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April 17, 2024

Os alunos às vezes surpreendem-nos

 


Hoje, ainda a propósito de valores e porque queria que percebessem que há uma diferença entre fazer juízos de facto -descrever objetivamente as situações- e juízos de valor mostrei, numa turma, esta pintura de Francis Bacon, que é um auto-retrato e perguntei-lhes o que seriam capazes dizer sobre a obra.

"É estranha", diz logo um. "Está tudo fora do sítio" diz outro. Volta-se um miúdo e diz, "ele não estava a fazer o retrato da sua cara, mas do seu lado emocional. Se calhar é como ele se sentia por dentro. Todo fora do sítio". Confesso que não estava à espera desta observação. O miúdo tem 15 ou 16 anos. Os alunos às vezes surpreendem-nos

Porque gostamos do ensino

 

Na segunda-feira passada, numa das turmas do 10º ano, dei à turma uma ficha de auto-determinação de valores fundamentais. Estamos a trabalhar essa questão dos valores e estamos na parte dos valores serem guias de acção na vida. Desafiei os miúdos a dizerem, por ordem, quais as 5 'coisas' que mais valorizam na vida. Alguns ofereceram-se para dizer e escrevi no quadro essas listas. Diziam mais ou menos a mesma coisa, embora em ordem diferente: a família, os amigos, o amor, a saúde, o dinheiro, a justiça ou a independência. Depois de as escrever inventei cenários para cada uma das listas em que tinham de tomar decisões difíceis entre a família e o amor, por exemplo, ou o dinheiro e a saúde, de maneira a levá-los a alterar constantemente a ordem dos seus valores ou até a ter que substituir valores por outros diferentes. O meu objectivo era que tomassem consciência da facilidade com que atraiçoamos valores que pensamos fundamentais, ao sabor das circunstâncias. Dei-lhes uma ficha (falei dela num posto anterior) para saberem auto-determinar os seus 5 valores fundamentais e como transformá-los em guias de acção para a vida. A ficha ajuda a responder à questão de saber, 'quem sou eu, como me vejo, no trabalho e na vida e com que valores me oriento'. A ficha ficou interessante e os miúdos compenetraram-se muito e em completo silêncio, naquela tarefa de descobrir quais são os seus valores fundamentais. No fim da ficha perguntei se alguém queria partilhar os seus 5 valores e duas alunas partilharam. Uma delas tinha como 2º valor, o 'poder', o que foi inesperado, do meu ponto de vista, mas interessante. A outra tinha em primeiro lugar, 'fazer a diferença'. Enfim, lembrei-me que podia fazer outra actividade que respondesse à questão, 'como é que os outros me vêem', o que se desvia um bocado do tema filosófico em discussão, mas pareceu-me que era interessante e de algum modo completava bem a ficha, porque os miúdos estão numa idade da adolescência em que precisam de referências para o auto-conhecimento - e vinha a propósito. Então propus-lhes uma actividade que faço às vezes nas aulas de psicologia, que consiste em cada um escrever o seu nome numa folha em branco e a folha passar por todos para que escrevam um valor positivo referente a cada um dos colegas. Meu Deus! A excitação que isto causou... Isto é numa aula às três da tarde em que eles geralmente já vêm muito cansados e estão meio moles, mas aquilo foi uma espécie de injecção de adrenalina. O alarido que a actividade causou... Quando saí da escola vi grupos deles com as folhas na mão a mostrarem uns aos outros o que estava escrito nas suas folhas, ainda em grande excitação sobre o assunto (espero que tenham ficado a pensar na questão dos valores). E é por isto que gostamos do ensino. 


April 11, 2024

Diário de bordo - Trabalho

 

Estou aqui há três horas a meio-inventar ('meio' porque fui-me inspirar numa ideia de um professor de filosofia americano e juntei-a com um exercício que faço às vezes com os alunos - ando há 4 ou 5 dias a pesquisar ideias) uma ficha sobre o tema dos Valores para tornar as coisas mais interessantes, porque se é tudo muito teórico e eles não vêem aplicação prática, desinteressam-se. 

