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January 14, 2023

Os 5 pecados capitais dos professores

 


VISTO DE FORA

Eis o top 5 dos “inegáveis” pecados capitais dos professores…visto por quem não é, claro!

person holding camera lens

por Tiago Franco // janeiro 12, 2023

Aprecio bastante o reportório de queixas repetido a cada greve da Função Pública. Vejo, com um sorriso, a indignação de quem afirma que uma greve, seja qual for, não pode prejudicar a vida das pessoas.

Dos utentes do metro aos passageiros da CP e da Carris, e passando pelos pais dos alunos, há uma enorme fatia de gente que ainda parece achar que uma greve é uma espécie de feriado móvel. Ou como dizia um antigo chefe meu, no início do século: “se querem fazer greves, que as façam ao sábado!”.

É um conceito peculiar, este, o das greves que não incomodam. Quer dizer, seriam greves sem qualquer utilidade ou sequer poder reivindicativo, mas certamente trariam uma lufada de ar fresco ao debate. Deixariam era de serem greves autênticas, se bem que não nos devemos perder em detalhes.

Sigamos.

Os professores são, dentro da Função Pública, aqueles que mais têm endurecido e prolongado a sua luta. Nos noticiários, caixas de comentários ou até no Fórum TSF – esse longevo barómetro do pensamento popular magistralmente coordenado pelo Manuel Acácio – é possível recolher um resumo das queixas mais frequentes contra os professores, e compreender assim como é que nós, portugueses, ainda estamos pouco talhados para a defesa dos direitos dos trabalhadores.

Deixo aqui o top 5 das queixas, e acrescento o que penso sobre as ditas:

1 – “As greves prejudicam os alunos

Se pensarmos que queremos alguém para passar o tempo dentro de uma sala com os alunos, então sim, a greve não só prejudica os alunos como os pais que têm de ficar com eles ou arranjar alternativas.

Contudo, se pensarmos um bocadinho, o que realmente devemos pedir ao sistema público de Ensino são professores motivados, e que possam, na sala de aula, realizar-se também profissionalmente, e, dessa forma, passar conhecimento aos nossos filhos.

Como não é isso que existe hoje, aquilo que prejudica os alunos são sim as sucessivas políticas de Educação que andam a destruir a Escola Pública. Ou ainda dois anos de confinamentos em nome ainda não se sabe bem de quê, e que, irremediavelmente, atiraram as necessidades educativas para segundo plano, como se o Apocalipse estivesse ali ao virar da esquina.

Aquilo que os professores estão a fazer, ao lutar pela dignificação da carreira, é exactamente a melhorar a Escola Pública e a beneficiar os alunos no longo prazo.

2 – “Os professores estão a ceder aos interesses dos sindicatos

Fico sempre pensativo com quem condena sindicatos como coordenadores das lutas laborais. Gostava de saber se, para essas pessoas, existe outra forma, desconhecida do grande público, para as pessoas se organizem e falarem como um colectivo.

Tem um trabalhador sozinho alguma influência nas decisões da sua carreira? Em princípio, não. Então, e se forem todos os trabalhadores do sector? Em princípio, sim. E podem falar todos ao mesmo tempo com o empregador? Por exemplo, com o ministro da Educação? Fica mais confuso, não é? Tipo Mercado da Ribeira e ninguém se entende. É por isso que se juntam em colectividades onde um fala por vários. É essa a “conversa dos sindicatos”; e sem ela não existe negociação.

3 – “Concordo com a luta dos professores, mas não há outra forma de protesto sem ser a greve?

Há. Por exemplo, para monges tibetanos há o silêncio. Mas aqueles vivem em mosteiros, sem rendas ou taxas de juro, comem pouca coisa, não abastecem as sandálias com diesel e, portanto, o custo de vida não sobe assim tanto relativamente ao salário.

Já para quem está há 10 anos numa conversa de surdos com os sucessivos ministros, essencialmente com o mesmo salário e sem progressão na carreira, a ver o custo de vida a disparar, de facto não há grandes alternativas a não ser a greve. É, de longe, a forma de luta mais civilizada e uma prova da paciência desta classe profissional.

4 – “Os meus filhos andam num colégio privado e nem sabem o que é uma greve

Sorte desses professores que ali dão aulas, por receberem um salário digno; e azar dos alunos do colégio privado, que, apesar da elevada propina, não aprendem um dos direitos fundamentais previsto na Constituição. Preciso de dizer mais alguma coisa a este respeito?

