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April 13, 2024

Mais outro Khamenei no rectângulo



Estão a sair das tocas. JMT, a dizer parvoíces para defender PPC e queixa-se que a desigualdade favorece as mulheres.

 

É mentira que as mulheres trabalhem mais em casa e ganhem menos do que os homens? Não, é totalmente verdade. 

Mas, por um dia, deixem-me continuar com a lista de desigualdades favoráveis às mulheres. Não é só na guerra. 

População prisional em Portugal no final de 2022: 12.198 reclusos. Número de homens: 11.331, quase 93%. Estados Unidos: 1.142.359 homens para 87.784 mulheres, praticamente a mesma percentagem que em Portugal. 
[então, não é difícil fazer uma pequena pesquisa sobre o crime, a nível português, americano ou mundial e constatar que mais de 95% dos criminosos são homens - nomeadamente de crimes violentos. Existem até estudos que pretendem saber se essa abissal disparidade que se observa ao longo dos tempos em todas as sociedades se deve ao cromossoma y e aos níveis de testosterona que os homens produzem. Logo, a esmagadora dos criminosos são homens e é por isso que há tantos homens presos - será que JMT queria que se prendessem mulheres só porque sim, para fazer número? Aliás até há dados que mostram que as mulheres são castigadas mais duramente que os homens, pelos mesmos crimes - talvez porque se considera natural a violência nos homens e a das mulheres uma aberração...?]

Suicídio: no mundo ocidental, os homens matam-se três a quatro vezes mais do que as mulheres.  
[como não sabemos as causas dos suicídios masculinos, não podemos tirar daí ilações, mas sabemos que apesar dos homens se suicidarem mais que as mulheres, a maioria das tentativas de suicídio vem das mulheres. Acontece que os homens escolhem meios mais violentos e eficazes para o suicídio (armas de fogo, atiram-se de pontes) do que as mulheres (comprimidos e veneno). 

Alcoolismo: mesma coisa, a probabilidade de serem homens é quatro vezes maior. 
[lá está: tradicionalmente as mulheres ficavam em casa a tomar conta das crianças e a tratar da casa, o que ainda se verifica: enquanto isso, os homens iam para as tabernas, agora vão para bares, beber sem controlo; em contrapartida, as mulheres, em vez de se entregarem ao álcool, têm taxas muito alta de depressão, comparadas com os homens. Na adolescência, a maioria das doenças mentais de ansiedade, bulimia, anorexia são das raparigas]

Drogas ilícitas, idem. 
[a mesma coisa: JMT usa o vício dos homens como um argumento de desigualdade em favor das mulheres: será que quereria que as mulheres também tivessem personalidades de dependência para haver igualdade? Não percebo então, porque não refere o facto dos clientes do vício da prostituição serem esmagadoramente homens como um factor de desigualdade a favor das mulheres]

E ainda temos a imbatível esperança média de vida: neste momento, em Portugal, está nos 78 anos para os homens e nos 83,5 para as mulheres. Cinco anos e meio de diferença. Espantoso: apesar de centenas de milhares de anos de sofrimento e de opressão masculina, as mulheres vivem bastante mais tempo do que os homens. 
[sim, as mulheres vivem mais anos, embora não se saiba porquê, mas sabe-se que vivem com pior saúde que os homens e até se sabem algumas causas: a primeira é o efeito das maternidade no corpo que envelhece o sistema biológico precocemente de maneira que os orgãos e o sistema em geral deterioram-se mais rapidamente que o dos homens; outra causa conhecida está no machismo da medicina que tem sido desenhado e pensado por homens, para homens, desde as doses de medicamentos a procedimentos médicos de maneira que a saúde das mulheres é descurada. Um exemplo de discriminação: o governo anterior decretou que os exames que têm que ver com a saúde das mulheres (ginecologia), não tem comparticipação da ADSE. A ADSE é um sub-sistema da função pública que tem uma maioria de mulheres. Talvez JMT não conheça, mas eu conheço muitas mulheres que deixaram de fazer rastreios de mama e ecografias ginecológicas por causa do preço. Já os exames específicos dos homens estão todos cobertos pelo sub-sistema... Portanto, os homens vivem menos tempo que as mulheres, mas sempre com melhor saúde do que elas, ganham mais pelo mesmo trabalho, têm melhores reformas a aproveitam a última fase da vida e pagam menos pelos seus produtos específicos - con certeza JMT já ouviu falar da taxa rosa.

(...) que a mulher tenha sido “oprimida e desprezada” ao longo de séculos é que “essas senhoras, alegadamente tiranizadas, nunca se queixavam ou manifestavam o seu desagrado”. O argumento é parvo? Sim, bastante, até porque não faltam manifestações de desagrado.
[não é pelas manifestações de desagrado que o sabemos. É óbvio que num sistema de poder masculino em onde as mulheres são mantidas economicamente dependentes dos homens não garante grande margem para queixas, sobretudo se o sistema legal legitima "esse poder natural do macho latino", como lhe chamou um juiz, não há tempo.

Porque é que há sobretudo homens na guerra? Talvez porque a Ucrânia é uma sociedade tradicionalista de base cristã. Se formos ver Israel, por exemplo, ou a China, todas as pessoas fazem o serviço militar obrigatório e as tropas estão cheias de mulheres.

Enfim, no afã de defender o ponto de vista de que as mulheres têm um lugar próprio na sociedade, que é o de estarem em casa a procriar na dependência dos homens, JMT não se importa de dizer disparates.

PPC tratou muito mal os professores e desconfio que é por sermos uma profissão de mulheres. Também desconfio que é por isso que JMT não gosta dos professores. Somos muitas mulheres que não sabem o seu lugar na hierarquia dos seres conforme os cânones da religião: Deus, anjos, homens, mulheres, outros animais, plantas, rochas.

January 30, 2024

Como é que o Público publica um artigo dum machismo tão primário e racista?




