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February 17, 2024

Passar ao lado da questão



A questão aqui não é ter escapado a esta mulher que o filho tinha intenções criminosas, nem ela está a ser julgada enquanto mãe, mas enquanto cúmplice do crime, porque a questão é que ela sabe que o filho tem uma arma, porque foram eles, pais, que lha compraram, ela é chamada à escola porque o filho tinha desenhado uma arma, balas e um corpo ensanguentado, com a mensagem “os meus pensamentos atormentam-me” numa folha da aula de Matemática e escolhe não avisar a escola de que o filho anda armado, deixando a escola na ignorância do perigo que ele representava. Mais ainda, foi-se embora sem fazer o mínimo esforço para saber se ele tinha a arma consigo e tirá-la. Isto não é uma mera falha dos deveres parentais, isto é cumplicidade no crime. Calhou a ser a mãe dele e, de facto, é uma irresponsável, mas se fosse uma tia, uma amiga, um professor, era igual: é cúmplice pois tem o conhecimento do perigo e opta por ocultá-lo. E é por isso que é condenada e não por ser mãe dele ou cometer erros de parentalidade.


Uma má mãe no banco dos réus

Helena Tecedeiro

A 30 de novembro de 2021, Ethan Crumbley, 15 anos, abre a mochila, tira a pistola que leva lá dentro e dispara sobre os colegas do liceu de Oxford, no estado americano do Michigan. Mata quatro.

Nem as páginas do diário do rapaz, nem as relíquias macabras que guardava no quarto, nem os SMS com pedidos de ajuda parecem ter sido suficientes para alertar Jennifer e o marido, James (que ainda aguarda julgamento), para a obsessão assassina do filho. Procurados pela polícia depois da prisão de Ethan, os Crumbley fogem, mas acabam detidos num antigo armazém em Detroit onde se refugiaram, levando com eles uma prova terrível: o recibo da arma que compraram para o filho quatro dias antes do tiroteio.

Pela primeira vez, além do atirador, também os pais do adolescente foram detidos e a mãe, Jennifer, acaba de ser condenada por homicídio involuntário por ter faltado aos seus deveres parentais.

Só quem tem filhos sabe como é fácil escapar-nos que se passa algo com eles. Sobretudo no mundo de hoje, em que andamos todos a correr, um mundo de horários loucos, em que as famílias muitas vezes mal se cruzam, entre o trabalho dos pais e as atividades dos filhos. Um mundo em que a hora de jantar deixou de ser sagrada como era quando eu era miúda, em que pais e filhos já raramente se sentam juntos à frente da televisão a falar sobre o seu dia.

Num mundo em que a internet faz mais companhia a muitas crianças do que a família, os perigos espreitam de todo o lado - bullying, assédios online de toda a espécie, exposição a conteúdos que podem baralhar os seus cérebros de adolescentes, já de si, confusos com todas as mudanças por que estão a passar. Nunca, como agora, foi preciso os pais estarem atentos aos sinais de que algo errado se pode estar a passar. E a vertigem da vida moderna não é desculpa.

Mas voltando a Jennifer Crumbley. Não só esta mãe americana não notou os sinais, como parece mesmo ter decidido ignorá-los. Questionada em tribunal pela sua advogada se alguma vez pensou que o filho podia ser perigoso, Jennifer admitiu que os pais passam mais tempo a tentar proteger os filhos dos perigos do que a imaginar que eles próprios podem magoar alguém e que admitir que Ethan podia matar foi “a coisa mais dolorosa que [teve] de fazer”. Mas recusou assumir que podia ter feito algo diferente para evitar o crime.

Mas podia, concluiu o júri. Duas horas antes do tiroteio, Jennifer foi chamada à escola do filho. Ethan tinha desenhado uma arma, balas e um corpo ensanguentado, com a mensagem “os meus pensamentos atormentam-me” numa folha da aula de Matemática. Sentada no gabinete do conselheiro escolar ao lado do filho, Jennifer não disse uma palavra sobre a pistola que o marido tinha oferecido ao adolescente. A mesma que este desenhara. A mesma que uma simples busca à sua mochila teria permitido descobrir, a mesma que usaria daí a pouco para disparar sobre os colegas.

Na sala do tribunal, Jennifer culpou o marido por ter comprado e não ter guardado devidamente a arma. Entre os Crumbley agora é cada um por si. Com o filho condenado a prisão perpétua em dezembro passado, sem hipótese de recurso, e James a ser julgado durante o mês de março, Jennifer ficará a saber a pena que terá de cumprir a 9 de abril.


As novas pedagogias que deixam os alunos sem liberdade de escolha II

 


Os alunos herdeiros das pedagogias de, 'nenhum aluno fica para trás porque vamos atrasar todos até ao ritmo do que menos anda para ele não ficar triste e se sentir excluído' têm como consequência que os alunos da geração smartphone, que estão agora a chegar às universidades, revelem ser incapazes de ler um texto longo ou um livro inteiro, mesmo que não seja complexo.
Incapazes de lidar com as suas ideias, incapazes de acompanhar um raciocínio, de compreender uma situação. Incapazes de concentrar-se durante o período de tempo necessário para o fazer.
Incapazes de lidar com uma aprendizagem que não seja, 'gira', 'divertida' e uma espécie de jogo excitante. 
No entanto, os políticos que defenderam e defendem este nivelamento por muito baixo, do ensino, "para as crianças menos capazes não se sentirem excluídas" (dirigido, sobretudo, à escola dos pobrezinhos mas a apanhar todos por tabela), defendem, ao mesmo tempo, que este ensino que deixa os jovens intelectualmente deficientes, deve promover o pensamento crítico... 
O pensamento crítico é a forma de pensamento mais complexa que implica justamente a capacidade de acomodar um grande volume de conhecimentos, a capacidade de compreender ideias complexas, de discorrer o raciocínio sobre essas ideias e testá-las intelectualmente com outras ideias e conhecimentos. Muitos até defendem que as criança e adolescentes, se usarem bem o telemóvel (depois de verem muitos vídeos no TikTok e muita pornografia?), estão preparadas para decidir sobre o que querem aprender e como ser avaliadas. 
Sabemos que os telemóveis são viciantes como o álcool ou as drogas e que são tão nocivos como eles, mas defendemos que é bom incentivar o seu uso precoce e indiscriminado para desenvolver o pensamento crítico?
Se não se dão contra desta imensa contradição de defenderem, simultaneamente, a incapacitação intelectual dos jovens por via do reducionsmo à instrução por aplicações de telemóvel e a sua sofisticação intelectual, é porque talvez eles mesmos não tenham essa capacidade de espírito crítico desenvolvida e façam parte do número de pessoas que não é capaz de ler um livro complexo, mas não se privam de dar conselhos sobre o que deve ser a educação e até impor políticas.
Dada a impossibilidade de ensinar conhecimentos complexos e difíceis através da simplificação redutora dos programas e aplicações do smartphones da felicidade, os políticos decidiram eliminar os primeiros em favor dos segundos. 
Ora, não se pode, ao mesmo tempo, desenhar um ensino pouco exigente para que os alunos não sintam stress e andem sempre felizes e querer que a escola forme pessoas capazes de ultrapassar obstáculos, de lidar com o stress das dificuldades e crises e capazes de alcançar objectivos, metas que implicam esforço, trabalho, stress e crises ocasionais.
Vamos pôr os jovens a fazer meditação oriental para ficarem bem com o mundo e nunca se stressarem com tudo o que vai mal - em vez de capacitá-los para compreenderem e lutarem por um mundo diferente e melhor. 
Este tipo de pedagogias educativas é a maior traição que se faz, não apenas às crianças e jovens que, mesmo que quisessem escolher um caminho mais complexo, já não estão capacitados para o fazer, mas à nossa própria civilização ocidental, herdeira das Luzes, que deu origem a uma evolução extraordinária no conhecimento e nos valores e direitos da Humanidade, do qual beneficiamos, nomeadamente, no nosso estilo e possibilidades de vida - agora, francamente em decadência.
Como diz este o autor do texto do post anterior, O que está a acontecer com a geração actual não é que estejam simplesmente a escolher o TikTok em vez da Jane Austen: estão a ser privados da capacidade de fazer essa escolha - sem qualquer razão ou benefício real. 
O mundo da educação foi infectado por políticas de ditadura de imposição do empobrecimento intelectual por via de políticos e 'pedagogos' de pensamento dicotómico básico que entendem que devemos escolher entre educar para a felicidade ou para as exigências próprias do conhecimento e da vida - e escolheram a felicidade.

Leituras pela madrugada - As novas pedagogias que deixam os alunos sem liberdade de escolha

 


A perda de coisas que eu tomava por garantidas


Dez anos após o início da minha carreira de professor universitário, os alunos deixaram de ser capazes de ler eficazmente.

