March 08, 2020

Paula Rego, 'Possessão'



pormenor (este pormenor da pintura fala tanto )


Anna Komnene




Anna Komnene (1 de Dezembro de 1083 - c.1153) ou latinizando o nome, Ana Comnena, considerada a primeira mulher historiadora. 
Era uma princesa bizantina que escreveu “Alexíada”, a história política e militar do reino de seu pai Aleixo I Comneno (1056-1118). Ana, uma erudita e gestora hospitalar (o seu pai e imperador entregou-lhe a administração do hospital e orfanato que mandara construir e onde Ana ensinava medicina), aprendeu com os seus tutores ciências como astronomia, assuntos militares, medicina, geografia, matemática e também a língua grega, teologia, história, retórica e literatura (consta que leu a Odisseia em segredo pois os seus pais consideravam o politeísmo perigoso). 
Esta filha do imperador Aleixo I e da princesa Irene Ducena (1066-1133), era especialmente devotada à filosofia que considerava a rainha de todas as ciências.
Ana, sendo a mais velha dos filhos do imperador, na infância foi prometida ao filho do Imperador Miguel VII e considerada a herdeira do trono de seu pai mas o nascimento de um varão, o seu irmão João, e a morte do seu noivo pôs um fim a estes planos. No entanto, embora o seu irmão tivesse realmente sucedido a seu pai Aleixo no trono, a sua mãe Irene sempre apoiou e preferiu a sua filha Ana que considerava mais capaz, o que provavelmente é um caso único na História da Idade Média.
Os 15 volumes da Alexíada são a obra dos seus últimos anos, que escreveu já exilada no mosteiro de Kekaritomene que tinha sido fundado por sua mãe. Dão-nos uma visão da chegada a Constantinopla dos primeiros Cruzados vista pelo lado bizantino. Aliás a Primeira Cruzada foi formada, entre outras razões, a pedido de Aleixo I ao Papa Urbano II, pois o Imperador desejava o apoio do Ocidente. Não contava é com os enormes contingentes de Cruzados que foram chegando.
Ana Comnena, muito considerada entre os seus contemporâneos, mantinha no mosteiro reuniões de intelectuais, nomeadamente as dedicadas a estudos aristotélicos. 
Nos seus escritos, fez questão de declarar a forma como reuniu as suas fontes: pequenos escritos sem pretensões literárias, velhos soldados que tinham lutado nas campanhas do Imperador, o que ouvira contar ao seu pai e aos seus tios e, como notaram os eruditos, Ana também usou os arquivos imperiais, tendo assim acesso a documentos oficiais. 
A preocupação com o apuramento da veracidade dos factos políticos e militares juntamente com a perspectiva pessoal (a defesa de seu pai e trechos descrevendo a vida familiar) colocam a talentosa e sábia Ana Comnena num elevado patamar da História Medieval.

Helena Santos da Cunha, nós e a história

5 mulheres




March 07, 2020

Clair de Lune





Henri-Joseph Harpignies
1819-1916

Life, really




Le colporteur



Uma noite bem passada



Ontem fui ouvir Evgeni Onegin de Tchaikovsky. Adorei. Foi espectacular. A ópera foi apresentada em versão concerto (saudades de quando vivia num país onde se andava uma hora para qualquer lado e se tinha acesso a uma casa de ópera...) porque não foi numa casa de ópera. Encenaram-na em um metro e meio de palco; no entanto, a encenação foi tão bem feita, de maneira tão inteligente e bonita que não frustrou as expectativas. Não é fácil porque a ópera tem cenas de festas e bailes.

A orquestra tocou muito bem, o coro excelente e os cantores muito bons. Foi mesmo espectacular. Depois, por sorte, na primeira cena, a Tatiana e a Olga cantaram a três metros de nós e no fim, o dueto da Tatiana com Onegin e a ária final dele também foram mesmo ali ao pé de nós que estávamos um bocado para a esquerda do placo mas mesmo à frente. É que a voz deles ouvida assim a três metros de distância tem um impacto emocional muito grande.

