudo.
Tudo o que há dentro de mim tende a despejar-me no chão,
No vasto chão supremo que não está em cima nem embaixo
Mas sob as estrelas e os sóis, sob as almas e os corpos
Por uma oblíqua posse dos nossos sentidos intelectuais.

   — Fernando Pessoa, poesias de Álvaro de Campos (excerto)

Duas palavras - 1ª caos

 


Nomear a realidade significa subtrair-se à confusão. Desde a primeira palavra pronunciada pelo ser humano na história da linguagem, o acto de atribuir ao mundo significantes -formas expressiva de o dizer- serve para tirar do 'caos' o seu conteúdo real. 

Anterior às palavras que nomeiam o real está o pensamento onde a realidade adquire forma e consistência. As palavras impedem que nos afundemos na desordem dos nosso sentimentos pessoais. Cada pessoa percebe a realidade de um modo único e quando elege a palavra para expressá-la tira-a e tira-se, do magma do anonimato. Atribuir 'etiquetas' linguísticas ao caos é o primeiro remédio para pôr ordem dentro de nós mesmos.

As palavras são o nosso index do universo, um mapa para não nos perdermos nele. 

Foi Hesíodo quem, na sua Teogonia (vv116-125) se encarregou de contar a génese do mundo a partir do caos:

Sim bem primeiro nasceu Caos, depois também 
Terra de amplo seio, de todos sede irresvalável sempre, 
dos imortais que têm a cabeça do Olimpo nevado, 
e Tártaro nevoento no fundo do chão de amplas vias, 
e Eros: o mais belo entre Deuses imortais, 
solta-membros, dos Deuses todos e dos homens todos 
ele doma no peito o espírito e a prudente vontade. 
Do Caos Érebos e Noite negra nasceram. 
Da Noite aliás Éter e Dia nasceram, 
gerou-os fecundada unida a Érebos em amor.

          (tradução de Jaa Torrano)


«ἦ τοι μὲν πρώτιστα Χάος γένετ᾽» No princípio havia o «caos».

No entanto, só no século XIV a palavra grega Χάος (caos) adquiriu o sentido de 'desordem primordial' que depois se transferiu para a Física e a Matemática. Em Hesíodo, o caos que 'vem a ser' não equivale ao 'ser' bíblico. O caos Grego não indica que há algo antes dele nem tampouco que seja um vazio, uma ausência de matéria. Pelo contrário, o caos Grego é «uma espécie de remoinho obscuro que traga todas as coisas num abismo sem fim, comparável a uma boca negra aberta de par em par»

Segundo Hesíodo, «no início não havia a palavra -que veio depois-, mas a responsabilidade de pôr ordem na gama de infinitas possibilidades que oferecia a existência. Só depois opta por gerar, sobretudo por meio de palavras (que têm poder criativo), a terra, os abismos, a luz e as sombras, sem esquecer 'eros', o mais formoso de todos, que afrouxa os membros e cativa de todos os deuses e todos os homens o coração e a vontade sensata nos seus peitos.» (Guidorizzi)

O Timeu de Platão não tem a menor dúvida: esse 'caos' descrito por Hesíodo não é senão a matéria informe e vasta a partir da qual se chegou ao pensamento. Ou, usando as palavras de Miguel Ângelo, dar forma a partir do todo [o bloco de mármore] e procedendo, não por meio de adição, mas de subtracção: mediante a 'arte de remover'. É exactamente o que é preciso fazer quando os nosso pensamentos estão etimologicamente «confusos», do latim confundere, isto é, «fundir conjuntamente», «misturar», vocábulo que nasce da união do prefixo «con» e do verbo fundere, verter - deitar num caldeirão uma variedade de ingredientes totalmente ao acaso, deixá-los cozer durante horas e ver o que daí resulta, como improvisados alquimistas da existência.

Daí vem o termo confusão, como no italiano confondere, no francês confondre, no inglês to confuse.

Está em estado de confusão quem não está em condições de entender o que lhe dizem, como quando fundimos a cabeça com pensamentos que nos assediam e deixam perdidos. Temos a opção etimológica de criar palavras, sabendo que a escolha das palavras é ao mesmo tempo a escolha das nossas acções no mundo e sobre os outros - e se criarmos palavras que nos sobrevivam, um registo, talvez possamos não ficar para sempre perdidos na «confusão» do universo e possamos brilhar de vez em quando, como uma estrelinha* intermitente.

*estrelinha = asterisco

do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)

June 17, 2021

Duas palavras - 2ª 'phronimos'

 


A quem recorre para obter conselhos? Quando as coisas são difíceis, e não sabe ao certo o que fazer, quem são as pessoas a quem pede ajuda? Pode ser a mãe ou aquela pessoa no trabalho que conhece as respostas. 
Talvez seja um estranho da Internet ou um profissional a quem paga. A questão é: 'porquê' escolhê-las? 
Estes peritos ou sábios são uma parte essencial do ser humano, e também constituem uma parte fundamental da teoria moral de Aristóteles. 