Tendo em conta que os adolescentes -e suspeito que muitos adultos- tomam decisões meio à balda e sem consciência de quais são os seus valores fundamentais e se estão a realizá-los ou a atraiçoá-los nas suas acções, o que significa uma vida com propósito incerto, resolvi fazer uma ficha para ajudar os miúdos a avaliarem-se nessa dimensão e determinarem os seus valores fundamentais. Depois escolher cinco, pô-los de modo a poderem retirar deles um guia de acção, ordenados por prioridades e que finalmente devem colar num sítio onde esteja sempre visível quando tenham que tomar decisões: no ecrã do PC, como fundo do telemóvel ou que seja. Deu muito trabalho para ficar um bocadinho desafiador mas não demasiado trabalhoso ao ponto de desencorajar e, acima de tudo, útil - acho que ficou fixe.


April 08, 2024

Hoje dei aos alunos uma tarefa difícil




Hoje começámos a abordagem do tema dos Valores e passámos a aula toda a discutir cenários e a problematizar hipóteses ligadas com o tema. Discutimos os problemas do subjetivismo dos valores e da questão cultural associada. Lemos uma carta de Bertrand Russel a Sir Oswald Mosley (mais abaixo).

Sir Oswald Mosley, fundador e líder da União Britânica de Fascistas, pediu a Bertrand Russell (que escrevia nos jornais contra o fascismo), pouco tempo antes do seu 90º aniversário, para ir discutir consigo os méritos do fascismo enquanto organização social.

Bertrand Russel recusou, como se lê na carta. Os alunos perceberam a recusa dele. Porém a questão que pus aos alunos é a seguinte: se todos se recusarem a discutir com os adversários assumindo que é impossível estabelecer um campo comum e se em vez disso nos cancelamos ou bloqueamos uns aos outros, o que nos acontece enquanto sociedade? Como tomamos decisões em assuntos fundamentais? 

Tarefa difícil: pensar em soluções para ultrapassar as incompatibilidades que derivam do subjectivismo dos valores. Discutir o assunto com os pais, os amigos... basicamente chatear toda a gente com o assunto e aparecer com ideias, mesmo que pareçam absurdas.

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Carta de Bertrand Russel a Sir Oswald Mosley:


“Caro Sir Oswald,

Obrigado pela sua carta e pelos anexos. Reflecti um pouco sobre a nossa recente correspondência. É sempre difícil decidir como responder a pessoas cujo ethos é tão estranho e, de facto, repelente ao nosso. Não é que eu não esteja de acordo com os pontos gerais apresentados por si, mas porque cada grama da minha energia tem sido dedicado a uma oposição activa ao fanatismo cruel, à violência compulsiva e à perseguição sádica que tem caracterizado a filosofia e a prática do fascismo.

Sinto-me obrigado a dizer que os universos afectivos que habitamos são tão distintos e, no fundo, opostos, que nada de frutuoso ou sincero poderia resultar da nossa associação.

Gostaria que compreendessem a intensidade desta convicção da minha parte. Não é por qualquer tentativa de ser rude que o digo, mas por tudo o que valorizo na experiência humana e na realização humana.

Com os melhores cumprimentos,”

Bertrand Russell


September 25, 2023

Pensar



Vou levar estas três frases para estas aulas de início do 10º ano. Este ano tenho turmas do 10º ano. São difíceis porque é preciso partir muita camada de verniz que trazem da educação da sociedade e das redes sociais que lhes embotou o espírito. Fazê-los ver e compreender por dentro que aquilo que julgam serem opiniões próprias e pensamentos sobre as questões são meras arbitrariedades cheias de pré-conceitos e vulgaridades sem nenhuma qualidade. 

Estamos a falar do pensamento, de como se progride de um pensador inconsciente e insipiente que nem sequer se dá conta de que há problemas para um pensador crítico excelente, o que implica interiorizar metodologias com padrões de qualidade do pensamento até que se tornem um hábito sem esforço consciente. Então, estamos a abordar os padrões a que deve obedecer o pensamento para fazer essa progressão.

Leva muito tempo. Ao contrário das outras disciplinas que têm e conhecem desde há anos, a Filosofia é uma coisa nova e ainda por cima estranha, muito diferente das outras disciplinas - tudo é discutido e esmiuçado até não haver mais nada para clarificar e eles não terem dúvidas, porque preciso que 'vejam' que esta metodologia não é apenas uma obrigação para tirar boas notas a Filosofia, mas sim um caminho para pensar bem, em qualquer área do conhecimento ou da vida.

