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April 16, 2024

O primeiro-ministro [português] não acha que o corpo das mulheres lhes pertença

 


Em França, Emmanuel Macron fez com que aquele país se tornasse o primeiro do mundo a inscrever o direito ao aborto na Constituição, por entender que o “corpo das mulheres lhes pertence e ninguém tem direito a dispor dele em vez delas”, e porque assim garante que aquele direito não pode ser posto em causa pelo primeiro reaccionário misógino que se lembre disso.

Em sintonia com o caso francês e ciente das crescentes restrições, o Parlamento Europeu aprovou a inclusão de todos os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, com o direito ao aborto incluído, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Falta que o Conselho Europeu aprove a recomendação dos eurodeputados. Mas nem todos os governos reconhecem esses direitos, e o português é um deles.

O primeiro-ministro está contra esse reconhecimento porque, ao contrário do Presidente francês, não acha que o corpo das mulheres lhes pertença.

Há uma agenda de direita misógina e retrógrada, alimentada pelo fundamentalismo católico, que se sente incentivada a sair das catacumbas e que reúne parte do PSD, CDS e Chega. É essa direita que defende a pertinência de criar o estatuto legal e fiscal para a “mulher dona de casa”, porque as mulheres são “mais propensas” a estar em casa, porque efectuam “actividades insubstituíveis” e porque, além disso, a “maternidade é reservada às mulheres”.

Até a diocese de Leiria-Fátima se associa à falsidade da conversão sexual de homossexuais, que foi criminalizada com os votos contra do PSD e Chega, como fez neste fim-de-semana, num congresso com o tema "Homens e Mulheres de Verdade", com base na crença de que a homossexualidade é uma perturbação psicológica.

Amílcar Correia in publico.pt

March 05, 2024

A mulher ideal

 


A mulher ideal

David Pontes

Uma revolução mudou muita coisa, mas não mudou tudo o que era necessário e 50 anos depois continuamos a tentar contrariar o que é estrutural e está errado, a desigualdade de género.

“Segundo o concesso [sic] geral masculino, o lugar da mulher é a passividade. Estar em casa. Cumprir o papel de esposa e mãe o melhor possível. Contribuir no processo de produção — um direito que eles generosamente lho concederam. De fornecer mão-de-obra barata. Satisfazer os apetites sexuais sempre que os seus donos lho exigem. Vender-se no prestíbulo [sic] e no casamento. Isso tudo. Desde que se reduza à sua insignificância. De mero apêndice do Ser-todo-poderoso-e-Perfeito. Assim está tudo bem. E a ordem (natural) mais do que mantida.”

A “ordem natural” no Estado Novo, a definição de mulher ideal, era a da fada do lar, esposa e mãe dedicada, submissa ao marido e com direitos diminuídos por não pertencer ao género certo.

Uma revolução mudou muita coisa, mas não mudou tudo o que era necessário e 50 anos depois continuamos a tentar contrariar o que é estrutural e está errado, a desigualdade de género. Ainda há muito por fazer, mas também há muito que foi feito e deve ser celebrado. Basta percorrer a infografia que elaboramos para este aniversário e perceber, por exemplo, que já não somos o país de mais de um milhão de mulheres analfabetas e que nas últimas décadas elas passaram mesmo a estar em maioria no ensino superior. Ou que as elas têm hoje maior presença em todos os sectores da vida em sociedade, mas persiste a diferença salarial entre sexos e que são elas que têm de acumular trabalho com tarefas domésticas.

Ao que falta fazer junta-se o que pode retroceder, para justificar a escolha do tema para a conferência do nosso aniversário. Há muito a temer quando no mundo, do Irão aos Estados Unidos, sobem ao poder políticos com uma agenda de recuo nos direitos de mulher, ou quando tantos homens ainda vivem no receio da igualdade. Pela primeira vez na história global, está a criar-se um fosso ideológico entre os homens (mais conservadores) e as mulheres (mais progressistas).

Precisamos de continuar a defender e a acreditar que, num futuro não muito distante, a mulher ideal será necessariamente aquela que tenha os mesmo os direitos e oportunidades que um homem. Só esse ideal é compaginável com a de uma Humanidade como um todo.


February 10, 2024

Morreu Robert Badinter, o homem que aboliu a pena de morte em França

 

Na noite de 8 para 9 de fevereiro, aos 95 anos de idade, Robert Badinter morreu na sua casa em Paris.
Advogado de profissão, Robert Badinter foi Ministro da Justiça de François Mitterrand e o arquiteto da abolição da pena de morte em França em 1981.
O seu empenhamento político foi marcado pela luta pela reabilitação dos presos, por uma série de alterações ao código penal e pela luta contra o anti-semitismo e a homofobia.
De 1986 a 1995, presidiu ao Conselho Constitucional, tendo depois sido senador pelos Hauts-de-Seine até 2011. Era um defensor de causas justas:
Uma grande figura intelectual e moral deixou-nos. Talvez devido ao facto da sua família ter sido atingida pelo horror do nazismo desde a infância, Robert Badinter pôs a procura da verdade, a exigência de humanidade e a esperança de paz no centro dos seus pensamentos e acções ao longo de toda a sua vida".   - Lionel Jospin
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A maioria dos países europeus aboliu a pena de morte a seguir à Segunda Grande Guerra. A França só aboliu a pena de morte em 1981. A última execução aconteceu em 10 de setembro de 1977. Hamida Djandoubi, um imigrante tunisino, tornou-se a última pessoa executada em França, bem como a última pessoa executada na Europa ocidental. Foi guilhotinado mas não em público. A última execução pública em França é de Eugène Weidmann, um alemão, em 1939 e pode ver-se no YouTube - uma coisa horrível. 
Para se ter uma ideia de como a abolição da pena de morte foi difícil e tardia em França, a última execução conhecida em território português foi em 22 de Abril de 1849 (José Joaquim, em Lagos, de alcunha “o Grande” que matou a criada do padrinho a tiro), apesar de só muito mais tarde ter sido retirada da Constituição.