Como é que o Público publica um artigo dum machismo tão primário e racista? Este artigo defende que Michelle Obama não passa de uma mulher negra popular entre as minorias (justamente por ser negra), que não vale um chavo e só é conhecida por ter sido casada com Obama. Obama não presta porque manteve guerras e a mulher (é assim que esta machista a considera) iria ser igual, porque...  ela é só uma negra sem valor que nunca fez nada e defende o maridinho...? Isto tudo porque a Carmo Afonso é uma defensora de Putin e da sua paz terrorista com sacrifício da Ucrânia e detesta tudo o que seja americano (que deve achar ser de extrema direita) ao ponto de escrever esta sujeira ideológica machista e racista. E já agora, quem é que adorou este artigo machista e racista? MEC... que surpresa...

Michelle Obama, uma mulher negra com apelido



Esta é uma maneira péssima de referenciar uma mulher e não poderia estar mais de acordo com tal reparo. Sucede que se Michelle não fosse mulher de Obama eu não estaria a escrever sobre ela.

Carmo Afonso



September 16, 2023

Para quem não percebe bem o que é o machismo e a sociedade patriarcal, é isto:




For those of you wondering how sexual harassment of female surgeons can occur *in theatre* - may I present to you a letter in today’s @thetimes


Tradução: se tens uma profissão brutalmente stressante (imagine-se os militares...) e és homem, tens direito de fazer bullying e assédio sexual às colegas mulheres, mas se és mulher, aguentas o stress brutal da profissão e ainda o outro stress brutal de esperar que os homens se aliviem das suas m#@%&@ pessoais fazendo-te bullying e assédio sexual. Mas as mulheres é que são "snowflakes".

July 26, 2023

"Os homens ajudam a perpetuar a desigualdade"



Distribuição de pelouros continua desequilibrada. Grande maioria das vereadoras fica com ação social, educação e saúde Presidências no feminino são mais igualitárias e contrariam uma divisão tradicional de tarefas

A tradição ainda é o que era nas autarquias, com a distribuição de pelouros a perpetuar uma divisão ditada pelo género. Continuam a ser reservadas aos homens pastas como obras municipais e gestão financeira, enquanto as vereadoras ficam mais com as chamadas áreas “soft”: educação, saúde, cultura e ação social. Uma investigação da Universidade do Minho revela também que as presidentes são mais igualitárias e os homens ajudam a perpetuar a desigualdade. Mas só três dezenas de mulheres lideram as câmaras municipais.


Carla Soares, in jn.pt/camaras-excluem-mulheres-das-obras-publicas-e-financas

July 15, 2023

O extremo da sub-representação das mulheres: o Irão




Também cá as mulheres estão sub-representadas. Quando olhamos o governo, a presidência, o Parlamento, o TC e as autarquias, as mulheres são uma pequena minoria. Sempre sub-representadas. Os seus problemas sempre no fim das prioridades e, quando considerados, o seu ponto de vista é desprezado. Só no governo temos vários machistas e um dos maiores é o ME, que despreza os professores, penso, por serem uma grande maioria de mulheres.

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Um tribunal penal de Teerão condenou uma mulher acusada de desrespeitar as regras obrigatórias relativas ao hijab a seis meses de prisão, a dois anos de proibição de viajar e a frequentar seis meses de sessões de aconselhamento para tratar da sua "doença mental".

Uma fotografia da decisão do tribunal começou a circular nas redes sociais a 10 de julho, provocando a indignação dos iranianos face ao número crescente de casos contra mulheres que desafiam as leis do uso obrigatório do véu.

As mulheres desafiantes têm sido presas, intimadas pelas autoridades e enfrentado processos judiciais, e centenas empresas encerradas por não obrigarem as suas seus clientes aos rigorosos códigos de vestuário da República Islâmica.

Uma ativista civil de Teerão, que optou por não usar o hijab em público, disse à IranWire que o sistema judicial iraniano procura "humilhar as mulheres e minar os seus esforços para criar mudanças sociais".

A mulher acima referida foi declarada como sofrendo da "doença infecciosa de não usar hijab" e acusada de se envolver, por causa disso, em "promiscuidade sexual". A proibição de viajar foi-lhe imposta devido à preocupação de que ela pudesse participar em actividades "anti-iranianas" durante as viagens ao estrangeiro.
De acordo com o tribunal, desrespeitar as leis do hijab obrigatório é um comportamento "antissocial" que constitui "uma doença mental contagiosa".

O tribunal afirma que os serviços de segurança ocidentais "exploram esta doença, promovendo a sua agenda anti-iraniana no seio da sociedade iraniana".

Um amigo da mulher disse ao IranWire que ela foi julgada à revelia: "Há cerca de um mês, ela recebeu uma SMS inesperada a instruí-la para clicar numa hiperligação para ver um aviso do tribunal relacionado com a sua alegada violação do hijab. Depois de clicar na hiperligação, descobriu o texto da convocatória do tribunal, que indicava que estava a ser processada por ter retirado publicamente o hijab da cabeça e exigia que comparecesse em tribunal numa data específica".

"Ela manteve a sua inocência, explicando que não tinha cometido qualquer crime e que o lenço tinha simplesmente caído enquanto caminhava".
A fonte acrescenta que a sua amiga, que decidiu não comparecer na audiência, recebeu um SMS cinco dias depois da data marcada para a sessão em tribunal, dizendo que ela tinha sido condenada à revelia.

"Com que fundamento acusam uma pessoa de promover a devassidão e a prostituição, de ter doenças mentais e sexuais, de ser antissocial e anormal e de procurar a atenção do público?

As investigações do IranWire revelaram que o governo não suporta os custos das sessões de psicoterapia impostas pela justiça. Estas sessões são frequentemente efectuadas a um preço exorbitante por clínicas associadas ou próximas do poder judicial. "As pessoas têm de suportar os custos sozinhas e gastar um mínimo de 26 milhões de tomans (520 dólares) duas vezes por semana durante seis meses", diz uma pessoa com conhecimento do assunto.


September 26, 2021

O Cristiano Ronaldo vai de Bentley para o emprego e ninguém vê mal...

 


Namorada de Nelson Évora e medalhada olímpica arrasada nas redes por comprar carro de luxo

Ana Peleteiro respondeu aos comentários com uma citação onde aponta à inveja dos muitos críticos. Atleta tem criticado abertamente o racismo e os partidos que o incitam.