5 – “Os professores continuam a ser uma classe com bons salários e com muitos privilégios; por exemplo, horário reduzido

Julgo que já não vale a pena bater na tecla das horas de trabalho fora da sala de aula, que não são contabilizadas. Ou sequer dos salários vergonhosos. Escrevi há dois meses, em 4 de Novembro, aqui no PÁGINA UM, sobre isso, com testemunhos reais: em média, profissionais com 10, 15 e 20 anos de trabalho não traziam para casa 1.500 euros líquidos. Isto é uma vergonha, Uma miséria e uma merda. Seja lá qual for o ângulo escolhido.

Mas há um pormenor na vida dos professores que gostava AINDA de referir, e que, tal como a história dos salários, me foi explicado na primeira pessoa. São relatos de pessoas que passam a vida a saltar de escola em escola, contratados durante mais de 10 anos, a mudar constantemente de zona do país, e que, por causa das vicissitudes da profissão acabam por ter muita dificuldade em formar uma família ou manter algum relacionamento estável.

Muitos, confidenciaram-me, optam, ou são obrigados a optar, por uma vida sozinhos, sem um núcleo familiar, por não ser possível conciliar nos primeiros anos da carreira… e mais tarde, “tinha passado o tempo”.

Compreendem a violência deste tipo de declarações? Ver-se empurrado para uma vida de solidão para se ser professor? É deste tipo de privilégios que os tais pais incomodados pelas greves se queixam?

A Escola Pública em Portugal – um dos países menos desenvolvidos da Europa, é bom que não se esqueçam – não eleva o seu patamar de excelência com pensos rápidos e esmolas. É necessário um investimento sério, continuado e uma política que não mude ao sabor de quem governa ou dos lobbies que por lá passam.

Enquanto existir um contribuinte, o dinheiro deve ir para a Escola Pública e o Serviço Nacional de Saúde. São esses os pilares do Primeiro Mundo. O resto é secundário. Os professores, repito-o pela enésima vez, são a base do sistema; a luta deles é a luta de todos. A começar pelos nossos filhos.

Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM. As fotografias foram retiradas do mural do Facebook da Fenprof, retratando o acampamento defronte do Ministério da Educação durante esta semana.

December 26, 2022

Os discursos do primeiro ministro não anulam a realidade

 


Na primeira pessoa: “Sou professora e todos os fins de semana, todos mesmo, percorro 1120 quilómetros em 16 horas de autocarro para estar com a minha família”

Carla Bastidas, professora do Ensino Básico
Carla Bastidas é professora do ensino básico, tem 46 anos, mora em Viseu e dá aulas no Algarve. Tem feito greve juntamente com os colegas na luta por melhores condições de trabalho. Este é o seu testemunho

Comecei a dar aulas em 2000/2001, tenho formação base de ensino básico com a variante de educação física. Nesse ano apresentei um projeto, junto com outros colegas, a um agrupamento de escolas na minha área de residência e lecionámos as nossas disciplinas em todas as escolas do primeiro ciclo e pré-escolar, mas a ideia não teve continuidade. Nos anos seguintes, fiz pequenas substituições por doença ou licença de maternidade, de um mês e/ou quatro meses, pelo Algarve e em Lisboa, e nunca consegui trabalhar um ano letivo completo.

Em 2008/2009, fui colocada por três meses no Algarve, na EB 1 de Silves, e, entretanto, engravidei. Por sorte, nesse mesmo ano, em fevereiro, fui colocada a 40 quilómetros de casa, em Oliveira de Frades. No ano letivo seguinte fui colocada pela primeira vez para o ano inteiro, mas no Alentejo, em Aljustrel. Como estava em final de gravidez, não me apresentei logo ao serviço e foi aí começou o meu dilema.

Ao fim de cinco meses do nascimento do Diego, quando me ia apresentar ao serviço, não consegui creche para o meu filho e fui alertada de que poderia tirar licença alargada de oito meses. Não hesitei. Apresentei-me a 1 de junho de 2010 e, como não conseguia creche em Aljustrel, fiquei alojada em Armação de Pêra, em casa de familiares. Fazia 135 quilómetros diariamente para ir trabalhar.

No ano seguinte, fui colocada novamente no Algarve, em Ferreiras, Albufeira. Levei o meu filho comigo pois sabia que tinha vaga na mesma creche onde havia estado no ano letivo anterior. No entanto, com esta decisão para trabalhar na área/profissão para a qual me formei, privei o meu marido Marcos de acompanhar o crescimento do nosso filho.