União Europeia: cronologia da abolição da pena de morte para crimes comuns e para todos os crimes.
A Bielorrússia é o único país do continente europeu que continua a realizar execuções. Na Rússia existe uma moratória.

December 30, 2023

Esta criança diz a triste verdade

 


Os violadores e pedófilos dos talibãs querem reduzir as mulheres a escravas domésticas e sexuais. Escravatura em pleno século XXI. Isto custa ver e mais custa ver que a ONU faz nada... a sua grande preocupação são os violadores do Hamas e os assassinos do Irão que meteu na presidência do Conselho dos Direitos Humanos. Este pessoal deste PS conseguiu infiltrar-se em todo o lado como um vírus...


November 02, 2023

Coisas inaceitáveis

 


November 01, 2023

Deixem os mulas a falar sozinhos



Sempre que um deles pegar no microfone vão-se embora.


@UNWatch

We are now calling on all countries to walk out of the room tomorrow when the Islamic Republic of Iran becomes Chair of the United Nations Human Rights Council Social Forum.

May 24, 2023

À atenção dos nossos deputados

 


Do ME e seus controleiros que querem legislar no sentido de destruir os direitos e a segurança das raparigas nas escolas, que confundem o respeito pelos transgéneros com a anulação dos direitos das mulheres e das raparigas.


ONU denuncia intimidação de feministas que criticam as políticas de género


Uma conselheira para os direitos humanos manifestou a sua preocupação relativamente aos países ocidentais.

Mana Afsari

Mulheres que discutem o sexo e a identidade de género no "Norte Global" enfrentam campanhas de difamação, abusos físicos e assédio legal, afirmou o Gabinete dos Direitos Humanos da ONU num comunicado de imprensa de 22 de Maio.

Reem Alsalem, Relatora Especial da ONU para a violência contra as mulheres e as raparigas, alertou para "o espaço cada vez mais reduzido" nos países ocidentais para as mulheres e as organizações feministas "se reunirem e/ou se expressarem pacificamente, para exigirem o respeito pelas suas necessidades com base no seu sexo e/ou orientação sexual".

"Estou perturbada com a táctica frequente das campanhas de difamação contra as mulheres, as raparigas e os seus aliados com base nas suas convicções sobre a não discriminação com base no sexo e nas relações entre pessoas do mesmo sexo", afirmou Alsalem, uma das observadoras dos direitos das mulheres da ONU. "Rotulá-las de 'nazis', 'genocidas' ou 'extremistas' é um meio de ataque e intimidação com o objectivo de dissuadir as mulheres de falar e expressar as suas opiniões."

A Relatora Especial afirmou que as tentativas de silenciar as preocupações sobre as tensões entre os direitos das mulheres e as políticas de identidade de género são "profundamente preocupantes, uma vez que se destinam a incutir o medo nas [mulheres e raparigas], a envergonhá-las até ao silêncio e a incitar à violência e ao ódio contra elas". Insistiu que a censura social, legal e violenta dos direitos das mulheres com base no sexo "afecta gravemente a participação digna das mulheres e das raparigas na sociedade".

"Testemunhámos incidentes de abuso verbal e físico, assédio e intimidação, com o objectivo de sabotar e fazer descarrilar esses eventos, bem como de silenciar as mulheres que desejam falar neles", disse Alsalem.

A relatora sublinhou que aqueles que dão prioridade à inclusão dos transexuais em detrimento dos direitos baseados no sexo "têm o direito de exprimir a sua opinião", mas não devem ser autorizados a ameaçar "a segurança e a integridade" dos outros todos.

O Relator Especial afirmou que esta censura prejudicava a segurança e a subsistência das mulheres e raparigas a todos os níveis da sociedade, observando que até "as mulheres políticas são sancionadas pelos seus partidos políticos".

A censura formal de Alsalem surge algumas semanas depois de Kate Forbes, a candidata à liderança do SNP que foi amplamente atacada pelas suas opiniões críticas em matéria de género, ter afirmado que as tentativas de anulação como as que foram feitas contra ela e a outra política do SNP, Joanna Cherry, no início deste mês, "não têm a ver com a contestação das opiniões de alguém: têm a ver [...] com o despedimento de pessoas dos seus empregos".

A advertência do conselheiro das Nações Unidas para os direitos humanos surge também no meio de preocupações crescentes com a retórica violenta de alguns activistas transgénero, bem como com a generalização da retirada da plataforma de académicas, jornalistas e figuras públicas que pretendem alargar os debates em torno da identidade de género de modo a incluir os direitos baseados no sexo e as considerações biológicas. 
Talvez a mais famosa seja a afirmação da autora de Harry Potter, J.K. Rowling, de que "se o sexo não é real, a realidade vivida pelas mulheres a nível mundial é apagada", que desde então levou a anos de críticas públicas, censura e queimas organizadas dos seus livros.

January 03, 2023

Há muito para fazer



Membros do Conselho dos Direitos Humanos em 2023:

🇨🇺 Cuba
🇶🇦 Qatar
🇨🇳 China
🇸🇩 Sudan
🇪🇷 Eritrea
🇩🇿 Algeria
🇸🇴 Somalia
🇻🇳 Vietnam
🇵🇰 Pakistan
🇰🇿 Kazakhstan
🇧🇩 Bangladesh

August 17, 2022

Ser a mudança




Direitos Humanos


Eddie Ndopu17 Agosto 2022

Quando as Nações Unidas foram edificadas a partir dos escombros da Segunda Guerra Mundial, teria sido inconcebível que alguém como eu - um jovem, negro e gay, utilizador de cadeira de rodas - fosse considerado para um emprego de alto nível na organização. Portanto, é um testemunho impressionante da distância que a humanidade percorreu desde 1945 o facto de eu estar entre os candidatos que a ONU considerará para suceder a Michelle Bachelet quando ela deixar o cargo no próximo mês como Alta-Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos.