Tenho que exemplificar, provocar as respostas deles para depois as desmontar nos seus erros e falhas. É um processo difícil porque muito resistem. Vêm com aqueles clichés do conhecimento estar já todo na internet à distância de um clique. Numa das aulas da semana passada usei frases do Eça para mostrar a diferença entre informação e conhecimento e como se pode extrair conhecimento da informação dada.
É difícil mas é um desafio interessante.

Pois estas frases que tirei do texto do post anterior vão servir muito bem para a aula de hoje. A primeira é uma provocação: que interessa pensar se não se chega a lado nenhum? vai servir para perceber que muitas vezes as perguntas são mais importantes que as respostas. As outras duas vão servir para enfiar o diálogo dentro da alma, como diria Platão, quer dizer, treinar a instrospecção e o aviso contra si próprio. Vamos ver.

o pensamento é "por natureza, uma actividade sem resultados"  [diria mais, sem uma paragem final, como uma viagem de comboio com imensas paragens, ramais, linhas paralelas e sem um destino final]

o pensamento é um diálogo entre interlocutores internos - um diálogo que se desenrola silenciosamente dentro de mim, entre mim e mim próprio"
 
pensamento requer, portanto, algo como uma democracia interna"



May 15, 2023

Alguns médicos tiraram o curso na universidade das cavalgaduras

 


Hoje perguntei a uma aluna, que tem estado mal, o que se passava quando veio entregar-me uma justificação de faltas. Disse-me que anda há um mês com um caroço no peito, que tem andado no hospital aqui da cidade de médico para médico, ninguém lhe sabe dizer o que é, marcaram-lhe exames para fim de Agosto (!) e entretanto o primeiro médico que a viu disse-lhe que, dado haver casos de cancro na sua família, podia ser um cancro da mama... !?! mas isto é coisa que se diga a uma miúda de 16 anos assim de chofre? Antes de fazer exames, antes de saber qualquer coisa objectiva? Chiça. Há médicos que tiraram o curso na universidade das cavalgaduras... a rapariga anda num estado de ansiedade brutal, escusadamente.


May 05, 2023

Coisas boas

 


Hoje entreguei uma medalha de mérito a uma aluna, em nome da escola. A medalha é entregue aos 3 melhores alunos da escola, desse ano de escolaridade. Portanto, ela está no 11º ano e a medalha refere-se ao 10º ano. Tirei-lhe uma fotografia com a medalha, na aula, para me memória futura, dela e da EE a quem enviei a fotografia. Não a ponho aqui porque não pedi autorização. É inteiramente merecida, não só porque é uma excelente aluna como também é uma rapariga muito bem formada enquanto pessoa.
Esta turma onde ela está, no ano passado tinha três alunos que a estragavam um bocado porque arrastavam uma meia-dúzia atrás para a dispersão e porque eram ainda muito infantis. Os alunos chegam agora ao 10º ano muito novos e muito infantis. No ano passado foi uma direcção de turma muito complicada, porque foi preciso resolver muitos conflitos e problemas sérios de uma maneira que não desconcentrasse a dezena de alunas que já mostravam ter um potencial muito bom e de maneira a não deixar os mais fracos resvalar para a desmotivação. Este ano cresceram, desses três, dois saíram e a turma concentrou-se e ficou uma turma bastante boa - são interessados, provocadores, participativos, argumentativos, concentrados, persistentes e bem educados. Nunca se queixam da quantidade de trabalho e têm sentido de humor que é uma característica essencial para podermos estar durante dois anos imensas horas juntos de maneira proveitosa. Foi uma turma que veio de menos a mais, o que é, de todas as situações possíveis, a melhor. É uma espécie de Passacaglia de Handel naquele crescendo que satisfaz.



November 07, 2022

Nunca há duas aulas iguais

 

É uma das coisas que gosto nesta profissão. Estou a começar o tema da filosofia da religião e hoje comecei por contextualizar o tema no programa do 11º ano, que é todo focado na epistemologia, de maneira que a questão implícita é: qual é o lugar de Deus no mundo actual da tecnociência? 