Por Adam Kotsko

Como professor universitário, há mais de 15 anos que dou aulas em pequenas faculdades de artes liberais e, nos últimos cinco anos, é como se alguém tivesse ligado um interruptor. Durante a maior parte da minha carreira, atribuí cerca de 30 páginas de leitura por aula como expetativa de base - por vezes aumentando para leituras puramente expositivas ou recuando para textos mais difíceis. (Nenhum ser humano consegue ler 30 páginas de Hegel de uma só vez, por exemplo.) 
Actualmente, os alunos sentem-se intimidados por tudo o que tenha mais de 10 páginas e parecem sair de leituras de apenas 20 páginas sem uma verdadeira compreensão do conteúdo. Mesmo os alunos inteligentes e motivados têm dificuldade em fazer mais com os textos escritos do que extrair conclusões descontextualizadas. 
Um tempo considerável da aula é gasto simplesmente para determinar o que aconteceu numa ou os passos básicos de um argumento - competências que eu costumava considerar como garantidas.
Uma vez que este desenvolvimento afecta muito diretamente a minha capacidade de fazer o meu trabalho tal como o entendo, falo muito sobre ele. 
Quando falo sobre isto com não académicos, surgem inevitavelmente certas respostas previsíveis, todas questionando a realidade da tendência que descrevo. Não sentiram todas as gerações que a geração mais nova está a ir para o inferno? Os professores não se queixaram sempre de que os educadores dos primeiros níveis não estão a equipar adequadamente os seus alunos? E não é verdade que, desde tempos imemoriais, os alunos saltam as leituras?
No entanto, a reação dos meus colegas académicos tranquiliza-me, pois não estou apenas a fazer queixinhas entre gerações. De facto, nunca conheci um professor que não partilhasse a minha experiência. Os professores também discutem a questão em publicações académicas, sob várias perspectivas. 
O que quase todos parecem concordar é que estamos a enfrentar novos obstáculos na estruturação e na realização dos nossos cursos, o que nos obriga a reduzir as expectativas face a uma preparação cada vez mais reduzida. 
Sim, sempre houve alunos que saltaram as leituras, mas estamos num novo território quando mesmo os alunos de honra altamente motivados têm dificuldade em compreender o argumento básico de um artigo de 20 páginas. 
Sim, os professores nunca se sentem satisfeitos com o facto de os professores do ensino secundário terem feito o suficiente, mas nem todas as gerações de professores tiveram de lidar com as consequências do No Child Left Behind e do Common Core. 
Por último, sim, todas as gerações pensam que a geração mais nova não está a conseguir passar de ano - excepto a atual geração de professores, que, de um modo geral, está mais empenhada no sucesso e na saúde mental dos seus alunos e é mais sensível às necessidades dos alunos do que qualquer outro grupo de educadores na história da humanidade. Não nos estamos a queixar dos nossos alunos. Estamos a queixar-nos do que lhes foi retirado.
Se perguntarmos o que é que causou esta mudança, há alguns culpados óbvios. A primeira é a mesma coisa que tirou a quase toda a gente a capacidade de se concentrar - o omnipresente smartphone
Mesmo sendo um académico de carreira que estuda o Alcorão em árabe por diversão, notei que a minha resistência à leitura diminuiu. Uma vez, numa reunião de professores, dei por mim a gabar-me de ter lido durante toda a viagem de comboio, que durou uma hora, sem olhar para o telemóvel. 
Os meus colegas concordaram que se tratava de um grande feito. 
No entanto, mesmo que raramente atinja esse nível elevado de concentração, sou capaz de o "activar" quando necessário, por exemplo, para ler um grande romance durante as férias. Isso deve-se ao facto de ter conseguido desenvolver e praticar essas capacidades de concentração prolongada e de leitura atenta antes da intervenção do smartphone
Para as crianças que foram criadas com smartphones, pelo contrário, essa base não existe. Provavelmente não é coincidência que o próprio iPhone, lançado originalmente em 2007, esteja a aproximar-se da idade universitária, o que significa que os professores estão cada vez mais a lidar com alunos que se teriam tornado viciados na dopamina do ecrã omnipresente muito antes de serem apresentados aos prazeres mais subtis da página.
A segunda explicação possível é a enorme perturbação causada pelo encerramento das escolas durante a pandemia de COVID-19. Ainda há algum debate sobre a necessidade dessas medidas, mas o que já não está em discussão é a perda de aprendizagem muito real que os alunos sofreram a todos os níveis. O impacto continuará inevitavelmente a fazer-se sentir durante a próxima década ou mais, até que a última coorte afetada pela "transição para a Internet" em massa acabe finalmente a sua formação. 
No entanto, duvido que os encerramentos pandémicos tenham sido, por si só, o factor decisivo. Não só o declínio acentuado da capacidade de leitura começou antes da pandemia, como os alunos que estou a observar já estariam no ensino secundário durante o encerramento das escolas. Por conseguinte, estariam mais bem equipados para tirar partido do formato online e, o que é mais importante, as suas competências básicas de leitura já teriam sido estabelecidas.
Menos discutidas do que estas tendências culturais mais amplas, sobre as quais os educadores têm pouco controlo. Falo das grandes mudanças na pedagogia da leitura que ocorreram nas últimas décadas - algumas motivadas pela exigência cada vez maior de "ensinar para o teste" e outras por modas que saem das escolas de educação. 
Nesta última categoria está o amplamente discutido declínio da educação fónica a favor da abordagem de "literacia equilibrada" defendida pela especialista em educação Lucy Calkins (que, mais recentemente, passou a aceitar a necessidade de mais instrução fónica). 
Comecei a ver os resultados desta mudança imprudente há vários anos, quando os alunos deixaram abruptamente de tentar pronunciar palavras desconhecidas e, em vez disso, fizeram uma pausa até reconhecerem a palavra inteira como uma unidade. (Numa aula recente, um aluno inteligente não soube pronunciar a palavra circunstâncias quando lia um texto em voz alta). 
O resultado desta literacia baseada em vibrações é que os alunos nunca atingem uma verdadeira fluência na leitura. Mesmo para além do impacto dos smartphones, a sua experiência de leitura é constantemente interrompida pela sua incapacidade, intencionalmente cultivada, de processar palavras desconhecidas.
Apesar de todas as falhas do método de literacia equilibrada, presumivelmente foi implementado por pessoas que pensavam que poderia ajudar. 
É difícil ver uma motivação semelhante na tendência crescente para expôr os alunos apenas ao tipo de frases curtas que podem ser incluídas num teste padronizado. 
Devido, em parte, às mudanças impulsionadas pelas infames normas do Common Core, os professores têm agora de lutar para atribuir aos seus alunos leituras mais longas, e muito menos livros inteiros, porque essas actividades não contribuirão diretamente para que os alunos obtenham resultados mais elevados nos testes, dos quais depende o grau de financiamento das escolas. 
A ênfase nos testes padronizados sempre foi, na melhor das hipóteses, uma distracção, mas chegámos a um ponto em que está a canibalizar activamente a experiência educativa dos alunos - um resultado que ninguém pretendia ou planeou e para o qual não há justificação possível.
Nesta altura, não podemos voltar atrás no tempo e fazer a pandemia de forma diferente, nem existe um caminho realista para voltar a pôr o génio dos smartphones na garrafa. (Embora deva referir que nós, enquanto sociedade, enquanto permitimos livremente o smartphone, tentamos manter outros produtos viciantes longe das mãos das crianças). 
Mas tenho de pensar que podemos, no mínimo, deixar de impedir ativamente que os jovens desenvolvam a capacidade de acompanhar narrativas e argumentos extensos na sala de aula. Independentemente da sua profissão ou do seu nível de educação final, eles vão precisar dessas competências. 
O mundo é um lugar complicado. As pessoas - as suas histórias e identidades, as suas instituições e processos de trabalho, os seus medos e desejos - são simplesmente demasiado complexas para serem captadas numa ficha de trabalho com um parágrafo e algumas perguntas de compreensão de leitura. A escrita em prosa em grande escala é o melhor meio de que dispomos para captar essa complexidade, e o sistema educativo não deve ter como objetivo impedir os alunos de aprenderem a lidar eficazmente com ela.
Não se trata de uma questão de snobismo, mas de justiça básica. Reconheço que nem toda a gente centra a sua vida nos livros tanto quanto um professor de humanidades. Acho que perdem com isso mas são adultos e podem escolher como passar o seu tempo. O que está a acontecer com a geração atual não é que estejam simplesmente a escolher o TikTok em vez da Jane Austen. Estão a ser privados da capacidade de escolher - sem qualquer razão ou benefício real. Podemos e devemos deixar de cometer este crime contra os nossos jovens.

February 14, 2024

"Estamos em campanha, temos temas mais prementes que museus e política cultural"? Não, temos temas igualmente prementes

 


Estamos em campanha eleitoral e temos temas mais prementes que museus e política cultural. Evidente: urgências encerradas nos hospitais, miúdos nas escolas com tombos nos resultados internacionais, faltas de professores, grávidas que podem fazer centenas de quilómetros até encontrarem um sítio para o parto, falta de médicos de família, polícias em revolta, prestações do empréstimo à habitação nos píncaros – tudo isto é mais urgente que museus. No entanto, lá por não ser urgente, a política para a cultura continua a ser estrutural.


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O desenvolvimento de um país -económico e social- está ligado ao seu desenvolvimento cultural. Quando se desligam estas duas dimensões temos países escravos de outros a funcionar como seus meros fornecedores de bens materiais e/ou países com muito dinheiro -por exemplo, os países do petróleo- mas sem desenvolvimento económico e social, onde o acesso a bens é privilégio de uma elite que tem dinheiro ou poder político e a vida cívica não existe. Os países onde mais se apoia a cultura são também os países onde mais se apoia uma educação de qualidade.

Em Portugal a maioria dos políticos vê a cultura como trívia, uma espécie de acessório ou de espectáculo de entretenimento e fuga ao dia a dia, mas a cultura (e a educação que lhe está indissociavelmente ligada) é para o ser humano, o que a água é para o peixe, como dizia alguém. E se o peixe não se dá conta que a qualidade da água em que respira, em que se alimenta e nada influencia o florescimento e possibilidades da sua vida (está imerso nela desde sempre), também o ser humano, no geral, não se dá conta da qualidade do contexto em que cresce e de como ele influencia toda a sua vida, desde a sua visão do mundo que forma as suas expectativas até à sua capacidade de evoluir e ter uma acção positiva nele - económica, social, política e filosófica.

Ao ler o programa para a educação do PSD fui dar com com uma referência a um estudo sobre o impacto de um bom professor na educação escolar de um aluno - .edulog.pt/Impacto_Professor_Sum.pdf.
Neste estudo conclui-se que a exposição de um aluno a um bom professor (a um professor eficaz, o que se mede nos bons resultados dos alunos - chamam-lhe impacto VAP), mesmo que apenas no ano de exame, é de molde a fazer com que melhore as suas notas até 70%, mas também as suas possibilidades e condições de vida futura, em porcentagem idêntica. Isto devia ser um alerta para não se deixar cair a profissão nas mãos de pessoas sem formação. A não ser que queiramos Portugal ao nível do ex-ministro de Sócrates que ia a países estrangeiros gabar-se de Portugal ser um país de fraca educação e cultura e, por isso, muito vocacionado para a mão de obra barata.

Quando vemos programas políticos que querem reduzir a educação à aprendizagem da leitura e de fazer contas ou amansar alunos em disciplinas chamadas, Cidadania, impostas por ministros que são um modelo de falta de respeito pelos direitos cívicos alheios, percebemos que a questão que esta jornalista aqui traz, a do MNAC ter as obras encaixotadas ao desprezo, não é secundária, mas premente. Tão premente como as outras que cita. Como sabemos, Camões, o nosso maior vulto literário, também foi encaixotado - que fez o ME, também da cultura? Nada, nadinha.