Uma dos aspectos que mais gosto na música é o facto de juntar gente de qualquer parte, credo, cor ou religião numa colaboração positiva onde o que se respeita é o talento e o trabalho, tanto da parte dos artistas, como da parte do público. Quer dizer, o público está-se nas tintas para que sejam altos, baixos, gordos, magros, louros, morenos, europeus, asiáticos, africanos ou outra coisa qualquer, o que queremos mesmo é que cantem bem.

Nesta ópera, o maestro é suíço, a soprano que fazia de Tatiana é finlandesa (uma vez muito expressiva e elegante), a mezzo soprano que fazia de Olga é uma portuguesa (uma voz baixa cheia de ressonância e poder), o tenor que fazia de Lensky com uma voz muito bonita cheia de legato, é russo, Andrè Schuen, o barítono com uma voz profunda, redonda e com muito poder, que fazia de Onegin, é um italiano de formação musical alemã, a mezzo soprano que fazia de Filipievna é uma polaca. Havia mais um russo e três portugueses nos outros papéis. A orquestra tem gente de tudo quanto é sítio. No entanto, quando tocam e cantam só há harmonia e acordo, nenhum descompasso. É lindo.

Enfim, há bocado, quando cheguei a casa, fui ouvir a versão da ópera que tenho cá em casa. É o que estou a ouvir.




March 05, 2020

Sou só eu que penso que a ministra da saúde é irresponsável?



Acabo de ouvir a ministra de saúde a dizer que os professores que vierem de partes da Itália 'não graves' podem ir trabalhar para as escolas desde não se cumprimentem fisicamente e lavem as mãos. Portanto, a Itália está fechada de alto a baixo: escolas, universidades, conferências, eventos culturais, museus, voos, etc, mas a nossa ministra acha que podemos ir e voltar de Itália que non pasa nada. E tudo se resolve se não nos tocarmos fisicamente como se não estivéssemos, nas escolas, uns em cima dos outros em espaços fechados, partilhássemos casas-de-banho, etc. Ahh e que os professores estão a uma distância segura dos alunos de modo que não há problema. É isso... os alunos estão na Lua e nós em Marte. Isto é demais... quando vemos os fatos protectores do pessoal médico percebemos bem o que está em causa.

Depois mentem  e mentem mal como foi com o caso do director do saúde 24.
Eu percebo que o governo esteja a pensar em não lançar o pânico e em poupar dinheiro e se calhar até pensa que, como quem morre são os mais velhos e os doentes, não há crise... até se poupa dinheiro em reformas e doenças... no entanto, esta displicência na maneira de tratar o caso  -nem sequer controlam as pessoas nos aeroportos para os turistas não fugirem- pode sair muito cara. É um risco muito grande, esse de não estar a fazer o que é possível para conter a propagação do vírus.

Os meus alunos são mais responsáveis que a ministra. Só falta a ministra também dizer que morre mais gente de fome que do vírus, como leio por aí, como se, quando estamos doentes, fosse uma ofensa tratarmo-nos, por haver crianças com fome e devêssemos deixar-nos sem tratamento.

Quanto mais se tentar esconder as coisas mais as pessoas se assustam.


Covid-19. Itália teve mais mortos que a China nas últimas 24 horas

Situação em Itália continua a escalar. Especialistas dizem que apanhou a ponta do iceberg, os casos mais graves e letais. Quando começarem a registar casos leves a taxa de letalidade começará a reduzir.





Medical staff members wearing protective clothing work 



World economic forum
Epidemic curve of confirmed COVID-19 cases reported outside of China, by date of report and WHO region with complete days of reporting through 01 March 2020


Singapura conseguiu controlar a propagação do vírus. O que fez?

Singapore
The island state was quick to restrict the movements of anyone who recently travelled to China or parts of South Korea. Strict hospital and home quarantine rules have been imposed.

A text and web-based solution was launched in February, requiring people under home quarantine restrictions to report their whereabouts to the government.


