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July 25, 2022

Filmes - On the Basis of Sex

 



Calhou hoje rever este filme, On the Basis of Sex, sobre a advogada e juíza do Supreme Court dos Estados Unidos, Ruth Bader Ginsburg, que morreu há um ano e tal.
Já tinha visto o filme, mas mais para ver como ela (eles, porque o marido também argumentou) argumentou o caso da discriminação de género no Supremo Tribunal, o que mudou a lei e fez jurisprudência. Hoje vi o filme na totalidade. 
Ruth Ginsburg foi uma mulher notável, mas o marido dela também. Eram ambos estudantes em Harvard, ele dois anos à frente dela e ela uma das três mulheres do seu curso. Isto no início dos anos cinquenta do século passado. O Dean da faculdade era um machista empedernido e um parvalhão profissional.

Quando ela começou a estudar tinham já uma filha e ajudavam-se um ao outro, repartiam todas as tarefas, dentro e fora de casa. Nesse ano ele ficou doente com um cancro testicular, fez várias cirurgias e radiação, numa altura em que os tratamentos eram ainda mais bárbaros do que são hoje e a esperança de sobrevivência era de 5%. 
Para além de cuidar dele e da filha enquanto ele esteve doente, o que foram mais de dois anos, ela assistia às suas aulas e às aulas dele. Ia às aulas dele tirar apontamentos e buscar bibliografia e depois dactilografava-lhe os trabalhos, entregava, tratava de tudo. Enfim, fez dois cursos ao mesmo tempo. Foi a primeira no seu curso.

Ele sobreviveu à doença (veio a morrer de cancro cinquenta anos depois) especializou-se em direito fiscal, foi logo contratado e era um advogado brilhante. Ela não conseguiu que ninguém a contratasse por ser mulher, o que lhe diziam na cara, de maneira que foi dar aulas para uma Universidade em Nova Iorque onde ambos vivam.
Quando ela pega no caso que mudou a lei, foi ele que a desafiou e juntou-se a ela na defesa do caso, contra a opinião da firma dele que achava que ia ser um fiasco que iria dar mau nome à firma. O resto é história.

O que achei interessante neste filme foi a perspectiva. Normalmente estes filmes de advogados focam-se na pessoa e na seu trabalho e passam-se muito dentro dos tribunais, mas este filme dá-nos o contexto da carreira dela. 
Ela e o marido faziam um casal extraordinário. Numa época em que estava escrito na lei que as mulheres deviam estar em casa a tratar das crianças e em que os homens tratavam as mulheres como se fossem crianças de três anos, o marido dela tinha uma maneira de ver o mundo e uma mentalidade que ainda nos dias de hoje é difícil de encontrar. 
Não sei se ela teria conseguido tudo o que conseguiu sem o apoio dele, porque ela teve tantos obstáculos e ninguém a levava a sério por ser uma mulher, apesar de ser a primeira do curso, assim como ele não teria chegado onde chegou -ou talvez nem tivesse acabado o curso- sem o apoio dela quando esteve doente.

Fui pesquisar se as coisas eram mesmo assim porque ele parece ser demasiado bom para ser verdade. Mas era mesmo assim, não é uma idealização romântica à americana. Isso impressionou-me mesmo porque eram um casal com as suas coisas, claro, mas com um respeito mútuo e uma capacidade de se ajudarem e compreenderem um ao outro, uma fé um no outro, raras. Um filme muito inspirador.





Ruth Ginsburg and Marty Ginsburg

July 17, 2022

Filmes - Persuasion

 


Este filme, baseado na obra de Jane Austen, não lhe faz justiça, o que é uma pena, porque o filme é muito bonito: as imagens do campo e dos bosques ingleses, de Dorset, dos interiores. 

O filme quis explicar-nos Jane Austen com termos modernos, como se fossemos idiotas e não soubéssemos transpor a obra para o tempo actual. Por exemplo, Anne Elliot apresenta-nos a sua irmã mais nova, olhando para a câmara e dizendo-nos para tomarmos atenção a três sintomas que mostram o seu narcisismo. Isto empobrece o filme. Austen é uma excelente observadora do comportamento humano, das suas lutas internas e mostra-os em toda a sua complexidade através da acção das personagens. Não precisamos de intérprete. Isto é o pior do filme, tentar estar em dois tempos históricos ao mesmo tempo e usar o actual para explicar o tempo da obra: acaba por não estar, nem num, nem noutro.