September 30, 2020

O caso do texto de Francisco Aguilar é mais grave do que parece

 


 O artigo que ele escreve foi aceite por um 'coordenador científico' e publicado numa revista de 'Ciências Jurídicas'. Quem lê o artigo fica estupefacto que esteja incluído numa revista 'científica' e tenha sido aceite por um 'coordenador científico' que mesmo sem pretensão de fazer um trabalho de peer review, revisão de pares, tem como função a manutação da qualidade académica e científica das publicações, melhorar a sua performance e, sobretudo, a sua credibilidade. Digo eu, porque o contrário seria impensável.

Quem lê o artigo do senhor Aguilar vê claramente que o artigo não tem nenhuma credibilidade científica: é um desarrazoado de ideias ao melhor estilo talibã, dum sectarismo muito à direita do Ventura, sem um único fundamento científico a suportar a linguagem ordinária os insultos que profere: nunca vi em lado algum que os termos que aplica indiscriminadamente às mulheres -nazis, porcas, assassinas, sociopatas, narcisistas, opiáceas, egoístas, desonestas, hipócritas, misandrícas, invejosas do pénis dos machos, destruidoras da civilização ocidental, futuras assassinas dos homens, etc., etc., sejam considerados científicos. Mas isto são conceitos científicos? O único argumento que o senhor oferece é a crença em Deus e as mulheres são julgadas com base na crença que ele tem numa entidade divina qualquer? Desde quando Deus é um argumento científico numa discussão qualquer? 

O que me parece muito grave neste caso, para além de ficarmos a saber que a Faculdade de Direito de Lisboa, que assumíamos ter dignidade e prestígio ser governada por homens que detestam mulheres e acham normal divulgar textos que denotam um machismo primário ao nível do Trump, ou pior, é os próprios pensarem que este tipo de textos têm, 'densidade cultural' e qualidade científica suficiente para serem publicados numa revista de 'Ciências Jurídicas' com um coordenador 'científico'. 

Não admira o descrédito em que andam as ciências humanas e sociais, se os indivíduos que deviam cuidar da qualidade do conhecimento são os primeiros a dar podium a pessoas e textos de crendice popular. A quantidade de vezes que já discuti com pessoas que dizem que as 'ciências humanas e sociais são só conversa de cultura geral sem objectividade ou operacionalidade' e que argumentei a favor da seriedade e objectividade do trabalho das ciências humanas e depois ficamos a saber que os decanos da faculdade são os primeiros a minar o seu próprio campo de estudo dando voz a parolos beatos sem cabeça. 

António Menezes Cordeiro, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e diretor da revista onde o artigo foi publicado diz que este é um "texto assinado que responsabiliza apenas o seu autor" [não senhor, foi aceite numa publicação da faculdade que se arroga científica, logo quem o aceitou é responsável] e que esta é uma "revista científica de circulação estrita", com critérios definidos para a publicação de textos: " têm que ter nível científico, devem ser autênticos, originais, e ter determinada apresentação gráfica". Exigências que já levaram à recusa de "vários textos".

"Ninguém levou a sério aquela conversa, o texto tinha uma certa densidade cultural, foi interpretado como uma crítica de tipo literário a algum extremismo no setor do feminismo"

"Ninguém levou a sério aquela conversa". Isto é, o homem é um tonto que ninguém leva a sério mas os seus textos, abaixo de qualquer critério mínimo de cientificidade e reveladores de uma mente beata, sem um mínimo de objectividade, são publicados numa revista pretensamente 'científica'. 
Se calhar ainda é aconselhada aos alunos que mesmo confusos, com o nível brejeiro e carroceiro da linguagem do senhor em causa, ficam na dúvida, dado que o texto vem legitimado pelo professor catedrático que o aceitou e pôs em divulgação, mesmo que restrita.

Se o director da revista aceita este texto por ter valor e diz que já recusou outros nem quero pensar o que seriam os outros.

E se este é o nível da mentalidade dos professores que orientam os destinos da faculdade, estamos tramados em termos de futuros advogados e juízes.
"Os decanos da faculdade queixam-se que o pedido de demissão do coordenador científico por parte do ex-director é ofensivo para o grupo das 'ciências jurídicas'. Estes decanos argumentam que o "debate de ideias, quando oportuno, deve processar-se com elevação universitária..."
Porque o senhor Aguilar é mestre em 'elevação universitária'...

Nunca pensei que o nível da faculdade estivesse neste patamar. Isto é o resultado do primismo de que sofrem as nossas universidades? Metem lá os primos, amigos e amantes, em vez de seleccionarem pessoas com nível intelectual e cultural. A decadência das universidades, sobretudo as de ciências sociais e humanas, vai de vento em popa.

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Jorge Duarte Pinheiro, docente e antigo diretor da Faculdade de Direito (em 2014/2015), diz ao DN que o tipo de pensamento expresso neste texto "não é um caso isolado" na instituição. "Há aqui uma escola", embora habitualmente seja "mais subtil", diz ao DN, questionando que "magistrados e advogados vamos ter" com este tipo de formação, para mais numa universidade pública prestigiada. Duarte Pinheiro ressalva que "não se pode tomar a parte pelo todo, nem a maioria dos alunos, nem a maioria dos professores tem esta forma de pensar", mas diz que "quem tem o poder material" na Faculdade de Direito"tem um pensamento anacrónico".

Jorge Duarte Pinheiro adianta que já pediu a demissão do decano coordenador científico do Grupo de Ciências Jurídicas e diretor da revista - António Menezes Cordeiro - e voltou a insistir no pedido. "Normalmente sou ignorado", acrescenta.

A posição deste professor abriu, entretanto, um novo foco de controvérsia na Faculdade, com o grupo de decanos (os professores mais antigos da Faculdade) a emitir um comunicado em que referem que Jorge Duarte Pinheiro emitiu "dentro e fora da Faculdade de Direito de Lisboa uma série de afirmações gratuitamente ofensivas em relação ao Decano da Escola e do Grupo de Ciências Jurídicas".