February 12, 2024

Uma nova investigação mostra o efeito dos algoritmos no aumento dos discursos de ódio dos jovens (e não só) e sugere estratégias




Dado que, nem os jovens, nem os adultos, se dão conta do perigo das redes sociais, uma das recomendações dos investigadores é que se faça uma espécie de «Roda dos Alimentos" para uma "dieta saudável" na utilização de redes sociais: os bons alimentos, os maus alimentos, o tempo e o modo de exposição a que tipo de sites, etc., para uso dos jovens e guia de parentalidade. Muito interessante, porque torna os perigos visíveis e objectivos e aponta rumos e metas.
Claro que uma das maneiras de evitar o mal das redes sociais é expor as crianças a outros estímulos mais saudáveis (desde a leitura à vida ao ar livre, tudo o que desenvolva os interesses e o pensamento) e retardar o momento de lhes dar smartphones.

Porque é que os algoritmos das redes sociais estão por detrás do recente aumento da misoginia


Uma nova investigação confirma que estes códigos ocultos são muito mais insidiosos do que pensamos.

Vejo constantemente pessoas - incluindo políticos - queixarem-se de que o TikTok é apenas uma aplicação "cheia de raparigas adolescentes meio nuas a dançar". Bem, se é isso que vêem, há uma razão para isso e não é por a maior parte do conteúdo ser assim.

Os algoritmos das redes sociais funcionam como bibliotecários, classificando e ligando os utilizadores às suas preferências. É por isso que o meu feed é maioritariamente composto por gatos, comida, recomendações de livros, factos científicos e pessoas que discutem temas que me interessam. No entanto, ao contrário dos bibliotecários, os algoritmos não se limitam às suas preferências.

Com o tempo, começam a mostrar-lhe coisas pelas quais não manifestou interesse anteriormente. E se parecer que se interessa por elas, mesmo que de uma forma negativa, passam a ser adicionadas às suas preferências e cada vez lhe mostram mais conteúdos semelhantes.

É também assim que as pessoas - especialmente, mas não exclusivamente, os jovens - são aliciadas e radicalizadas online. Incluindo rapazes jovens, muitos dos quais foram recentemente vítimas da onda de misoginia nas redes sociais.

Um estudo recente realizado em parceria entre a UCL, a Universidade de Kent e a Association of School and College Leaders (ASCL) investigou o papel dos algoritmos das redes sociais na radicalização online, especificamente no TikTok, que continua a ser mais popular entre as gerações mais jovens. 
- Katie Jgln in  medium.com

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A investigação revelou, num estudo de modelação algorítmica, um aumento de quatro vezes do nível de conteúdo misógino na página For You das contas TikTok em apenas cinco dias na plataforma.

A investigadora principal, Dra. Kaitlyn Regehr (UCL Information Studies), afirmou: "Os processos algorítmicos no TikTok e outros sites de redes sociais têm como alvo as vulnerabilidades das pessoas - como a solidão ou sentimentos de ausência de controlo - e «gamificam» conteúdos nocivos. [apresentam-nos como um jogo]. Quando os jovens se alimentam, em micro-doses, de temas como a auto-mutilação ou o extremismo, parece-lhes um jogo, um entretenimento.

"Os pontos de vista e os estereótipos nocivos estão a normalizar-se entre os jovens. O consumo online está a ter impacto nos comportamentos offline dos jovens, à medida que vemos estas ideologias saírem dos ecrãs e a entrarem nos pátios das escolas.

"Além disso, os adultos muitas vezes não sabem como funcionam os processos algorítmicos nocivos, ou mesmo como podem alimentar os seus próprios vícios nas redes sociais, o que dificulta a parentalidade em torno destas questões."

Os investigadores começaram o estudo por entrevistar jovens que se envolvem e produzem conteúdos radicais online. Este trabalho serviu de base ao estudo algorítmico para a criação de arquétipos, que representam tipologias de rapazes adolescentes que podem ser vulneráveis à radicalização através de conteúdos online

Os investigadores criaram contas no TikTok para cada arquétipo, com interesses de conteúdo distintos típicos desses arquétipos (por exemplo, procurar conteúdo sobre masculinidade ou abordar a solidão) e utilizaram essas contas para ver vídeos que o TikTok sugeriu na sua página For You, durante um período de sete dias.

O conteúdo inicial sugerido estava de acordo com os interesses declarados de cada arquétipo; por exemplo, com material que explorava temas de solidão ou de auto-aperfeiçoamento, mas depois foi-se desviando cada vez mais para a raiva e culpa dirigidas às mulheres. Ao fim de cinco dias, o algoritmo do TikTok apresentava quatro vezes mais vídeos com conteúdo misógino, como a objectificação, o assédio sexual ou o descrédito das mulheres (passando de 13% dos vídeos recomendados para 56%).

A equipa de investigação conduziu mesas redondas e entrevistas com dirigentes escolares, que atestaram que os estereótipos misóginos estão a normalizar-se também na forma como os jovens interagem pessoalmente.

Os investigadores apresentaram as seguintes recomendações:

1. Responsabilizar as empresas de redes sociais e pressioná-las para que abordem os danos causados pelos seus algoritmos e dêem prioridade ao bem-estar dos jovens em detrimento do lucro.

2. Implementar uma educação para uma "dieta digital saudável", que considere os diferentes tipos de tempo de ecrã e de conteúdos digitais com que os jovens se envolvem, à semelhança dos diferentes grupos de alimentos, tendo em conta a quantidade que é consumida, a forma como pode tornar-se "ultra-processada" devido aos algoritmos e os potenciais impactos na saúde mental e física.

3. Tutoria entre pares, capacitando os alunos mais velhos para trabalharem com os mais novos e ajudando a envolver os rapazes em debates sobre misoginia.

4. Promover uma maior consciencialização dos processos algorítmicos entre os pais e a comunidade em geral.

Os investigadores afirmam que a sua investigação pode aplicar-se de forma semelhante a outras plataformas de redes sociais, apoiada pela investigação de outros grupos sobre o Instagram e o YouTube, por exemplo, enquanto os algoritmos das redes sociais podem também favorecer outros tipos de conteúdos nocivos, como material de auto-mutilação ou ideologias extremas. 

Investigações anteriores realizadas pela Dr.ª Regehr e colegas da UCL revelaram que a violência sexual online é experimentada habitualmente por mulheres e raparigas, tendo aumentado ainda mais nos últimos anos. Este trabalho contribuiu para a nova legislação sobre flashes digitais em 2022.
As conclusões da UCL mostram que os algoritmos - sobre os quais a maioria de nós pouco sabe - têm um efeito de bola de neve em que fornecem conteúdos cada vez mais extremos sob a forma de mero entretenimento. Isto é profundamente preocupante em geral, mas particularmente no que diz respeito à amplificação de mensagens em torno da masculinidade tóxica e ao seu impacto nos jovens que precisam de poder crescer e desenvolver a sua compreensão do mundo sem serem influenciados por material tão terrível.

Congratulamo-nos com o apelo para envolver os jovens, em particular os rapazes, na conversa para combater este problema, juntamente com os seus pares e famílias. Apelamos às plataformas de redes sociais em geral, mas ao TikTok em particular, para que revejam urgentemente os seus algoritmos e reforcem as salvaguardas para evitar este tipo de conteúdo, E apelamos ao governo e à Ofcom para que considerem as implicações desta questão sob os auspícios da nova Lei da Segurança Online. É tempo de agir e não de continuar a falar de acção.

   - Geoff Barton, Secretário-Geral da Associação de Directores de Escolas e Colégios 



February 08, 2024

Porque é que, nem mesmo a mandar passar todos, consegue?



A taxa de abandono precoce da educação e formação em Portugal aumentou no ano passado para 8%, 


Passar ao lado das questões

 


Um estudo académico (...) demonstra que os jovens procuram as redes sociais para fugir à depressão ou, no mínimo, para aliviar os sentimentos de culpa, ansiedade e frustração. (...) o que está a dar é ser “delulu” (delirante). (...) Ou seja, o autoengano é a solução... para a felicidade. (...) O autoengano é servido em doses cavalares a quem está sequioso de mudança.

No novo mundo digital, a felicidade é muitas vezes desligada da nossa realidade concreta. Como explica a jovem Alex Rae Smith, que se autointitula no TikTok como “mentora”, o que as pessoas devem fazer é recriar mentalmente a vida. “O meu desafio para hoje é que apenas pensem na realidade tal como a desejam. Se fizerem isso durante 24 horas, vão ficar espantados com a magia da experiência”

A viciação psicológica nas redes sociais e nos conceitos de felicidade aí veiculados não é mais nem menos grave do que a adição do álcool ou do jogo. Existe e deve ser contrariada. Como? Debatendo o problema e apostando na literacia mediática. Devemos, portanto, descartar a censura e aprofundar a pedagogia.

Pedro Araújo in www.jn
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Em primeiro lugar penso mesmo que as crianças e adolescentes até uma certa idade, deviam ser impedidos de aceder às redes sociais e mesmo de usar smartphones - da mesma maneira que não se expõe crianças e adolescentes ao vício do álcool ou do jogo, também não se devia expô-los ao vício das redes sociais. 

As aplicações das redes sociais são cada vez mais viciantes. Fazem os algoritmos mesmo para que as pessoas se viciem nelas e, abaixo de uma certa idade, as crianças e adolescentes são completamente vulneráveis aos seus efeitos negativos. Aprender a usar um computador sim, smartphones só a partir de uma certa idade e com alguma supervisão.

Em segundo lugar, é importante perceber porque é que os adolescentes (e não só) buscam as redes sociais como escape. Talvez porque sentem e sabem que não têm controlo sobre a sua própria realidade. Não é inédito. Desde sempre as pessoas procuraram escapes para as suas frustrações, ansiedades e medos. A religião é o exemplo mais óbvio, mas também a arte, a violência, a leitura. A religião, por exemplo, ensina que uma maneira de controlar o seu próprio destino é rezar.

No dias que correm a organização económica, social e política arrasa completamente as expectativas dos jovens: ter um trabalho não-escravo, acesso a uma casa para morar, a meios de construir uma vida, a bens culturais e de lazer é uma miragem e o resultado é os jovens sentirem que não têm nenhum controlo sobre o seu destino (que lhes aparece catastrófico) façam o que fizerem.

Numa parte importante, a linguagem dos adultos e dos poderes políticos em quem devíamos confiar para servir de timoneiros na resolução dos problemas é negativa e anti-pedagógica em extremo ou de um falso optimismo que raia o absurdo e ainda assusta mais.