O outro erro, a meu ver, está na superficialidade. O filme parece adoptar o tom de folhetim da série Bridgerton, que é, ironicamente, uma imitação em tom muito sentimentalista, de Austen. Pois este filme imita Bridgerton, desde logo pelo tom da narradora que dialoga com a câmara. Só que Jane Austen não escreve folhetins, as suas personagens são densas e complexas. Persuasão é uma obra que começa oito anos depois da personagem, Anne Elliot, ter rompido o noivado com Wentworth, por influência da família, por ele ser um homem comum e sem dinheiro. Desde então ela tornou-se uma pessoa calma, por fora, mas dilacerada por dentro, muito fechada na dor, sempre numa angústia e tensão insuportáveis. Isso é invisível no filme. Wentworth também é um homem que vive na dor e no ressentimento. Também não passa no filme. Tudo muito superficial.

Uma pena. Belíssima música, cinematografia muito boa, bons actores, mas uma má adaptação da obra.


July 03, 2022

Filmes - Falling for Figaro


 

Este filme está listado como uma comédia romântica um bocadinho pirosa -nos comentários- mas não é isso que vejo nele, apesar de ter humor e romance também. É sobre uma jovem mulher americana, uma brilhante gestora de fundos que num ponto alto da sua carreira quando lhe dão uma promoção de peso, decide abandonar tudo para ser cantora de ópera porque adora ópera. Então, muda-se para uma aldeia nas Highlands da Escócia onde uma amiga lhe indicou uma ex-diva da ópera transformada em professora de canto, meio-reformada. E começa a ter lições para entrar num concurso importante que lhe dará acesso a uma carreira.

Millie, como se chama a rapariga, não tem família, nem contexto de nota. Fez-se a si mesma. Sabemos que se tornou uma gestora de fundos por precaução, para poder ter uma carreira com acesso a uma vida boa e confortável. Porém, assim que alcança o que desejava percebe que não quer passar a vida a fazer uma coisa que não lhe dá prazer nenhum, só dinheiro, tendo que renunciar àquela que é a sua verdadeira paixão: a ópera. E, sendo uma pessoa com muita auto-confiança, inteligência e já bastante dinheiro, resolve ir viver a sua paixão.

O mundo da ópera é um mundo muito snob e ela tem de vencer muitas resistências, nomeadamente o elitismo da professora, uma ex-diva falida que a aceita como aluna porque lhe cobra uma fortuna, mas ela está decidida a não desistir. O resto é a história do filme.

O que cativa no filme é ser uma história de redenção, uma história do valor vencer o hábito e a distância social. Uma rapariga americana, sem família nem connections fura o muro social com a sua inteligência e paixão. A competição dela na aldeia é o filho do dono do pub local que tem uma excelente voz de barítono e tem lições com a ex-diva há muito tempo, estando toda a aldeia a torcer para que ele vença o concurso e com ele essa barreira social do nascimento e possa fugir da pobreza local.

Quem faz de Millie é Danielle Macdonald, uma excelente actriz de quem gosto bastante e que sai fora do formato enlatado americano, desde logo porque veste o tamanho 16 (pelo menos) e, contrariamente ao que é costume nas mulheres grandes, não faz filmes sobre ser gorda - aquelas comédias brejeiras a que destinam estas actrizes. Quem faz de ex-diva é Joanna Lumley, uma atriz capaz de fazer comédia com subtileza e com um sotaque completamente snob.

O filme é amoroso: amor pela vida, amor pelo canto, amor pelas pessoas.

June 14, 2022

Para quem não sabe o que foi o Holodomor

 


Está a começar um filme no canal Cinemundo exactamente sobre isso. Não vou ver todo porque acaba tarde e amanhã tenho que levantar cedo, mas já o vi e é muito bom.

Por acaso este é outro filme e até nem o vi.


June 10, 2022

A Aparição

 


Está a passar num canal da TV chamado, 'amc' a Aparição, de Vergílio Ferreira. Passado em Évora, onde ele ensinou e eu morei -e estudei- durante cinco anos. Filmado na cidade e no Liceu de Évora que agora é a Universidade. Vou ver, menos pelo filme que para espreitar as coisas que reconheço.


