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August 18, 2024

Heinz Wismann: "L'Europe n'est pas un gène, elle naît de la séparation avec l’Asie"

 

Guillaume Erner fala-lhe aqui do seu último livro, Lire entre les lignes, sur les traces de l'esprit européen. Remontando ao mito da Europa, o filósofo analisa os fundamentos culturais da integração europeia, que teriam precedido quaisquer considerações geográficas, políticas ou económicas.

Segundo Wismann, a Europa nasce da separação com a Ásia, num acto cultural e não num acto político e durante muito tempo (desde Heródoto) a Europa era referida como o Ocidente por comparação com o Oriente - o 'Grande Ventre' que é a China.

Na Europa, a situação de uma comunidade de línguas diferentes obriga a que cada um se desprenda da naturalidade linguística -significante/significado- em que se encerrava como coisa evidente. Então, a diversidade que leva ao descentramento é o primeiro gesto europeu em oposição a civilizações unitárias que invocam constantemente a origem pura para manter as tradições. A Europa é como a música onde o mesmo e o outro coabitam na harmonia as sua dissonâncias particulares. É uma renovação constante da identidade pela alteridade.

Uma conversa muito interessante sobre a filosofia, a cultura, a política, a economia, a música, a Europa - e o futebol.

February 14, 2024

"Estamos em campanha, temos temas mais prementes que museus e política cultural"? Não, temos temas igualmente prementes

 


Estamos em campanha eleitoral e temos temas mais prementes que museus e política cultural. Evidente: urgências encerradas nos hospitais, miúdos nas escolas com tombos nos resultados internacionais, faltas de professores, grávidas que podem fazer centenas de quilómetros até encontrarem um sítio para o parto, falta de médicos de família, polícias em revolta, prestações do empréstimo à habitação nos píncaros – tudo isto é mais urgente que museus. No entanto, lá por não ser urgente, a política para a cultura continua a ser estrutural.


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O desenvolvimento de um país -económico e social- está ligado ao seu desenvolvimento cultural. Quando se desligam estas duas dimensões temos países escravos de outros a funcionar como seus meros fornecedores de bens materiais e/ou países com muito dinheiro -por exemplo, os países do petróleo- mas sem desenvolvimento económico e social, onde o acesso a bens é privilégio de uma elite que tem dinheiro ou poder político e a vida cívica não existe. Os países onde mais se apoia a cultura são também os países onde mais se apoia uma educação de qualidade.

Em Portugal a maioria dos políticos vê a cultura como trívia, uma espécie de acessório ou de espectáculo de entretenimento e fuga ao dia a dia, mas a cultura (e a educação que lhe está indissociavelmente ligada) é para o ser humano, o que a água é para o peixe, como dizia alguém. E se o peixe não se dá conta que a qualidade da água em que respira, em que se alimenta e nada influencia o florescimento e possibilidades da sua vida (está imerso nela desde sempre), também o ser humano, no geral, não se dá conta da qualidade do contexto em que cresce e de como ele influencia toda a sua vida, desde a sua visão do mundo que forma as suas expectativas até à sua capacidade de evoluir e ter uma acção positiva nele - económica, social, política e filosófica.

Ao ler o programa para a educação do PSD fui dar com com uma referência a um estudo sobre o impacto de um bom professor na educação escolar de um aluno - .edulog.pt/Impacto_Professor_Sum.pdf.
Neste estudo conclui-se que a exposição de um aluno a um bom professor (a um professor eficaz, o que se mede nos bons resultados dos alunos - chamam-lhe impacto VAP), mesmo que apenas no ano de exame, é de molde a fazer com que melhore as suas notas até 70%, mas também as suas possibilidades e condições de vida futura, em porcentagem idêntica. Isto devia ser um alerta para não se deixar cair a profissão nas mãos de pessoas sem formação. A não ser que queiramos Portugal ao nível do ex-ministro de Sócrates que ia a países estrangeiros gabar-se de Portugal ser um país de fraca educação e cultura e, por isso, muito vocacionado para a mão de obra barata.

Quando vemos programas políticos que querem reduzir a educação à aprendizagem da leitura e de fazer contas ou amansar alunos em disciplinas chamadas, Cidadania, impostas por ministros que são um modelo de falta de respeito pelos direitos cívicos alheios, percebemos que a questão que esta jornalista aqui traz, a do MNAC ter as obras encaixotadas ao desprezo, não é secundária, mas premente. Tão premente como as outras que cita. Como sabemos, Camões, o nosso maior vulto literário, também foi encaixotado - que fez o ME, também da cultura? Nada, nadinha.

August 26, 2023

E se nos juntássemos todos para comprar a “Galeria Abel Salazar?” Parece-me uma excelente ideia

 


Organize aí um crowdfunding e divulgue-o em sítio onde todos possam contribuir, cada um na sua possibilidade. Alinho e contribuo.


E se nos juntássemos todos para comprar a “Galeria Abel Salazar?”