Por exemplo, hoje mesmo, Guterres disse que o mundo entrou na "Era do Caos". Os adolescentes e os jovens ouvem, como nós todos, constantemente, este tipo de linguagem por parte das pessoas que deviam ter propostas de soluções porque foram para os cargos para solucionar, têm os meios e estão em lugares de virar o leme. Porém, passam o tempo a gritar a sua frustração como crianças e adolescentes perdidos. 

Compreendo a estratégia dos adolescentes que este articulista chama "autoengano" mas que não é um engano, é uma estratégia de terapia mental. Quando fiquei doente e todos os relatórios médicos descreviam uma realidade horrível em todos os aspectos e os médicos me falavam em batalhas e em vencer a guerra [do cancro, palavra que nunca dizem] comecei a pensar que, se isto era uma guerra, estava tramada porque tinha andado durante muito anos a enfraquecer os soldados do meu exército (o sistema imunitário) com o vício de fumar. A sensação de estar nas mãos de outras pessoas e não ter nenhum controlo sobre a minha pessoa e o meu destino, era muito assustadora. 

Então, arranjei para mim mesma uma outra metáfora para a doença que não envolvia guerra nem soldados e desenvolvi uma estratégia de entrar num certo estado mental a que chamei de "excesso de felicidade". Era um estado mental me resguardava do stress, da ansiedade e do medo da doença, das suas ramificações, dos seus procedimentos e das suas consequências. Durante muitos e muitos meses, todos os dias pessoas desconhecidas me enfiavam agulhas, despiam, enfiavam tubos, palpavam, viravam, enfiavam-me em máquinas claustrofóbicas, injectavam-me medicamentos horríveis... desenvolvi uma técnica de projectar a mente para um cenário imaginário de calma e de felicidade para fugir a estas experiências físicas e psicológicas negativas, stressantes e deprimentes e conseguir manter o ânimo. 
 
Portanto, compreendo muito bem que os jovens, que não têm estratégias de resistência, escapem a uma realidade que lhes dizem ser um cancro terminal (o clima, a falta de emprego ou o emprego-escravo, os salários de miséria, a impossibilidade de ter uma casa, constituir família, a escassez de bens, etc.) que sabem que têm de combater, mas para o qual sabem não ter exército.

Porque é que os jovens activistas do clima só têm acções destrutivas e negativas? Porque lhes dizem que a realidade é uma Era de Caos, um beco sem saída, que já não é possível construir, que o futuro está condenado.

Quem é que hoje em dia não foge a ver as notícias da realidade: um poço sem fundo, um beco sem saída, um desfiar de casos de incompetência, impotência, corrupção e decadência?

Na realidade não estamos no caos, estamos numa crise, que é uma situação muito diferente. Para uma crise há soluções e se as soluções forem acertadas a crise transforma-se num momento de crescimento e evolução. 

E era assim que os problemas deviam ser entendidos e enfrentados pelos poderes instituídos: não com palavras de desespero, presságios de morte e obstáculos intransponíveis que deixam as pessoas paralisadas no medo, nem com palavras de falso optimismo enganador.

A linguagem médica, fora esse hábito que vejo em todo o lado -médicos e literatura- de falar das doenças como guerras a vencer, é em geral muito positiva para dar aos doentes a noção de que as situações não são desesperadas. Que existem métodos, tratamentos, estratégias e que se umas não resultarem, experimenta-se outras. Nunca se diz a taxa de mortalidade, fala-se na taxa de sobrevivência; não se fala em tumores, mas em lesões; aponta-se sempre em primeiro lugar o que está a resultar.

Há muitos anos que faço isso com os meus alunos. Nunca lhes meto medo com os exames, as notas, o futuro, etc. Digo-lhes como podem conseguir e o trabalho que isso implica, mas que é perfeitamente possível e mais fácil do que parece. O que é difícil é a disciplina do trabalho e do estudo. Mas também para isso há estratégias e metodologias. 

Portanto, se os adolescentes e os jovens precisam de fugir da realidade é porque os adultos em geral e os líderes políticos são medíocres e não fazem o seu trabalho e depois disfarçam dizendo que era impossível, que é o caos, que é catastrófico, que não há tempo, que não há maneira, que a culpa é dos outros. Os adolescentes e os jovens vêem-se como vítimas de uma realidade para além do seu controlo e uns escapam -lhe nas redes sociais, a maioria na auto-indulgência.

A literária mediática é útil, claro, mas não resolve este problema de se ter criado uma sociedade de impotência, por um lado, e de indulgência, por outro. 

February 01, 2024

Óbvio para todos menos para o ME e seus sicofantas



Para que serve uma escola que nem a integridade física dos seus alunos protege?



Santana Castilho

A escola pública vive numa espécie de parque temático de desconcerto, desagregação e declínio. Não lhe bastava já ter de remar penosamente contra a apologia do prazer imediato, do consumo supérfluo, da extravagância e do efémero, que caracterizam uma sociedade moralmente demissionária e ensandecida. 

À complexidade das razões económicas, sociais, morais e outras, que estão na origem de um modelo de convivência violenta e indisciplinada na comunidade escolar, juntou-se agora uma crescente e inqualificável incapacidade das respectivas autoridades para reagirem à brutalidade criminosa que tomou de assalto o último reduto de pudor comportamental entre alunos.

O que aconteceu só pode provocar náuseas a qualquer humano minimamente civilizado: em Vimioso, nas instalações da escola que frequenta, uma criança de 11 anos foi sodomizada com o cabo de uma vassoura. Como se a barbárie fosse ainda pouca, o presidente da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Vimioso, António Santos, revelou à CNN Portugal que um dos agressores é irmão da vítima.

Do mesmo passo, José Manuel Alves Ventura, que denunciou o caso e é presidente da Junta de Freguesia de Vimioso, referiu-se a um ambiente “de terror e de encobrimento” e a um clima “de medo” entre os mais jovens.

Os factos, de que foram abjectos protagonistas/agressores oito alunos com idades entre os 13 e os 16 anos, ocorreram a 19 de Janeiro. Mas só chegaram às mãos da Polícia Judiciária a 23, tendo a vítima sido encaminhada para o Instituto de Medicina Legal, no Porto, para realização de perícias, no dia seguinte.

“Este grupo de alunos mais velhos sente que é impune e ninguém lhes põe travão. Não obedecem aos pais, nem aos professores”, denunciou ainda José Ventura.

Estas tristes circunstâncias justificam, infelizmente, que retome ideias anteriormente abordadas nesta coluna, uma vez que, por vias e com motivações diversas (algumas perversas), continuam a impor-nos um conceito pedagógico que associa a defesa da disciplina a pulsões autoritárias de quem não consegue afirmar-se por outros meios (supostamente paradisíacos). 

Sejamos claros: se uma vertente nuclear da educação for (e é) tornar o ser moralmente responsável pelos seus actos, perante a sua consciência e perante os outros, resulta evidente que não o podemos deixar entregue à sua natureza instintiva. Temos, isso sim, de o orientar num processo que o leve a admitir que a sua liberdade tem limites e que a entrada na sociedade supõe a aceitação de um conjunto de normas e de regras (disciplina) a que terá de obedecer. Assim sendo, o acto de educar supõe uma vertente disciplinar, que não dispensa a coerção necessária para substituir instintos (animais) por virtudes (humanas).

Não entender isto tornou-se politicamente correcto, mas denunciar isto vale o risco de ser queimado na fogueira inquisitória dos “pedabobos”. A autonomia que sempre tenho defendido para as escolas não serve se for entregue a (ir)responsáveis que escondem que a indisciplina é o maior problema das instituições que dirigem.

Dir-se-ia que a indisciplina se normalizou, assumindo-se como coisa inevitável. Dir-se-ia que a obsessão pelos cuidados a prestar às crianças e aos adolescentes obliterou a obrigação de os responsabilizar. 

É tempo de os responsáveis encararem a dureza da realidade que negam: a manifestação da crueldade de muitos pré-adolescentes e adolescentes, vinda da incompetência ou da demissão parental, não pode ser aceite na escola com os panos quentes da pedagogia romântica. Muito menos com as artes demagogicamente inclusivas, branqueadoras e flexíveis, dos tempos que correm.

Erram os que identificam disciplina com repressão, sem lhe reconhecer a capacidade transformadora de um ser bruto num ser social, ética e culturalmente válido.


January 30, 2024

Tudo o que está mal nas escolas



Um aluno de 11 anos é violado por oito colegas, alguns com 16 anos. Uma funcionária assiste como cúmplice. Os alunos envolvidos na sodomização levam três dias de suspensão (o que será preciso para que levem o máximo da pena de suspensão? Matar?). Todos -atacantes e funcionária- continuam alegremente na escola, com a vítima desta brutalidade a ter que levar com a sua presença, o que é uma segunda violação. Será uma política de inclusão de delinquentes? Em que planeta isto é normal? No planeta deste ME para quem não assistir a aulas de cidadania é que é grave...

Noutra escola um rapaz de 15 anos é vítima de tentativa de violação por quatro colegas, um dos quais com dezanove anos. A notícia chama a este crime, "um episódio" e não diz se tiveram um dia de suspensão ou se continuam todos alegremente na mesma escola.

Os ignorantes que legislam abstractamente imposições às escolas, não levando em conta que há uma dramática falta de pessoal, logo de segurança, ao ponto de se contratarem funcionários que nunca poderiam entrar numa escola, quanto mais tomar conta de alunos; que as escolas são locais onde há alunos de idades que vão dos 11 ou 12 anos até aos 20 ou mais, sendo os primeiros muito vulneráveis na presença dos segundos; não levando em conta que adolescentes indefesos e vulneráveis frequentam os mesmo espaços onde há delinquentes juvenis muito mais velhos, podiam pôr os olhos nestas notícias e imaginar que fossem seus filhos ou netos, antes de vomitarem leis que servem os seus princípios ideológicos mas não os alunos.

Esta notícia resume tudo o que está mal na educação: falsas políticas e conceitos de inclusão; desresponsabilização dos alunos com comportamentos de indisciplina; desresponsabilização dos pais destes alunos; contratação de pessoal sem critérios de qualidade - como se trabalhar numa escola ou numa fábrica de parafusos exigisse o mesmo perfil; falta de segurança; direcções cobardes e incompetentes; tutela incompetente e desinteressada dos problemas reais das escolas; deputados servos ideológicos, ignorantes encartados.


Aluno de 11 anos sodomizado por oito colegas em escola de Vimioso, Bragança


Episódio de sodomização terá ocorrido no interior do estabelecimento de ensino, “com recurso a uma vassoura” e na presença de uma funcionária, que “nada fez” para travar os supostos agressores.