"Os problemas internos da Faculdade resolvem-se nos seus órgãos próprios, democraticamente eleitos", refere o comunicado, acrescentando que o "debate de ideias, quando oportuno, deve processar-se com elevação universitária e nunca na base da intriga, da injúria ou da difamação".

September 07, 2020

"Há normas para viajar num transporte público. Fique sabendo que não tem condições para viajar assim. Anda aí a provocar os homens todos!".

 


"Anda aí a provocar os homens todos!" - como sabemos até há 100 anos, quando as mulheres andavam todas tapadas da cabeça aos pés, não havia assédio nem violações... Isso só aconteceu quando começaram a mostrar as pernas ou peito... aliás, como é do conhecimento de todos, nos países do Médio Oriente onde as mulheres andam todas tapadas com burcas não há assédio nem violações...

Pois, há normas para viajar e uma delas devia ser a obrigação do revisor (para além de pagar multa à mulher) fazer e ficar aprovado numa formação sobre direitos humanos, assédio e machismo. 

Se um homem viajar com a camisa toda aberta o revisor, mesmo que seja gay, não lhe diz nada, porque um homem ter um corpo é normal e não o faz para ofender ninguém. Já a mulher ter um corpo, é uma provocação e um descaramento pelo qual se devia desculpar e esconder.



"Ainda bem que não está frio ou as mamocas constipavam-se”, terá dito o funcionário da CP.

Uma passageira do comboio que fazia a ligação entre Carrascal e Tomar, no sábado passado, acusou um revisor da CP de assédio e apresentou queixa à empresa e “às autoridades competentes”.

A situação foi denunciada pela própria nas redes sociais. “Quando fui abordada pelo revisor que no final de me cobrar o bilhete (que demorou bastante porque estava mais interessado em olhar para o meu peito do que para a máquina) disse o seguinte: - "Ainda bem que não está frio ou as mamocas constipavam-se”, revelou Sara Sequeira.

“Isto dito por um homem na sua hora e local de trabalho! Isto não é um comportamento normal em nenhum lado muito menos num sitio onde sou cliente”, acrescentou.

A passageira contou ainda que disse ao revisor que o seu “comportamento foi nojento. No mínimo deveria pedir desculpa”, mas segundo a própria não foi isso que aconteceu depois. “Mas não!!! ainda diz que eu é que ando aí a provocar os homens?”.

“Fui apresentar queixa às autoridades competentes porque este tipo de atitudes devem ter consequências para quem as pratica. Não se calem. Não deixem estas coisas passar em branco. Somos livres de andar de vestido fora e dentro de um comboio!!!! Estamos no século XXI! Chegaaaaaaaa de nos massacrarem com este tipo de comentários, de provocações, de toques, de assédio!”, lê-se no texto que acompanha um vídeo, onde é possível ouvir-se o funcionário da CP, confrontado pela passageira, a dizer: "Há normas para viajar num transporte público. Fique sabendo que não tem condições para viajar assim. Anda aí a provocar os homens todos!".


July 26, 2020

Equívocos e contradições de Fernanda Câncio



FC começa logo por tratar as pessoas como estúpidas dizendo que a maioria pensa que poder é um termo que se restringe a governo ou muito ricos e que não percebem que toda a estrutura social está marcada por relações de poder. Esse é o primeiro equívoco, partir do princípio que é uma elite entre ignorantes.

Em seguida fala de 'cultura de cancelamento' dando o exemplo da carta assinada pelos 153 intelectuais americanos que terá sido motivada, em sua opinião, pela polémica à volta dos tuítes de J.K. Rowling sobre a expressão, 'pessoas que menstruam' no âmbito de uma campanha de produtos higiénicos (tradicionalmente chamados femininos). Esse é o segundo equívoco de FC porque J.K. Rowling, ao falar acerca do assunto, está a dar voz às pessoas que critica e não a silenciá-las. Ora, a cultura de cancelamento é justamente o oposto: trata-se de silenciar pessoas não lhes dando voz, tirando-lhes a voz ou ignorando-as como se não existissem. 
Não estou aqui a concordar ou a discordar da opinião de J.K. Rowling, estou a fazer notar que criticar (entenda-se criticar como um processo analítico) e argumentar são modos de dar aos outros um estatuto de igualdade e por isso a crítica e a argumentação estão presentes em democracia e não em ditaduras.

Cultura de cancelamento era -e ainda é- o que se fazia aos negros e às mulheres e não só, que eram ostracizados e ignorados, quer dizer, nem sequer se lhes reconhecia voz. Como se faz em muitas culturas de modo generalizado.

 Ora, J.K. Rowling dá voz aos seus opositores a partir do momento em que os reconhece como interlocutores, mesmo que seja para criticá-los. A reacção dos opositores que se sentiram atingidos não foi a de argumentar e criticar mas de chamar-lhe nomes e peticionar para que fosse ostracizada. Imediatamente apareceram pessoas a dizer que se recusavam a trabalhar com ela ou a participar na edição dos seus livros. Nem um argumento contra, apenas castigo. 
Cá em Portugal também se escreveu uma carta aberta a pedir que calassem o André Ventura por ser fascista. Não me lembro de ver FC criticar essa carta como critica esta. Será porque está de acordo com o conteúdo da carta? Esse é o equívoco e a contradição: sermos a favor de cartas abertas que mandam calar alguém de que não gostamos e contra cartas abertas que pedem para que se possa falar do que não gostamos.

Como a FC muito bem sabe, hoje-em-dia o twitter tornou-se uma guilhotina e nos EUA, sobretudo, um professor universitário, um dirigente de uma empresa, um autor, etc, ser acusado de racismo ou homofobia ou machismo, sem um único argumento que seja, dá origem a despedimentos sem apelo nem agravo, porque, felizmente, os que não tinham voz, agora têm, mas, infelizmente, às vezes usam-na exactamente da mesma maneira que os antigos opressores usavam:  mandam calar e castigar. Tem havido casos escandalosos. Não me parece que isso seja um benefício social, que melhore o racismo, a homofobia, a transfobia, o machismo ou outro 'ismo' qualquer.