O antigo Café Rialto é hoje uma loja. A enorme pintura mural Síntese da História, de Abel Salazar, foi totalmente coberta com uma parede que permitiu colocar mais umas quantas prateleiras.

Renato Soeiro

Há um desafio muito concreto que gostaria de deixar aos leitores deste texto e à sociedade em geral, muito especialmente aos portuenses e a todas as pessoas que se interessam pela cultura e pelo património.

Um dos cafés mais interessantes do Porto morreu. Hoje, felizmente, ainda temos o Majestic, o Guarany, o Ceuta e outros, mas este morreu há muito. Era o Café Rialto, na esquina da Rua de Sá da Bandeira com a Praça de D. João I, ponto de encontro de artistas e intelectuais. Foi inaugurado em 1944, pleno de obras de arte. Quando fechou, as obras de arte foram retiradas. Todas menos uma, que era inamovível: uma enorme pintura mural com 5 metros de largura e mais de 3 metros de altura, uma obra-prima do grande mestre Abel Salazar a que este chamou Síntese da História.

O espaço foi tendo outros usos. Como muitos outros espaços da Baixa, um dia foi uma dependência bancária, mas o mural lá estava, magnífico, cobrindo toda a parede de fundo.


Pintura "Síntese da História", de Abel Salazar 


Hoje é uma loja. Para optimizar o espaço, a pintura foi totalmente coberta com uma parede que permitiu colocar mais umas quantas prateleiras. Esta é a triste situação actual.

Podemos fazer alguma coisa em relação a isto?

Penso que sim, que podemos e devemos. Mas fazer o quê?

Uma solução

A solução mais simples e rápida, respeitadora de todas as leis e normas vigentes, seria comprarmos aquele espaço. Comprarmos o espaço e oferecê-lo à Casa- Museu Abel Salazar.


Modus operandi

Não seria certamente difícil encontrar um mecenas que pudesse fazer a aquisição do espaço (é apenas uma loja), mas a minha proposta é outra. O Porto tem tradição de fazer homenagens – erguer estátuas, por exemplo – através de subscrições públicas. É um modo activo de afirmação de cidadania que nos caracteriza e diz muito da sociedade que somos e queremos ser. 
Uma subscrição pública para resgatar o mural de Abel Salazar seria em si mesmo uma bela homenagem a um homem que a cidade já homenageou comparecendo em massa no seu funeral, em afrontamento directo com a ditadura; já homenageou com uma estátua; já deu o seu nome a uma das escolas da Universidade do Porto. Abel Salazar ficaria certamente emocionado ao saber que a compra deste espaço com a sua pintura foi um acto colectivo e popular.

É claro que na subscrição pública contaremos não só com o cidadão que empenhadamente contribuirá com uns poucos de euros retirados do seu magro salário ou pensão, mas também com o contributo dos bancos e das empresas, do Ministério da Cultura e da Gulbenkian, da Câmara do Porto e das associações empresariais, das fundações e dos mecenas.

O ideal seria que, para receber directamente as contribuições, fosse aberta uma conta especial da casa-museu ou da sua associação para este efeito, pormenor a decidir pela própria casa-museu, pela universidade e pelo seu reitor.

A Câmara Municipal do Porto poderia ter um papel importante no contacto com o actual proprietário do espaço e na negociação das condições da transacção.

Talvez a Faculdade de Arquitectura possa assumir o projecto de remodelação do espaço e a das Belas-Artes o da sua divulgação.

O Porto é capaz

Enfim, o que se pretende é uma mobilização geral de vontades e de capacidades de uma cidade que já mostrou que o sabe fazer sempre que é preciso.



July 03, 2022

Cultura de massa

 


"The bastard form of mass culture is humiliated repetition... always new books, new programs, new films, news items, but always the same meaning." - Roland Barthes

December 15, 2021

Não temos uma política de valorizar o que temos

 


Hoje estava na sala de profs à conversa com três colegas de artes. Estávamos a comentar a ausência de uma política de valorização do património artístico contemporâneo que temos. Os espanhóis, por exemplo, valorizam imenso o seu património. Nós, em comparação, temos pouca coisa, mas o que temos é bom, só que está 'escondido', quer dizer, em sítios onde só duas ou três pessoas sabem. O museu Berardo é muito desprezado. No entanto, tem muitas peças que aparecem regularmente em todos os grandes livros e artigos internacionais sobre o género. Depois, há uma pequena galeria que tem um desenho de Cocteau, um pequeno museu que tem um Dali, outro que tem três Picassos, etc. Há muita coisa dispersa que devia ser reunida num grande museu de arte do século XX e contemporânea para que pudesse ser apreciada, pois estando as obras dispersas por 500 sítios, acabam por 'perder-se' e nem ser apreciadas. Por exemplo, podia acabar-se a ala do palácio da Ajuda e fazer lá um museu em continuidade. Os outros países valorizam tudo. Por exemplo, vamos a Paris ao museu Picasso e a certa altura já não se aguenta, tanta pintura a metro. Ao contrário dos poetas que deitam fora os esboços dos poemas e só publicam a obra final, os pintores guardam as obras preparatórias todas, que no caso de Picasso são, sei lá...  5.500 que depois põem num museu. Nós não valorizamos nada porque não temos uma política cultural porque os governantes não querem saber da valorização cultural. Não temos muito e o que temos anda escondido, disperso, não-visto, não-apreciado. Vêm muitos turistas ao país que têm uma cultura de museus e iriam ver essas coisas.