Aristóteles argumentou que uma vida plena e florescente ευδαιμονία (eudaimonia) é caracterizada pela virtude, guiada pelo que se chama φρόνησις (phronesis) ou "sabedoria prática". 
phronesis é a capacidade de encontrar o meio-termo em qualquer situação - saber o que é corajoso, ou amável, ou justo, quando não é imediatamente óbvio. 
Como qualquer capacidade, não vem naturalmente. Requer experiência e esforço consciente. A pessoa que domina a phronesis é conhecida como, φρόνιμος (phronimos). Estes, os phronimos, são os «sábios» que já viram e viveram o suficiente do mundo para perceber as pessoas e as situações, saber como agir e dar bons conselhos por causa disso. 
Assim como consultamos o médico para as doenças ou um engenheiro para as obras, recorremos aos phronimos para aprender com a sua sabedoria. 
Esta sabedoria surge como um tipo de percepção. Assim como um artista pode ver uma pintura de maneira diferente da maioria das pessoas, os phronimos vêem as 'pessoas' de maneira diferente. A este tipo de percepção chama-se, 'nous'. 
Por exemplo, um rapaz ingénuo mas bem intencionado pode pensar que a honestidade é sempre o melhor. Por isso, ele diz à sua amiga que ela parece tola com aquele vestido novo (como o príncipe Bolkonsky diz à sua filha Mária no romance de Tolstói). O phronimo, porém, tem o bom senso de ver que a sua amiga é tímida, pelo que decide, em vez disso, dizer uma mentira bondosa - "o vestido parece óptimo!" Ou, um novo professor pode punir um aluno por não fazer os seus trabalhos de casa, sem se aperceber da fragilidade desse aluno. O professor de phronimos é aquele que 'vê' correctamente a situação, e talvez ofereça uma palavra amável, ou ajude de outra forma que não reforce a fragilidade. 

A  phronesis vem com o enxerto duro da experiência e do auto-aperfeiçoamento consciente. Significa que se viu o suficiente dos mundo e das pessoas para saber a situação e a melhor maneira de agir. 

Não é fácil de descrever, mas todos nós conhecemos a pessoa phronimos na nossa vida. O conselho de Aristóteles é que os invoquemos o mais possível. 

Mini Philosophy (com adaptações)

Duas palavras - 1ª apolítico

 


'Apolítico', referindo-se a pessoas, é uma palavra formada por engano. 

Político refere-se aos assuntos da 'polis' (πόλις) a palavra grega que identifica a cidade. A cidade-Estado grega, mas também a sua forma de organização e de vida, as suas leis. O que corresponderia hoje a um região administrativa, pois incluía as terras circundantes, urbanas e rurais.

A palavra, 'política' tem origem em πολιτεία (politeía) e grosso modo refere-se às acções que dizem respeito à vida da cidade - à sua administração e governo; ou em πολιτική (politika), o plural neutro de πολιτικές (politikós), as coisas políticas; ou em πολιτικέ (politikè), junção de polis+ technè, a arte política.

Segundo Aristóteles, o homem é um πολιτικον Ζον (zoon politikón), um animal político.  

'A' é um prefixo (prefixos são morfemas que se colocam antes dos radicais, basicamente a fim de modificar-lhes o sentido. Os que ocorrem em palavras portuguesas têm origem em latim e no grego) que significa, 'privação', negação', ausência', como se vê em 'ateu', o que nega θεός (theos), Deus; 'anarquia', ausência de um princípio αρχή (arqué); 'amoral' o que é privado de moral, etc.

Ora, no sentido etimológico do termo política não existem pessoas 'apolíticas' neste medida em que, mesmo que a pessoa não faça parte da administração da 'polis', sofre os efeitos dessa administração, da mesma maneira que sofremos os efeitos do sol no planeta, quer queiramos, quer não e, do mesmo modo que sofremos os tipos de violência de que Dom Helder fala nesse recorte mais abaixo. Da mesma maneira que os russos sofreram a guerra napoleónica, mesmo não tendo opinião ou participação directa nela. E as suas acções na 'polis' têm uma significado e repercussão nessa mesma 'polis', tonando-as políticas.

Portanto, o que significa, ser 'apolítico', propriamente falando? Alguém que nega a política? Negar a política seria negar que é real a situação de pessoa estar inserida numa polis. Alguém ou algo estranho à política? A resposta é igual à anterior. Alguém que não se envolve em política? Está envolvido, quer queria, quer não - pode não ir ter com ela mas ela vai ter consigo. 

Quem escapa à política e pode dizer que é apolítico? Quando alguém diz, 'sou apolítico, não quero saber de política nem de políticos', fala inconsequentemente, pois o facto de viver e agir numa polis, já faz da pessoa um animal político, de modo que a sua vida tem, quer queira ou não, uma dimensão política - pode é ser uma dimensão política positiva ou negativa, de desinteresse pelo seu papel politico. Mas que o tem, tem.