May 07, 2022

Filmes - «Memória»

 


No dia em que se comemora o silêncio, um filme centrado num ruído. Este filme, passado na Colômbia, centra-se numa mulher estrangeira que começa a ouvir um ruído que mais ninguém ouve e que parte à procura do significado desse ruído. No entanto, o filme não é sobre o ruído mas sobre nós enquanto seres e a nossa relação com mundo, a Natureza e o Universo. Não tem música e a sua banda sonora são os sons da Natureza, da cidade, dos seres humanos. Mais do que descrever ou explicar o filme mostra a Natureza, as construções humanas e o próprio ser humano como caixas de ressonância onde as vibrações do Universo ficam retidas, discos duros que guardam toda a informação do que é. Depois, nós, humanos, podemos ser como antenas que captam essas camadas de milénios de experiências em qualquer cenário ou objecto (o som que ela ouve, por exemplo) e nunca perdermos o «diálogo» com a [nossa] Natureza ou podemos estar perdidos no ruído superficial do mundo, sempre com filtros entre nós e entre nós e o mundo, incapazes de o apreciar ou pensando que os momentos em que o apreciamos, esses momentos de ruptura com o «normal» são loucuras, alucinações, alienações. A arte vem daí, dessas visões de alucinação, a música vem dessas alucinações sonoras. Como cada um pensa, imagina e sente cada coisa é tão individual -cada um com as sua vibrações, ressonâncias e colecções íntimas de traumas- que a comunicação é difícil. 

Este filme é muito polissémico e penso que terá muitas interpretações consoante quem o vê.


May 02, 2022

Gaslit, uma mini-série

 


A série é baseada no podcast Slow Burn de Leon Neyfakh e é sobre o escândalo Watergate. O que diferencia a série de outros filmes sobre o Watergate é o facto de ser, não um desenvolvimento dramático do género policial político, com as grandes personagens do jogo -o rei, a rainha e os bispos- na construção da conspiração, mas sim uma sátira negra que incide sobre os cavalos e os peões.

A série é contada a partir do ponto de vista da personagem de Martha Mitchel, uma célebre sulista e vedeta social, mulher do Procurador Geral de Nixon, John N. Mitchell. Martha Mitchel, de quem nunca tinha ouvido falar, era uma mulher exuberante e desbocada que estava sempre nas notícias por dizer o que pensava dos políticos e das políticas do seu partido, o que causava, amiúde, grandes embaraços ao governo e, evidentemente, ao marido. Foi ela quem primeiro ligou o nome de Nixon ao caso Watergate e fê-lo publicamente de maneira que obrigou o marido a uma escolha de lealdade entre ela e o Presidente e acabou fechada e isolada num quarto de hotel na Califórnia, guardada por seguranças e impedida de ver notícias e de falar à imprensa. Daí o nome da série, a relembrar o famoso filme de George Cukor com Ingrid Bergman.

Acompanhamos John Dean, um típico político menor sem grandes escrúpulos sempre a tentar ver o melhor ângulo para vender os seus talentos e conseguir aproximar-se das cúpulas do poder; Gordon Liddy, um zelota do FBI que comanda a operação de assalto à sede de campanha do Partido Democrata e outros peões menores. 

A série mostra-nos o ridículo e o patético das personagens políticas nos seus jogos de enganar e de ganhar vantagem sobre os adversários, o absurdo das situações, a cegueira dos lacaios que vêem no seu líder alguém mais que humano e a pequenez moral dos grandes actores políticos que governam os países. A farsa que a maioria representa para si mesmo e para os outros. Uma trágicomédia onde pessoas menores e fúteis envolvidas em jogos labirínticos nos corredores do poder decidem do destino de todos. Tem cenas e diálogos deliciosos que vemos sempre com um riso nos lábios.

Quem representa o papel de Martha Mitchel é Júlia Roberts, numa prestação muito boa, como nunca a tinha visto. Sean Penn tem o papel de John N. Mitchell. Está irreconhecível por conta das próteses na cara que lhe retiram, a meu ver, alguma capacidade de expressão. Dan Stevens é um John Dean excelente, oleoso e sem moral. Shea Whigham constrói um Gordon Liddy completamente fanático, dedicado à causa e ao seu Presidente. 