Durante estes dois anos ia a casa de carro apenas uma vez por mês e na companhia dos meus pais ou da minha sogra, que se deslocavam desde Viseu e do Porto respetivamente, de autocarro, para me fazerem companhia nas viagens, de forma a que eu não viajasse sozinha com o bebé.

Entretanto fiquei desempregada e decidi abandonar o ensino pois com as despesas, o filho em crescimento, o crédito de casa… era necessário trabalhar. Encontrei emprego numa empresa privada, embora ligada ao ensino, no Grupo Porto Editora. Era consultora pedagógica em várias escolas na periferia de Viseu e dormia em casa todos os dias. Não havia dinheiro nenhum no mundo que pagasse o facto de eu poder dormir todos os dias na minha cama e estar junto da minha família. Entrei nos quadros da empresa e pensei que já não voltaria mais a lecionar, mas a vida prega-nos partidas.

“Tive uma baixa psiquiátrica”

Em 2018, com a gratuitidade dos manuais escolares e a baixa taxa de natalidade, fui dispensada das minhas funções. Voltei ao ensino, mas como já não tinha um ano de serviço, nos últimos seis anos [requisito para estar na 2.ª prioridade dos concursos de professores] fui inserida na 3.ª prioridade. Tive de alargar o concurso para Lisboa e Algarve, perto das zonas onde tinha estadia em casa de familiares, para que as despesas não aumentassem e fossem suportadas. Estive três meses numa escola no Montijo e não trabalhei mais nesse primeiro ano de regresso ao ativo.

No ano letivo seguinte (2019/2020) enganei-me a concorrer e fui trabalhar dois meses para Vila Real de Santo António, onde tive de procurar alojamento. E em janeiro já estava colocada em Alfornelos, Amadora. Fui sozinha, deixando o meu filho, então com 10 anos, só com o pai, tendo de se deslocar para a escola com boleias porque o horário de trabalho do meu marido não era compatível com o horário escolar do nosso filho.

Entretanto veio a pandemia e, no meu caso, ficar em ensino à distância foi bom, pois embora fosse muito mais trabalhoso do que estar no ensino presencial, conseguia estar junto da minha família e principalmente do meu filho.

A professora Carla com o marido e o filho, com quem está aos fins de semana

No ano seguinte (2020/2021), fui colocada em Lisboa, nas Olaias. Lá voltei eu a andar com a “casa às costas” para casa da minha tia, abandonando o meu lar e a minha família mais uma vez. A experiência não correu bem, entrei em baixa psiquiátrica e fui seguida em psiquiatria e psicologia. Tive de tomar medicação e não regressei a essa escola.

Dizem que, depois da tempestade, vem sempre uma bonança. Em 2021 /2022 consegui voltar nos concursos à 2.ª prioridade e fui logo colocada para iniciar funções a 1 de setembro no Agrupamento de Escolas Silves Sul, na EB1 de Alcantarilha, onde fui muito bem acolhida por colegas, funcionários e direção da escola. No presente ano letivo estou com o meu contrato reconduzido no mesmo agrupamento.

“Estar longe é uma enorme dor”

Embora tenha um ambiente de trabalho espetacular, todos, mas mesmo todos os fins de semana, desde o ano letivo 2018/2019, vou a casa de autocarro para conseguir estar um pouco com a minha família. São 560 quilómetros de distância para cada lado. Faço 16 horas de autocarro – viajo das 16h20 às 00h25 à sexta-feira e das 16h00 às 23h30 ao domingo – para conseguir exercer a profissão de que tanto gosto e tentar aproveitar estar o mais possível com a minha família.

Tenho uma casa de familiares à disposição no Algarve e pago as despesas do dia-a-dia, mas não tenho de suportar uma renda. Ainda assim, com o atual nível de vida e os gastos que temos, continua a ser incomportável. Por esse motivo, o meu marido e o meu filho passaram a viver com os meus pais em Viseu, pois decidimos vender a nossa casa.

Consigo poupar dinheiro no almoço, pois levo uma marmita todos os dias e só me desloco para o Algarve na minha viatura no começo e no fim do ano letivo porque não é possível suportar o preço do combustível e das portagens.