Se for selecionado, serei o funcionário público internacional de mais alto escalão com deficiência desde a fundação da ONU. Esta seria uma vitória histórica para 1,3 mil milhões de pessoas com deficiência que, segundo a ONU, compõem o maior grupo minoritário do mundo.

A Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assinada em 2007, tem ajudado a promover a inclusão em todos os setores. Mas ver alguém numa cadeira de rodas numa posição de poder ainda é bastante invulgar. Em muitas partes do mundo hoje, o rosto do ostracismo ainda é o de uma criança deficiente de pele escura.

Eu poderia facilmente ter sido aquela criança. Mas poderia dizer que a minha experiência como defensor dos Direitos Humanos começou aos 6 anos de idade, quando - com lágrimas a escorrer pela cara - disse à minha mãe: "Eu quero ir prá escola".

A vida de uma criança numa cadeira de rodas na Namíbia, onde passei os primeiros 9 anos da minha vida, é muitas vezes extremamente limitada, como o é em grande parte do mundo em desenvolvimento. Segundo a ONU, 90-98% das crianças com deficiência no Sul Global não têm a oportunidade de ir à escola.

Na época, de facto, eu estava a contrariar as estatísticas simplesmente por estar vivo. Aos 2 anos de idade, fui diagnosticado com atrofia muscular espinal, doença degenerativa mortal que ataca o sistema nervoso. Os médicos disseram à minha mãe que eu provavelmente não viveria para ver o meu quinto aniversário. Estou com 31 anos hoje.

A minha mãe, que secou as lágrimas dos meus olhos, estava determinada. Ela encontrou uma escola disposta a aceitar-me. No meu primeiro dia, fui colocado no fundo da sala de aula. Ficou claro que esperavam pouco de mim. Eu espantei a professora ao escrever o meu próprio nome - algo que a maioria das outras crianças não conseguia fazer. Um sorriso espalhou-se pelo rosto dela. Ela viu que eu poderia aprender da mesma maneira, ou talvez até mais depressa, que os outros.

Essa experiência ensinou-me a ter expectativas, independentemente dos obstáculos no meu caminho. A minha candidatura para suceder a Bachelet procura ultrapassar os limites do possível, não só para pessoas com deficiência, mas para qualquer pessoa que já se sentiu desvalorizada, subestimada e marginalizada.

Se for selecionado, serei o líder mais jovem ao nível da liderança principal. A ONU muitas vezes enfatiza a importância de envolver os jovens, dada a nossa participação no futuro. E, no entanto, somos um grupo demográfico não-representado na instituição. A seleção de uma liderança jovem para esta posição daria novo impulso e autoridade ao trabalho do Alto-Comissário da ONU.

Conseguir Direitos Humanos para todos parece muitas vezes um objetivo impossível, especialmente agora, quando tudo parece impossível. Como Nelson Mandela enfatizou, parece sempre impossível até que seja feito.

Eu tive de me lembrar dessas palavras há algum tempo, quando ainda estava na Amnistia Internacional e tinha o mandato impossível de reunir dois grupos conhecidos por desconfiarem um do outro: líderes empresariais e defensores dos Direitos Humanos. Eu convenci-os a ouvirem-se uns aos outros como parte de uma campanha para responsabilizar as indústrias extrativas pelas violações de Direitos Humanos em África.

Num momento em que o mundo está cada vez mais fraturado e parece que simplesmente deixámos de nos ouvir uns aos outros, acho que o escritório do Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos está qualificado para enfrentar os desafios mais urgentes dos nossos dias. Pela primeira vez desde 2001, a maioria da população mundial vive sob governos não-democráticos e violadores de direitos. Enfrentamos um nacionalismo intensificado, uma crise económica emergente e uma pandemia global - uma crise de saúde que muitos governos enfrentaram reivindicando poderes de emergência e adotando restrições que muitas vezes violam direitos. E, claro, os conflitos na Ucrânia, no Sahel, em Mianmar e numa série de outros lugares criam as suas próprias preocupações significativas sobre direitos.

O Alto-Comissariado da ONU desempenha um papel crucial em tempos como estes, servindo como um farol para os princípios dos Direitos Humanos e defendendo aqueles que corajosamente se pronunciam quando veem violações em todo o mundo. Como vem dizendo o secretário-geral da ONU, António Guterres, os Direitos Humanos sustentam "todo o sistema da ONU. (Eles) são essenciais para abordar as causas e os impactos amplos de todas as crises complexas e para construir sociedades sustentáveis, seguras e pacíficas".

Se o secretário-geral me selecionar para esse cargo, o meu trabalho será identificar e expor as violações de direitos de modo incansável, independentemente dos interesses poderosos que estejam no caminho, e envolver-me com os defensores da sociedade civil para tornar o trabalho da ONU mais participativo e mais relevante para impulsionar mudanças.

Eu sou, reconhecidamente, um candidato fora da caixa para este cargo - uma escolha impossível, poderão dizer. Mas acredito, em especial nestes tempos, que um pensamento novo, uma energia nova e a capacidade de ver como superar barreiras aparentemente impossíveis são exatamente o que o mundo precisa.

Eddie Ndopu, ativista de Direitos Humanos, é um defensor dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável junto do secretário-geral da ONU.
© Project Syndicate, 2022.

July 01, 2022

Para grandes males, grandes remédios



No dia 24 de outubro de 2019, em 1975, 90 por cento das mulheres islandesas abandonaram os seus empregos e saíram das suas casas, indo para as ruas exigir direitos iguais aos dos homens. Recusaram-se a fazer qualquer trabalho, seja no emprego ou em casa - deixando tudo, desde atender telefones nas recepções até aos cuidados infantis, para os homens fazerem. O país fechou efectivamente à medida que os homens lutavam para fazer face à situação. Ouvia-se locutores de rádio ler boletins noticiosos com o som de crianças a brincar em segundo plano. Os Pylsur (cachorros quentes islandeses) esgotaram em todo o país enquanto os homens tentavam alimentar-se a si próprios e aos seus filhos. As instituições ficaram completamente paralisadas.