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No Núcleo Arqueológico da Rua dos Correeiros há vestígios fenícios, romanos, islâmicos, medievais, pré e pós-pombalinos. Classificado como Monumento Nacional desde 2015, reabre ao público com uma nova museologia que ajuda a contar 2500 anos de Lisboa.

November 14, 2021

"O mau gosto e a má moral andam muitas vezes de mãos dadas".

 


John Cleese retira-se do evento da União de Cambridge por causa dos 'wokes'

Comediante diz que está 'a colocar-se na lista negra' depois de outro orador ter sido banido por imitação de Hitler

John Cleese retirou-se de um evento na União de Cambridge, dizendo que ele próprio se punha "na lista negra" antes de "outra pessoa o fazer".

A decisão da estrela dos Monty Python e Fawlty Towers foi um protesto depois do crítico de arte Andrew Graham-Dixon ter sido banido da sociedade em debate por fazer uma imitação de Adolf Hitler.

Cleese devia ter-se dirigido aos estudantes na sexta-feira, mas retirou-se, dizendo que também se tinha feito passar por Hitler num sketch de Monty Python: "Estava ansioso por falar com estudantes de Cambridge esta sexta-feira, mas ouvi dizer que alguém de lá foi colocado na lista negra por fazer uma imitação de Hitler.

"Fiz o mesmo num programa de Monty Python, por isso estou a colocar-me na lista negra antes que alguém o faça". Peço desculpa a qualquer pessoa em Cambridge que estivesse à espera de falar comigo, mas talvez alguns de vós possam encontrar um local onde as regras woke não se apliquem".

De acordo com relatórios, Cleese estava de visita a Cambridge como parte de um documentário que está a fazer sobre a "cultura woke".

O presidente da União de Cambridge, Keir Bradwell, disse que era uma "enorme pena" que Cleese sentisse que já não podia participar no evento. "Estávamos realmente ansiosos por receber John aqui.

"Teria sido um evento realmente fantástico e os nossos membros estão realmente entusiasmados por ouvir falar dele - o documentário que ele está a fazer é extremamente actual. Ele é o tipo de orador que iria prosperar com o nosso público e na nossa sala".

A impressão e os comentários de Graham-Dixon Hitler vieram durante um debate na semana passada sobre a moção "Esta casa acredita que o bom gosto não existe". Numa declaração, o historiador de arte disse que não era sua intenção perturbar as pessoas, mas persuadir o público "de que o mau gosto e a má moral andam muitas vezes de mãos dadas".

Ele acrescentou: "Peço desculpa sinceramente a qualquer pessoa que tenha achado as minhas tácticas de debate e o uso da própria linguagem de Hitler perturbadoras; na reflexão, posso ver que algumas das palavras que usei, mesmo entre aspas, são intrinsecamente ofensivas".

Ele rejeitou a "implicação de que sou racista e anti-semita ... O discurso que proferi foi um ataque estridente ao racismo e ao antisemitismo de Hitler".

Numa carta publicada no Facebook, Bradwell disse que as observações feitas por Graham-Dixon durante o evento foram "irreflectidas e grotescas" e pediu desculpa pelo seu próprio fracasso em intervir. 


May 22, 2021

Food for thought

 


"A cultura foi outrora considerada propriedade patenteada dos seres humanos: temos a arte, a ciência, a música e as compras online; os animais têm o instinto, o imprinting e as respostas automáticas. Essa atitude desdenhosa para com as mentes não humanas mostra-se cada vez mais profundamente mal orientada a cada nova descoberta de inteligência ou capricho animal: A cultura, como muitos biólogos agora a entendem, é muito maior do que nós". (Oliver Sacks Foundation)




December 07, 2020

Um artigo sobre apropriação cultural que diz exactamente o que penso sobre o assunto

 


Quando ouço dizer que pessoa tal foi criticada porque escreveu sobre um personagem negro ou que ia representar uma personagem da cultura afro-americana, sendo brancos, penso logo, 'aqui está alguém que se vê em primeiro lugar como uma raça e só depois como um ser humano'.

Quem gosta de ópera, como eu, percebe o absurdo disto. É certo que é verdade que eu não posso saber ao certo como é a experiência de uma pessoa emigrante angolana em Portugal ou a experiência de um homem, assim como qualquer um destes não pode saber da minha: mas somos humanos e a experiência humana é similar e há sempre pontos comuns mesmo com pessoas que parecem muito diferentes: ou somos ambas mulheres/homens ou ambas mães/pais, ou já fomos emigrantes em outro sítio, etc. Ou já lemos ou temos amigos dessa cultura, etc.