Numa exposição enviada à agência Lusa, a Junta de Freguesia de Vimioso, presidida por José Manuel Alves Ventura, denuncia "um clima de terror e de encobrimento" que, alegadamente, se vive no Agrupamento de Escolas de Vimioso, relatando vários casos de violência entre alunos, entre alunos e funcionários, e dando conta de que, na sexta-feira 19 de Janeiro, ocorreu o episódio "hediondo da sodomização".

Segundo estas fontes, policiais e locais, dois dos agressores têm 16 anos — já respondem criminalmente — e os restantes entre 13 e 15 anos, acrescentando que, passada uma semana, tanto os alegados agressores como a vítima continuam a frequentar o mesmo estabelecimento de ensino.

Segundo caso em poucos meses

Recorde-se que em Dezembro último, o Jornal de Notícias (JN) noticiava uma alegada tentativa de violação de um rapaz de 15 anos, por outros quatro jovens, no interior de uma escola profissional de Vila Nova de Famalicão. De acordo com o diário, a Polícia Judiciária está a investigar o episódio, que terá acontecido no início de Novembro.

À data de publicação da notícia, o inquérito, aberto por denúncia do progenitor da vítima que foi feita à escola, ainda não estava concluído. A vítima referia a tentativa de violação por quatro colegas, dois com 19 e 16 anos e outros dois com 15. Segundo o relato do JN, o rapaz afirmava que estes o apanharam junto a uma oficina de mecânica do estabelecimento de ensino. Depois de ser agarrado, um dos agressores tentou sodomizá-lo com o cabo de uma vassoura, onde tinha sido posto um preservativo.

January 29, 2024

Absentismo na educação: mais de 40% de professores nunca faltam e 50% faltam 1 dia ou 2 por ano



... num máximo de 10, o que é bom, tendo em conta os milhares de deslocados que vivem a centenas de quilómetros da família. Quem falta muito são os doentes com doenças prolongadas - cancros e doenças semelhantes, incapacitantes: 8%. O que faz sentido, dada a idade avançada dos professores. Em todos os níveis de ensino a média de idade são os 50 anos, grosso modo. Também se nota que à medida que se avança para a faixa dos 60 anos há mais doenças prolongadas. O que também bate certo. É a vida. Portanto, os professores, tirando aqueles que têm doenças prolongadas que obrigam a tratamentos incapacitantes, faltam pouco, o que é notável, tendo em conta as condições de trabalho - sobretudo os milhares de deslocados. O problema é não haver professores para substituir esses doentes.


Faltas dos professores são muitas, mas só 10% registam um absentismo de longa duração



Todos os dias “faltam em média 11 mil professores” nas escolas. Sistema é pouco “célere” nas substituições. Primeiro estudo com dados sobre o absentismo docente é apresentado nesta segunda-feira.

Clara Viana29 de Janeiro de 2024


Parecem versões rivais da mesma realidade. O primeiro estudo que aborda a assiduidade docente, coordenado pela investigadora Isabel Flores e com informação extraída das bases de dados “alimentadas pelas escolas”, contém duas informações que chocam pela dimensão: “Todos os dias faltam (em média) 11.000 professores” e “o número de dias que os professores faltam é muito elevado, chegando a perto de dois milhões de dias de faltas por ano”.

São dados que constam do estudo Professores sob a lupa — A realidade demográfica e laboral dos professores do ensino público em Portugal 2016/17-2020/21, que é lançado nesta segunda-feira pelo Edulog, um think tank da Fundação Belmiro de Azevedo direccionado para a área de Educação. Em análise está o universo dos docentes do ensino não superior público (do pré-escolar ao secundário).

Mas há também esta informação: cerca de 30% a 40% dos professores “nunca faltam” e outros 50% fazem-no alguns dias (menos de dez por ano). Será esta uma versão alternativa da realidade descrita atrás? Na análise coordenada pela investigadora Isabel Flores, estes três destaques acabam por se conjugar para dar conta da situação que se vive nas escolas públicas portuguesas no que às faltas dos professores diz respeito. E que se poderá também resumir assim: “10% dos professores são responsáveis por 80% dos dias de falta.”

Dez por cento do corpo docente corresponde a cerca de 12 mil professores. Este é o número de docentes “que faltam 30 dias ou mais por ano e que o fazem, quase na totalidade, por doença continuada”, frisa Isabel Flores, que é também directora executiva do Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa​. A maioria das baixas de longa duração prolonga-se, em média, por 120 dias. Os alunos têm 180 dias de aulas. É um problema? É, sobretudo, porque nem sempre se consegue substituir os professores de baixa médica e porque o modelo em vigor é pouco “célere”.

Ou, dito de outro modo, “da análise do padrão de absentismo torna-se claro que o principal motivo para que existam alunos sem aulas prende-se com a dificuldade em substituir professores que estão ausentes por faltas de longa ou curta duração”, lê-se no estudo. E a situação tem vindo a agravar-se.


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Antecipar substituições

Só por conta das baixas de curta duração (até 10 dias), “estima-se que todos os dias existem 5000 turmas em que pelo menos um professor está em falta sem ter quem o substitua”. Estas baixas abrangem cerca de 50% dos docentes.

Mas a dificuldade maior em substituir professores, aponta-se neste estudo, “assenta maioritariamente no grupo que falta mais de 30 dias – 70% dos quais por doença continuada”. Isso leva os autores (em que se incluem, além de Flores, Cláudia Vajão, Rute Perdigão e Vanda Lourenço) a defender, que, “perante esta realidade, torna-se claro que as políticas se devem direccionar para melhorar o processo de substituição através da capacidade de antecipar”.

O ministro da Educação, João Costa, chegou a garantir que o Ministério da Educação pretende actuar sobre esta matéria, mas quer primeiro perceber quais são os padrões, tendo em conta que “o absentismo tem variações ao longo do ano lectivo”, com períodos mais agudos e outros mais calmos.

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Apesar de ter mandado constituir 7500 juntas médicas para analisar declarações de doenças e baixas médicas de professores (só cerca de 400 foram concluídas), João Costa admitiu que os níveis de absentismo entre os docentes “são semelhantes aos níveis sentidos na restante função pública” e que o maior problema acaba por ser os impactos imediatos da falta de um professor. “Se um professor fica doente, um aluno fica sem aulas, enquanto, numa repartição, o trabalho se acumula para outro dia. Os problemas são diferentes e fazem-se sentir de forma diferente”, disse em Maio de 2022.

O estudo publicado pelo Edulog abrange os anos lectivos de 2016/17 a 2020/21, sendo que este último é considerado um ano “atípico” devida à pandemia de covid-19. Só um exemplo: o número de dias de faltas disparou de perto de 1,9 milhões, em 2019/20, para mais de 2,3 milhões. De qualquer modo, sobressai desta análise “um padrão muito persistente” que é o seguinte: “O sistema educativo deve preparar-se todos os anos para substituir 12% dos seus docentes por razões de doença, sabendo que essas substituições têm, maioritariamente, uma duração de 120 a 240 dias.”

Tal também significa que a doença é a principal razão na base das faltas dos professores. Quase todos os outros motivos são residuais, a começar pelas licenças de parentalidade, o que reflecte um dos grandes problemas com que se defrontam as escolas: o envelhecimento do corpo docente, cuja idade média já ultrapassa os 51 anos. E que pode também ser expresso assim: em 2020/21, os professores com 60 anos ou mais representavam 19% do corpo docente, quando cinco anos antes eram 9%.

Para além das faltas por doença continuada ou pontual, são contabilizadas as registadas por apoio à família, cidadania (participação em greves e manifestações), férias (dias gozados em período de aulas que o docente pode colocar, com um limite sete dias/ano) e outros (junção das licenças de parentalidade e outras licenças e faltas por formação profissional).

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As faltas de longa duração “crescem gradualmente a partir dos 60 anos, e acima dos 64 ultrapassa os 20%”. “Ou seja, um em cada cinco professores com mais de 64 anos falta mais de 30 dias, o que é uma percentagem muito superior à média”, precisa Isabel Flores. E adianta em contraponto este dado: “Até aos 55 anos a percentagem de professores nestas situações fica abaixo dos 10%.”

O estudo frisa ainda que, “se o professor faltou mais de 30 dias no ano anterior, tem uma possibilidade sete vezes superior aos restantes colegas de continuar a faltar, com o mesmo padrão de faltas”.
12%"O sistema educativo deve preparar-se todos os anos para substituir 12% dos seus docentes por razões de doença, sabendo que essas substituições têm, maioritariamente, uma duração de 120 a 240 dias”, lê-se no estudo

Refere Isabel Flores na entrevista que deu ao PÚBLICO a propósito do estudo que é hoje apresentado e que pode ler aqui: “É evidente que se uma pessoa teve uma doença continuada no passado, a probabilidade é voltar a ter necessidade de tratamentos e episódios de doença que a impeçam de estar na linha da frente.”

Sem esta disrupção, aponta a investigadora, “para quem não tem por hábito faltar, a probabilidade é manter esse comportamento”. A análise por categorias de faltas “tende a estar ligada de um ano para o outro, sendo expectável que quem faltou entre um e dez dias continue a fazê-lo. Já os que nunca faltam num ano podem passar a ter faltas moderadas no ano seguinte, sendo bastante improvável que passem a engrossar o grupo dos professores com maior número de faltas”.


O que se pode saber sobre a assiduidade do corpo docente?


Quer saber o número de faltas por agrupamento? As justificações para estas faltas? Ou a idade média dos professores que dão aulas nas várias unidades orgânicas do país? A base de dados disponibilizada esta segunda-feira pelo Edulog permite responder a estas questões.

Fica-se a saber, por exemplo, que o Agrupamento de Escolas Garcia da Orta, no Porto, foi o que registou maior número de faltas dadas por professores em 2020/21: cerca de 12.274, das quais 71% provocadas por doença continuada. A idade média dos professores do quadro, que são a maioria ronda os 56,1 anos, bem acima da média nacional (51,2).

As 11 unidades orgânicas com maior registo de faltas estão situadas na zona Norte do país. Como é o caso do Agrupamento de Escolas Tomaz Pelayo, em Santo Tirso (11.199 dias de faltas), com uma idade média dos professores do quadro nos 54,2 anos. Ou do Agrupamento de Escolas D. Pedro IV., em Vila do Conde (7056). Mais uma vez, a idade dos professores do quadro (53,1) está acima da média nacional.