Embora isto não tenha mudado as coisas da noite para o dia, seguiram-se alguns acontecimentos monumentais e cinco anos mais tarde a Islândia teve a primeira mulher presidente democraticamente eleita do mundo. Oito anos mais tarde, um partido só de mulheres, a Aliança das Mulheres, ganhou os seus primeiros lugares no parlamento. E assim por diante.

Mesmo assim, embora a Islândia esteja consistentemente no topo da lista da igualdade de género, não é uma utopia feminista, como os meios de comunicação social frequentemente sugerem. Há ainda muito a fazer. E ainda assim. Percorremos um longo caminho.

Alda Sigmundsdóttir



May 07, 2022

A opressão das mulheres pelas religiões é outra desgraça

 


March 08, 2022

A moeda da diplomacia é a hipocrisia

 


@ClaFrancavilla

De acordo com documentos divulgados, funcionários egípcios identificaram a França, Grécia, Hungria e Chipre como "pontos fracos" dispostos a ajudá-los a diluir a crítica ao registo abismal de direitos humanos do #Egypt na ONU: https://middleeasteye.net/news/egypt-eu-criticism-sisi-blocked-greece-diplomats-worked

Um Passo atrás: O Egipto tem sido um buraco negro dos direitos humanos durante anos, especialmente desde que Sisi tomou o poder em 2014. A UE, cuja política externa funciona por unanimidade, tem geralmente reagido a crises de direitos humanos através de sanções e/ou acções na ONU. O Egipto continua a ser a excepção mais notória. 
Apesar das provas esmagadoras de abusos graves e sistemáticos, e dos repetidos apelos à acção das ONG https://bit.ly/3MvZOou e do Parlamento da UE https://bit.ly/3vMwepa, a Europa continua relutante em perturbar o seu aliado repressivo. De facto, acontece exactamente o oposto.

Carta aberta à União Europeia e aos seus Estados Membros sobre o Egipto Caro Alto Representante, Caros Ministros dos Negócios Estrangeiros,

A Europa continua a fornecer armas, dinheiro e apoio político ao Egipto, cujo governante abusivo recebe tratamento de tapete vermelho e até medalhas de honra apesar (ou por?) da sua brutal repressão: 
hrw.org/news/2022/02/1
Uma rara excepção são as declarações da UE na ONU, mas mesmo aí, a linguagem utilizada é tão "lisonjeadora" quanto possível. E é aqui que surge o artigo MEE.

Veja por si mesmo: compare a língua utilizada para a Bielorrússia ou Myanmar com a utilizada para o Egipto: 
eeas.europa.eu/delegations/un

Declaração de grupo de 26 Estados Membros SEAE - Serviço Europeu para a Acção Externa - Acção Externa da União Europeia Basicamente, o governo egípcio continua a pagar quase nenhum preço pelos seus abusos horrendos. Não é de admirar que continuem sem os diminuir. 

Muitos diplomatas europeus estão fartos e cansados disto - e por todas as razões certas... 175 deputados de toda a Europa pediram mais uma vez aos seus governos que tomassem medidas para estabelecer um mecanismo de monitorização e informação da ONU sobre direitos humanos no Egipto, há muito esperado:  jcoetjen.de/artikel/joint-.

October 07, 2021

A voz de Zarifa




A voz de Zarifa



Carlos Carreiras
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Zarifa fala pelas meninas e mulheres que não têm voz. Não sejamos cúmplices com o silêncio. Que com a nossa ajuda a sua voz se ouça ainda mais alto e mais longe.

Quando se fala, nem que seja por minutos, com alguém como Zarifa Ghafari, o resultado só pode ser um grande banho de realidade. Tinha acabado de celebrar mais uma vitória eleitoral em Cascais. A noite de domingo 26 de setembro tinha sido longa. Segunda-feira, logo ao início da tarde, o meu primeiro compromisso de agenda assinalava uma “receção oficial a uma das primeiras mulheres presidente de câmara no Afeganistão”. Por mais que nos sintamos próximos desta massacrada nação que diariamente nos entra pela televisão adentro, não estamos, nunca podemos estar, preparados para o contacto, ainda que remoto, com o Afeganistão, também conhecido como o lugar onde a loucura e a bondade andam de braço dado. Uma coisa é saber que a violência faz parte do dia-a-dia. Outra, bem diferente, é estar cara a cara com os que exibem, nas palavras e na pele, as marcas da crueldade dos teocratas.

Quero falar-lhe do encontro que tive com Zarifa. Ou, melhor, quero contar-lhe a história desta jovem afegã de 29 anos, voz firme e olhar intrépido. Zarifa Ghafari tornou-se uma das primeiras mulheres autarcas do Afeganistão. Tinha apenas 26 anos quando, em 2018, foi eleita presidente de Maidan Shar, uma cidade conservadora, onde os talibãs são bastante populares, a apenas uma hora de caminho a oeste de Cabul. Sem surpresa, a presidente de Câmara viu-se demasiadas vezes envolvida em problemas. Colecionava ameaças diariamente. A sabotagem ao seu trabalho começava dentro do seu próprio gabinete, onde uma corte de informadores passava aos talibãs a rotina da sua líder. A coragem que movia Zarifa, reforçada pela esperança de um futuro melhor para a sua cidade e o seu país, estava ausente nos que a rodeavam.

Zarifa era uma ameaça para os talibãs não apenas por ser presidente de câmara ou por trabalhar com o Ministério da Defesa na proteção das vítimas da guerra. Zarifa é uma ameaça para os radicais pelo que representa: ela é a cara dos direitos das mulheres e das meninas num dos lugares mais violentos e brutais do mundo. “Não tenho armas, mas tenho a minha voz”, disse-me Zarifa.