Neste momento, o bilhete de ida e volta de autocarro tem o custo 66 euros por fim de semana, o que totaliza cerca de 250 euros por mês. Entre portagens e combustível, se eu levasse carro, aquilo que gasto mensalmente com as viagens de autocarro era o que iria gastar por fim de semana. O meu marido é administrativo, ganha o ordenado mínimo e é ele quem está com o meu filho e tem aguentado emocionalmente toda esta situação. Os dois continuam a ser o meu grande suporte.

Acabo por conseguir recuperar um pouco o sono durante a semana porque estou sozinha e deito-me mais cedo. De igual modo, o trabalho que tenho de fazer extra-aulas (preparação de aulas e correção de testes, por exemplo) fica circunscrito aos dias úteis porque não levo trabalho para casa ao fim de semana. Gostava que as pessoas percebessem que os professores têm muito trabalho invisível e que não termina nas horas em que damos aulas.

Vivemos numa constante adaptação. Estar longe de casa já levou o meu filho a verbalizar que quer que eu deixe o ensino. Ele diz-me: “Vem para Viseu e vai trabalhar para um supermercado”. Eu respondo-lhe que não é fácil arranjar um novo trabalho com a minha idade.

Não consigo deixar de me emocionar quando penso numa certa madrugada de novembro quando recebi uma mensagem do meu filho às 3h30. Dizia: “Mãe, não me sinto bem”. O Diego estava doente e mesmo sabendo que ele está muito bem com o pai, em momentos de aflição recorre à mãe. Não descansei até chegar a sexta-feirapara ir para casa. Estar longe nestes momentos é uma enorme dor.

Porque faço greve

Enquanto contratados, o nosso primeiro foco é entrar nos quadros. Este ano consegui renovar contrato na mesma escola para onde entrei no ano passado, mas nos moldes em que atualmente estão os concursos, o ano letivo de 2023/2024 seria o meu terceiro contrato e entraria em quadro de zona, neste caso no Algarve, mas poderia pedir destacamento por aproximação à residência. Com esta nova modalidade que o Ministério da Educação (ME) quer impor aos concursos, isso está fora de questão. O ME quer criar o que se intitula de mapas de pessoal, em que depois é impossível aproximarmo-nos à zona de residência porque os mesmos estão agregados a um município.

Defendemos que deve ser mantida a modalidade de concurso e não passar para a municipalização. Na proposta do Ministério, os municípios passam a ter autonomia para a colocação dos professores e os critérios deixam de ser a nossa graduação de lista e a nossa classificação profissional.

O dia 9 de dezembro foi o primeiro dia de greve e desde dia 12 que a mesma tem funcionado por tempos letivos. Neste momento, a greve continua por tempo indeterminado. Obviamente, temos muitas penalizações a nível salarial porque os tempos em que fazemos greve são descontados no nosso vencimento.

Ser professor nestas condições é ser resiliente, contra tudo e contra todos. A vida de professor não é fácil em muitos aspetos e é preciso gostar muito do que se faz. Os risos e os abraços que recebo dos meus 24 alunos todas as segundas-feiras ajudam-me a ganhar novo fôlego e a suportar um pouco melhor a dor que sinto por estar longe da família.

Visão


December 12, 2022

Greve de professores

 


Estou totalmente de acordo com os motivos e a justeza desta greve, mas não com o tempo e o modo. Penso que a acção de luta devia ser em outras frentes. Na justiça, na recusa em fazer trabalho não lectivo. Já o disse, não me parece que esta greve tenha utilidade ou eficácia e penso que só irá prejudicar os professores. As pessoas em geral não percebem nada dos problemas da educação e culpam os professores por todos os males, na senda da propaganda que os governos fazem contra nós, de maneira que a greve só vai engrossar a já gorda demagogia deste ME e do primeiro-ministro sobre os professores. A não eficácia da greve deve-se, porém, em grande parte, à oposição declarada dos maiores sindicatos de professores, desde logo a FENPROF, que calculo esteja a perder muitos sócios: os professores mais velhos que todos os anos se reformam aos milhares e os mais novos que preferem alguém como o S.T.O.P. que pelo menos faz qualquer coisa. Sim, porque Nogueira critica a falta de soluções deste sindicato que existe há 4 ou 5 anos, como se ele mesmo, Nogueira, há 30 anos ou mais à frente do sindicato, tivesse alguma vez apresentado ou conseguido solucionar problemas aos professores. Nada, zero. Face às políticas cancerígenas deste ministro pensadas para a educação, a solução que oferece é fazer uma manifestação no dia dos namorados ou quando o homem chegar a Marte. Uma vergonha. Não é só à Lurdes Rodrigues, ao Crato e a este ministro que lá está que devemos a decadência da educação pública no país: é também à cumplicidade dos sindicatos. Quem de nós mais velhos não se lembra como 120 mil professores se juntaram atrás de Nogueira, em 2008, para lhe dar força para negociar e o modo como ele deitou para o lixo esse esforço e nos vendeu à Lurdes Rodrigues? De maneira que, se ele tivesse vergonha na cara estava calado e se fosse alguém que se preocupa com os professores e não com o seu poder, apoiava os que estão a lutar, bem ou mal, pela educação em vez de vir para os jornais queixar-se e fazer-se de vítima.