A série vai no segundo episódio que acaba com Martha Mitchel a perceber que foi levada para a Califórnia com um falso pretexto para a afastarem de tudo e a trancarem num quarto de hotel. Sabemos o que se vai passar e mesmo assim queremos ver.

publicado também no delito de opinião

April 13, 2022

Filmes - «Drive my car»

 


Adaptado de um conto de Haruki Murakam é um filme sobre ser-se humano, sobre as relações entre as pessoas, sobre as cicatrizes que nos marcam, os fantasmas dos mortos que carregamos, os estilhaços do passado que nos ferem, as traições que fazemos, não só a outros mas a nós próprios para alimentar as mentiras que dizemos a nós mesmos para aguentar "a inevitável angústia de viver uma vida breve num mundo absurdo". Sobre a redenção que vem de não mentirmos a nós mesmos e vivermos uma vida genuína, e das relações genuínas que estabelecemos -se temos coragem- com outros também capazes de não mentir a si próprios. Sobre sermos como Karataev, a personagem do «Guerra e Paz» de Tolstói. 

São três horas de filme. Ao fim de mais de meia-hora aparecem os créditos iniciais do filme e percebemos que estávamos a ver apenas o prólogo. O prólogo acaba com a morte da mulher do actor e encenador de meia-idade à volta do qual o filme se passa. O filme [re]começa passados dois anos desse acontecimento trágico que encerrou uma situação difícil de um casamento de vinte anos, de uma relação genuína que descarrilou depois da morte da filha pequena, da traição da mulher com outros homens (por razões que no filme se percebem), e da traição dele a si mesmo quando finge não saber e não se importar com a traição da mulher para evitar o aprofundamento da dor.

A maior parte do filme passa-se dentro de um carro vermelho vivo que ele estima muito e conduz, às vezes com acidentes (simboliza a própria vida em marcha) e que passa a ser conduzido por uma rapariga motorista que lhe atribuem quando vai a Hiroshima encenar a peça de Tchekhov, «O Meu Tio Vânia», uma peça difícil de representar sem que se olhe para dentro de si, como ele mesmo diz. A relação do actor-encenador com os outros actores, com o texto da peça e, sobretudo, com a motorista que lhe guia o carro durante esse tempo e com quem estabelece uma relação genuína, dois seres humanos que se reconhecem e mostram como são, transformam-no. A ela também.

É um filme para se ver com atenção e vagar, para não perder os pormenores simbólicos, a cinematografia, o trabalho dos actores, os diálogos e os monólogos, excelentes a mostrar o humano em nós. 


publicado também no blog delito de opinião


March 25, 2022

Olha o que descobri

 


A Amália Rodrigues num cameo de um filme com umas cenas passadas na Lisboa dos inícios dos anos 90, a trocar duas frases com os protagonistas principais do filme. É uma Lisboa anterior ao boom do turismo e dos edifícios renovados. Como sempre nestes filmes, os realizadores gostam dos eléctricos, das escadinhas de Alfama e ruelas do Bairro Alto. Lisboa tão cinematográfica que causa nostalgia.



March 20, 2022

Filmes num dia de chuva

Está aqui a cair uma belíssima chuvada e até já houve dois trovões.

Dia de ficar em casa a beber chá e ver filmes. Tenho andado a ver filmes com o William Hurt. A semana passada vi dois, Gorky Park e The Doctor.
Gorky Park é um filme policial passado na Rússia soviética com espionagem e corrupção à mistura. Muito bom.

The Doctor é sobre a cultura de muitos médicos. É sobre um cirurgião cardíaco, um regular asshole, como dizem os americanos, cheio da sua importância. Um dia descobre que tem um tumor na laringe e passa para o papel de doente onde tem de aturar os colegas médicos, como médicos. Passa do andar de cima do hospital para a cave, onde está a medicina nuclear. Vai do céu ao inferno em meia dúzia de dias. Quem o ajuda a crescer é uma colega doente oncológica com um tumor na cabeça. Muito bom.

Agora vou ver Eyewitness. sobre um crime, refugiados judeus do Leste Europeu em Nova Iorque. Cheio de bons actores.