Escusado será dizer que destemor lhe valeu uma sentença de morte pelos talibãs.
Durante o seu mandato, interrompido abruptamente pela queda do Governo afegão democraticamente eleito, Zarifa sofreu três tentativas de assassinato. Certo dia, enquanto encostou para ir à farmácia, um grupo de homens passa e “pum, pum, pum, pum”, descarrega rajadas sucessivas no carro da ‘mayor’. Outra vez, tentaram matá-la com uma explosão de gás em sua casa – as marcas contam essa história. Ao todo, três tentativas de assassinato falhadas. Zarifa não tombou. Por isso procuraram a sua família. Oficial do exército, o seu pai foi o primeiro alvo dos talibãs.

Enquanto isso, os americanos retiram-se de forma atabalhoada. Numa questão de dias, num dos fiascos estratégicos do Ocidente que a história se encarregará de lembrar, os talibãs tomam conta de todo o país. “Estava à espera que me viessem buscar para morrer”, confessa a jovem. Felizmente, não esperou. Zarifa percebeu que a sua permanência no Afeganistão, onde queria continuar a luta, seria em vão. Pior, estava a colocar toda a sua família em risco.

Esborrachada contra o chão de uma carrinha, saiu de Maidan Shar em direção a Cabul nos caóticos dias de Agosto, enquanto o mundo assistia pela televisão ao desmoronar de um país em direto. Escapou por um triz a um controlo dos talibãs no acesso ao aeroporto e conseguiu fugir em direção à Turquia num golpe de sorte.

Hoje a viver exilada na Alemanha, Zarifa não tem poupado esforços para erguer a voz das meninas e mulheres afegãs junto das opiniões públicas Ocidentais. De passagem por Cascais, ela promete continuar a lutar. E pede apoio a todos. Porque todos podem fazer a sua parte: os cidadãos podem levantar a sua voz, colocando pressão nos governos; os governos podem sentir a pressão dos cidadãos, pressionando diplomaticamente os talibãs e os seus apoiantes (nomeadamente o Paquistão) para uma solução que preserve os direitos humanos no Afeganistão. Aquele que é, provavelmente, o pior lugar do mundo para se ser menina ou mulher.

Só para os crédulos o fim de uma guerra eterna seria sinónimo de paz eterna. O “acordo de paz” negociado por Washington com os Talibãs está morto – se é que alguma vez viu a luz do dia. Logo em 2020, ainda a tinta no papel estava fresca, já os talibãs levavam a cabo uma campanha de assassinatos dirigidos, ataques a escolas, hospitais e maternidades, num total de mais de 3000 mortos e 5800 feridos. Todos civis.

Na loucura do verão, duas imagens ficaram gravadas na minha memória como prenuncia de tempos de chumbo para o povo afegão. Por um lado o desespero às portas do aeroporto de Cabul, num amontoado de gente que se espezinhava para escapar à tirania. Por outro a profanação e destruição do mausoléu de Ahmad Shah Massoud, o mítico “Leão de Panjshir” e Némesis dos talibãs.

Foi como se a réstia de esperança para o Afeganistão desaparecesse num sopro.

Ouvir Zarifa Ghafari restaura a confiança num futuro melhor para o povo afegão. Um futuro que podemos ajudar a construir com ações concretas, como assinar a petição de Zarifa.

September 07, 2021

Peter Singer - a polémica

 



Top dog: como os animais capturaram a política

William Moore


'Os bispos fazem parte da cultura inglesa', escreveu T.S. Eliot em 1948, 'e os cavalos e os cães fazem parte da religião inglesa'. Era uma piada. Será que ainda é? Hoje, o fervor pela vida animal é tão forte que, por vezes, pode certamente sentir-se religioso. Os políticos gostam de nos dizer que somos uma 'nação de amantes de animais', porque é uma verdade incontroversa. Mas se o amor pelos animais vem à custa dos seres humanos, isso não é um exemplo de valor moral. É um sinal de colapso moral.

A evacuação de Cabul ofereceu um exemplo claro. Pen Farthing, um antigo soldado que se tinha estabelecido na cidade, foi-lhe oferecido um voo de regresso a casa, mas disse que não viajaria sem os cães e gatos no seu santuário animal. Parecia um absurdo. Restaram dias para evacuar milhares de pessoas. Mas após a efusão pública de apoio na Grã-Bretanha para a sua campanha, conhecida como "Operação Arca", os militares cederam. Um avião deixou o Afeganistão com os animais enquanto os humanos abandonados, incluindo membros do pessoal do Farthing, observavam.

Ben Wallace, o Secretário da Defesa, disse aos deputados na semana passada que tem "soldados em terra que foram desviados de salvar essas pessoas por causa de histórias imprecisas, de lobbying impreciso". Mais tarde, disse que os apoiantes de Farthing tinham ocupado "demasiado tempo" dos comandantes superiores. Dominic Dyer - um activista do bem-estar animal, amigo de Carrie Johnson, e principal apoiante de Farthing - agradeceu a Boris Johnson por apoiar a Operação Arca 'porque ele sabia que era a coisa certa a fazer'.

Farthing e os seus apoiantes negam ter dado prioridade aos 'animais de estimação em detrimento das pessoas'. Dizem que queriam sair de Cabul com o seu pessoal, bem como com os animais. Mas para muitas pessoas, os animais eram o que realmente importava. Numa chamada para Tom Swarbrick na LBC na semana passada, um membro do público veio em defesa da Operação Arca. Uma vida é uma vida", disse ela. 'Está a dizer, se eles não são intérpretes, vamos meter um cão no [avião]?' perguntou Swarbrick. Houve, então, uma longa pausa: 'Quer a resposta honesta? Sim.'