Quem gosta de ópera, dizia eu, sabe como certos registos de vozes são raros. Estamos mais que habituados a ver um tenor negro a interpretar o rei D. Carlos, por exemplo, ou uma mezzo-soprano negra ou asiática ou mexicana ou o que seja a interpretar a princesa de Éboli ou um tenor branco a interpretar Otelo. Ou um artista de 50 anos a interpretar o jovem Romeu. Ninguém quer saber que sejam brancos ou negros a interpretar papéis de outra cultura, faixa etária, raça ou o diabo a nove. Queremos é saber das vozes e da interpretação. Ninguém pensa: ai que estão a apropriar-se da cultura do outro. Um músico negro não pode tocar Beethoven, um branco não pode cantar Bob Marley?

Por esta ordem de ideias, de cada vez que uma rapariga negra esticasse o cabelo seria acusada de se apropriar de uma característica de outra cultura. É ridículo e um impedimento ao entendimento entre culturas, povos e raças diferentes.

Eu fiz um amigo árabe quando fui ao deserto do Sahara, via Tunísia. Mantivemos contacto durante uns anos (perdemo-lo na altura da Primavera árabe). A vida e a cultura dele não têm nada a ver com a minha (na cultura dele, se começam a falar sobre os problemas da vida quotidiana, começam a chorar - uma pessoa da primeira vez que vê isso fica numa aflição porque não se está à espera) mas entendíamo-nos bem. Eu gosto de saber e acho que ele gostava de falar com alguém de outra cultura. Não fiquei a saber por dentro o que é ser um guia árabe do deserto, mas tenho, hoje-em-dia, uma noção aproximada dessa experiência e podia escrever uma personagem num romance baseado nesse conhecimento exterior. Porque não? 

Alexandre Dumas era de descendência negra mas viveu toda a vida em França, foi secretário do Duque de Orléans, futuro rei Luís Filipe e escreveu profusamente sobre a corte francesa, o rei, a rainha, os mosqueteiros e por aí fora. E então? Qual é o problema? 




Alexandre Dumas








All Shook Up: The Politics of Cultural Appropriation

Na era do capitalismo global, imaginar as vidas dos outros é uma forma de solidariedade crucial. 

Ouvi pela primeira vez a frase “Fique na sua pista” há alguns anos, num workshop de redação que estava dando. Estávamos a falar sobre uma história que um aluno do grupo, um homem asiático-americano, havia escrito sobre uma família afro-americana. Havia muito o que criticar sobre a história, incluindo muitos clichês sobre a vida dos negros americanos. 
Eu esperava que a classe oferecesse sugestões para melhorias. O que eu não esperava era que alguns alunos diriam ao escritor que ele não deveria ter escrito a história. Como disse um deles, se um membro de um grupo relativamente privilegiado escreve uma história sobre um membro de um grupo marginalizado, isso é um ato de apropriação cultural e, portanto, causa dano.

Discussões sobre apropriação cultural chegam aos noticiários a cada um ou dois meses. Duas mulheres de Portland, depois de saborear a comida durante uma viagem ao México, abrem um carrinho de burrito quando voltam para casa, mas, atacadas por activistas online, fecham os seus negócios em poucos meses. Uma aula de ioga numa universidade no Canadá é encerrada por protestos de estudantes. 
O autor de um romance para jovens, criticado por escrever sobre personagens de origens diferentes das suas, pede desculpas e retira o livro de circulação. 
Uma variedade tão ampla de actos e práticas é condenada como apropriação cultural que pode ser difícil dizer o que é a apropriação cultural. 

Grande parte da literatura sobre apropriação cultural é espectacularmente inútil nesse aspecto. LeRhonda S. Manigault-Bryant, professora de estudos Africana no Williams College, diz que o termo "refere-se a pegar a cultura de outra pessoa - propriedade intelectual, artefactos, estilo, forma de arte, etc. - sem permissão." Da mesma forma, Susan Scafidi, professora de direito na Fordham e autora de Who Owns Culture? Apropriação e autenticidade na lei americana, define-o como "Tirar propriedade intelectual, conhecimento tradicional, expressões culturais ou artefactos da cultura de outra pessoa sem permissão. Isso pode incluir o uso não autorizado de dança, vestimenta, música, idioma, folclore, culinária, medicina tradicional, símbolos religiosos, etc. de outra cultura. ”

Essas definições parecem esclarecedoras, até que se pense sobre elas. Por um lado, a ideia de “tirar” algo de outra cultura é tão ampla a ponto de ser incoerente: não há nada nessas definições que nos impeça de condenar alguém por aprender outro idioma. Por outro lado, eles contam com uma ideia - "permissão" - que, neste contexto, não tem qualquer significado. A permissão para usar as expressões culturais de outro grupo não é algo que seja possível receber, porque etnias, identidades de género e outros grupos semelhantes não têm representantes autorizados a concedê-la. 
Quando os romancistas, por exemplo, escrevem fora de sua própria experiência, as editoras agora recrutam “leitores sensíveis” para garantir que eles não digam nada que possa ofender - mas uma vez que os livros são publicados, os romancistas ficam por conta própria. Não há nada que eles possam fazer para refutar a acusação de que os produtos de sua imaginação foram "não autorizados", nada que eles possam fazer para repelir a acusação de que causaram danos por se desviarem das suas pistas.