June 13, 2021

duas palavras - 2ª liberdade

 


um homem que decide privar outro homem de liberdade é, na realidade, prisioneiro, por sua vez, do ódio, dos preconceitos e das limitações do seu espírito

Estas palavras de Nelson Mandela são tão claras como a sua história. Viu-se obrigado a cumprir uma pena de 27 anos de prisão, para poder converter-se, em 1994, no primeiro presidente não branco, da história sul africana.

Para os 'presos limitados', os que odeiam e eliminam serão sempre, 'eles'.

Desde os que viviam em paz na pequena ilha do Egeu meridional e que em 416 AC se opuseram à ocupação ateniense durante a guerra do Peloponeso reivindicando por meio de palavras o direito humano à justiça e à liberdade, até aos acuais cientistas, ambientalistas e jornalistas, e todos os activistas dispostos a revelar a verdade 'à outra parte' e a dar testemunho em primeira pessoa contra a violência e a negação da liberdade, não com armas, lanças ou pedras mas com a rebelião das palavras e dos gestos exemplares que delas derivam, todos eles têm um riso cristalino: o riso da liberdade.

Libertas, em latim, ελευθερία (eleutheria) em grego, são palavras que derivam de uma antiquíssima raiz indoeuropeia, leudhero-, isto é, "aquele que tem direito a pertencer a um povo". A liberdade é, desde sempre, a condição do homem livre desde o seu nascimento (contraposta à do servus, o escravo), ou do homem libertus, o servo emancipado. 

Só o homem livre pode tomar a decisão de pertencer a uma entidade superior ao indivíduo, seja um Estado, uma família, uma religião, um amor, uma profissão ou uma ideologia.

O servo, pelo contrário, pertence a alguém como um objecto. O seu pensamento não é adesão mas posse. A sua palavra não é a de levar a cabo uma acção mas a de executar uma ordem. O desejo de ser livre e deixar de ser servo, escravo, é o motor de qualquer história, desde a que se escreve com maiúscula , a História do mundo, até à mais pequena, a história pessoal de cada ser humano.

A liberdade é a necessidade mais antiga do ser humano: em seu Noe organizaram-se revoltas, protestos, guerras, revoluções capazes de mudar as fronteiras geográficas de povos inteiros e os milites temporais de épocas inteiras. É pela ânsia de liberdade que os seres humanos de desunem; para poderem chamar-se, não 'um', mas 'um de...' que mudam a história. Somos livres só quando juntos a alguém ou algo maior que nós. 

Pelo contrário, a solidão é a estrada principal para a pequenez da escravidão onde ficamos relegados a um cantinho à espera de ordens. Lutamos contra quem nos impede de escolher, o que fazer, onde ir, o que dizer, como pensar, em quem crer ou quem amar. 

O sentido grego antigo de liberdade era tão profundamente humano que supôs ser universal. Era a possibilidade d chamar-se livre de um tirano, de um estrangeiro, de um amo.  Porém, era acima de tido o direito-dever de  e gestos 'exercer essa liberdade por meio de palavras e gestos precisos'.


do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)





duas palavras - 1ª migrante

 


Comprovarás como é salgado

o pão alheio e que duro caminho é

subir e descer as escadas dos outros

      - Dante, Paraíso


Os tempos actuais, completamente diferentes dos passados, impõem a necessidade de adoptar uma postura: nem de direita, nem de esquerda, nem de centro, apenas humana. Somente disso se ocupa a linguística, "ciência humanista" por excelência: o estudo dos seres humanos através da sua maneira de nomear as coisas e, da sua mudança -involução ou evolução; pouco importa, não fazemos juízos- no decorrer dos tempos.

O verbo 'migrar' e o adjectivo 'migrante' descendem de uma raíz indo-europeia, 'mei-/moi-' que tinha, originariamente o significado de 'trocar', 'mudar'. Daí deriva o latino migrare e daí, por sua vez descendem, o substantivo munus, 'encomenda', 'oferta' (daí vem município) e o adjectivo, communis, comum.

Uma 'troca', um 'intercâmbio', segundo relata o étimo, sem nenhuma conotação geográfica de deslocação de um local para outro. Poderia tratar-se de uma cortesia, de um bem tangível como, 'tenho demasiadas maçãs verdes, troco-as pelas tuas laranjas maduras'; ou de ideias. Inclusive de palavras. Uma língua confinada nos bastiões dos dicionários das academias acaba por não nomear a realidade. Converte-se num mero catálogo de um tempo passado do qual o que fala a língua já não guarda memória alguma.
Se uma língua muda, ou melhor, 'muta', é porque está viva e vivos estão os que a falam. A palavra 'migar' leva consigo um sentido indefinido de mudança. E também uma grande carga de perda, abandono e dor.

Recentemente pusemos-nos a 'odiar' ou 'detestar' os seres humanos que chegam a 'nossa casa' ao ponto de obscurecermos por completo a ausência que 'em suas casas', necessariamente, tiveram de deixar.