Coisas que podemos fazer para além das que já todos sabem:

1. Disinfect your mobile device screen twice per day
— it is a portable petri dish, accumulating bacteria and, yes, viruses. Antibacterial wipes are necessary here, as they generally kill viruses as well. Clean your device at least twice daily, once at lunch and once at dinner time (or linked to another daily routine). A recently published study estimates that viruses like COVID-19 may be able to persist for up to nine days on smooth glass and plastic surfaces, like a mobile phone screen.


2. Avoid touching your face.
Your mouth, nose, eyes and ears are all routes into your body for viruses, and your fingers are constantly in touch with surfaces that may contain viruses. This simple measure is very hard to maintain consistently, but is essential for infection control.


3. Use masks only if you are yourself ill
and give social kudos to people who are responsible enough to use them when sick.

4. Self-quarantine if you are ill and have a fever.

5. Engage your social network to brainstorm other simple behavioural changes.

Nocturna - Yeranos







Just because is beautiful and I really need that - The inner gaze





Rene Magritte (Belgia, 1898-1967) - Le regard intérieur

Just because is beautiful and I really need that - ornamentos medievais









Reflection III



"... students are not just blank slates when they walk into our rooms, but instead are living stories with very real conflicts. As their teachers, we are being invited into these stories. And while the part we play is often short and temporary, our words and actions can have a monumental impact." (Trevor Muir)

Às vezes é difícil 'ver' as pessoas por detrás dos alunos. Temos tendência a categorizá-los enquanto alunos porque é o modo mais rápido e eficaz de conseguir pô-los a trabalhar e a aproveitar-lhes as capacidades. A maioria dos alunos, sendo uma história viva, claro, é comum: têm uma família típica, são pouco incentivados ao estudo e gastam tempo de mais agarrados ao telemóvel. 

No entanto, há alunos que são diferentes. Por vezes é porque são pessoas incomuns, por vezes é porque têm vidas incomuns. Tentamos perceber ao certo porque e como é que aquela pessoa se construiu daquela maneira e como chegar à pessoa por detrás do aluno, se se dá o caso de ser alguém que parece estar ali, não estando.

Às vezes basta uma palavra, outras vezes cometemos um erro que provoca uma reação e isso é o suficiente para estabelecer uma relação. Estou aqui a tentar perceber uma aluna. Passámos o 1º período, eu e os outros professores da turma a tentar perceber a completa inacção da rapariga que é uma pessoa muito correcta, sempre com um ar muito sério e fechado. Cada vez que olho para ela tenho a sensação que ela não está ali na aula.

Soube, falando com um colega, que ela nos anos anteriores era uma aluna muito diferente. Activa e empenhada. Estranho. Quer dizer que alguma coisa mudou, ou na vida dela, ou no desenvolvimento interno, quer dizer, os miúdos na adolescência, de vez em quando, têm mudanças estruturais muito bruscas. Às vezes descobrem qualquer coisa acerca de si, outras vezes descobrem qualquer coisa acerca dos outros ou do mundo que os abala.

Aproveitei um momento de uma aula em que fui entregar qualquer coisa à mesa dela e disse-lhe, 'falei com um professor seu do ano passado e ele pintou-me um retrato seu irreconhecível. Disse-me que era uma aluna muito interessada e activa. O que se passou para ter mudado tanto? É algum problema que se possa resolver?' Ela não disse nada e eu pensei que não tinha conseguido quebrar aquela barreira que ela põe entre ela e os outros. 

Para minha surpresa, passadas umas duas ou três aulas, veio falar comigo no fim da aula, disse-me que tinha um problema e falou. Combinámos um plano que acho não a convenceu muito ( a mim também não mas foi para ganhar algum tempo para pensar melhor e, no entretanto, dar-lhe um objectivo) mas acordámos dar três semanas para ver se há mudanças e depois voltar a falar. 