Antes de entrar no tema, propriamente dito, pus os alunos a dizer que conceitos lhes vêm à mente quando pensam em Deus e na religião e escrevi uma nuvem de 'tags' a serem abordadas ao longo do trabalho. O programa de filosofia da religião é redutor e segue a 'lógica' da abordagem dos temas em geral nesta nova orientação: que argumentos a favor e que objecções. Só que eu prefiro uma metodologia em espiral -para usar o termo do formador do mini-curso que fiz na semana passada- que vá avançando em círculos cada vez mais abrangentes, sem perder a ligação ao fundo e, já que falamos no tema, discutimos as questões que interessam aos alunos, cuja maioria professa uma religião.

Fiz isto nas duas turmas do 11º ano e os resultados foram diferentes, de maneira que, à medida que iam dizendo palavras e íamos discutindo a introdução delas na nuvem, a discussão tomou sentidos diferentes em cada uma das turmas. Nunca há duas aulas iguais. 

Numa das turmas tenho um aluno muito engraçado. Perguntou-me como podia tornar-se eloquente e eficaz a discutir as questões, mas de uma maneira rápida. lol  Respondi-lhe que é como ter 5 anos e perguntar como pode ter já 21 mas sem ter que passar pelos 6, 7, etc. 'Como é que a professora faz?' Leio, leio, leio e discuto com outras pessoas. 'Mas isso leva tempo. Tenho que ler, não basta pensar?' Não, se quer argumentar um assunto com eloquência e eficácia tem de ter bons e bastantes conhecimentos sobre o assunto, senão não tem conteúdo para desenvolver argumentos e contra-argumentos e, já agora um bom vocabulário para a questão da maleabilidade mental, senão nem as palavras tem para defender as suas ideias. 

Este é um dos grande problemas da educação: todos, a começar pelos ministros, falam como se a aprendizagem e a educação fossem imediatas - tens uma aula de cidadania e transformas-te em bom cidadão; tens 45 minutos por semana de inglês e ficas a falar inglês; dás 300 faltas a matemática mas ficas a saber de matemática; fazes um questionário online e tens imediatamente a solução. Depois os miúdos não têm noção (nem os pais muitas vezes) que assimilar, acomodar e transformar informação em conhecimentos é um processo lento e trabalhoso durante muito tempo. 

Enfim, tirei uma fotografia dos quadros nas duas turmas porque tenho de garantir que não fica nenhum conceito por discutir, enquadrar, etc. No fim espero que saiam deste mini-curso de filosofia da religião com organização conceptual, algumas respostas e pistas para pensar.





May 11, 2022

Estas coisas é que têm valor na profissão

 


Hoje, uma colega de Biologia, num intervalo , veio ter comigo e perguntou-me se no ano que vem dava Psicologia. Disse-lhe que não porque estou com turmas do 10º ano e para o ano estou com as mesmas turmas no 11º ano. Ahh, disse, pois foi o que eu disse aos pais. - Pais? Estivemos a falar de ti na minha reunião de pais. Vários dos pais foram teus alunos no ano da turma da Marlene e do Bruno -lembras-te?- e no ano anterior noutra turma. (claro que me lembro e tenho alguns no FB. O Bruno encontro-o de vez em quando na Gulbenkian) É que estávamos a falar das opções que eles vão escolher no 12º ano e os pais disseram-me que já tinham falado com eles. Que eles queriam uma disciplina onde desse para tirar boas notas mas onde se aprendesse algo novo e que queriam escolher a Psicologia, mas que queriam que eles te apanhassem como professora porque adoraram as tuas aulas 😍💪 de maneira que queriam que te perguntasse se ficavas com eles. 

Estas coisas é que têm valor na profissão, porque o resto... os governos, o salário, as injustiças, as perseguições que uma pessoa sofre e outras cenas fazem da profissão um deserto onde ninguém quer entrar... mas os alunos? Ah, isso vale a pena.