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"Neste complexo quadro, foi anunciada uma greve que os professores não conseguem fazer, por não poderem prescindir do seu salário por tempo indeterminado, mas bastou ouvir alguns dos seus promotores ou dinamizadores para perceber o seu verdadeiro objetivo e alvo. Não pela forma como (e por quem) está a ser promovida, mas pelo que é dito em reuniões em que não é apresentada uma única proposta com soluções para os problemas. Afirmações que advêm ou são complementadas nas redes sociais, em blogues, mails ou mensagens de WhatsApp, com o recurso a contactos pessoais não autorizados pelos próprios, com divulgação pública desses mesmos contactos."

- Mário Nogueira, dirigente da FENPROF, no Púbico

December 07, 2022

FENPROF marcou uma manifestação para o dia em que o homem pisar o solo de Marte




Ser grãos para moinho

Santana Castilho

A degradação do sistema de ensino começou com Maria de Lurdes Rodrigues, a 12 de Março de 2005, e tem vindo num contínuo de responsabilidade partilhada, ao qual, com arredondamentos de pequena monta, 13 anos cabem ao PS e quatro ao PSD.
No passado dia 29, o ministro da Educação fez-se ouvir em conferência de imprensa. Denunciou o que apoda de falsidades sobre as suas intenções. Foi um discurso insidiosamente dúplice, sinuoso, mas estratégico: de recuo em termos de propostas e calculista no que toca à manipulação e à adulteração do que tinha dito antes, para desmobilizar e confundir os mais indignados.
Reagindo à iniciativa do ministro, a FENPROF divulgou todas as propostas que se podem extrair daquilo que ele apresentou (via PowerPoint e, em rigor, a única referência escrita sobre as alterações em análise) nas reuniões de 22 de Setembro e 8 de Novembro, relativas à revisão do regime de concursos. Mais, requereu as actas e as gravações áudio dessas reuniões.
Cotejando as duas intervenções, parece-me cristalina a conclusão: foi o ministro da Educação que, no momento dois, disse que o ministro da Educação tinha mentido no momento um. Neste quadro, e estando convocada uma greve de professores, que se inicia a 9, é tempo de dizer duas coisas, que se impõem:
– É relevante que tenha sido sob a égide de governos do PS, de António Costa, e a partir de uma perspectiva enviesada de a geringonça e PS serem de esquerda, que tenhamos assistido aos maiores e graves atropelos ao direito de greve, instituto fundamental de qualquer sociedade livre: entre outros, mais do que discutíveis requisições civis de enfermeiros e professores, polícias a baterem à porta de motoristas de viaturas de transporte de matérias perigosas e polícia de choque usada para intimidar os grevistas e proteger os fura-greves, no caso dos estivadores.
– Vivemos num país onde as condições de trabalho dos professores têm vindo a ser gradual e crescentemente espezinhadas desde 2005, sem indignação suficiente e eficaz dos próprios, nem expectável sobressalto dos demais cidadãos. E quando um sindicato (S.TO.P.) tem a “desfaçatez” de reclamar de modo mais vigoroso, é ostracizado pelos pares, que se apressam sempre a boicotar os combates que não sejam de sua iniciativa. Dito isto, é evidente que, para que as propostas de João Costa se venham a impor, quantas menos sejam as vozes críticas ou discordantes, melhor. Por isso mesmo, são em minha opinião colaboracionistas com o poder todas as lógicas que isolem ou abafem os que queiram sair dos conhecidos rituais dos sindicatos do sistema.
Aqui chegados, é minha convicção que estamos perante um modus operandi que se repete. Primeiro apresentam-se cenários horríveis. Depois vive-se um ritual hipócrita de prolongadas e falsas negociações e caricaturais protestos (abaixo-assinados, cordões humanos, marchas, vigílias, quem sabe se um jantar de Natal, para inovar). No fim, o ministério ganha e os sindicatos também: o primeiro por ter pregado mais um prego no caixão; os segundos por terem “evitado o pior”. Só os professores perdem. Perdem sempre, desde 2005! Já têm pouco para perder, mas vão mobilizar-se em defesa desse pouco, numa manifestação … a 4 de Março do ano que vai vir!
Em vez de promover avanços, os sindicatos do sistema contentam-se com atrasar os retrocessos. Assim, as nossas organizações sindicais têm-se transformado em albergues de inutilidades, enquanto o quotidiano dos professores é cada vez mais penoso. E sendo a gestão da percepção pública um importante instrumento político, João Costa tem nesta doce oposição sindical um instrumento importante para disfarçar a mediocridade da sua acção. Por tudo isto, seria bom que reflectíssemos sobre o papel dos movimentos independentes de professores e sobre a forma como essas organizações, sem a logística e os recursos das duas grandes federações sindicais, lhes impuseram a dinâmica que conduziu à grande manifestação de 2008.
Disse a FENPROF que a força da luta se mede pelo número dos que nela participam. Digo eu que se mede, antes, pelos resultados conseguidos. Numa luta de professores por melhores condições de trabalho e melhor escola pública, só há um lugar aceitável, se não quisermos ser grãos para moinho: ao lado deles!