Se não houver mudanças, não sei ainda bem o que fazer mas, o principal, que era conseguir perceber a 'história viva' por detrás da máscara de aluna, para poder intervir, isso já consegui. Agora o meu objectivo é conseguir que ela passe de ano, mesmo que chumbe a uma cadeira porque me parece que há aqui uma janela de oportunidade curta (não falta muito para o fim do ano) e parece-me que se ela não passa e vai parar a uma turma com uma dinâmica negativa perde-se.

Estas coisas da educação de adolescentes levam muito tempo. Tempo para confiarem em nós o suficiente para se abrirem, tempo para conseguirem modificar-se... tempo. É preciso termos muita paciência e saber esperar o momento certo. Há pouco tempo cometi um erro com outra miúda de outra turma e ela retraiu-se outra vez. É muito mais difícil do que parece.

Às vezes basta os miúdos perceberem que percebemos que alguma coisa não está bem.

Reflection II



La résistance à ce système n’est pas seulement nécessaire, elle est légitime. Il faut cependant que vous preniez conscience que c’est un combat qui se fait sur le long terme. Peut être plus long que votre propre espérance de vie.
Nous devons reconnaître que nous ne serons peut être pas ceux qui expérimenteront le fruit de nos luttes d’aujourd’hui. A mes yeux c’est excitant. J’ai la sensation d’être une petite partie d’un ensemble bien plus grand.
Si nous organisons notre lutte de cette manière, nous serons sans doute capable de produire une transformation de nos sociétés pour les génération futures.

Angela Davis, Nantes 2015.



(tradução: a resistência a este sistema não é apenas necessária, ela é legítima. No entanto, tem que tomar-se consciência de que esta é uma luta a longo prazo. Pode ser mais longa do que a nossa própria esperança de vida.
Temos que reconhecer que talvez não sejamos aqueles que experimentarão o fruto das nossas lutas de hoje. Para mim, isso é emocionante. Sinto que sou uma pequena parte de um conjunto muito maior.
Se organizarmos a nossa luta desta forma, sem dúvida seremos capazes de produzir uma transformação das nossas sociedades para as futuras gerações)



Reflection



“This is winter wheat we are sowing, and others will reap the harvest.”

-Elizabeth Cady Stanton, to Susan B. Anthony

A profound Rothko



“I’m interested only in expressing basic human emotions—tragedy, ecstasy, doom, and so on,” (Mark Rothko )













Mark Rothko
No. 14, White and Greens in Blue, 1998
Offset Lithograph
90.2 × 69.9 cm
Private collection

A quem interessa o AO?



É instrutivo passar em revista o que de mais relevante sucedeu nestes 30 anos e que o PÚBLICO acompanhou em milhares de edições (chega hoje à n.º 10.907). Como? Uma solução prática e acessível é a Wikipédia. Há uma súmula desses factos, para cada ano, e em português. Universal? Isso é coisa que não existe, apesar da ilusão, que também surgiu em 1990 sob a forma de um acordo ortográfico internacional, de uma “unificação”. Na verdade, tais textos estão escritos em legítimo português do Brasil e, por isso, neles lemos coisas que por cá se escrevem de outra maneira (e nada relacionado com ortografias): “metrô de Moscou”, “vai ao ar [o último episódio de Friends]”, “lançado videogame”, “[sonda] aterrissa em Titã”, “Microsoft lança o novo console de jogos”, “festividades de virada de ano”, “primeiro turno [de eleições]”, “pandas marrons”, “ônibus espacial”, “Copa do Mundo”, “Quênia decreta toque de recolher”, “[inaugurado] primeiro trem-bala chinês”, “governo de coalizão”, “vítima de parada cardíaca”, “terremoto”, “Madri”, “Copenhague”, “Irã”, “Teerã”, “Bagdá”, “tênis”, “Aids”, “usina nuclear”, “astrônomos”, “colisão entre trem, ônibus e caminhão”, “decolagem do aeroporto”, “restos mortais de 1.270 detentos”, “ministro do trabalho se demite após 1 mês de denúncias de propina”, “torcidas de times de futebol”, “Facebook atinge um bilhão de usuários cadastrados”, “Cuba concede anistia”, “fenômeno astronômico permite ver Vênus próximo da Lua”, “alunissagem”, “Ronaldo ganha o prêmio da FIFA”, “narrador esportivo”, “israelenses e palestinos”, “sofria de câncer”, “disparos contra policiais”, “no Marrocos”, “dezesseis pessoas”, “caminhoneiros [em greve]”, “caminhões-bombas”, “Donald Trump e Kim Jong-un fazem reunião de cúpula”, “Suprema Corte da Índia derruba lei colonial”, “primeira espaçonave a pousar no lado oculto da Lua”, “mortos após um vazamento de gás”, “contêiner refrigerado de um caminhão”, “1917 vence prêmio de Melhor Filme”, “Brigid Kosgei quebra recorde mundial de maratona”, “[astronauta] aterrissa na Soyuz MS-13”, etc.