February 20, 2022

Filmes - Eiffel

 


Este filme, de 2019, decorre durante os dois anos (1887 a 1889) que durou a construção da Torre que leva o seu nome e acompanha as vicissitudes da obra, nomeadamente a oposição de que foi alvo por parte de muitos parisienses. No entanto, o filme passa-se à volta de um acontecimento-hipótese que pretende responder à questão que desde há muito intriga os historiadores: porque é que Eiffel, que se opunha veementemente à construção de uma torre de ferro para a exposição de Paris de 1889 -ele tinha visto planos- de repente, de um dia para o outro e sem explicação aparente, decidiu construí-la e tornar-se o seu maior defensor. O filme adianta uma hipótese baseada na história de vida de Eiffel.

Quando era mais novo, Eiffel tinha sido o engenheiro chefe da construção de uma ponte de ferro em Bordéus. Acontece que ele e a filha do dono da construtora, Adrienne Bourgès, se apaixonaram perdidamente, mas foram impedidos de casar pela família dela, devido a ele ser de uma classe social inferior. Então, o filme supõe que eles se encontram em Paris vinte anos depois, por acaso, numa jantar em que se discute que projecto se deve levar à exposição de 1889, para elevar o nome da França, ainda afectada pela derrota de Sedan e para rivalizar com a Estátua da Liberdade, cujo esqueleto é da autoria de Eiffel. Nesse jantar, desafiado por Adrienne Bourgès, ele propõe-se construir construir a Torre, com 300 metros de altura, toda em ferro, no centro da cidade, para poder ser desfrutadas por todas as classes sociais. A partir daí o filme passa-se nos dois tempos desse grand amour, separados por vinte anos. No filme, a Torre tem a forma de um 'A', por causa de Adrienne.

Não sabemos se isto é verdade, mas também não interessa muito porque o filme é menos uma reconstituição histórica dos factos (nem abordam a oposição dos 300 artistas) e mais uma reconstituição da atmosfera, dinâmica e ambiente históricos da época. Dado que tem uma excelente e impecável produção damos vários passos atrás, no tempo, mas também na literatura. Entramos nas novelas de Dickens, com as fornalhas da revolução industrial quando estamos nas cenas de construção das fundações da Torre; estamos no ambiente de Proust nas cenas de interior dos jantares elegantes e passeios pelos parques e entramos nos romances queirosianos quando se discute as inovações e as políticas da época e o ambiente de fim de uma era. Vale a pena ver esse mundo ainda não totalmente perdido.



publicado também no delito de opinião

February 08, 2022

Aniversários - John Williams 🎉 90 anos

 



Oito décadas a fazer músicas inesquecíveis. Começou nos anos 50 e para além de música para o cinema ainda fez músicas para a TV, Jogos Olímpicos, concertos...

Entre outras, deu-nos:


- Valley of the Dolls
- Goodbye, Mr. Chips 
- Fiddler on the Roof 
- Tom Sawyer
- Jaws
- Star Wars
- Close Encounters of the Third Kind
- E.T. the Extra-Terrestrial
- Indiana Jones 
- Sabrina
- The Witches of Eastwick
- Empire of the Sun
- The Accidental Tourist
- Indiana Jones and the Last Crusade
- Born on the Fourth of July
- Jurassic Park
- Schindler's List (5º óscar)
- The Lost World: Jurassic Park
- Harry Potter
- War Horse

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Tema principal da Lista de Schindler na homenagem a John Williams no AFI Life Achievement Award 2016 (primeiro compositor homenageado).
Maestro: Gustavo Dudamel
Sinfonia da Juventude Americana
Solista: Simone Porter

January 25, 2022

Filmes - The Lost Daughter

 


Este filme é baseado num livro da Elena Ferrante, a autora mistério que ninguém sabe quem é. Enfim, a editora dela deve saber. Isso agora não interessa. O filme é, essencialmente, acerca de ser-se humano e de como isso interfere com a ideia que a sociedade tem das mulheres enquanto mães. A 'boa mãe' é a mãe que ama os filhos acima de tudo, acima da sua vida, que se anula completamente para estar sempre ao dispor dos filhos. 