No pólo oposto, entre as dez unidades com um menor registo de faltas figuram sete escolas profissionais, que têm um regime de ausências diferentes do praticado no ensino regular. No ensino profissional, as aulas não leccionadas têm de ser repostas ou pelo professor que faltou ou por permuta.

Para além do ano de 2020/21, que é considerado “atípico” devido à pandemia, pode ser consultada também a informação respectiva a 2016/27 e 2018/19. Existem agrupamentos que se mantêm, nos três anos em análise, na lista dos que têm maior registo de faltas, outros que mudam, mas a predominância do Norte mantém-se.

January 15, 2024

Acho extraordinário que pessoas que não são professores nem percebem nada de educação escolar tenham grande espaço nos jornais para vender teorias ignorantes




Compreendo que um pai fale dos assuntos do ponto de vista dos pais e encarregados de educação e parece-me muito positivo. Mas não, fala mesmo do ponto de vista do professor, como se suas opiniões de dramaturgo tivessem valor de pedagogia escolar.

Primeiro fala num documentário iraniano sobre a escola, pois apercebe-se que se calhar essa educação não é comparável à nossa mas isso não o atrapalha e adianta que há questões transversais como as diferenças sociais, que criam clivagens acentuadas (mas que parecem ser ignoradas por quase toda a gente). A ideia que as pessoas em geral ignoram as consequências das diferenças sociais é logo uma grande prova da ignorância do indivíduo, acerca de tudo o que se diz e escreve em educação. Mas ele deve pensar que é grande especialista de travesseiro.

Depois atira, en passant, que podia falar na encíclica relação entre notas de testes e exames e desempenho académico), mas que não vai falar... pois claro, eu também podia falar de tudo sobre a maneira errada como os cientistas abordam combustão de foguetes espaciais mas não vou falar... é isso... LOL

Enfim, isto para chegar aos TPCs e poder dizer mal: os trabalhos de casa são uma intromissão da escola no espaço da casa que deixam os filho sem tempo para brincar; são uma agenda de autoridade e que é para atirar as culpas para os pais e humilhá-los. Os TPCs são uma prova, diz, de um sistema classista que humilha os pais já mal pagos e que não têm tempo para os filhos. (como se os professores não fossem também pais e também mal pagos...)

Esta ideia dele de que a escola é apenas um espaço para os alunos passarem facilmente e socializarem sem dar trabalho aos pais, é muito querida a este ministro da educação e, por isso, está tristemente na moda.

Este indivíduo, em vez de vir defender as virtudes do laxismo dos professores e das famílias, devia reivindicar uma escola com condições de qualidade pois é assim que defende os seus filhos. Se os pais trabalham horas demais, o que deve mudar é a organização do trabalho em vez de sacrificar as possibilidades dos filhos. 

Na prática, o que ele está a dizer é: não puxem pelo meu filho que eu também não me interesso muito por isso e quero é que ele brinque e não me chateie que estou cansado. É claro, um dia quando o filho ficar de fora de todas as oportunidades por não ter feito nenhum esforço e acabar a arrumar prateleiras do supermercado, vai queixar-se da vida e da escola que não puxou por ele, mas quando o filho teve as oportunidades e era demasiado novo para perceber o que seria o resto da sua vida, o pai, em vez de incentivá-lo a melhorar, queixou-se dos professores esperarem dele mais do que ele próprio.

Quer as pessoas queiram quer não, há disciplinas que precisam da experiência que só se consegue com a prática, tal como os jogos de telemóvel que o indivíduo cita. Aí já não lhe faz confusão que os filhos passem horas a praticar para ganhar perícia, mas quando se refere à escola, de repente a prática que leva à perícia é má? Compreendo: é má porque lhe dá trabalho.

E querer dar aos alunos instrumentos que lhes permitam ter mais escolhas na vida é humilhar os pais? Que grande narcisismo...

Este ano tenho uma turma com um grande grupo de alunos interessados e focados, alguns deles muito bons, e um maior número ainda de bons. Isto é o suficiente para que os menos bons subam de nível. Têm pais interessados e colaborativos. Aparecem todos na reunião e são interventivos. Na primeira reunião disse-lhes que os professores têm boa impressão da turma mas que os miúdos precisam de melhorar o domínio da língua portuguesa. Se eles querem apenas passar de ano, como estão chega perfeitamente, mas se têm expectativas mais elevadas (e eu sei que têm) têm que melhorar bastante nesse domínio porque eles pensam todas as disciplinas, da matemática à filosofia, usando o português e se o português deles é rudimentar, isso significa que as suas ideias lhes correspondem... é uma limitação à possibilidade de trabalhar conceitos e ideias complexas, ferramenta sem a qual, não podem ter grandes expectativas. O que é uma pena dado o empenho e as capacidades dos miúdos. Disse-lhes o que podem fazer para ajudar os filhos nisso porque não é algo que se possa fazer exclusivamente nas duas aulas que têm por semana. 

Agora se fazem é com eles, mas a mim cabe-me puxar os alunos para cima e não empurrá-los para baixo -  como este pai defende.

Portanto, se os pais, não podem, porque não sabem ou não têm tempo para ajudar os filhos nos TPCs, devem reivindicar que eles sejam feitos na escola em vez de reivindicar que se deixe os filhos sem instrumentos para competir com os tais que têm outros recursos - claro que com a falta de professores e o estou-me-nas-tintas dos governantes para a educação isso não vai acontecer. Era preciso os pais serem muito exigentes com o ME em vez de se ocuparem a dizer mal dos professores.

Só que não. Repetem como rebanhos esta ladainha dos TPCs serem maus para o fígado. Mas depois, se vão ao médico, querem que seja um tipo que os atenda focado, com competência e sem negligência ao fim de um dia de trabalho e querem que o engenheiro tenha perícia a fazer os cálculos da ponte, como também querem que os farmacêuticos tenham muita prática e não se enganem nas fórmulas e querem que os professores saibam tirar dos alunos o que eles nem sabem que têm lá dentro. Mas naturalmente que pensam que essas pessoas tornaram-se peritas no seu trabalho, não fazendo os trabalhos de casa quando andavam na escola... porque os pais não estavam para colaborar.

Felizmente nem todos os pais são como este - para bem dos filhos. Gente que atira os filhos para a escola e depois querem que eles saiam de lá educados e cozinhados no ponto, sem que tenham que colaborar um átomo na tarefa de educar os filhos. 

Se os filhos lhe dão trabalho para que os teve? Pensava que era só brincadeira e que a parte do trabalho era só para os outros? Hoje em dia há muito isto de os professores querem apostar nos alunos e puxar por eles e os pais dizerem que não. Uma lástima.


Trabalhos para casa: claro que não

Os encarregados de educação e pais, já sobrecarregados por empregos mal pagos, precários e que exigem energia mental e física, ainda são forçados a abdicar do tempo de família.

Paulo César Gonçalves
Autor, dramaturgo. Nasceu em Guimarães, voltado para o Castelo da Fundação e, até ver, está vivo.

15 de Janeiro de 2024


O documentário Homework, de 1989, do realizador iraniano Abbas Kiarostami, mostra uma realidade perturbadora: entrevistas com vários alunos e dois pais de alunos da escola Shahid Masumi, a propósito dessa prática tão tradicional de enviar trabalhos para casa.

Claro que o bias da sociedade iraniana e do próprio tempo em si se colocam. Não há grande comparação possível com as sociedades ocidentais. E se a relação essencial se mantiver, mude o país, mude a cultura, mude a percepção? Há situações transversais, como a incapacidade de alguns pais em ajudar os filhos, pelas mais variadas razões. As crianças não conseguem esconder os aspectos mais embaraçosos da sua vida, sejam os castigos físicos, a privação ou a comparação com quem tem mais: o que fica é o retrato devastador da diferença entre ricos e pobres. Entre quem pode e quem não pode.

Viajando mais de 30 anos, mais para o ocidente, vemos e escutamos uma prosa continuada de culpabilização e responsabilização dos pais, a propósito da educação, do desempenho escolar e de outros aspectos relacionados com a vida dos mais novos. Vamos deixar de lado o aspecto já batido das óbvias diferenças sociais, que criam clivagens acentuadas (mas que parecem ser ignoradas por quase toda a gente). Vamos focar-nos no prático dos trabalhos para casa (e até poderíamos ir mais longe, focando esforços na encíclica relação entre notas de testes e exames e desempenho académico).

Os "tpc" só servem para o seguinte, mesmo que os tiros nos pés não sejam logo óbvios: entrada desenfreada do espaço escola no espaço família (curiosamente, o fenómeno em sentido contrário é quase sempre diabolizado); captura do tempo de lazer e de ócio familiar (depois de quase meio dia a fio na escola); desequilíbrio na relação escola/família; inexistência do tempo de brincadeira (e assumir que o tempo de escola é mais importante do que o tempo brincadeira, o que é uma grosseira mentira); agenda de acatamento, disciplina autoritária e preparação tida como certa para uma vida incerta; convite à "normose"; responsabilização dos pais e encarregados de educação por temas que podem não dominar; tomada de pressuposto e colagem de rótulos.

A pretexto de uma suposta preparação e consolidação, os trabalhos para casa reinam incontestados, arautos do esforço e do "mérito", ao serviço de programas e de um sistema tão ultrapassado quanto classista.

Fruto da falta de tempo, os encarregados de educação e pais, já sobrecarregados na sua grande maioria por empregos mal pagos, precários e que exigem energia mental e física, ainda são forçados a abdicar do tempo de família para cumprirem com funções suplentes que lhes roubam o necessário tempo para consolidarem laços familiares.

Não se admirem dos telemóveis, dos tablets e dos ecrãs: não nasceram de geração espontânea. São a fácil solução para uma vida mais sobrevivida do que vivida: foi a escola pouco exigente (mas que crê ser o oposto), em termos humanos, dos testes e dos "tpc", que inventou estes refúgios.

 

Espero que o próximo ME seja menos ignorante que este




Que não se preocupe apenas com a sua carreira/tacho. Espero que o próximo ministro das finanças seja menos ignorante que este e que não se preocupe apenas com a sua carreira/tacho. Espero que o próximo PM seja menos ignorante que este e que não se preocupe apenas com a sua carreira e a dos seus amigos. Logo, todas estas razões põem de parte PNS que ainda é pior que estes três da vida airada.

Estágios pagos vão ficar limitados a regiões onde há falta de professores


Grupo de trabalho que aconselhou o ME na reforma da formação dos docentes discorda da versão final do diploma. Faculdades também estão descontentes.