Algo como a admoestação para 'permanecer na sua faixa' está por trás dos protestos que surgiram quando o retrato de Dana Schutz de Emmett Till no seu caixão foi exibido uma exposição no Museu Whitney em 2017 - provavelmente o capítulo mais amargo da discussão sobre apropriação cultural na memória recente.

A artista Hannah Black escreveu uma carta aberta ao Whitney “com a recomendação urgente de que a pintura fosse destruída”. Black continuou: “Por meio da coragem de sua mãe, Till foi colocado à disposição dos negros como uma inspiração e um aviso. Pessoas não negras devem aceitar que nunca irão incorporar e não podem compreender este gesto. . . . ” 
A resposta de Schutz identificou o problema com a ideia de ficar na mesma pista. “Não sei o que é ser negro na América”, disse ela, mas sei o que é ser mãe. Emmett era o único filho de Mamie Till. O pensamento de qualquer coisa acontecendo com seu filho está além da compreensão. A dor deles é a sua dor. Meu envolvimento com essa imagem foi através da empatia com sua mãe. . . . A arte pode ser um espaço de empatia, um veículo de conexão. Não acredito que as pessoas possam realmente saber o que é ser outra pessoa (nunca saberei o medo que os pais negros podem ter), mas também não somos completamente desconhecidos.

O que ela estava a dizer é que a pista que compartilhava com Mamie Till-Mobley pelo facto de ser mãe era tão importante quanto a pista da raça.

The philosopher and novelist Iris Murdoch wrote, “We judge the great novelists by the quality of their awareness of others.” If Tolstoy is considered by many to be the greatest novelist who ever lived, this isn’t because of the beauty of his sentences or the shapeliness of his plots. It’s because he could bring to life so many wildly different characters, from the young girl preparing eagerly for her first ball to the old man dying in his bed, from the aristocrat on a fox-hunt to the serf watching the aristocrat ride by. Tolstoy’s intense responsiveness to life jolts us into an awareness of how much more deeply we could be living; his intense responsiveness, in particular, to other people, jolts us into an awareness of how much more keenly we could be entering into the experiences of the people around us.
(...)
Quanto mais se lê sobre apropriação cultural, mais difícil é resistir à conclusão de que a preocupação em permanecer no seu caminho é uma espécie de política falsa. Os críticos da apropriação cultural acreditam estar envolvidos numa atividade política significativa, mas os objetos de suas críticas geralmente são pessoas relativamente impotentes - a professora de ioga, as mulheres com o carrinho de burrito, o artista visual, o romancista que ousa se aventurar fora de sua pista. 
(...)
Às vezes, gostaria que estivéssemos equipados com um sentido extra, um sentido que nos permitisse perceber o quanto estamos conectados uns aos outros. Quando colocasse minha camisa, sentiria o trabalho do trabalhador da confecção na Nicarágua que a costurava; quando uso o meu telefone, fico ciente da criança trabalhadora na República Democrática do Congo que minerou o cobalto para sua bateria; quando descascasse uma laranja, sentiria a presença do trabalhador na Flórida que a colheu. 

Na falta desse sentido, precisamos cultivar a imaginação simpática. Precisamos tentar imaginar a vida de outras pessoas. Portanto, não estou a argumentar que, quando os artistas tentam imaginar a vida de outras pessoas, devemos relaxar e ver seus esforços como basicamente inofensivos. 

Estou a argumentar que imaginar a vida de outras pessoas é uma parte essencial do esforço para trazer à existência um mundo mais humano. Podemos abraçar uma espécie de solipsismo cultural que afirma que grupos diferentes não têm nada em comum, ou podemos compreender que as nossas vidas estão inextricavelmente ligadas às vidas de pessoas que nunca conheceremos. 

Podemos negar o que devemos uns aos outros ou podemos buscar recuperar a visão de uma humanidade compartilhada. Podemos escolher acreditar que é virtuoso tentar permanecer nas nossas faixas, ou podemos escolher aprender sobre a ideia de solidariedade. É uma ideia antiga, mas para aqueles de nós preocupados com liberdade e igualdade, ainda é a melhor ideia que temos.


(tradução minha de excertos do artigo)

August 23, 2020

Acerca da devolução da arte



França devolve arte ao Benim e Senegal


O Parlamento francês aprovou esta semana a lei que permite a devolução de uma série de peças de arte, nas quais se contam 26 artefactos ao Benim e um sabre ao Senegal.
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A questão da devolução da arte aos seus países de origem não me parece assim tão complicada se houver bom senso de todas as partes.

Quando fui ao Egipto, o guia que nos foi buscar ao aeroporto e andou connosco nesse dia, ao passarmos por uma praça com um obelisco disse, 'este obelisco é do tempo do Faraó tal e tal. Emprestámos muitos obeliscos aos romanos, aos franceses, aos ingleses.' 'Emprestámos' foi um termo empregue ironicamente, naturalmente, porque os europeus andam a roubar obeliscos aos egípcios desde o tempo do Imperador Augusto ou antes, mesmo.   