O desastre expôs a popularidade da crença de que as vidas humanas não têm mais valor do que as dos animais. De facto, alguns consideram os animais superiores porque a sua nocência lhes confere virtude. 'Tudo é bom no mundo, excepto nós, humanos', disse recentemente o príncipe Harry. Ele foi gozado por isso, mas tinha identificado o zeitgeist. A RSPCA recebe anualmente mais dinheiro em doações do que a NSPCC; o Santuário do Burro recebe mais do que as três mais proeminentes instituições de caridade de abuso doméstico combinadas.

Uma sondagem do YouGov na semana passada revelou que 40% do público britânico acredita que as vidas animais valem tanto como as humanas - apenas nove pontos atrás daqueles que acreditam que as vidas humanas valem mais. É também uma posição mais favorecida pelos jovens do que pelos idosos, pelo que é provável que se torne mais prevalecente.

Como é que acabámos aqui? Muita coisa pode ser colocada no filósofo Peter Singer e no seu livro "Animal Liberation" de 1975. A sua rejeição generalizada da crença de que a vida humana tem um valor intrínseco lançou as bases para o movimento moderno de defesa dos direitos dos animais. "A mera pertença à espécie Homo sapiens", escreveu ele, "não precisa de ser crucial para que uma vida seja tirada ou poupada".

Num artigo de 1995 para The Spectator, Michael Sissons argumentou que Singer e os seus seguidores levaram as coisas longe demais. Não tenho dúvidas de que, se se permitir que os direitos dos animais avancem para os seus alvos finais, a opinião pública irá, a seu tempo, considerá-lo cada vez mais irritante e ridículo', escreveu ele. Creio que daqui a 20 anos, quando estas questões tiverem sido devidamente enfrentadas, o movimento dos direitos dos animais sofrerá o mesmo destino que outras doutrinas utópicas que causaram tanta devastação no século XX".

Em vez de se abater, a tendência acelerou. O cantor propôs uma hierarquia de inteligência e sentimento. O que temos agora é uma hierarquia de cortesia. A filosofia de Singer é racional - friamente, rigidamente. O culto britânico moderno ao culto dos animais é sentimental. É a sobrevivência do Instagrammable.

Se o amor pelos animais vem à custa dos humanos, não é um sinal de valor moral, mas de colapso moral.

E onde o público encabeça, os políticos seguem-nos, mexendo-se para se manterem a par. No exame post mortem das eleições de 2017, os estrategas Tory reconheceram muitos fracassos - a proposta de Theresa May de "imposto sobre demência", por exemplo - mas uma das conclusões foi que o partido tinha subestimado o enorme poder político do movimento dos direitos dos animais.

Durante a campanha eleitoral, May comprometeu-se a realizar um voto livre sobre a caça, acrescentando casualmente: 'Como acontece, pessoalmente, sempre fui a favor da caça à raposa'. Mais pessoas partilharam artigos sobre este momento do que histórias sobre a Grã-Bretanha a deixar a UE. O YouGov descobriu que 56% dos eleitores se podiam lembrar da política. Apenas 11% apoiavam-na.


August 18, 2021

Porque devemos agir para defender as mulheres afegãs, as sauditas, as iranianas, etc

 


A globalização não é um processo de expansão meramente económico ou político, é também cultural. Sem entrar nas armadilhas, quer do etnocentrismo, quer do relativismo cultural, parece-me pacífica a ideia de que são as pessoas particulares e não os seus dirigentes ou cabides quem devemos ouvir no que respeita à questão da liberdade e do modo de vida das pessoas que constituem os cidadãos de cada país.

A maioria de nós tem agora, pelo menos, duas identidades: 

1. a identidade com o seu país/povo de origem;

2. a identidade de cidadão do mundo que até há pouco tempo era algo de meia dúzia de pessoas, por assim dizer, que viviam a passar fronteiras e agora se espalhou a quase toda a população mundial, por várias razões:

- os problemas que nos afectam são globais - o ambiente, o excesso de população, as desigualdades sociais, etc.; 

- os valores dos Direitos Humanos vieram substituir os valores das religiões e, ao contrário destas, esbatem fronteiras e criam círculos cada vez mais alargados de identificação e solidariedade: identificamo-nos, enquanto mulheres com o sofrimento de outras mulheres e, num círculo mais alargado, identificamo-nos com elas enquanto seres humanos, independentemente de sermos mulheres ou homens;

- o alargamento da educação obrigatória e, como consequência, a exigência de racionalidade nas normas que regem a nossa vida -por isso, os discursos dos governantes onde 'garantem' que as coisas são de um modo já não passam, porque pedem fé onde as pessoas querem razões;

- a ideia de intervenção e responsabilidade pessoais, herdeiras do despertar da consciência da Humanidade no rescaldo dos crimes nazis;

- a internet e a facilidade de comunicação global.

Por exemplo, sou uma pessoa que se sente cidadã do meu país -portuguesa, neste caso-, mas também europeia, nos valores e, ao mesmo tempo, cidadã do mundo. Isso agora é vulgar. Sinto-me, enquanto mulher, solidária com o sofrimento e a violação de direitos das mulheres oprimidas nestes regimes de fascismo teocrático, sigo as que posso através das redes sociais e acompanho a interacção dessas mulheres com mulheres de todas as culturas. Há uma grande solidariedade e apoio que ultrapassa a cultura fechada dos países respectivos, o que mostra que em todo o lado as pessoas têm um nível de vivência cultural, paralelo ao nacional, mais abrangente, mais abstracto, trans-nacional. As pessoas ligam-se pelos Direitos Humanos umas às outras em qualquer ponto do mundo.

A mesma coisa acontece na participação em grupos ambientais, científicos, artísticos, etc. - são cada vez mais trans-nacionais e em todos os povos, vemos que há valores dos Direitos Humanos que são assumidos e queridos pelas pessoas e que as ligam activamente aos outros seres humanos do planeta.