Passo por alto, voluntariamente, a mesquinhez das polémicas contemporâneas acerca dos migrantes, seres humanos acusados de divertir-se cruzando os mares pelo gosto de exportar para outros locais os gestos de culturas primitivas e ameaçadoras. Fico-me no meu pequeno jardim, a linguística. E o grego antigo.

Resulta paradoxal comprovar como, há milénios, faltam da língua clássica de Platão, Ésquilo ou Tucídides, algumas peculiaridades maravilhosas - desde a aorista até ao opcional-, todas elas perdidas desde que se transformou em κοίνη διάλεκτος (koiné diálektos), na 'língua comum' que, desde os tempos de Alexandre, que estendeu o grego até às mais remotas regiões da Europa, África e Ásia. Da mesma maneira resulta paradoxal comprovar como nunca se deixa de elogiar o que o grego nos trouxe, até hoje, por ter 'migrado' para todas as línguas, europeias e não-europeias. 

'Migrante', ou melhor 'emigrante', tem sido esta língua, nascida num território restrito da Ática e pré-destinada à conquista intelectual do mundo. Hoje acusa-se o inglês de gerar muitos neologismos que contaminam as nossas línguas latinas, mas quem acusaria o grego de ter feito o mesmo? Alguém grita pelas palavras perdidas nas línguas originais, desde o etrusco ao antigo germânico, substituídas por vocábulos gregos? Não foi dada a impressão de que se tratou de uma sublimação, de uma troca necessária?

A palavra, 'migrante' passou a fazer parte das línguas latinas como empréstimo medieval, a partir do francês, émigrer
Durante muito tempo ninguém teve necessidade de apontar o dedo linguístico a quem tinha 'migrado' para aqui, palavra que aparece no vocabulário italiano só em 1846; porém, muitas pessoas, anteriormente, tiveram necessidade de contar que haviam 'e-migrado' para além.

"Deixarás todas as coisas queridas / com mais ternura", diz Cacciaguida, o cruzado, a Dante, no Paraíso

Para o poeta empenhado na subida ao Paraíso não se trata apenas de uma profecia acerca do seu destino pessoal, que será o de exilado. É também um testemunho directo do que viveu quase dois séculos antes de Dante, da dor que, 'mudando' deixa atrás e do seu pão tão amado, que outro morderá, enquanto ele mordisca uma comida de sabor desconhecido, preparada por mãos estranhas.

do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)

June 12, 2021

duas palavras - 2ª beijo

 


'Diz-me tudo o que eu queria', isto, é, beija-me. O mais belo dos paradoxos, pois lábios sobre lábios é silêncio. O étimo que diz tudo sem necessidade de dizer nada. Nenhum gesto no mundo fala mais que um beijo: canta, grita, murmura, encanta, recorda, sabe dizer qualquer palavra não pronunciada precisamente porque não faz nenhuma falta dizê-la. Basta senti-la.

O italiano bacio, deriva do latim basium. Um étimo em aparência, simples. No entanto, os estudiosos não estão de acordo na altura de explicar como chegou ao latim.

Uns dizem que deriva do grego antigo, βάζω (bádso), significando, 'eu digo-te' ou então, βασκαινω (baskáino), sinificando, 'eu seduzo-te'. Enquanto, 'beijo-te', provavelmente, φασκω (phásko), 'prometo-te' e, ao mesmo tempo, 'creio-te', pois no fundo, a raíz desse gesto em que uma boca cala a outra descende do verbo, φημί (phémí), 'dizer'.

Nenhum destas possibilidades está desprovida de romantismo, pouco concordante com o rigor das etimologias.

O Dictionnaire etymologique de la langue latine, de Alfred Ernaut y Antoine Meillet não tem dúvida alguma: a aparição tardia do vocábulo latino basium, leva a pensar num empréstimo linguístico, talvez celta.

A lingua literária evita este dilema. Plauto, por exemplo, sabe apenas o verbo depoente, osculari, 'beijar', e o substantivo, savium, beijo.

 Catulo porá nisto um ponto final. Não só o poeta é de Verona estando mais perto das contaminações linguisticas com os povos do Norte como foi o primeiro que importou para a língua latina escrita as palavras, basium e basiari, típicas da oralidade (a tal transmissão culta) - a partir desse momento os dois vocábulos estendem-se às línguas romanas sem mudança de significado. É dele:


da mi basia mille, deinde centum
dein mille altera, dein secunda centum,
deinde usque altera mille, deinde centum.
dein, cum milia multa fecerimus,
conturbabimus illa, ne sciamus,
aut ne quis malus inuidere possit,
cum tantum sciat esse basior
um.

na tradução de Maria Helena da Rocha Pereira:

Dá-me mil beijos, depois um cento,
e mais mil, depois outro cento,
depois outros mil, e mais cem.
Em seguida, quando juntarmos muitos milhares,
misturamo-los, para que não saibamos
ou nenhum malvado possa invejar-nos,
quando souber que tantos foram os beijos.


Continua a falar enquanto guardas silêncio. Beija-me e entretanto perdemos a conta das palavras ditas com os lábios, sem necessidade de voz.