O filme passa-se em dois tempos da vida de uma mulher, Leda (a que, na mitologia, teve dois ovos), uma professora universitária: no primeiro ela está na meia-idade e vai para uma ilha grega fazer férias e escrever e no outro tempo, ela é uma mãe recente, com duas filhas de dois e quatro anos, enquanto está a escrever a tese de doutoramento e a tentar ter uma carreira. Não tem tempo, nem sossego e o marido parte do princípio que o trabalho dele é que é sério e que ela, sendo agora mãe, deve mudar e sacrificar-se a si e à sua carreira pelas filhas. Só que ela sente-se a sufocar, sem espaço nem privacidade nem tempo para ela. Ficamos a saber que a certa altura da vida dela ela sai de casa desesperada e durante três anos vai tratar da vida e da carreira dela. Depois volta, mas fica para sempre com essa culpa que os homens não têm porque ninguém espera deles que deixem de ser humanos quando têm filhos e se anulem como se espera das mulheres, de modo que são ausentes sem culpa. 

O filme mostra a humanidade por baixo dos constrangimentos e pressões sociais e como ser-se humano nem sempre é bonito, mas é a realidade e não aquela imagem sacralizada que prega as mulheres à cruz da maternidade. No filme há uma família enorme que aparece na ilha e que tem uma rapariga nova com uma filha pequena e essa situação vai servir para Leda fazer uma catarse da culpa. O filme acaba com ela a sangrar enquanto fala com uma das filhas que lhe telefona preocupada por ela não dar notícias há dias e lhe diz, 'estávamos a pensar que tinhas morrido' -ao que ela responde, 'não, agora estou viva'.

Existem homens no filme mas são personagens secundárias e o filme 'vive' de 4 mulheres, Jessie Buckley, Dagmara Dominczyk, Dakota Johnson, Olivia Colman, quatro actrizes que gosto muito e fazem um excelente papel. Maggie Gyllenhal é a realizadora e realiza o filme com uma sensibilidade muito crua. Ela é muito inteligente a mostrar as camadas que se escondem atrás da superfície. Não esconde nada. Muito bom.



January 23, 2022

Filmes - «Munique, The Edge Of War» (Munique, À Beira Da Guerra)

 


Este filme gira à volta da assinatura do acordo de paz de Munique, em 1938, entre Chamberlain, primeiro-ministro inglês e Hitler, em vésperas da Segunda Grande Guerra. O filme tem duas histórias paralelas a correr em simultâneo: uma é a da assinatura do acordo e do papel de Chamberlain nesse processo -que o filme defende ter sido positivo pela razão de ter dado um ano de paz à Inglaterra e aos aliados para se preparem para a guerra; outra é uma tentativa de impedir a assinatura do acordo por parte de dois diplomatas, um inglês, secretário de Chamberlain e outro alemão, secretário de Hitler, que se conheciam e eram amigos desde os tempos de Oxford, que ambos tinham frequentado. 

O filme está bem feito. Sabemos a história e, mesmo assim, ficamos presos ao suspense da situação. Somos levados a questionar-nos se, chegado o momento que não tem retorno, o saberíamos reconhecer e, reconhecendo-o, se estaríamos à altura do momento. Esta é uma questão importante no filme.

É difícil não traçarmos um paralelo com a situação actual, salvas as devidas distâncias, naturalmente, pois Putin não é Hitler, mas a situação geopolítica tem os mesmos contornos. 

Estamos num momento de autoritarismo crescente nos regimes do mundo, de crise económica com muito populismo, muita revolta e temos a Rússia de Putin a exigir que o Ocidente feche os olhos e permita o sacrifício de uma parte grande da Ucrânia e da sua possibilidade de sucesso económico, bem como de outros países da esfera da ex-URSS, a troco de paz. Na altura do acordo de Munique, em 1938, também se estava numa grande crise económica, com autoritarismos crescentes no mundo, populismos e revoltas e com a Alemanha de Hitler a exigir que o Ocidente fechasse os olhos à anexação dos Sudetos da Checoslováquia a troco de paz.

Tal como na época, também hoje há acordos secretos entre o líderes da minoria separatista e o ditador invasor. Então como hoje, o ditador que faz exigências a troco de paz não é pessoa capaz de honrar compromissos ou acordos e tem a mão leve para o assassinato. Então como hoje o Ocidente tem, acima de tudo, desorientação e medo do ditador.

(publicado também no blog delito de opinião)



January 17, 2022

Listas - 47 filmes para quem se interessa por Filosofia





Lista de Zizek! (tradução minha com adaptações)



Filmes com pensadores:

* Zizek!