Tenho uma turma onde os alunos, um em particular, acha que sou uma espécie de conselheira de sabedoria e então todas as aulas faz perguntas... engraçadas, às vezes impertinentes. Mas não é por mal. Então hoje, a falar no de Stuart Mill e no princípio filosofia dele, a felicidade da maioria, que é o objectivo da acção ética, e estando a falar no que é para ele a felicidade -o prazer ou ausência de dor- perguntou-me, 'oh, professora, como é que sei se sou feliz? Que critério devo usar para aferir da minha felicidade?' E falámos disso e depois perguntou-me se eu acreditava na felicidade e eu disse que não acredito na felicidade plena como coisa permanente, mas que acredito em momentos felizes e em desenvolver recursos internos para saber gerar momentos de prazer em momentos de crise e infelicidade. Então e quem não tem esses recursos, como faz? Aprende a desenvolver. E quem não é capaz? Bem, disse, alguns acabam no psiquiatra a pedir medicação, mas há outros maneiras de lidar com o problema antes de ir aí.—No anos 70 os músicos não buscavam esses estados na droga, perguntou? - Sim e muitos morreram antes do 30 anos à conta disso. —A professora já procurou na droga esse estado de felicidade? — What?? Não lhe parece que essa pergunta é impertinente? Pediu desculpa. Não foi por mal, disse, foi por curiosidade. Não lhes falei no Aldous Huxley que defendia o uso de drogas como portal para certo tipo de experiências porque são muito novos e  o mais certo era perceberem de uma maneira inconveniente. Mas disse-lhes que não preciso de tomar cenas para ver cenas porque tenho a imaginação e outras coisas. Isto foi mesmo no fim da aula e tocou para sair. Mas todos as aulas há perguntas sobre cenas que levam a outras cenas.


January 26, 2022

Diário de bordo

 


Hoje a aula, numa das turmas, foi diferente. É uma turma onde a maioria dos alunos tem sempre algo a dizer 🙂 e todos gostam de perguntar e de discutir. Um dos alunos, já não sei a propósito de quê disse que tinha andado a ler sobre os estóicos e gostava da perspectivas deles sobre a vida [portanto, anda a pensar no sentido da vida]. Ninguém na turma sabia quem eram os estóicos e ele explicou o que tinha lido sobre o que eles pensavam ser o sentido da vida. Isso deu alguma discussão. Depois perguntou-se se eu era estóica e disse-lhe que não - quis saber porquê. A seguir pergunta-me qual é, então, o sentido da vida. Disse-lhe que não é algo que uma pessoa possa ditar para as outras, que cada um tem que construir o seu sentido e que a Filosofia pode ser uma grande ajuda nisso. Diz uma, 'tenho tempo de pensar nisso'. Contei-lhe o caso do meu ex-aluno que faleceu há menos de um mês devido a uma cena que alguém lhe pôs na bebida. Ficaram calados. Depois um diz que gostava de morrer atropelado porque é poético. LOL Fartei-me de rir. É claro que lhe disse que não há poesia nenhuma em morrer atropelado. É um sofrimento horrível. 'Mas é poético, dizia ele, deixamos a vida conscientes de que é tudo um sofrimento. [bem...]O que eu gostava mesmo era de não morrer, diz outro. Pois, digo, eu, lamento desiludir, mas isso... not gonna happen de maneira que o melhor é começar a pensar na direcção que quer dar à sua vida. Diz outro, 'pensar? O meu lema é mesmo não pensar muito e fazer as coisas com boa disposição, com os amigos'. —Ah, isso de se ter boa disposição na vida geralmente requer uma muita experiência e boa dose de pensamento, digo eu, mas pode tornar-se um epicurista. 'Epicurista? Isso é o quê? Explique, explique'  🙂 Estes miúdos são muito vivos e têm muito potencial humano.


October 17, 2021

A propósito desta tabela

 


Estava numa turma na semana passada e estávamos a falar do que são os problemas humanos e a questão do sentido da vida estar ligado à felicidade foi trazida à colação por uma miúda e eu disse, 'não sei o que entende por felicidade'. Depois perguntei à turma qual é a ideia deles de felicidade. Uma aluna disse logo, 'não acredito que haja uma coisa que dê toda a felicidade. Há várias coisas que vão dando felicidade'. Um rapaz disse, 'para mim a felicidade está ligada a atingir objectivos'. Outra aluna, 'para mim a felicidade é ter paz' (percebi logo tanta coisa desta aluna...); outra: para mim é estar bem com os outros e sentir-me bem'; outro: precisamos de ter coisas para podermos depois tratar de procurar a felicidade'. As respostas foram todas neste tom. Tenho expectativas muito positivas com esta turma.