Aliás, a Carta dos Direitos Humanos -um dos grandes textos da Humanidade- reconhece, no seu preâmbulo, o parentesco de todos nós numa grande família e a existência de uma consciência global da Humanidade, em nome da qual a Carta fala, independente das culturas dos povos:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;

Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do homem conduziram a actos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do homem;


É por isso que interessa pouco que os líderes talibãs digam que as pessoas do seu país querem a sharia. O que interessa é saber se aqueles que vão sofrer com ela, a querem. Ora, sabemos que não a querem, nem no Afeganistão, nem no Irão, nem na Arábia Saudita bem como em outros países. E sabemo-lo porque o dizem, porque pedem ajuda, porque os regimes só as calam com a prisão, a tortura e a morte.

Assim como já não estamos no tempo em que se dizia, relativamente às cenas de pancada, 'entre marido e mulher não metas a colher', também já não estamos no tempo em que se dizia, 'cada país tem a sua cultura e não podemos intrometer-nos'. Não podemos usar o argumento da tolerância para tolerar o intolerável.

Não quero com isto defender que há culturas ou países que têm a verdade e devem impô-la aos outros, como têm feito as grandes potências. Quero dizer que há limites, dentro de cada cultura para o que nós todos, enquanto consciência da Humanidade, aceitamos que façam na casa ao lado, por assim dizer. E os limites têm que ser aqueles que estão inscritos na Carta dos Direitos Humanos:

Artigo 3.º

Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo 4.º

Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.

Artigo 5.º

Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Artigo 6.º

Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento em todos os lugares da sua personalidade jurídica.

Artigo 7.º

Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.


Todos nós vemos quando estes direitos estão a ser grosseiramente atropelados e esse é o limite. Precisamos de mais, não menos, ONU. Mais e melhor, mais eficaz. Uma ONU diferente, com mais força de acção e persuasão. Afinal, todos assinaram a Carta.

E é por isso que não podemos encolher os ombros ao que se passa no Afeganistão, no Irão, na Arábia Saudita, etc., como se fosse uma problema cultural local. Já não o é. Agora é um problema global.

A União Europeia é um excelente balão de ensaio das possibilidades humanas e espero que o resultado desta aventura seja positivo e vá nessa direcção de sermos capazes de ver o global, o que nos une para além do local que nos desune e de construir uma Carta Ética forte e não fraca. É por isso que custa que a Inglaterra tenha abandonado o projecto.

É verdade que a invocação dos Direitos Humanos tem um lado perverso (nada neste mundo é só virtude) que é o de as pessoas assumirem que têm direito a tudo sem esforço e luta, apenas por serem humanas, mas esses casos restringem-se aos direitos que implicam materialização: casa, emprego com salário decente, etc., porque no que respeita aos Direitos fundamentais: de vida, de segurança, de liberdade, de paridade face à lei, de educação, esses, temos de os garantir a todos, independentemente da cultura local.

Em suma: precisamos agora de estratégias e não de desculpas, de atirar culpas e de discursos de relativização da opressão. A globalização não pode ser apenas uma expansão económica à lógica da qual tudo se submete, mesmo a vida das pessoas.




July 23, 2021

Agora que se aprovou uma lei contra a liberdade de expressão, porque não dar mais um passo e retirar a liberdade de objecção de consciência?

 


Grão a grão...


3222 jovens, objetores de consciência

Mário Bacelar Begonha

Um Estado é uma nação organizada que tem fins de conservação, de justiça e de bem-estar social, ou seja, respetivamente: território, população e governo, de justiça comutativa e distributiva e fins de natureza social.

Quanto mais desenvolvido é um Estado, maior deve ser a sua responsabilidade política e social o que implica grande coesão social e desenvolvimento humano, o que por sua vez exige organização para a realização desses objetivos, que não podem variar conforme o tempo e a moda, ou seja, conforme a conjuntura.

O Estado-nação tem obrigações e interesses permanentes a que tem que ser fiel, sob pena de claudicar e desaparecer, absorvido ou incorporado num outro Estado.

A defesa e segurança dos cidadãos de uma nação, é hoje, um dos assuntos mais sérios com que se deparam os Estados-modernos, a começar pela conservação do seu território que é um elemento decisivo e indispensável para acolher uma nação.

Uma nação sem território é um “sem abrigo”. Não entendemos nem aceitamos, que fique ao critério pessoal de um cidadão de 18 anos de idade, decidir se quer ou não cumprir o serviço militar para ajudar na defesa do seu país, em caso de necessidade, e ter, apesar disso, depois da recusa, o estatuto de cidadão.

Quem no passado era rejeitado na inspeção médica para o serviço militar, era obrigado a pagar uma taxa militar, ao Estado, durante anos, como compensação pelo prejuízo causado.

Aos 18 anos um indivíduo não tem a maturidade mínima para tomar certas decisões que tenham implicações no coletivo nacional.

No séc. XX a maioridade só era adquirida aos 21 anos e só aos 25 se podia entrar num casino.

Nos últimos oito anos, 3.222 jovens invocaram objeção de consciência para não cumprir o serviço militar, sendo a maioria por motivos religiosos...

Segundo a lei de 1992, tal direito de isenção do serviço militar, verifica-se quer em tempo de paz ou de guerra. Tal facto foi divulgado pelo Instituto Português do Desporto e Juventude que, pensamos, deve ter qualquer conexão com o Ministério da Educação!?!...

Se, no futuro, passarem a ser 100% os objetores de consciência, como vai o Governo resolver o problema da Defesa Nacional? Será que vai contratar mercenários, ou firmas privadas com exércitos privados de aluguer?. É que quem cumpriu o serviço militar e até participou no esforço de guerra, não pode entender esta postura do Estado ou de um Governo de esquerda, já que as esquerdas tratam bem deste setor e só o Estado é que decide o que é que os cidadãos devem pensar acerca da defesa do país, e quem assim não pensar sofre as consequências que o Estado entender. As esquerdas radicais sabem-no bem, quer o PCP quer o Bloco.