Samuel Silva

Foi anunciado como um dos trunfos para atrair mais jovens para a profissão de professor, mas o diploma que institui o regresso dos estágios remunerados nas escolas esconde uma surpresa. O Governo só deve autorizar a criação de núcleos de estágio em regiões onde exista escassez de docentes. Ou seja, os estudantes de todo o país terão de ir para Lisboa ou para o Algarve. Este não é o único motivo de descontentamento nas escolas e faculdades de educação. Até o grupo de trabalho que aconselhou o Ministério da Educação nesta reforma está contra a versão final da lei.

As alterações ao regime jurídico da habilitação profissional para a docência foram promulgadas em Novembro pelo Presidente da República. A versão final do diploma, entretanto publicada, apanhou de surpresa as faculdades e escolas superiores de educação, onde são formados os professores. 

O diploma faz depender o funcionamento dos núcleos de estágio de um despacho que terá de ser rubricado não só pelo ministro da Educação, mas também pelo das Finanças. O documento ainda não foi publicado, mas, em reuniões mantidas com os ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior nas últimas semanas, as instituições conheceram a intenção do Governo: autorizar apenas a constituição de núcleos de estágio em regiões onde há maior carência de docentes.

Ou seja, na prática, os estudantes finalistas dos mestrados de formação de professores de todo o país teriam de estagiar em escolas da Área Metropolitana de Lisboa ou do Algarve, onde se concentram as maiores carências de docentes.

Os docentes estagiários serão remunerados segundo o índice 167, o primeiro da carreira, que corresponde a um vencimento de cerca de 1600 euros mensais brutos para quem tiver um horário completo. A medida foi usada como um trunfo pelo Governo quando apresentou esta reforma, que pretende responder ao problema da falta de professores.

Com este regime de estágios, “os estudantes usarão a sua remuneração para pagar um quarto barato e pouco mais, em regiões onde o custo de vida é maior do que o da cidade onde vivem. E o resto das suas despesas ficará, como sempre, por conta das respectivas famílias”, lamenta Alexandre Franco de Sá, que coordena o Conselho de Formação de Professores na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

Este docente critica o facto de estudantes de mestrados em ensino da sua instituição ou da Universidade do Minho terem de se deslocar para Lisboa ou o Algarve. É também essa a preocupação de Carlos Teixeira, que dirige a Escola Superior de Educação de Bragança: “Tenho alunos do primeiro ano que já me disseram: ‘Se tiver que ir estagiar para Lisboa, não vou.’”

“Não é um princípio bem pensado. A formação de professores foi condicionada pela necessidade de suprir a falta de docentes”, critica Teixeira, que também preside à Aripese, associação que reúne as várias escolas superiores de educação.


“O Governo diz que acabou com os professores de casa às costas, mas quer substituí-los por estudantes de casa às costas”, ilustra, por seu turno, Ângela Lemos, presidente do Instituto Politécnico de Setúbal. A dirigente representa o Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos (CCISP) – sector onde se formam boa parte dos professores – nos contactos com os dois ministérios.


January 12, 2024

Quando o Chega quer impor a idade média à escola




 Ventura: mesmo planeta, outro mundo




A proposta de resolução apresentada pelo Chega, que visa conceder aos encarregados de educação o poder de autorizar a participação, ou não, dos seus filhos em aulas sobre identidade de género e outras temáticas, tem suscitado um intensa polémica. Esta medida coloca em risco o papel crucial da escola enquanto espaço de conhecimento, diálogo e diversidade. 

Ao questionar se um pai que acredita que a terra é plana pode privar os seus filhos de aulas de Geografia ou se um fundamentalista de qualquer religião pode opor-se à participação dos seus ‘rebentos’ em aulas de Biologia, baseadas na teoria da evolução, a Iniciativa Liberal trouxe à luz a complexidade e os desafios enfrentados pela educação numa sociedade plural. 

A escola é mais do que uma instituição que ensina a ler, a escrever e a contar. Desempenha um papel crucial no crescimento e formação das nossas crianças e jovens, não apenas transmitindo conhecimento académico, mas também promovendo a compreensão, o respeito pela diferença e a construção da identidade. 

A liberdade de escolha dos pais é, sem dúvida, um direito constitucional, e que deve ser tido em conta. No entanto, impor restrições à diversidade de conhecimento que os alunos podem adquirir, compromete a missão essencial da escola. Os pais não são donos dos filhos. Até dos animais de estimação já somos designados de “tutores!

A educação deve ser um processo enriquecedor, fornecendo aos alunos as ferramentas para compreenderem o mundo. Restringir o acesso a determinados conteúdos com base em convicções individuais prejudica não apenas a qualidade da educação, mas também a capacidade dos alunos de enfrentarem os desafios contemporâneos. Negacionismos da evolução à parte, importante é garantir que a escola seja um espaço de respeito e diversidade.

Ana Cáceres Monteiro DN

January 11, 2024

Títulos: Há professores com mais de 200 alunos ou mais de 11 turmas atribuídas




Este título até dá a entender que são apenas uns poucos, mas não é assim. Todos os professores, até uma certa idade têm o máximo de turmas possível a que se descontam uma se têm um cargo. 
Até chegar a uma certa idade em que nos tiram uma turma e passados 5 anos outra turma, tive sempre 7 turmas (cheguei a ter 8), cada uma com 30 alunos. No início dos anos 90 do outro século, era comum as turmas terem 35 alunos. 
Se tinha um cargo de DT tinha 6 turmas em vez de 7. Portanto, o normal era ter cerca de 210 alunos. Eu e toda a gente. Quem tinha disciplinas com aulas por turnos (as ciências que têm aulas em laboratórios) tinha menos turmas. 
E essas 7 turmas podiam e podem, ser de vários níveis de escolaridade, o que obriga a preparar aulas e material para anos diferentes com currículos diferentes.
Se hoje em dia já não são todos a ter esta barbaridade de alunos é porque os professores estão envelhecidas e a lei permite que tenham menos uma ou duas turmas a partir de certa idade. 
Mesmo assim, acontece que muitos professores ainda têm, depois das aulas, horas de aulas apoio marcadas no horário, que são aulas, de facto, embora o ME lhes chame outra coisa para poder dizer que não sendo aulas não têm que ser pagas como tal: tudo serve para explorar os professores. 
Portanto, é normal que muitos professores tenham mais de 200 alunos, com vários níveis de ensino.
O meu caso é diferente porque enquanto doente oncológica e com atestado de incapacidade muito elevada, a legislação do trabalho e a medicina do trabalho não me permite ter muitas turmas dado o prejuízo para a saude - dar aulas exige imensa robustez física e mental. 
Mesmo assim, estou com excesso de turmas e de trabalho, porque alguém entendeu mandar-me ao médico da medicina do trabalho em Outubro, apesar de ter um relatório anterior definitivo, e o médico olhou para o meu horário e para os relatórios e exames médicos, fez-me perguntas e mandou-me reduzi-lo imediata e definitivamente, coisa que não vou fazer até ao fim deste ano, por opção própria e à minha responsabilidade, porque se deixar agora uma turma é certo que ficam sem professor o resto do ano, o que não me parece bem, mais a mais porque fui eu que escolhi o meu horário, ninguém me obrigou a ter este horário. Para não falar em que atirava uma DT para cima de um colega que, de certeza, não precisa de mais trabalho. Portanto, vou aguentar até ao fim do ano, mas vou organizar a parte do trabalho que é móvel, de uma maneira que seja menos cansativa.


Há professores com mais de 200 alunos ou mais de 11 turmas atribuídas

Professores com mais de 11 turmas atribuídas, mais de 200 alunos ou a dar aulas a vários níveis de ensino são casos denunciados num inquérito da Fenprof, que alerta para o perigo de mais casos de "burnout". Segundo os dados preliminares do inquérito realizado entre setembro e outubro e que envolveu 4.471 docentes de todo o país, os professores do 2.º e 3.º ciclos e do ensino secundário estão a trabalhar, em média, mais de 50 horas por semana.

O sobretrabalho já tinha sido denunciado em 2017 pela Fenprof, que na altura disse que se registavam semanas de trabalho de 47 horas, mas "a situação agravou-se" nos últimos sete anos, sublinhou o dirigente sindical Vitor Godinho, em declarações à Lusa.

A trabalhar mais 15 horas por semana, os professores são obrigados a sacrificar a sua vida pessoal e familiar, o que os pode levar "à exaustão", havendo muitas "situações de burnout", alertou, lembrando que também fica em causa a qualidade de ensino.

Mais alunos e mais turmas atribuídas são sinónimo de mais trabalho, que se nota em tarefas como preparar aulas ou corrigir testes e trabalhos de casa.

O estudo mostra que apenas metade dos docentes tem menos de cinco turmas atribuídas, o que para a Fenprof deve ser o limite máximo de turmas atribuíveis a cada docente.

Já um em cada cinco docentes (19,5%) tem sete ou mais turmas a cargo, havendo mesmo 4,2% dos professores com 11 ou mais turmas atribuídas.

Ter mais alunos e turmas é sinónimo de mais trabalho, sendo que há casos de professores que têm turmas de vários níveis de ensino: a Fenprof defende que o máximo devem ser três níveis, mas 10% têm quatro níveis e 6,8% têm, pelo menos, cinco.

A trabalhar mais de 15 horas semanais do que o previsto por lei, o sindicalista diz ser "preciso impedir que a ilegalidade se instale" e pede aos responsáveis políticos que olhem para os resultados do inquérito "para que o inferno não seja o limite".

Medidas propostas

A Fenprof volta a apresentar um conjunto de medidas para garantir a aplicação dos horários de 35 horas, que vão desde "uma distinção séria e clara entre componentes letiva e não letiva do horário dos professores", voltando a componente letiva a englobar todas as atividades diretas com alunos.

Garantir que os professores têm no máximo 100 alunos, cinco turmas e duas disciplinas, níveis ou áreas curriculares é outra das reivindicações.

A redução da componente letiva de base para 20 horas semanais e a redução de horas para quem tem cargos de natureza pedagógica "em número de horas condizente com as funções e tarefas a desempenhar" também fazem parte do caderno reivindicativo.

Mais 15 horas de trabalho que o previsto

Os professores trabalham em média mais de 50 horas por semana, mais 15 do que o horário legalmente definido, em tarefas como preparar aulas, apoiar alunos com dificuldades, corrigir testes mas também tarefas burocráticas.