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do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)

duas palavras - 1ª triste

 


Afligido, pesaroso por algo que dói por dentro. Quando chega, a tristeza faz o mesmo ruído que as nuvens, capazes de obscurecer rapidamente um dia de sol: ou seja, nenhum.

Quem já, alguma vez, ouviu o ruído de uma nuvem a passar? Não se ouve, porém, imediatamente faz sombra. 

Quando se está triste, é o animo que se põe turvo, obscuro.

Luz que de repente se apaga como o filamento de uma lâmpada quando já não pode mais e se rompe.

Há um montão de coisas que o étimo de 'tristeza' nos sabe contar, palavra de 'origem imprecisa' mas, sem dúvida, procedente do latim, tristis (tardio, tristus) que deu depois lugar a todas as 'tristezas' na formação medieval, tristo.

Melancolia pan-românica na sua etimologia, embora cada língua diga, ou melhor, cale, o seu modo de obscuridade interior.

O francês, triste, embora igual ao espanhol, é uma palavra que percorreu outro caminho, o de uma 'transmissão culta' - é nome que se dá, em linguística, ao termo que não entra no vocabulário por necessidade, mas por um poeta o ter utilizado pela primeira vez. Quase nunca se sabe quem foi, só se sabia que, em questão de palavras, sabia mais que nós.

Não há maneira de dissipar as nuvens. Se existisse, brilharia sempre o sol nos nossos dias tristes. A única coisa que podemos fazer é aceitá-las e abrir o guarda-chuva dos étimos para não nos molharmos demasiado.

No sanscrito, encontramos trsta, que equivale a 'áspero' e que sobrevive hoje no lituano, tirsztas, 'cascavéis', no sentido de 'intratáveis' como ficamos para os outros quando estamos 'tristes'.

No latim, tristitia, significava, na realidade, um dia de chuva: tristis, era o céu quando se punha escuro. Também se dizia do fruto arrancado da árvore demasiado cedo, 'amargo', 'ácido'. Um alperce que parece delicioso mas que faz mal assim que o mordemos devido a estar acre. Daí o termo 'áspero' também ser usado para exprimir o nosso estado de ânimo quando nos sentimos tristes. 

No Appendix Probi, códice escrito no mosteiro de Bobbio no ano 700 (sem dúvida copiado de um 'antígrafo', um documento mais antigo que dataria do séc. V) e atribuído a um tal Probo, inclui-se uma lista de 227 palavras que não corresponderiam às boas normas do latim clássico. Neste Appendix, a variante 'tristus' é censurada devido à sua formação analógica a partir de maestus laetus; segundo o autor, seria preferível o termo, tristis.

Acontece irmos buscar as nossas palavras, não ao dicionário de falar mas ao de calar. Está nublado, porém, 'fingimos que' está sol, como se estivéssemos felizes, em latim, laeti, contente. E quando sofremos, se nos ocorresse dizê-lo, estaríamos maesti, adjectivo que remete ao verbo latino, 'lamento-me'.

a vida escapa e não está quieta, uma hora, dizia Petrarca no seu Cancioneiro.

Pessoa, para quem 'todo o estado de alma era uma paisagem*, dizia:

Ah, na minha alma sempre chove.
Há sempre escuro dentro de mim.**

ou

Cai chuva do céu cinzento 
que não tem razão de ser
até o meu pensamento 
tem chuva nele a escorrer***

ou ainda

Sofremos? Os versos pecam
Mentimos? Os versos falham
E tudo é chuvas que orvalham
Folhas caídas que secam.****

*Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I. Fernando Pessoa
**Cartas de Fernando Pessoa a Armando Côrtes-Rodrigues. 
***Poesias Inéditas (1930-1935). Fernando Pessoa
**** Fernando Pessoa, in 'Cancioneiro'

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do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)

June 07, 2021

Duas palavras - 2ª catarse

 


Catarsis - é uma libertação, como quando se dança de alegria entre escombros, ao ter a notícia que a guerra terminou.

Catarse como 'purificação', do grego κάθαρσις (katharsis): num certo sentido que só os gregos sabiam expressar, tornar-se limpo, puro - a partir do adjectivo καθάρός (katharós), seres humanos recém-chegados ao mundo, não pela primeira vez mas uma outra vez.

A palavra difundiu-se de modo idêntico em quase todas as línguas, apesar das suas interpretações terem sido muito distintas. Na medicina, a partir de Hipócrates, 'catarsis' passou a ser desintoxicação do que contamina, material ou espiritualmente o corpo: de todo o 'miasma'.

Desde Pitágoras que a 'catarsis' foi, por outro lado, a resolução de um problema matemático. Na psicoterapia, segundo Freud e Brauer, é o alívio, a libertação da histeria ou de qualquer estado de ansiedade que só se alcança evocando e revivendo os acontecimentos que estiveram na origem da ansiedade. Nos ritos mágicos sem nenhum fundamento científico a palavra veio a significar, 'exorcismo'. Isso chama-se 'timo' etimológico. Catarsis não significa, como se diz muito, depurar ou drenar. Somos seres humanos, não pântanos.