Há muito me confunde o tipo de raciocínio que combina uma defesa maximalista da liberdade de expressão com a aflição face às reações - também discursivas - de desagrado que certas expressões de liberdade ocasionam. Esta frase não é séria pois ninguém, e FC sabe-o, defende a total liberdade de expressão. É difícil e complexo saber onde está a linha de demarcação entre liberdade de expressão e abuso, mas ninguém defende que possa dizer-se tudo e mais alguma coisa, de modo que basear uma argumentação neste falso princípio de que as pessoas que defendem a liberdade total de expressão querem calar os oprimidos está manchada de equívoco e falsidade, logo nos pressupostos.

Finalmente, FC admira-se que pessoas que são feministas possam assinar uma carta contra 'oprimidos', em seu entender. De facto, muita gente, e a FC é uma dessas pessoas, pelo que lemos nas suas crónicas de jornal, abstêm-se de criticar as mulheres, sendo mulheres, os gays, sendo gays, os negros, sendo negro, os políticos de esquerda, sendo de esquerda, os partidos de direita, sendo de direita, etc. Para essas pessoas, eu estar aqui a criticar a FC, uma feminista, é um erro. Como nunca devia ter criticado a Lurdes Rodrigues ou esta Ministra da Saúde ou outra qualquer mulher, porque na opinião dessas pessoas, se critico mulheres estou a dar armas ao inimigo, por assim dizer. Só que a mim parecem-me esses serem são maus princípios para se construir uma sociedade mais justa e igualitária e não critico ou elogio pessoas na base do sexo, cor, credo, orientação política, etc.

Liberdade de expressão e de crítica, que estão na base de uma cultura de 'não cancelamento' e não opressão, só se preservam e fortalecem se defendermos regimes políticos que as valorizem, desde logo dando voz às pessoas, dando instrumentos de controlo à oposição, valorizando vozes críticas, dando força à imprensa livre. Não me lembro de uma única vez, sequer, ter lido crónicas de FC a criticar governos que se destacaram na censura de opositores, na tentativa de controlo dos meios de comunicação social, nem sequer me lembro de ler críticas a indivíduos extremamente machistas da esquerda, ou mulheres ministras que usavam do cancelamento para calar tudo e todos. Dir-me-à que nas suas crónicas fala do que quer. Pois, é exactamente isso a liberdade expressão. Não estou de acordo com ela neste aspecto (embora concorde com muitas das suas crónicas) mas defendo o seu direito a falar do que quer, como quer.

No que me diz respeito sou a favor de argumentar e criticar e não de mandar calar. Já me tentaram calar muitas vezes à força, com bullying, com calúnias vergonhosas. Continuei a falar. Nunca na minha vida colaborei para que alguém deixasse de ter voz. De vez em quando tenho alunos muito racistas e machistas. Podia, pura e simplesmente, mandá-los calar e não lhes dar voz, como vejo outros fazerem. Não deixo que ofendam ninguém, mas não os mando calar. Argumento e obrigo-os a argumentar até que não tenham argumentos. E faço isto uma e outra vez com muita paciência e sem me irritar até que são os próprios a reconhecer que não têm razão. Alguns são teimosos e nunca dão o braço a torcer mesmo não tendo argumentos. Não fico a embirrar com eles por causa disso. São fruto de uma educação e sei muito bem não consigo chegar a todos e há quem não goste mim... A diferença entre mim e a FC é que, muito provavelmente, a FC entende que a mera opinião racista ou machista deles já é, por si, ofensiva para essas minorias, e que isso é razão suficiente para os mandar calar. Não é a minha maneira de pensar.

Lembro-me de um deputado do Parlamento Europeu, há pouco tempo, ter defendido no plenário que as mulheres deviam ganhar sempre menos que os homens pela razão de os homens, serem, obviamente, mais inteligentes que as mulheres. Houve logo petições para o destituir, como castigo de ser tão machista e de o PE não querer que se pense que ele é representativo da casa. A questão é que ele é mesmo representativo pois representa todos os que votaram nele. O que é preciso mudar é a mentalidade das pessoas que votam em homens como ele e não cancelá-lo. 

Estou convicta que para se mudar as mentalidades de maneira sólida e não provisória, é preciso persistência e resistência, argumentos convincentes, firmeza e coerência, coragem. Acredito na educação como modo de melhorar as sociedades, mas não à força. Pela palavra. É preciso atitude filosófica de distanciamento e paciência para perceber que a sua luta de hoje vai ser aproveitada, não por si, mas pelos que vieram depois. E que até podem deitar tudo a perder. 


Embora falar de "cancel culture", então
Fernanda Câncio

Não é fácil consciencializar que a despeito dos nossos sentimentos, das nossas ideias e intenções, fazemos parte de uma estrutura de poder. Até porque para a maioria das pessoas, aparentemente, "poder" é sinónimo de governo ou cargo político ou muito dinheiro; a ideia de que existem relações de poder historicamente codificadas na estrutura social e cultural, que essas relações nos precedem e transcendem e estão inscritas na linguagem, por exemplo, tem sido, como se sabe, objeto de enorme resistência - aquela que se tem erguido face ao que é denominado de "politicamente correto" e também ao que tem sido referido como "cancel culture", duas noções relacionadas entre si.

É sobre essa denominada "cultura de cancelamento", representada como associada à esquerda, a carta aberta surgida a 7 de julho no site da revista americana Harper com o título "Uma carta sobre a justiça e o debate livre". Assinada por 153 intelectuais, muitos deles vistos como de esquerda, e incluindo os escritores Salman Rushdie (o qual, recorde-se, foi alvo em 1989 de uma fatwa do então supremo líder do Irão, aiatola Khomeini, sentenciando-o à morte por causa de Os Versículos Satânicos), Margaret Atwood, J. K. Rowling e Martim Amis, a histórica feminista Gloria Steinem e o filósofo Noam Chomsky, adverte para aquilo que identifica como "restrição do debate, seja por um governo repressivo ou uma sociedade intolerante" e "o clima de intolerância que se instalou em todos os quadrantes", considerando que "a troca livre de informação e de ideias, sangue vital de uma sociedade liberal, está a ser mais constrangida a cada dia que passa".