* Examined Life

* Derrida

* The Ister

* The Pervert’s Guide To Cinema

* Being In The World (2010)



Filmes com filósofos como personagens:

* Bill And Ted’s Excellent Adventure (2001)* (Tony Steedman como Socrates)

* When Neitzsche Wept (2007)* (Armand Assante como Friedrich Nietzsche)

* The Last Days Of Immanuel Kant (1994) (David Warrilow como Immanuel Kant)

* The Alchemist Of Happiness (2004) (Abol Reza Kermani como Ahmad al-Ghazali)

* Um Estrangeiro em Porto Alegre (1999) (Nelson Diniz como Albert Camus)

* Cartesius (Ugo Cardea como René Descartes)

* Blaise Pascal ( Pierre Arditi como Blaise Pascal)

* Socrates (Jean Sylvère como Socrates)

* Socrates (1982)* (James Mason como Socrates)

* Augustine Of Hippo (Dary Berkani como St. Augustine)

* Beyond Good & Evil (Erland Josephson como Friedrich Nietzsche)

* Wittgenstein (Clancy Chassay como Young Ludwig Wittgenstein)

* Alexander (Christopher Plummer como Aristotle)



Experiências de pensamento famosas ou discussões de problemas filosóficos famosos:


* Rashomon – Introdução geral à Subjectividade/Objectividade

* Groundhog Day – Interpretação moderna de O Mito de Sísifo

* Being There – Realidade socialmente construída; o que gosto de chamar O Problema da Comunicação

* Being John Malkovich – A Subjectividade Inescapável da Mente Humana

* I ♥ Huckabees – Adaptação flexível da História da Filosofia em forma Narrativa

* A.I. – Qualquer filme que tenha robôs que pensem como os humanos

* Eternal Sunshine – Materialismo; Metafísica das memórias

* Minority Report – Livre arbítrio/determinismo

* The Matrix – A maioria das pessoas dirá que tudo isto se baseia na caverna de Platão. Eu penso no Dualismo Cartesiano. A principal razão para isto é que não se está no mesmo corpo quando se está na Matriz. É a famosa distinção entre consciência e corpo de Descartes.

* The Truman Show – Esta é a verdadeira Caverna de Platão dos filmes modernos. Embora Truman nunca abandone a caverna.

* Thank You for Smoking – Rétorica Pré-Socrática/Pós-Moderna

* A Clockwork Orange – Identidade da Pessoa; Teoria Política; Justiça; blá blá blá blá

* Lake Of Fire – Considerações éticas sobre o aborto

* Inception – Este filme é recente e está no centro de uma discussão feroz, que é o sangue vital da investigação filosófica. Tema: embora se possa argumentar que Nietzsche precedeu Freud na descoberta do inconsciente, a versão freudiana está na linha da frente em, Inception. O método psicanalítico de Freud teve muito a ver com os sonhos e como eles nos afectam e descrevem. Também o cepticismo cartesiano, ou «O Problema do Mundo Externo», estão presentes.

* Pi – A Ontologia dos Números

* Waking Life – Oferece de facto uma secção transversal algo realista da experiência académica filosófica. Alguns pensadores soam como se estivessem a apresentar brilhantemente soluções reais para problemas reais, alguns parecem estar a dizer algo perspicaz mas não são suficientemente articulados, alguns são demasiado esotéricos para dizer e outros estão simplesmente a consumir drogas.

* Stranger Than Fiction – O Individuo autêntico

* Ikiru – Ser-para-a-morte

* The Seventh Seal – A angústia do absurdo

* The Gods Must Be Crazy – Nem consigo contar quantas vezes este filme foi referenciado nas discussões sobre o "Ser e Tempo" de Martin Heidegger. A garrafa de coca-cola é uma peça de equipamento que de repente aterra numa cultura sem a totalidade referencial das garrafas de coca-cola. Como tal, para os bosquímanos, a garrafa de coca-cola deixa de ser um equipamento, embora retenha a disposição-à-mão como o seu modo de ser.