Rui Pinto a quem interessa a longa prisão preventiva com isolamento?



Ex-ministros, escritores e deputados pedem libertação de Rui Pinto

"A aplicação da prisão preventiva - com períodos de isolamento absoluto - a um cidadão português, quatro anos depois da alegada prática de um crime de extorsão na forma tentada, é inédita em Portugal", lê-se no texto que acompanha o abaixo-assinado por dezenas de nomes.
...
A prisão de Pinto é considerada "chocante" uma vez que "contrasta com a liberdade e impunidade de quem pratica crimes com a gravidade dos denunciados pelo mesmo".
...
"Rui Pinto deverá, naturalmente, responder pelos crimes que tenha cometido, mas os signatários entendem dever manifestar publicamente a sua discordância com a sua prolongada prisão preventiva, instando as autoridades judiciárias portuguesas a pôr termo a tal situação", justificam os nomes que assinam o documento.

Sobre a música e a liberdade - um texto da 'garota não'.



Sobre a música e a liberdade

Há um ano atrás o Festival de Música de Setúbal trouxe à ordem do dia alguns dos mais inquietantes contributos a que assisti sobre a forma como a música pode ser um exercício de liberdade.

Falou-se de condição mental, doenças degenerativas, integração e dignidade. E dois dos relatos que mais me impressionaram relacionavam a música com contextos particularmente severos: prisões e zonas de guerra.

O 1.º baseava-se num estudo com mulheres reclusas: no início só participavam nas sessões para cumprir pena, poucas semanas depois desenhavam em folhas de papel oitavas de teclado onde treinavam a posição dos dedos para fazer bonito na sessão seguinte, chegando a compor as suas próprias peças e a apresentá-las publicamente.

Colheram aplausos, mas sobretudo plantaram na memória a música como corda de escalada, barco à vela, campo de flores, avião: não um ponto de fuga, mas de libertação.

O 2.º baque no peito aconteceu-me com a maneira como a intervenção de um grupo de músicos voluntários junto de crianças em campos de refugiados se manifestava na qualidade do seu sono. Porque as dinâmicas musicais em que as envolviam as fazia rir e descontraía.

Comoveu-me perceber que nos dias das sessões as crianças dormiam períodos mais longos, manifestando menos despertares súbitos (de pesadelos e traumas associados a bombardeamentos de guerra).

Eu, que nunca provei de nenhum destes quadros, posso apenas dizer que é na música que encontro também, muitas vezes, a liberdade. Porque me esvazia quando o corpo está demasiado pesado, me sossega o coração quando tudo lhe dói. Outras vezes, é também uma seara a perder de vista onde derramo todo o meu contentamento.

A música por si só não retira pessoas da prisão nem termina guerras, não acaba com recibos verdes nem com o desmatamento bruto da Amazónia. Não faz com que as mulheres deixem de ser batidas até à morte. Mas acredito que tem esta capacidade incrível de acordar e elevar consciências.

Podemos sempre – sempre – continuar a cantar amores e desamores, mas ela tem em si uma força tão transformadora que, se lhe dermos oportunidade, arrisca-se a ser um dos mais profundos e pungentes exercícios de liberdade: individual e coletiva.

A Garota Não
Música