A escolha da expressão "sangue vital" ganha uma tonalidade sarcástica se soubermos que a carta surge um mês após J.K. Rowling, autora de Harry Potter, ter sido acusado de transfobia na sequência de uma série de tuítes nos quais reagia à frase "pessoas que menstruam" (a qual refere o facto de haver homens transexuais que têm o período, assim como hermafroditas ou outras pessoas que não se identifiquem como mulheres), ironizando: "Estou certa de que existia uma palavra para isso, qual era?" Perante a maré de críticas, manteve a sua posição: "Conheço e amo pessoas trans, mas apagar o conceito de sexo impede que muitos possam falar das suas vidas. Não é ódio dizer a verdade."
...
Há muito me confunde o tipo de raciocínio que combina uma defesa maximalista da liberdade de expressão com a aflição face às reações - também discursivas - de desagrado que certas expressões de liberdade ocasionam. E mais me confunde ainda que quem repita "palavras são só palavras, não são ações", se transtorne com tempestades tuiterianas (a última vez que vi, o Twitter é feito de palavras), protestos vocais ou mesmo apelos a boicote. Raios, isso não é tudo palavras? Tão palavras como dizer que uma mulher trans não é uma mulher, ou que só as mulheres menstruam, e que se menstrua é mulher - o que é afinal uma forma não particularmente subtil de boicotar vários grupos de pessoas, recusando-lhes o direito a definir a sua identidade e, decorrentemente, a, como a minha amiga, entrar numa casa de banho identificada com o género com que se identificam.

Assim, o que Rowling fez, do seu considerável lugar de poder, foi participar no "cancelamento" daqueles grupos de pessoas - grupos de pessoas historicamente perseguidas, anuladas, obliteradas, assassinadas. E o que esta carta faz, ao afirmar que há menos liberdade discursiva e de debate hoje, é fazer de conta que antes não havia grupos inteiros de pessoas "canceladas", sem direito a voz ou a sequer se autonomearem, e que esse cancelamento, derivado de estruturas relacionais de poder que se perpetuam, não continua a subsistir.

Para dar um exemplo que vai ao encontro das preocupações feministas de Rowling, basta atentar ao que sucede às mulheres no espaço público - à forma como são sistematicamente alvo de tentativas de intimidação, humilhação e silenciamento (ou seja, cancelamento) através da perpetração de violência, seja ela simbólica, discursiva ou física. Como explicou Alexandria Ocasio-Cortez de forma cristalina esta semana no Congresso dos EUA, essa é ainda hoje a realidade das mulheres, incluindo das que como ela ocupam "lugares de poder".

Que haja feministas a assinar uma carta na qual se certifica existir menor liberdade de debate porque os historicamente oprimidos e silenciados agora falam, se irritam e contra-atacam, disputando o poder, é mesmo muito deprimente.

July 13, 2020

Isto é um erro tão grande



Why does philosophy have a problem with race?

Unthinkable: Racist views must be confronted honestly, says philosopher Aislinn O’Donnell




No longer can one pretend that the Enlightenment figure David Hume was speaking out of character when he ranked black people as “naturally inferior to the whites”. Nor can one pass off Immanuel Kant’s lowly regard for “the Negroes of Africa” as an aberration. Nor indeed can Voltaire’s anti-Semitism and offensive baiting of non-whites be treated like a minor blip in an otherwise unblemished intellectual record.

As John Gray writes in his book Seven Types of Atheism, “Voltaire’s racism was not simply that of his time. Like Hume and Kant, he gave racism intellectual authority by asserting that it was grounded in reason.”

Philosophy has largely been taught through the eyes of male, pale thinkers. Is it time for an overhaul?

Aislinn O’Donnell: “Philosophy departments’ lack of diversity when it comes to both curricula and staff
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Querer ajustar contas com os filósofos por terem sido racistas. Também foram machistas. Ainda ontem fui dar com uma frase de Hegel -A mulher pode ser educada, mas sua mente não é adequada às ciências mais elevadas, à filosofia e algumas das artes- chocante. Hegel viveu até quase meados do século XIX. Mas pior que Hume, Kant ou Hegel serem racistas ou machistas, são os autores contemporâneos ainda o serem. Na semana passada li um livro de Byung-Chul Han, um pensador coreano que vive e ensina na Alemanha, chamado, A Agonia de Eros. O autor fala da tendência actual de se reduzir os sentimentos a emoções e afectos positivos e superficiais e da importância da negatividade no que é autêntico e conclui dizendo que o amor se efeminou... quer dizer, as mulheres só são capazes de emoções fúteis e pueris e infectaram os homens com essa incapacidade. Que diabo! Como não podemos partir do princípio que o indivíduo não se dá conta do seu machismo, só podemos concluir que não se dá conta da sua estupidez. No entanto, o livro tem muitas ideias que me parecem válidas e certeiras. É claro que este indivíduo não é Hume, nem Kant, nem Hegel. É só um pensador. Para mim um filósofo é outra coisa. Mas eu aproveito do livro as ideias que me parecem bem pensadas e não renego o que me parece bem pensado só porque o homem é um machista idiota. Nem percebo essa maneira de pensar. Se fossemos a rejeitar os autores machistas, em todas as áreas da cultura, sobravam uns cinco...

Tem que se aceitar que os homens, e em particular, os brancos, na generalidade, sobretudo de uma certa idade, têm uma grande incapacidade de se des-subjectivarem, são muito auto-centrados e por isso falta-lhes compreensão e respeito pela alteridade da humanidade. 

A ideia de que os filósofos são sábios está tão impregnada na mente que em geral não se lhes perdoam estes erros. Ou melhor, não se lhes reconhecem erros, de modo que estas particularidades de carácter aparecem como pecados que têm que ser constantemente purgados.

O que interessa dizer vinte vezes que os filósofos eram racistas ou machistas? Ou que viveram num tempo de colonizadores e que não rejeitaram essa visão, até a aceitaram? Basta sabermos uma vez. 
É mais importante tentar perceber porque é que essas pessoas que tão bem pensam em tantas dimensões da realidade, não conseguem pensar-se fora da cultura que os formou e livrar-se dos seus preconceitos. Isso e diversificar os departamentos que, como se diz no artigo, têm uma falta de diversidade que não ajuda ao debate de ideias.