De maneira mais simples, significa soltar, deixar que alguma coisa se vá. Qualquer dor ou sofrimento que se volte contra nós tem que ser agarrado e solto em algum sítio, para fora de nós. Os gregos faziam-no no teatro, que era um dever cívico e moral e não um entretenimento qualquer. É Aristóteles quem, na sua obra, A Poética, reflecte em como a 'mimeis' (a ficção, a imitação) do absoluto, da irracionalidade, da perda total de nós mesmos é fundamental para nos libertarmos dos nosso medos e inseguranças que, caso contrário, correm o perigo de transformar-se em demónios. Pense-se em Medeia, Clitemnestra, Édipo, Prometeu e seus trágicos destinos.

Nenhum ser humano é só bom ou só mau, todos somos uma infinita gama de tons cinza entre o preto e o branco. É muito melhor aceitar a nossa natureza imperfeita, irracional, representada num palco e deixar que aí se faça a 'catarsis'. A nossa época, que é um tempo de outono cultural que dura todo o ano e em que os teatros fecham ao mesmo ritmo que caem as folhas das árvores, esta palavra obriga à revolta e obriga a falar.

Para Platão, a 'catarsis' é a palavra, não como monólogo, mas como diálogo: pergunta, resposta, lógica, empatia, aceitação e compreensão - só o diálogo pode salvar-nos das trevas da alma. É preciso sair da obscuridade da nossa caverna.

Er, o herói arménio, depois de morrer no campo de batalha, levantou-se na pira já acesa, antes que o seu corpo fosse consumido pelas chamas e contou aos homens aquilo de que tinha sido testemunha no mundo dos mortos. Depois de uma caminhada de quatro dias pelo Inferno, as almas dos defuntos chegam à presença de Ανάνκε (Anánke), deusa da necessidade, cujo símbolo é um fuso. Junto dela estavam sentadas as suas três filhas, as Moiras: Cloto cantava o presente, Láquesis cantava o passado e Átropos, o futuro. Um arauto segurava uma cesta com todos os modelos e possibilidades de vida e avisava as almas de que seriam responsáveis pelo seu destino. Não era um sorteio, era uma escolha. 

Er deu-se conta da quantidade de vezes que os espíritos erravam na escolha movidos pela ingenuidade e irracionalidade. Por exemplo, quem na vida anterior tinha habitado uma polis bem governada escolhia habitar a de um tirano. Agaménon optou por viver como uma águia, para que, à sua vista agudíssima não se lhe escapasse traição alguma, enquanto Ulisses, cansado de tanto viajar, decidiu não mover-se mais. 

Depois de efectuar a sua escolha, cada alma recebia de Láquesis o seu daimon δαίμων, o génio tutelar que estava encarregue de vigiar se o sujeito cumpria a vida que tinha escolhido. Depois, o sujeito apresentava-se diante de Cloto para confirmar o seu destino e por fim ia a Átropos que o tornava imutável. 

As almas eram então encaminhadas através do deserto e do rio Lete (esquecimento) e depois de descansar nas margens de Amelete (despreocupação), todos, menos Er eram obrigadas a beber das águas de Lete. Os imprudentes bebiam demais para tentar esquecer as dores sofridas. O que mais surpreendeu Er foi ver que todas as almas escolhiam uma nova vida em função das experiências negativas sofridas na vida anterior, seguindo, estupidamente, condicionados pelo passado. 

Er desceu ao reino dos mortos para poder dizer no reino dos vivos: a desculpa de dizer, que 'as coisas sempre foram assim', não é válida. Se falarmos, soltamos o mal, deixamos que se vá na sua 'catarsis' final.

do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos-  de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)
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Falar é uma actividade curativa, se o falar é um diálogo de ingénuos - pessoas livres que escolhem a palavra como instrumento de arqueologia, de liberdade e de compaixão. 



As três Moiras - túmulo de Alexander von der Mark por Johann Gottfried Schadow. Alte Nationalgalerie, Berlim.

Duas palavras - 1ª ingénuo

 


Etimologicamente, 'ingénuo' não significa o bobo, aquele que não tem dois dedos de testa. Também não é aquele que acredita no primeiro que lhe aparece à frente. Nem o que carece de engenho, do latim ingenium, a capacidade de inventar, projectar, descobrir coisas 'geniais': a profissão do engenheiro.

Etimologicamente, 'ingénuo' significa, aquele que nasceu livre e continua a sê-lo diariamente. Na Antiguidade, a palavra 'ingénuo' que deriva do substantivo latino, genus, 'estirpe', 'linhagem', designava aqueles que não eram escravos. Isto é, aqueles que não tinham que pedir permissão ou pedir, por favor'. Eram os que tinham direito a escolher, em virtude de ter um nome próprio, pois só os 'ingénuos' tinham direito a ter um nome e um apelido e, desse modo, a existir na realidade.

