August 23, 2020

Acerca da devolução da arte



França devolve arte ao Benim e Senegal


O Parlamento francês aprovou esta semana a lei que permite a devolução de uma série de peças de arte, nas quais se contam 26 artefactos ao Benim e um sabre ao Senegal.
----------------------------------------------


A questão da devolução da arte aos seus países de origem não me parece assim tão complicada se houver bom senso de todas as partes.

Quando fui ao Egipto, o guia que nos foi buscar ao aeroporto e andou connosco nesse dia, ao passarmos por uma praça com um obelisco disse, 'este obelisco é do tempo do Faraó tal e tal. Emprestámos muitos obeliscos aos romanos, aos franceses, aos ingleses.' 'Emprestámos' foi um termo empregue ironicamente, naturalmente, porque os europeus andam a roubar obeliscos aos egípcios desde o tempo do Imperador Augusto ou antes, mesmo.   

Parece-me inegável que não é possível devolver toda a arte que foi deslocada, desviada ou como lhe queiram chamar, por guerras ou pela vida colonialista. Tínhamos que recuar milénios e as culturas a quem foram tiradas as obras também elas desviaram obras alheias. Estamos a falar de milhares de milhões de obras, algumas que já deram várias voltas ao mundo porque em cada guerra mudam de mãos.

Dito isto, parece-me que há obras que são identitárias de uma cultura e essas devem ser devolvidas, não só porque não fazem sentido fora dos países de origem, mas como símbolo do reconhecimento da injustiça e falta de ética que foi, removerem-nas dos sítios onde pertencem. 

Veja-se por exemplo, este caso das cariátides do Erecteion grego. Falta uma delas que está sozinha, em Londres, separada das suas irmãs, descontextualizada e exposta como uma mutilação. Parece que alguém mutilou um corpo, roubando-lhe um braço e o expõe com orgulho, deixando o corpo longe, incompleto.




Da mesma maneira os mármores de Elgin pertencem ao Partenon e não aos ingleses; o busto de Nefertiti devia estar no Museu do Cairo e não na Alemanha e outros. Recentemente um museu alemão devolveu a bíblia de Witbooi à Namíbia...




... e o padãro dos descobrimentos que os portugueses lá deixaram em 1486:


The cross, placed on Namibia's coast by Portuguese explorers in 1486, is a symbol of the country's colonial past.
Namibian Ambassador to Germany - Andreas B.D. Guibeb standing with the Cape Cross in Berlin (picture-alliance/dpa/B. Pedersen)

Portanto, o que me parece é que estas peças que são identitárias de um povo, uma cultura ou uma nação, devem ser devolvidas aos países de origem, porque lhes pertencem, em primeiro lugar e porque é lá que fazem falta, não nos museus onde estão - são só mais uma peça, por importante que seja em termos de chamariz de público. Depois, era um gesto de bom entendimento entre culturas, que tanta falta faz.


E já agora, senhor ME: mande pagar o que me devem, sff!


No comments:

Post a Comment