Há qualquer coisa de esperança no mundo quando vemos miúdos no começo da vida já tão engagées.



January 13, 2021

Nunca sabemos de onde vêm as lições

 


Tenho na lista de amigos do FB muitos ex-alunos. Um deles é um rapaz que foi meu aluno há uns 13 ou 14 anos, numa turma de um curso de Desporto. A turma era terrível no 10º ano e arranjou tantos problemas aos professores que ninguém os suportava, de modo que só eu e outro professor ficámos com eles no ano a seguir. Por essa altura já me dava tão bem com eles que nem me passaria pela cabeça largar a turma. No 10º ano, no entanto, por duas ou três vezes me fizeram perder a cabeça e nessas alturas em que me fazem perder a cabeça, que são raras, mas acontecem, tenho a tendência de me saírem pela boca fora muitas verdades, ditas à bruta e, pior, ditas às vezes com sarcasmo corrosivo. Lembro-me de perder a paciência várias vezes com este rapaz e uma das vezes com uma frase que ainda hoje me persegue. Não dava nada por ele. Pois agora, quase todos os dias ele e a vida dele me batem na cara, por assim dizer. Não é que tenha um sucesso extraordinário, mas tem uma boa vida. É casado, tem uma filha e está à espera de outro filho. Ele e mulher gostam mesmo um ao outro e apreciam-se. Isso vê-se. Trabalha com imenso entusiasmo, sempre sorridente e bem disposto. O tipo de pessoa em que se tornou é algo que nunca esperaria. Erro meu a ajuizar. Vejo-o por lá pelo FB com frequência e de cada vez que o vejo, vejo o meu erro. É um marcador pedagógico. Uma grande lição.


November 12, 2020

dos alunos

 


A minha turma de artes mandou-me um mail, assinado, os procrastinadores :) com muitas saudades e muitos beijinhos. Também tenho saudades, que eles são muito engraçados. E beijinhos também, porque não?


June 17, 2020

dos alunos. - coincidências




Na turma do 12º ano andamos a trabalhar o tema das relações entre as pessoas e os grupos e a propósito disso abordamos as teorias de Gordon Allport sobre o preconceito e a discriminação, quer dizer, como se passa de um para o outro. E ele tem a ideia que uma maneira de atenuar os preconceitos ou mesmo, fazê-los desaparecer, passa pelo aproximar das pessoas, já que, enquanto não conhecemos as pessoas de perto elas são categorias estereotipadas, mas quando começamos a conhecê-las nas suas características pessoais, apercebemos-nos da sua complexidade individual e torna-se difícil manter os preconceitos iniciais. [esta é uma das razões porque nunca percebi que se enfiassem imigrantes em guetos em vez de os espalhar no meio dos outros] Nem de propósito, fui dar com este artigo sobre um indivíduo que faz grandes baixas no KKK com esse princípio de aproximar-se das pessoas, falar com elas, etc. Muito interessante, a experiência que ele conta nesta entrevista.
Hoje também falámos de conflito e cooperação e é claro que o conflito que está na ordem do dia entre a polícia e as populações vem mesmo a calhar. É sempre preciso cuidado a falar destas coisas nas aulas. Tenho alunos filhos de polícias, um da PJ.
Estou a uma semana de acabar as aulas com o 12º ano. Três anos e agora acaba-se assim... isto chateia-me e incomoda-me.

May 19, 2020

dos alunos



Hoje tive uma aula/sessão com uma turma com miúdos muito queridos. Na semana passada aborreci-me com eles porque ninguém tinha lido um texto, tarefa que era necessária para discutir uma questão. Aborreci-me um bocadinho com eles... o que foi uma estupidez, uma estupidez, mesmo... o que interessa uma pessoa aborrecer-se? Não é assim que se resolvem as coisas... enfim, entre essa aula e a de hoje deixaram na plataforma pedidos de desculpa e hoje apareceram na sessão com uma pontualidade ao segundo, a perguntar como tenho passado, sempre muito solícitos, todos a participarem. Depois disse-lhes que na quinta não há aula porque vou o dia todo para o hospital. Mandaram imensas mensagens de motivação. Muito queridos estes miúdos. Vou ter que pensar num desfecho muito positivo para as turmas, para ficarem com a satisfação de ter valido a pena este trabalho em confinamento - os que trabalharam.