A palavra, que entrou no vocabulário italiano na primeira metade do século XIV e que se encontra também no espanhol, ingenuo, no francês, ingénu designa a vida simples, franca, sincera, digna do homem livre - o sentido negativo de, excessivamente confiante, que hoje damos a 'ingénuo', só surge a partir de 1795. 

A ingenuidade é, pois, liberdade. Quantas vezes demos bofetadas a nós mesmos, por assim dizer, por termos confiado em demasia, num amor, num desejo, numa cidade, num ponto de vista político?

Voltando à etimologia: por acaso não é natural e humano ter o direito e, até o dever, de sermos nós mesmos, tal como somos e também o direito de escolhermos e de nos equivocarmos? 

Somos 'geniais' quando decidimos ser 'ingénuos', ou seja, livres, sem montagens nem artifícios. Um dia pagaremos a conta. 'Estupendo, aqui tem e fique lá com o troco, vida.' Na verdade pagaremos o preço de ter amado, de ter odiado, de ter escolhido, enfim, de ter vivido.


O mar queima as máscaras

As incendeia no fogo do sal.

Homens cheios de máscaras

flamejam pelo litoral.


Tu só poderás resistir

na fogueira do Carnaval.

Só tu que sem máscaras

escondes a arte de existir.


(Giorgio Caproni - Antologia poética)


É melhor viver como ingénuos que disfarçados de Arlequim,  saltimbanco vestido de remendos de cores, conhecido em todas as tradições populares desde o século XVI - que de ingénuo não tem nada e está sempre metido em situações grotescas para seduzir a Colombina. Com o rosto sempre coberto de uma máscara negra, para fingir que é livre como seu amo, esse que de facto o é. A arte de existir não dispõe de maquilhagem ou de cabeleira postiça, diz-nos o étimo e o grande poeta de Livorno. Não é um circo nem um Carnaval. "Que vergonha quando nos obstinamos em viver como máscaras artificiais e como comediantes.'

do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos - de Andrea Marcolongo, ed. taurus (com adaptações)

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Gosto deste significado da palavra 'ingénuo' que implica a arte de existir e viver livremente e de modo autêntico, sem artifícios, mesmo que isso signifique ser enganado, por vezes, ou enganar-se, o que não é a mesma coisa. Como dizia, Samuel Beckett, 'tentar, errar de novo, errar melhor'

Pierre, no Guerra e Paz, à luz deste sentido do termo ingénuo, tem uma existência mais plena que os outros, porque de facto tenta, erra bastante, mas não desiste e não perde a autenticidade nessa busca por um sentido para a existência.

Procurar ter um sentido para a existência e procurar ter uma vida boa são coisas diferentes - pode ter-se tido ou construído uma vida com sentido, mas não feliz; assim como se pode ter uma vida cheia de prazeres e felicidades, mas vazia de sentido e, portanto, em parte infeliz, se se tem consciência disso, porque não tendo, a questão do sentido não incomoda. 

Difícil é conseguir ambas: um sentido para a vida e, ao mesmo tempo, uma vida feliz. Agora, sem liberdade de escolha e sem autenticidade não se tem, nem uma coisa nem outra: porque a existência inautêntica retira sentido ao próprio sentido e o prazer postiço não é felicidade, é uma droga que mascara a ausência de felicidade.

O que leva à 2ª palavra: catarse.


June 05, 2021

duas palavras - 1ª felicidade

 

Felicità Raggiunta

Felicità raggiunta, si cammina
per te sul fil di lama
Agli occhi sei barlume che vacilla,
al piede, teso ghiaccio che s'incrina
e dunque non ti tocchi chi più t'ama

Se giungi sulle anime invase
di tristezza e le schiari, il tuo mattino
è dolce e turbatore come i nidi delle cimase
Ma nulla paga il pianto del bambino
a cui fugge il pallone tra le case

— Eugenio Montale

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Felicidade Alcançada

Felicidade alcançada, caminha-se
para ti sobre o fio da navalha
Para os olhos és uma chama que vacila
para o pé, és fino gelo que estala
e por isso, não te toque quem mais t'ama

Se te achegas a essas almas plenas
de tristeza e as libertas, a tua manhã
é doce e perturbadora como os ninhos nos beirais
Mas ninguém consola o choro da criança
a quem escapa o balão por entre as casas

(tradução minha)

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- no poema, a felicidade é tão delicada que se caminha para ela em equilíbrio e toda a força (ou stress) a quebra e apaga. Se a felicidade é alcançada é tão doce e perturbadora como a luz da manhã, que surpreende e encanta e liberta a alma de tristezas, mas se a deixamos fugir, depois de a vermos, vislumbrarmos ou alcançarmos, ninguém nos consola. Portanto, a felicidade é para quem está disposto ao sofrimento de caminhar até ela no equilíbrio instável e doloroso do fio da navalha sem perder a delicadeza. 
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A felicidade, parece-me, vem das pessoas/coisas que nos inspiram. É uma inspiração, seguida de expansão, acção, modificação. Existem as pessoas/coisas que nos 'inspiram' (uma palavra que começa no grego pneuma, ar, no sentido de espírito que nos enche e anima, dá vida, literalmente (anima=alma=vida) e ao fazê-lo libertam-nos do estado de estar [espiritualmente] morto e causam em nós aquela expansão activa própria da felicidade.