Parece-me inegável que não é possível devolver toda a arte que foi deslocada, desviada ou como lhe queiram chamar, por guerras ou pela vida colonialista. Tínhamos que recuar milénios e as culturas a quem foram tiradas as obras também elas desviaram obras alheias. Estamos a falar de milhares de milhões de obras, algumas que já deram várias voltas ao mundo porque em cada guerra mudam de mãos.

Dito isto, parece-me que há obras que são identitárias de uma cultura e essas devem ser devolvidas, não só porque não fazem sentido fora dos países de origem, mas como símbolo do reconhecimento da injustiça e falta de ética que foi, removerem-nas dos sítios onde pertencem. 

Veja-se por exemplo, este caso das cariátides do Erecteion grego. Falta uma delas que está sozinha, em Londres, separada das suas irmãs, descontextualizada e exposta como uma mutilação. Parece que alguém mutilou um corpo, roubando-lhe um braço e o expõe com orgulho, deixando o corpo longe, incompleto.




Da mesma maneira os mármores de Elgin pertencem ao Partenon e não aos ingleses; o busto de Nefertiti devia estar no Museu do Cairo e não na Alemanha e outros. Recentemente um museu alemão devolveu a bíblia de Witbooi à Namíbia...




... e o padãro dos descobrimentos que os portugueses lá deixaram em 1486:


The cross, placed on Namibia's coast by Portuguese explorers in 1486, is a symbol of the country's colonial past.
Namibian Ambassador to Germany - Andreas B.D. Guibeb standing with the Cape Cross in Berlin (picture-alliance/dpa/B. Pedersen)

Portanto, o que me parece é que estas peças que são identitárias de um povo, uma cultura ou uma nação, devem ser devolvidas aos países de origem, porque lhes pertencem, em primeiro lugar e porque é lá que fazem falta, não nos museus onde estão - são só mais uma peça, por importante que seja em termos de chamariz de público. Depois, era um gesto de bom entendimento entre culturas, que tanta falta faz.


E já agora, senhor ME: mande pagar o que me devem, sff!


July 21, 2020

Situações que dizem muito acerca do lugar da cultura em Portugal



Ando aqui há algum tempo à procura do discurso de aceitação do prémio Nobel de Bertrand Russel em versão portuguesa e não encontro. Encontro a original, em inglês e também encontro em espanhol, mas não em português. Não é como se Bertrand Russel tivesse sido uma figura menor da cultura a nível mundial, muito pelo contrário. Não por acaso, quando falo com alunos acerca de trabalhos e de como fazer pesquisas na internet, digo-lhes sempre que é provável não haver informação em sites portugueses e que o melhor é irem a sites brasileiros ou ingleses, se souberem razoavelmente inglês. Digo isto com alguma tristeza, mas temos que ser pragmáticos nestas coisas. Quanto aos discursos de aceitação de laureados, encontra-se o de Saramago e pouco mais.

June 11, 2020

Falta de bom senso



A retirada de "E tudo o vento levou" do catálogo da plataforma de 'streaming' HBO Max nos Estados Unidos será temporária, para que seja incluída contextualização histórica ao filme de 1939.
Num comunicado hoje divulgado, a WarnerMedia, detida pela AT&T e que opera a HBO Max, classifica "E tudo o vento levou" como "um produto do seu tempo" que retrata preconceitos raciais.

De acordo com a empresa, quando "E tudo o vento levou" regressar à HBO Max, irá incluir "contexto histórico e uma denúncia dessas mesmas representações, mas será apresentado tal como foi criado, porque fazer o contrário seria o mesmo que alegar que esses preconceitos nunca existiram".

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Por esta ordem de ideias temos também que etiquetar todos os filmes que são preconceituosos contra as mulheres e proporcionam uma visão estereotipada delas (ou o racismo é mau mas o sexismo é bom?) que são praticamente todos e não são de outras épocas, são desta. Todos os dias abro a TV e se passo nos canais de filmes, está sempre a passar um filme onde as mulheres só aparecem na altura em que os personagens masculinos querem fazer sexo e então elas aparecem para se despirem e o realizador mais a equipa toda das filmagens poderem vê-las nuas a fazer sexo com um homem que está sempre vestido; ou então aparecem para dizer a um homem que os amam e ele são a melhor coisa do mundo, ou para desfilarem roupas, ou para fazer de esposas ou para darem gritinhos como histéricas ou para serem violadas e agredidas. Todos esses filmes que veiculam uma imagem das mulheres ofensiva e humilhante, até, têm que ser rotulados. Aliás, se levássemos isso avante tinha que proibir-se a maioria dos filmes onde as equipas, desde produtores a realizadores, passando por técnicos, são, sabemos-lo agora, um conjunto de homens desonestos (alguns mesmo porcos e criminosos) que abusam de mulheres e crianças.