Não me faz mossa nenhuma ler as barbaridades que esses indivíduos, e até algumas mulheres, dizem sobre as mulheres. Hanna Arendt, numa entrevista que anda no YouTube, diz que as mulheres que têm profissões masculinas perdem a feminilidade ou algo do género, agora não me recordo ao certo se eram as profissões se era outro aspecto. Era uma mulher com um intelecto muito forte mas com uma mentalidade, em muitos aspectos, do seu tempo e não estava habituada a ver as mulheres a fazerem certas coisas e essa visão colidia com a sua estética de vida. Isso não retira valor ao seu pensamento, embora seja uma pena, claro.

Na verdade, o que me surpreende são aqueles que escaparam ao 'enformamento' das suas pessoas no processo de socio-endoculturação. Um dia li um livro italiano de memórias, do fim da Idade Média, escrito por uma mulher. Já não me lembro que livro era. Acho que é duma colecção que tenho de livros escritos por mulheres de outras épocas. A mulher contava que os pais a casaram muito nova, com 14 anos ou 15. O marido tinha quase 40 anos. Na noite do casamento o marido disse-lhe para ela não se preocupar que não ia forçá-la a dormir com ele, que esperava até ela ser mais velha e estar preparada. Que achava mal os pais casarem as raparigas muito novas, que era uma grande violência. Disse-lhe que não tinha pressa em ter filhos e que se os pais perguntassem ela que dissesse que estava tudo bem. Ela falava disto com um grande carinho por ele e lembro-me de ter ficado estupefacta. Parecia um discurso actual e invulgar, mesmo nos nosso tempos. Não estamos à espera que um homem, sobretudo em tempos remotos, tenha esse tipo de compreensão, de capacidade de se des-centrar, de respeito e delicadeza. 

Ainda hoje, a maioria dos homens de uma certa idade são machistas, paternalistas e vêem as mulheres como 'pessoinhas' de modo que esperar que outros de outros séculos fossem capazes de ver fora do seu tempo, é um exercício inútil e, quanto a mim, errado. É uma perda de tempo e não se ganha nada em sabedoria com isso. Uma pessoa não  deita fora as pinturas de Gaugin só porque ele era um porco esclavagista e um ordinário. Sabemos que o era. Podemos pôr uma nota informativa ao lado das suas pinturas, para ajudar à verdade do autor, mas isso não retira valor às pinturas. 

Hume, Kant e Hegel eram pessoas d seu tempo, por muito que isso nos custe, mas isso não retira valor às suas obras.

June 13, 2020

Violência contra estátuas 'versus' violência contra pessoas



Este homem fala do assunto como se fosse uma questão estética, sabendo nós todos que não o é. Põem-se estátuas de pessoas nas ruas e praças públicas para homenageá-las no pressuposto que prestaram serviços à Pátria, que a honram. É um reconhecimento público como a medalha da Ordem do Infante ou algo do género. É por isso que não há estátuas de Hitler no espaço público, apesar de ele ter mandado fazer muitas e de bom gosto estético. Se uma pessoa praticou actos odiosos, criminosos, qual é a razão de o homenagearmos publicamente? Nenhuma. Dizer que as estátuas de pessoas que cometeram crimes odiosos devem ficar por terem valor estético é fingir que não se percebe o problema.

Este indivíduo, George Floyd, cuja morte filmada foi a gota de água, é constantemente citado por ter um passado de pequena delinquência, mas aquele rapaz branco que violou uma colega, há um ano e maio, aproveitando-se de ela estar embriagada e a deixou caída, inconsciente e meio nua atrás de um caixote do lixo, na universidade de Yale, se não me engano, levou 3 anos de pena suspensa porque o juiz considerou que era de boas famílias e tinha um futuro promissor. É um violador promissor, sim. Isto é o pão nosso de cada dia.

Que as pessoas revoltadas contra o racismo tenham deslocado a sua agressividade para as estátuas e não para outras pessoas parece-me um mal muito menor e é significativo que ao fim de menos de 15 dias de protestos onde se sujaram e estragaram meia dúzia de estátuas a sociedade já esteja pelos cabelos e faça como este senhor que chama acéfalos aos que protestam e os compara, a eles e não aos que matam, efectivamente, pessoas e não estátuas, ao Daesh. 

O cardeal Fernando Niño de Guevara, pintado por El Greco não está na praça pública, está dentro de um museu e se não há nenhuma placa a explicar quem ele foi e o contexto da obra, devia haver.

A questão é complexa. Há homens que não podiam estar em cima de estátuas, publicamente: foram criminosos, praticaram actos criminosos, traficaram escravos, foram cruéis esclavagistas. Já Descartes dizia que um dos problemas da humanidade está em que se educa os mais novos na veneração dos violentos da história e não nos bons exemplos. 

Depois há outros, como o Padre António Vieira que defendeu os índios mas também defendia a escravatura por questões económicas, embora nunca tenha tido escravos e não parece correcto condená-lo por crime de pensamentos.

No entanto, compreendo a revolta. Há um tipo que há um par de anos escreveu no Expresso que a sociedade, diga-se os homens, devia vedar o empregos às mulheres até elas produzirem, pelo menos, 2 filhos, como se faz noutro país qualquer, mas é claro que isso não se podia fazer, dizia ele, porque as feministas haviam de fazer um escândalo. Isto é defender a escravatura das mulheres. Imagine-se que ele dizia que a sociedade devia vedar o emprego a negros até eles produzirem não sei o quê. Que diriam? Que ele defende a escravatura. Pois, é a mesma coisa. Ele continua a escrever alegremente grandes barbaridades no mesmo jornal. Não defendo que lhe façam mal, pois seria condenar alguém por crimes de pensamento, mas que é revoltante e triste que o jornal dê emprego a um tipo que sonha com a degradação das mulheres a escravas procriadores dele e seus capangas, ah isso é.