Para falar em termos kantianos, se queremos o fim, também temos que querer os meios de lá chegar e os meios de lá chegar são procurar e identificar as pessoas/coisas que nos inspiram, conservá-las com aquela delicadeza de que fala o poema e estar disposto a sofrer o fio da navalha por elas. 

A felicidade não é ataraxia, aquele estado de tranquilidade inactiva dos estóicos e epicuristas. A felicidade é espírito, é acção, é criação. Todos/tudo que nos inspire origina felicidade se nos leve à criação, à actividade, à expansão, à reinvenção. Na felicidade há exaltação - a felicidade não está nas coisas ou em ter coisas a não ser nas coisas que nos inspiram e não está nas pessoas a não ser naquelas que nos inspiram desta maneira activa e criativa. O que leva à 2ª palavra - poesia, a poiesis.

March 13, 2021

Links para trabalhadores de palavras

 


83 links

 

 

  • DeltCi – Dicionário Eletrônico de Terminologia em Ciência da Informação;
  • Definr – Incredibly fast dictionary;
  • ODLIS: Online Dictionary for Labrary and Information Science;
  • Wordfind – site para identificar anagramas;
  • Biographical Dictionary – Breves biografias com nome, profissão e datas de nascimento e morte de 28 mil personalidades;
  • Biography.com  – Biografias de 25 mil personagens históricos e do presente, contendo a data de nascimento de cada um deles;
  • Bushido Online – Apresenta um glossário com termos relacionados às artes marciais; bushido significa à maneira do guerreiro;
  • Catholic Encyclopedia – Versão digital de uma extensa enciclopédia sobre o catolicismo publicada no início do século XX;
  • Encyclopedia.com – Apresenta 57 mil verbetes da sexta edição da Columbia Encyclopedia. Links levam a textos de revistas e jornais e a ilustrações;
  • Encyclopedia Mithica – Especializado em mitologia, este site define deuses, seres supernaturais, monstros e outras lendas;
  • Fact Monster – Almanaque, atlas, dicionário e enciclopédia em formato adequado para crianças. Em inglês;
  • Instrument Encyclopedia – Interessante iniciativa, com fotos e explicações sobre instrumentos de todo o mundo;
  • Internet Archive – Dedicado a registrar a evolução da Internet, este catálogo já possui mais de 10 bilhões de páginas;
  • Information Please – Reúne almanaques sobre áreas variadas, como ciência, esportes e história;
  • Mithos – Em português, traz personagens mitológicos africanos, árabes, greco-romanos, entre outros;
  • Ponteiro – Fácil de usar, este guia indica fatos importantes que aconteceram em cada dia do ano;
  • Quotations Page – Reúne cerca de 18 mil citações de 2.300 romancistas, pensadores e políticos, organizadas por autor ou assunto;
  • Skeptic’s Dictionary – Apresenta crenças e ideias fornecendo dicas de como pensar criticamente sobre elas; 
  • Symantec Security Response – Enciclopédia de vírus digitais e alarmes falsos. Oferece dicas de como identificá-los e precaver-se;
  • Symbols.com – Mostra e explica mais de 2.500 símbolos, de ideogramas da Antiguidade ao ejetar do videocassete;
  • The Devil’s Dictionary – Discorre sobre os termos relacionados com uma visão politicamente incorreta. O texto original foi escrito em 1911;
  • Webopedia – Dicionário de informática e tecnologia da informação que também indica links para obter mais informações;
  • Acronym Finder – Oferece o significado de siglas e acrônimos, principalmente em inglês;
  • Allwords.com – Procura palavras pelo início ou pelo fim em inglês, holandês, francês, alemão, italiano e espanhol;
  • Dicionário de Gírias – Organizado por edições, este site explica termos da linguagem oral e abre espaço para internautas contribuírem com novos vocábulos;
  • Dicionário Libras – Reúne animações ensinando a realizar cerca de 700 gestos da linguagem brasileira de sinais;
  • FreeTranslation.com – Traduz, rapidamente, textos de até 10 mil caracteres e páginas da Internet;
  • Dictionary.com – Dicionário e tesauro de inglês, bastante completo, com conteúdo de 11 fontes;
  • Michaelis – Dicionário de língua portuguesa, útil também para compreender algumas regras ortográficas;
  • OneLook – Afirma ser capaz de localizar mais de 6 milhões de termos em 954 dicionários catalogados;
  • Wordsmyth – Encontre palavras por aproximação. Este dicionário possui versão para crianças, que indica palavras relacionadas;
  • YourDictionary.com – Além de definir termos em inglês, traz indicações de centenas de dicionários de outros idiomas.
  • Linguee – Dicionário para diversos idiomas
  • DicSiglas –  Dicionário de siglas, abreviações, termos e expressões



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