Depois passamos aos livros e rotulamos os livros onde se descrevem personagens estereotipadas pelo racismo e pelo sexismo. Para já não falar nos livros como a Lolita, que falam da pedofilia como se fosse um amor romântico... são quase todos. Depois fazemos o mesmo aos filmes que veiculam imagens estereotipadas de homens e adolescentes como bestas que só pensam em abusar de mulheres e dar pancada a outros ou roubá-los. Acabavam-se os filmes todos de cowboys mais aqueles filmes para adolescentes rapazes que estão sempre a passar na TV. Os filmes franceses e italianos de até há pouco tempo iam todos à vida.
E temos que rotular as pessoas também: este realizador é convidado frequente do sheik tal e tal deste país que defende a escravatura e opressão das mulheres. Afinal, é pior ser um esclavagista e sexista hoje do que no tempo do filme 'E Tudo o Tempo Levou', não? 

A única maneira de lidar com isto é dar espaço às pessoas não brancas para contarem a sua história e o seu ponto de vista da história, como se tem vindo a fazer: há realizadores de cinema e TV negros e asiáticos e de outras etnias, bem como mulheres que começam a mostrar a sua perspectiva. Nas universidades existem desde há tempos cadeiras e cursos que pretendem isso mesmo de mostrar como a história está escrita por esclavagistas e machistas que deturpam e mentem: é assim que a Mª Madalena ou a Cleópatra, uma mulher extraordinária como líder e muito culta passou para a história como uma prostituta.
É assim que as mulheres e a suas vidas e ações foram apagadas. 

Há pouco tempo li um artigo sobre as raparigas e as mulheres que tinham bandas de rock na altura do Elvis e do nascimento do rock. Algumas foram percursoras dele e das outras bandas que vieram e tinham imenso sucesso localmente. A Fender vendia tantas guitarras a raparigas como a rapazes. Porque é que nunca se tornaram conhecidas para além das suas terras? Porque as rádios as censuravam. Parecia mal, isso de tocar numa banda, era coisa logo rotulada de prostitutas. E agora? Proíbem-se as rádios? Escreve-se uma placa à porta a dizer que em tempos foram muito sexistas e trataram mal as mulheres?

E a arte nos museus? Quase toda sexista, com uma visão pornográfica das mulheres e racista? Também se proíbe?

Quando passo um filme nas aulas, que é sempre escolhido cuidadosamente para ser usado a propósito de um tema, de vez em quando têm cenas sexistas (às vezes racistas mas esses passo de propósito para discutir e mostrar como essas ideias se põem subrepticiamente nas obras) porque é praticamente impossível encontrar um filme não machista, os meus alunos, hoje em dia, dão logo por elas e manifestam-se.

O que quero dizer é: temos que educar melhor: sem racismo, sem sexismo e dar espaço e voz para que outros, que não apenas os homens brancos contem a sua história e mostram a sua perspectiva dos factos, das ideias.

'E tudo o Vento Levou' é um filme que mostra como a escravatura era normal, porque o era, de facto. Escrever um texto a dizer que não estão de acordo com aquelas ideias é um bocado sem sentido. Ninguém está à espera que estejam. Tentem é passar outro tipo de filmes, também. E já agora, evitem os realizadores e produtores que têm e veiculam essas ideias, hoje! Em vez de tentar corrigir o passado, corrijam o presente, contribuam para que se escreva um novo presente e um novo futuro, livre de escravatura, de misógina, de homofobia e machismo. Por exemplo, não dêem milhões a séries como o Game of Thrones, que passa uma visão racista e sexista do mundo: são todos para brancos menos um e as mulheres são vistas como servas de homens, prostitutas ou seres manhosos por natureza. Sim, há duas personagens femininas diferentes... a sério? O os gays, que são três ou quatro e acabam todos mortos como castigo? Ou isso não interessa porque a série dá muito lucro?

May 15, 2020

Educação, vida, cultura, tecnologia e escola - excerto duma pequeníssima entrevista a Gilles Lipovetsky



R. A escola pública não é uma despesa, é um investimento para o futuro. É preciso pagar bem aos professores e ensinar o aluno a respeitá-los. Não sou eu quem diz isso, hein. Platão já dizia. Se acreditamos que computadores e tablets resolverão todos os problemas, estamos em um erro grave. O professor é imprescindível. E é preciso formar os jovens de modo que sejam mais adaptáveis, com menos medo de mudar. Assim, haverá menos frustração. E muito importante: é preciso dar muito mais importância à arte e à cultura. Caso contrário, só nos restará o shopping!

P. Sem querer ser um pessimista desmancha-prazeres, dá a sensação de que caminhamos para o lado oposto. Reinam sem rival os tais “saberes instrumentais”...
R. Sem dúvida.