Também Churchill defendia que os negros e outros são raças inferiores, mas isso é o que ele pensava e não o que fazia. E, na verdade, ele foi alguém que prestou grandes serviços à Pátria dele e não só.
Hoje li umas respostas de Spike Lee a actores e realizadores acerca deste assunto e a certa altura perguntaram-lhe onde viveria se não vivesse na América: em Brooklin, disse, porque não imagina viver noutro sítio senão naquele país que inventou a democracia e que é melhor que os outros e é excepcional, etc. Portanto, um indivíduo que se queixa, com razão, dos que assumem e agem no pressuposto de que a raça dele é inferior, é ele mesmo veículo de ideias de haver povos superiores e povos inferiores.

(um aparte - ontem ouvi umas duas ou três horas de entrevistas do congresso americano a umas pessoas por causa do impeachment e vários vezes falaram do excepcionalismo americano. Eles estão mesmo convencidos que são um povo superior...)

Por conseguinte, as coisas são demasiado complexas para reduzir as pessoas a acéfalos ou bárbaros. Do lado dos que mandam e têm mais contas a prestar, há muita cegueira e recusa de ver o óbvio. O príncipe belga defendeu o Rei Leopoldo II, um ladrão e criminoso que fez coisas inomináveis, dizendo que ele nunca foi ao Congo e por isso não é responsável por nada do que lá se fez em seu nome. Isto é revoltante e a revolta de vez em quando transborda.
As pessoas não gostam de ver o transbordo e queixam-se mas nunca se queixam do transbordo dos outros, os que praticam a violência contra essa pessoas, dia após dia, ano após, ano, década, após década, século após século.

A sociedade funciona com o racismo, o etnocentrismo e o machismo em default. A máquina está programada para descriminar e tratar como cidadãos de segunda classe, os negros e outras etnias e as mulheres. Há excepções, sim, mas são isso mesmo, excepções.
Se se quer mudar este estado de coisas não se pode deixá-las correr por si, porque elas não se corrigem sozinhas, visto que os que estão no poder e têm vantagens não querem abdicar delas.
A quantidade brutal de homens incompetentes e intelectualmente menores que ocupam cargos só se percebe quando percebemos que o default da máquina social são eles. De modo que é preciso ir mexer nas configurações da máquina e assinalar todas as caixas e não apenas uma, como agora acontece.
E quem não vê isto e só vê um lado da questão, é cego e agrava os problemas.

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... a vandalização de monumentos que em algum momento passaram a ser vistos como símbolos nefastos por parte de determinadas dinâmicas políticas, sociais, religiosas, ou de defesa de um gosto preestabelecido.
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O tema é antigo e sempre perigosamente recorrente, mostrando à saciedade quão acéfalo é o pendor dos homens para a violência gratuita e quão frágeis para lhe resistir são as obras de arte e os monumentos da História
...Com máximo propósito, estas palavras ganham sentido face aos actos de violência contra obras de arte – os monumentos públicos, as estátuas e os memoriais – que, nos últimos dias, se têm multiplicado em várias cidades do nosso planeta, e também em Portugal, na onda dos sentidos protestos contra a repressão xenófoba nos EUA.
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O iconoclasma é sempre um acto inadmissível, e não se resume naturalmente aos atentados do Daesh, ou dos talibans, contra museus, monumentos e demais patrimónios da humanidade, pois se alarga às atrocidades dos senhores do mundo nas guerras de cobiça contra populações inteiras para pilhagem e controle dos seus recursos.
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Pergunto: não aprendemos nós todos com a História? Parece que não sabemos, mas devíamos saber, que todas as obras de arte (independentemente da sua maior ou menor qualidade estética) são sempre trans-contextuais e, mais!, estão isentas de culpa pelos desmandos da cegueira humana. Vamos retirar de exposição pública no Metropolitan Museum de Nova Iorque o excepcional retrato do Cardeal Fernando Niño de Guevara, pintado por El Greco (c. 1600), porque o retratado é uma figura infame, responsável por inúmeras fogueiras inquisitoriais, coisa que aliás o próprio pintor bem sabia, deixando na tela a impressão da sua antipatia pelo modelo? 
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Vitor Serrão


Se os telemóveis entrassem dentro de portas



... como agora entram dentro de qualquer detenção policial com imagens de vários indivíduos negros a serem mortos pela polícia, o abalo seria tal que nem 10 anos de protestos chegavam.
Se entrassem pelas casas adentro para se ver os homens a espancarem e matarem mulheres e filhos (e nisto não há raça que faça pior ou melhor); pelos escritórios adentro para se ver chefes, patrões e outros em cargos de poder a assediarem e abusarem de raparigas e de mulheres, nem 10 anos de protestos chegavam. Vivemos numa cultura de assédio sexual. É essa a educação que os homens têm desde que nascem e tudo, desde o comportamento dos pais, à literatura, filmes e jogos, acabando na publicidade o reforça em vez de combater. 


A ex-estudante [de Harvard] publica nas redes sociais uma mensagem, desde então replicada milhares de vezes, com a proposta indecente que recebera de um professor quase oito anos antes. Num correio eletrónico datado de 21 de julho de 2012, Gary Urton, então diretor do Departamento de Antropologia, reputado especialista da época pré-colombiana, propunha “algo mais íntimo” do que um almoço para discutir a investigação da então aluna do doutoramento de Arqueologia Antropológica.

“E se fôssemos para um quarto de hotel com uma garrafa de vinho e passássemos toda uma tarde à conversa e em explorações?”, “sem qualquer pressão; apenas a possibilidade de algo potencialmente muito especial e único”, escrevia Urton...


Ao longo da extensa investigação do “Harvard Crimson”, 72 mulheres — a maioria alunas ou ex-alunas — denunciam os abusos a que foram submetidas por parte de altos responsáveis daquele Departamento, desde propostas indecentes a toques, beijos e mesmo pressões repetidas para manter relações sexuais “não consentidas”. (Expresso)

January 08, 2020

O machista de serviço




Ele bem tenta disfarçar mas volta e meia trai-se. Não me lembro de alguma vez ele ter falado de João Soares como, o menino do papá.

Ascensão e queda da menina do papá

Daniel Oliveira