É estranho que, quer na esquerda, quer na direita, todos fiquem em silêncio e que até haja caçadores que foram objetores de consciência, mas que têm licença de caça para matar animais.

Teremos que esperar por novos tempos que vão trazer, com certeza, grandes mudanças já que “o que não tem solução, solucionado está”. É só uma questão de tempo, tal como foi no 25 de Abril de 74.


May 29, 2021

Direitos Humanos na Era Digital

 


Era sobre os perigos que este artigo denuncia -os perigos dos algoritmos gerirem anonimamente a nossa vida com os preconceitos dos matemáticos que os construíram- que a tal Carta dos Direitos Humanos na Era Digital devia ter acautelado. Em vez disso a AR aprovou uma lei decalcada das palavras de Marcello Caetano:

“Não é informar bem o público deitar mão a todos os mexericos, a todas as intrigas, a todas as fantasias ouvidas nas mesas dos cafés, ou a algum intrujão imaginativo, para as deitar cá para fora como grandes e sensacionais revelações’’.
Marcelo Caetano, Conversas em Família, 28/3/1974 (citado por António Luís Marinho no jornal i)

... que por sua vez, copiava as palavras do início da ditadura:

O redator da lei de imprensa de 1926, Manuel Rodrigues, defendeu anos mais tarde que “os portugueses tinham o vício da informação e da calúnia” e uma “curiosidade e um desejo doentios de ser informados e informar, em especial sobre a vida do Estado, a ordem política interna e internacional”. (citado por António Luís Marinho no jornal i)


A resposta a um pedido de fundamentação de um acto ablativo de direitos não pode ser “computer says no!”.

Mário João Fernandes

Muitos dos adquiridos civilizacionais (democracia, direitos fundamentais, submissão da Administração à lei, escrita e previamente cognoscível,…) são tidos no Ocidente como garantidos na sua essência e permanentemente disponíveis, numa modalidade de bens públicos a que se acederia pela via do nascimento na parte boa do mundo.

A pandemia do ano 20 deste milénio mostrou os limites desta crença, com a generalizada troca de direitos e liberdades por uma propagandeada segurança. A erosão do Estado de Direito é ainda mais forte por via das tecnologias da informação (TI) do que pela via pandémica, embora a simbiose entre estas duas pragas potencie os efeitos nefastos.

Das várias modalidades de malfeitorias possíveis às mãos das TI há que reservar o oitavo círculo do inferno para a inteligência artificial (IA). A tomada de decisões que afectam os cidadãos e as empresas com recurso a algoritmos, não conhecidos, não publicitados, cujo funcionamento não é explicado, conhecido ou sindicável, transportam-nos para uma nova Idade Média em matéria de direitos fundamentais. Este Admirável Mundo Novo está repleto de vícios antigos (não publicidade das regras que norteiam a decisão da Administração, não fundamentação) e de velhas tentações (a arbitrariedade e impunidade do poder e a desigualdade de armas num litígio).

Combater as violações “artificialmente inteligentes” de direitos fundamentais é tarefa particularmente difícil porque na maior parte dos casos o titular dos direitos nem sequer consegue ter consciência da forma como opera a violação. Combater os abusos cometidos com recurso a algoritmos exige tenacidade, tempo e recursos.

Atentemos num exemplo recente, muito educativo quanto à bondade da IA. A Autoridade Tributária holandesa muniu-se de um algoritmo “capaz” de identificar os contribuintes com maior propensão para cometerem fraudes em matéria de abono de família. O dito algoritmo, baptizado com grande originalidade como SyRI (Systeem Risico Indicatie), passou sistematicamente a considerar os agregados familiares de imigrantes como propensos à fraude e, sem qualquer fundamentação razoável ou passível de contraditório, reclamou a devolução dos abonos recebidos em anos anteriores.

Entre queixas dos advogados das famílias, investigações da Autoridade de Protecção de Dados e inquéritos parlamentares, o uso do algoritmo resultou na demissão, em 15 de Janeiro de 2021, do primeiro-ministro Mark Rutte, considerando que foram violados princípios fundamentais do Estado de Direito.

No Reino Unido (RU), onde os pergaminhos da tutela dos direitos dos cidadãos contra os abusos da Administração merecem respeito, o uso de algoritmos foi já abandonado no caso da substituição, afflicti mores, dos exames de acesso à universidade por uma ponderação curricular. O dito algoritmo favorecia sistematicamente os alunos das escolas privadas.

Também pelo RU foi abandonado um outro algoritmo (“Streaming Tool”) que analisava os pedidos de visto e que tinha uma estranha tendência para avaliar negativamente todos os pedidos de não caucasianos. O sector privado não é imune aos perigos da IA, com destaque para as relações jurídicas caracterizadas pela desigualdade negocial (relações laborais, direitos dos consumidores…).

A Comissão Europeia apresentou a 21 de Abril um Regulamento proibindo certos usos da IA e restringindo outros, classificados como sendo de alto risco. A negociação legislativa não durará menos de um ano e o Regulamento prevê uma vacatio de 24 meses. Até lá teremos de viver com os meios de bordo.

April 18, 2021

Navalny - Já lá vai o tempo em que o Ocidente era uma defensor coerente dos direitos humanos



Acabo de ouvir uma entrevista com o embaixador russo. O entrevistador diz-lhe que grupos de direitos humanos escreveram a protestar com a prisão de Navalny, que está em perigo de morte iminente e pergunta se não é verdade que ele está preso porque incomoda Putin. O embaixador responde que Navalny é um hooligan e que foi preso por violar a liberdade condicional, "tal como Assange, que vocês prenderam", diz ele. E desta maneira cala o entrevistador, pois o Ocidente não tem moral para criticar Putin quando tem Assange preso e em risco de vida apenas por incomodar políticos. E Snowden exilado por denunciar criminosos.



Russian medics sound alarm over Alexei Navalny's blood test results

March 08, 2021