Filmes que apresentam as ideias de filósofos particulares:


* Nietzsche (2003)*

* My Night At Maud’s

* Nietzsche and the Nazis (2006)*



Filmes baseados em Novelas escritas por filósofos famosos:

* The Stranger (de Albert Camus)

* Le Journal Du Séducteur (1996) (de Soren Kierkegaard)

* The Fountainhead (de Ann Rand)



Outros:

* The Elegant Universe (2003)

* M.A. Numminen Sings Wittgenstein (1993) M.A. Numminen, acompanhado por Pedro Hietanen, canta um excerto do Tractatus Logico-Philosophicus de Ludwig Wittgenstein no seu estilo inimitável. -imdb

January 01, 2022

Filmes - Don't look up

 


Este filme é uma comédia negra. O melhor do filme é conseguir mostrar, como se não o soubéssemos e o estivéssemos a perceber pela primeira vez, o absurdo da vida actual onde a futilidade das redes sociais prevalece sobre a realidade, onde tudo é entretenimento e negócio, onde os lugares mais poderosos do mundo são ocupados por sociopatas, onde as instituições científicas têm à sua frente, não cientistas, mas actores políticos, onde os presidentes das grandes multinacionais se vêem a si mesmos como criativos e génios, onde se usa a estatística, não como um instrumento mas como um fim em si mesmo, onde ninguém quer aceitar a dor que vem com a realidade da vida. Numa das cenas, um bilionário mostra a última novidade tech: uma aplicação que mede o nível químico-hormonal da pessoa para decidir se está emocionalmente triste ou deprimida e projectar-lhe no telemóvel imagens de cachorrinhos e cenas afins. Portanto, ninguém ouve ou quer saber da ciência aborrecida e chata dos dados, das evidências, dos cálculos e da revisão de pares - daí o nome do filme, "Não olhes para cima" o que no filme significa, não olhes a realidade. Consequentemente, o filme, que retrata a realidade em que vivemos, acaba em catástrofe, embora com um twist cómico-sarcástico. Está recheado de bons actores. O filme é um espelho virado para nós mesmos e para a nossa cultura, como diz o actor principal.


December 11, 2021

Uma comédia

 


Leve, mas au point, como os franceses sabem fazer. Cheio de clichés e exageros, mas com graça e sem lamechices ou pequenos moralismos. Estive a vê-la com uma amiga. Deu para rir e ficar de boa disposição 🙂


December 01, 2021

Filmes - Miss Stevens

 


Miss Stevens (Lily Rabe) é uma professora de inglês do secundário numa escola da Califórnia. É uma professora empenhada, conscienciosa e sensível aos problemas dos alunos. Tem uma vida solitária. O filme passa-se durante três dias em que ela leva três alunos -uma rapariga e dois rapazes- a uma cidade relativamente próxima para um concurso de teatro que pode trazer dinheiro para a escola. Desse três alunos, um deles, representado pelo Timothée Chalamet, é um adolescente a necessitar de se expandir, brilhante na arte da representação e que toma medicação para a depressão. Também é um solitário em busca de estabelecer uma relação significativa e profunda com alguém e vê na professora alguém idêntico de modo que projecta-se nela. Acontece a estes três alunos, o que acontece com os adolescentes naquelas idades dos 17 e 18 anos, que é terem mudanças de humor e, a par de momentos muito infantis, em algumas ocasiões, ver-se aparecer já o adulto neles, com uma maturidade surpreendente, o que torna difícil à professora, por vezes, manter os limites professor-aluno no lugar. Como um professor colega dela diz a certa altura, há duas maneiras de ser professor: uma é fácil e outra difícil. A fácil é ser um treinador dos alunos, prepará-los para exames e para terem carreiras, sendo sempre exterior a eles e distante dos seus problemas interiores, portanto, nunca se aproximando do universo interior deles. A difícil é aproximar-se desse universo e lidar com ele sem perder a distância e o profissionalismo. 

A profissão de professor é uma profissão de relações humanas, porque nós estamos no local de trabalho, no emprego, mas os alunos, embora estejam num local de trabalho, não estão no 'emprego', não são funcionários. Estão ali plenamente como pessoas, de modo que aquela máscara profissional que nós pomos no trabalho, eles ainda não a têm, mas como dentro das aulas não podem ser quem são, porque estão numa situação artificial, controlada, isso é-lhes muito difícil. Estão ali também a aprender isso: a ter camadas, umas exteriores e outras interiores, defendidas. 

Quem é professor percebe no filme mais do que ele mostra.

O filme está realizado com muita sensibilidade e bom gosto, com bons diálogos e excelentes representações.