March 21, 2020

dos alunos



A minha turma do 12º ano está agora a enviar-me trabalhos - o prazo de entrega é hoje porque aquilo é muita coisa e tenho que classificar e comentar até quarta, o mais tardar, de modo que amanhã é dia de trabalho. Acho que já disse aqui uma vez que estamos (estão) a fazer um livro de Psicologia do 12º ano, com umas aulas diferentes do que é costume. Infelizmente, como tenho aulas com eles às quartas à hora do almoço e como tenho tido montes de coisas -consultas, endoscopias e outras porcarias- marcadas para essa hora em Lisboa já faltei meia dúzia de vezes às aulas deles e vamos atrasados na matéria. Não é grave.

Agora mesmo um grupo enviou-me um trabalho. Não o partilho porque não é meu e não é público senão punha-o aqui. Ainda não o li mas já o abri o e percorri as páginas só para ver se havia alguma coisa desconfigurada. Está espectacular na apresentação gráfica, mas conhecendo eu o grupo e tendo já visto o que fizeram no 1º período, há-de estar muito bom no conteúdo também.

O que acho piada é que tenho esta turma desde o 10º ano e nessa altura não dava grande coisa por eles, de início. Trabalhavam pouco, chegavam atrasados, não tinham noção nenhuma de rigor e de brio... achavam-me extremamente exigente e arrogante porque diziam palermices que achavam que me iam chatear e em vez disso eu gozava e fartava-me de rir...  ahah  Chegámos a meio do ano a darmo-nos muito bem.

Quem os viu e quem os vê... quando olho para o trabalho deste grupo e me lembro das coisas péssimas que faziam no 10º ano. Só não é inacreditável porque já vi isto acontecer tantas vezes que já me parece normal. Digo muitas vezes às turmas, no 10º ano, para guardarem o primeiro trabalho que fizeram, para no fim do ano ou no ano seguinte olharem para ele e perceberem o que progrediram. Os que fazem isso depois riem-se e escandalizam-se com os pseudo-trabalhos que faziam. É giro, isto :)

January 14, 2020

dos alunos




Hoje estive numa turma, muito simpática, por sinal, a explicar como avaliar a verdade, falsidade ou contingência lógica de fórmulas proposicionais e depois dei-lhes uns exercícios para fazerem. A certa altura, diz uma rapariga que entrou agora para a turma, 'Oh, meu Deus! Estou a sentir-me tão inteligente! Percebi tudo à primeira e estou a saber fazer tudo!' 🙂

November 06, 2019

dos alunos




É difícil trabalhar com as turmas de Humanidades do 10º ano. Têm imensa dificuldade em perceber tudo que não seja concreto. Hoje vi-me grega para que percebessem que uma dupla negativa corresponde a uma afirmativa. Dei 20 exemplos diferentes. O que acontece é que a turma, para além de ter alunos que passaram os últimos anos sem professor disto ou daquilo, durante meses, às vezes todo o semestre (como no caso da Geografia) tem alunos muito novos, com 14 anos ou 15 acabados de fazer. Entram na escola aos 5 anos e como vão sempre passando, saibam ou não saibam, chegam ao 10º ano demasiado cedo e sem as ferramentas mentais mais básicas.
Dei-lhes um pequeno exercício lógico só para perceberem como é comum pensarmos sem rigor lógico  a partir de informações incompletas que completamos com inferências abusivas. O exercício tem um texto pequenino sobre um homicídio, um corpo encontrado num jardim e a prisão e interrogatório de suspeitos. Depois, fazem-se afirmações que eles têm que classificar como verdadeiras, falsas ou duvidosas. Quase todas as afirmações eram duvidosas porque dúbias relativamente às informações que o texto nos fornece. Punham verdadeiro em todas e não percebiam porque eram duvidosas. Foi difícil.

Depois é uma turma completamente passiva, tentam não fazer esforço algum para pensar. Como o esforço para perceber e raciocinar sobre hipóteses em abstracto é muito grande para a idade/maturidade que têm, cansam-se rapidamente. Para piorar as coisas a turma é enorme, está no limite possível e isso torna impossível fazer certos trabalhos de modo individualizado.
Acho que a Filosofia devia ser dada no 11º e 12º anos quando já são um bocadinho mais velhos.