O horário dos professores é de 35 horas semanais, mas, em média, os docentes do 2.º e 3.º ciclos assim como os do ensino secundário trabalham 50 horas e 15 minutos, segundo os dados preliminares do inquérito.

Em média, estão a trabalhar mais 15 horas por semana do que está previsto na lei e para realizar todas as tarefas têm de roubar tempo "à sua vida pessoal", disse à Lusa Vitor Godinho, delegado sindical da Fenprof.

Muitas das horas que dedicam aos alunos e às escolas não são pagas, "são trabalho pro bono", criticou o sindicalista, referindo que a situação se agravou nos últimos anos.

Em 2017, os professores trabalhavam, em média, 47 horas por semana, agora são mais três horas e meia por semana.

O inquérito revela que os professores gastam, em média, 16 horas e 35 minutos a dar aulas, e outras 18 horas para desenvolver tarefas como preparar as aulas e realizar as avaliações dos seus alunos.

Estas duas componentes atingem praticamente a duração semanal legal do horário, que são 35 horas, mas os professores têm muitas outras tarefas, alertou o sindicalista.

Há o trabalho feito nas escolas que vai desde cargos pedagógicos, a apoio a alunos, tarefas administrativas, reuniões, substituição de colegas que faltam ou coadjuvações em sala de aula.

Em média, os professores despendem 15 horas e 45 minutos na "componente não letiva de estabelecimento", lê-se no inquérito.

No caso dos docentes com cargos de direção de turma ou com coordenação de departamento, o estudo indica que ultrapassam largamente as horas que lhes são atribuídas para esse efeito.

Os diretores de turma têm duas horas para desenvolver esse trabalho, mas o estudo indica que gastam, em média, quatro horas e 18 minutos.

Vitor Godinho acredita que a realidade seja ainda mais preocupante, uma vez que estes professores têm de realizar reuniões com colegas, estar disponíveis para resolver problemas de alunos e receber pais, responder e enviar mails aos encarregados de educação, além de outras missões como fazer o levantamento das faltas dos estudantes, "uma a uma, de todos os alunos a todas as disciplinas".

A excessiva carga burocrática é outro dos problemas, consumindo mais de quatro horas semanais.

Atualmente, "os professores gastam mais uma hora por semana em tarefas burocráticas do que em apoio aos seus alunos", lamentou o sindicalista.

O apoio aos alunos representa quase três horas semanais, segundo o estudo que revela uma "flagrante situação de sobretrabalho" e muitas tarefas a serem desenvolvidas em horas não registadas.

A Fenprof tem por isso um conjunto de medidas que quer ver aplicadas e que passam por limitar o número de alunos e turmas atribuídas e por redefinir o que é componente letiva e não letiva.


January 10, 2024

O ME: até Março ainda tem muito para estragar





Neste notícia com este título bombástico a fazer crer que os professores dizem que estão doentes, não estando, ficamos a saber que o ministério da educação contratou uma empresa privada de trabalho temporário de serviços médicos, (7500 juntas médicas) a quem pagou 150 euros à hora para que, apoiados num despacho desactualizado de 1989 acerca de doenças graves e incapacitantes, tratassem de excluir o maior número possível de professores da possibilidade de trabalharem em escolas perto de suas casas. É a isso que chama 'falsas declarações'. 7500 juntas médicas para este fim de prejudicar professores. Trabalhar, não para o benefício dos alunos, mas para o prejuízo dos professores. Isto diz muito do seu carácter. Daí que tudo em que mexe se estraga.


Serão 80 os professores com declarações “falsas” de doença


A mobilidade por doença permite que os docentes com patologias graves, ou com familiares próximos nesta situação, fiquem colocados numa escola junto da sua casa ou do local de tratamento. Neste ano lectivo foram abrangidos 4107 professores.

Também não é conhecido se este processo já chegou ao fim e para que conclusões aponta. Mas Joana Leite acrescenta que o chumbo dos professores nas juntas médicas se tem ficado a “dever à inadaptabilidade do uso” da legislação em vigor “como critério de acesso a este tipo de mobilidade”. Em causa está, no concreto, a aplicação de um despacho de 1989 que elenca quais as doenças incapacitantes que justificam longas ausências ao trabalho.

Numa recomendação enviada ao ministro da Educação, em Março passado, a provedora da Justiça defendeu a necessidade de se proceder à revisão e actualização do “elenco de doenças incapacitantes”, frisando que a utilização do despacho de 1989 “não se revela adequada para aferir a necessidade de uma solução de mobilidade”, nem para quaisquer “outros fins” que não seja a justificação de períodos prolongados de baixa médica. O que não é o caso dos docentes em mobilidade.

O ME garante que foram adjudicadas 7500 juntas médicas. No portal Base estão publicados dois contratos, datados de Dezembro de 2022, assinados com a empresa de prestação de serviços Precise Lda., no valor total de cerca de 281 mil euros. O preço por hora/sessão ficou fixado em cerca de 150 euros contra os 218 previstos inicialmente no caderno de encargos.

A Precise é uma empresa de trabalho temporário que tem sido contratada por variadas entidades públicas, sobretudo para a angariação de serviços médicos.

December 30, 2023

Como sufocar antecipadamente qualquer revolta - uma previsão certeira



′′Para sufocar antecipadamente qualquer revolta, não deve ser feito de forma violenta. Métodos arcaicos como os de Hitler estão claramente ultrapassados. Basta criar um condicionamento coletivo tão poderoso que a própria ideia de revolta nem virá à mente dos homens. O ideal seria formatar os indivíduos desde o nascimento limitando suas potencialidades biológicas inatas...

Em seguida, o acondicionamento continuará reduzindo drasticamente o nível e a qualidade da educação, reduzindo-a para uma forma de inserção profissional. Um indivíduo inculto tem apenas um horizonte de pensamento limitado e quanto mais seu pensamento se limita a preocupações materiais, medíocres, menos se pode revoltar. É necessário que o acesso ao conhecimento se torne cada vez mais difícil e elitista..... que o fosso se cave entre o povo e a ciência, que a informação dirigida ao público em geral seja anestesiada de conteúdo subversivo.

Especialmente sem filosofia. Mais uma vez, há que usar persuasão e não violência directa: transmitir-se-á maciçamente, através da televisão, entretenimento imbecil, bajulando sempre o emocional, o instintivo. Vamos ocupar as mentes com o que é fútil e lúdico. Com conversa fiada e música incessante, evita-se que a mente se interrogue, que pense, reflicta.

Vamos colocar a sexualidade na primeira linha dos interesses humanos. Como anestesia social, não há nada melhor. Em geral, vamos banir a seriedade da existência, escarnecer de tudo o que tem um valor elevado, manter uma constante apologia à leveza, de modo que a euforia da publicidade, do consumo se tornem o padrão da felicidade humana e o modelo da liberdade.

Assim, o condicionamento produzirá uma integração tal, que o único medo (que será necessário manter) será o de ser excluído do sistema e, portanto, de não poder mais ter acesso às condições materiais necessárias para a felicidade. O homem em massa, assim produzido, deve ser tratado como o que é: um produto, um bezerro, e deve ser vigiado como deve ser um rebanho. Tudo o que permite adormecer a sua lucidez, a sua mente crítica é socialmente bom, o que arriscaria despertá-la deve ser combatido, ridicularizado, sufocado...
Qualquer doutrina que ponha em causa o sistema deve ser designada como subversiva e terrorista e, em seguida, aqueles que a apoiam devem ser tratados como tal ′′.

Günther Anders - A obsolescência do homem, 1956".

Ter voz própria

 


O que faz com que certas pessoas que nascem com um talento extraordinário para a pintura escolham ser falsários? Talvez não escolham.
Estive a ver um filme (The Last Vermeer) sobre o processo de Han van Meegeren -considerado o maior e melhor falsário de sempre- na Holanda, no pós-guerra. Quando se descobre entre a arte roubada por Goering, um Vermeer desconhecido, os holandeses vão à procura da pessoa que lho vendeu e vão dar com Han van Meegeren, um pintor holandês de terceira categoria e negociante de arte. Acusado de colaborar com os nazis e arriscando-se à pena de morte, Han van Meegeren pinta um Vermeer num espaço de meses, na prisão, para provar que o Vermeer que vendeu a Goering é uma fraude e que nunca vendeu tesouros artísticos aos nazis, mas apenas falsificações. O que consegue fazer e lhe devolve a liberdade, mas como consequência desse revelação temos que até hoje não sabemos quais as pinturas 'descobertas' e vendidas por ele no século XX (ele morreu seis semanas após a libertação)  são verdadeiras e quais são falsas. Muitos quadros 'descobertos' e vendidos por ele estão em grandes museus do mundo. Han van Meegeren falsificava variados estilos mas era especialista em Vermeer, um pintor que pintou pouquíssimas telas que valem, pela sua raridade, uma enorme fortuna.

Estava a ver o filme e a pensar o que faz com que uma pessoa nascida com um talento extraordinário para a pintura escolha ser falsária em vez de deixar o seu legado para a posteridade? Em parte, como lhe diz uma personagem no filme, faltou-lhe a força de vontade, a alma, para enfrentar os críticos e vencer as adversidades próprias dos artistas que têm que abrir caminho por si mesmos. 

Porém, isso só não basta para explicar essa renúncia de si mesmo: falta-lhes voz própria. 

"Conhece-te a ti mesmo" era uma máxima do Oráculo de Delfos, da Grécia Antiga, citada por Platão em vários dos seus diálogos, pela voz de Sócrates. Quem não se conhece a si mesmo, quem não mergulhou nas profundezas da sua alma e viu os recantos, as armadilhas, os abismos e todas as cores e texturas que encerra, não tem inspiração para criar porque não tem voz própria. É um copiador de imagens, de superfícies. Pode ter uma técnica muito sofisticada ou rigorosa, como uma mecânica do gesto, mas falta-lhe a visão que a técnica revela. A visão vem de dentro, pois mesmo o que nos inspira vindo de fora, só o faz porque ecoa e é reconhecido dentro e é de dentro que vem esse sopro criador.

Em cada uma das mil vozes de Pessoa, reconhecemos Pessoa.

Educar é, em grande parte, educar a voz para a individualidade, ensinando o processo da reflexão, da introspecção, da arqueologia interior, sem os quais as pessoas crescem imitadores desinspirados, altifalantes de vozes alheias, cidadãos tecnicamente amestrados, renúncias de si próprios.