P. Não acha que se instalou na sociedade uma espécie de aristocracia tecnológico-computacional?
R. Totalmente, e é um problema. É bom formar elites tecnológicas, mas acho que vamos acabar pagando um preço por essa situação. Porque o ser humano é complexo. Veja, eu observo muitos pesquisadores, matemáticos, físicos e engenheiros de nível bem elevado que cantam em corais. Ou que se inscrevam em cursos de teatro ou de pintura. Não sei por quê, mas acontece. Talvez simplesmente não encontrem um sentido pleno em seu trabalho. E isso é também a democracia. A democracia não é só ter eleições livres, é formar indivíduos que desfrutam, que sejam ricos em suas habilidades, e não apenas instrumentos de voto e de trabalho.

P. O senhor fala do longo prazo como opção social. Infelizmente, não parece que...
R. Ah, eu não sou político. Não tenho um programa. E o que estou propondo não teria um resultado eleitoral direto, é claro. O hiperindividualismo, um assunto sobre o qual escrevi, não é apenas uma retração egoísta. É também um desejo de expressão de si. O hiperindivíduo quer gostar do que faz. E que o que faz lhe agrade. Conheço muitas pessoas que ganham muito dinheiro, pelo que sei, mais de 10.000 euros por mês e que detestam seu trabalho. É claro que não são uns coitados, mas, sim, frustrados. A democracia tem a ver com o enriquecimento da pessoa —um enriquecimento não econômico—, e nesse sentido estamos vivendo um fracasso democrático. A democracia não pode ser só um instrumento de eficiência utilitarista. Da mesma forma que lutamos contra a degradação do meio ambiente, temos que trabalhar contra a degradação das qualidades criativas da pessoa. Os jovens querem sentir estima por si mesmos, a autoestima é um dos grandes temas da nossa sociedade.

P. Refere-se a um apoio político prioritário à educação e à cultura? E é raro encontrar isso. Na Espanha, não, por exemplo, isso está claro.
R. Sim, falo sobre isso, mas não são necessários grandes projetos. Sou contra projetos culturais grandiosos! No final, isso acaba só no star system. Se Mitterrand tivesse dedicado o gasto de suas obras faraônicas em Paris a melhorar a infraestrutura cultural das cidades pequenas ou a melhorar a situação dos subúrbios das grandes cidades, tudo teria sido melhor. Trata-se de mobilizar pintores, escritores, músicos para que ensinem as pessoas a fazer coisas enriquecedoras, especialmente as crianças, como atividades extracurriculares, mas a sério, e não necessariamente a cargo do professor. Os professores não podem fazer tudo. Se um ator de uma companhia profissional de teatro diz a um adolescente em que consiste este ou aquele trabalho do século XVIII, isso adquire um significado totalmente diferente e há uma boa chance de que a criança goste. Investir nisso custa muito menos do que em usinas nucleares, é claro. É uma questão de vontade política, trata-se de fazer com que as pessoas digam o que gostam, não só quem detestam!

P. O que o senhor fala, definitivamente, é de um novo contrato social, não só de política.
R. Uma sociedade cujos eixos exclusivos são as telas, o trabalho e a proteção social é uma sociedade deprimente. É preciso investir em educação. E as possibilidades de investimento em assuntos educacionais são infinitas. Um dos maiores fracassos nas sociedades ocidentais do pós-guerra foi a "democratização da cultura". Pensou-se que, ao abrir muitos museus por muitas horas e com grandes obras, graças ao dinheiro do Estado, muita gente nova se juntaria às visitas, mas não foi assim. Quando se presta atenção, ao longo do tempo as pessoas que vão aos museus são as mesmas de sempre: gente de um certo nível educacional. Os camponeses e os operários da construção em geral vão pouco. É uma questão de educação.

P. Talvez seja mais uma questão de princípios do que de dinheiro. Ou de que o primeiro garante o segundo.

R. Sem dúvida alguma. Pais e professores têm aí uma responsabilidade crucial.

P. O senhor escreveu contra o fato de que os pais eduquem seus filhos com luvas de pelica. O que queria dizer exatamente?

R. É um erro imenso. É indispensável que o professor recupere a autoridade. Há alunos que insultam o professor, e isso é inadmissível. Educar não é seduzir. Há obrigações. Em um dado momento, é preciso obrigar a fazer coisas. Nem tudo pode ser flexível, agradável, discutível. É preciso trabalhar duro, e forçar a trabalhar. O homem é Homo faber, é preciso ensinar a fazer. E é preciso recuperar a retórica, ensinar as crianças a se expressarem e a raciocinar, porque o computador não vai fazer isso por eles. O homem é Homo loquens, o ser que fala.

May 07, 2020

Assíria



Gosto tanto de tudo o que tem a ver com a Assíria. Nínive...
A Gulbenkian tem um baixo-relevo assírio do palácio de Nimrod muito bonito. Vi no museu Pergamon aquelas duas figuras-portas lindíssimas do touro alado. São impressionantes
Esta aqui que está no British Museum é belíssima. Tão delicada. Não sei o simbolismo mas vê-se a representação da abundância na vinha cheia de densos cachos de uvas e a representação da força na leoa que descansa à sombra da videira. A cabeça da leoa cheia de expressão.

Os terroristas do ISIS destruíram o que restava do palácio por razão nenhuma.