October 13, 2022

Os pontos nos is

 


A 26 de Setembro, durante uma visita a uma escola de Santo Tirso, João Costa disse haver, por semana, mil baixas por doença, apresentadas por professores. Mas falando de horários por preencher já usou um indicador percentual: 3%. No sistema de ensino labutam 130517 professores. Se seguisse a mesma regra, o ministro poderia ter dito que o número de baixas que referiu correspondia a 0,76% dos professores. Porque escolheu o valor absoluto em vez do percentual? Obviamente porque 1000 impressiona bem mais que 0,76.

Santana Castilho, in Não coce a barriga quando morrer outro professor!

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Há pessoas que pertencem a profissões onde ao fim de 20 anos se ganha 6000 a 7000 euros, se não tiver nenhum cargo especial, mais subsídios de deslocação, de viagem, de roupa especial, de alimentação em restaurante especial, mais sabonete para limpar a baba e o diabo a nove, mas vêm apontar o dedo aos professores com doenças oncológicas que ao fim de 40 anos de serviço às vezes ainda ganham 1500 euros e são colocados a 200 km de casa sem subsídios nenhuns. A mim até as palavras me faltam para classificar esta gente que gosta de destruir professores, para se sentirem mais homens, calculo.

July 22, 2022

Os professores precisam de férias, mas...

 

Porque não imagina esta senhora um esquema para os seus filhos e pede, capciosamente, para se roubarem as férias aos professores?

Os professores precisam de férias, naturalmente. Os estudantes também. Mas seria pedir muito que se imaginasse um sistema em que os pais pudessem estar mais livres e mais presentes para os filhos durante as suas férias escolares?

Joana Gonçalves Santos, presidente da Associação das Juízas Portuguesas 

Fui ver que associação de juízes no feminino é esta e dei com este texto acerca dos fins da associação: 
A associação tem como fim – a promoção e defesa dos direitos humanos, em especial das mulheres e crianças, conforme o Direito nacional e internacional, tendo por base um compromisso com a igualdade, a justiça e o Estado de Direito, como pilares de uma democracia;

 A promoção e defesa dos direitos humanos. O direito ao descanso não é um direito humano? 

Esta mulher é juíza, presidente desta associação e devia ter sensibilidade para os direitos humanos que diz defender, mas não tem. Os professores precisam de férias, mas... pensem lá um esquema em que os professores trabalhem nas férias como... sei lá... animadores sociais, directores de cruzeiros, chefes-escuteiros dos nosso filhos ou algo porque não estamos para aturar os nosso próprios filhos ou arranjar soluções tendo essa gente ao serviço do Estado.

Os professores são pau para todo o serviço. Que grande lata!

Não interessa que os professores também sejam pais ou avós; não interessa que sendo pais, passem o ano longe dos filhos porque são colocados a 200km de casa e tenham de trabalhar em duas escolas para sobreviver; não interessa que cheguem ao fim do ano exaustos porque atiram para cima deles funções de assistente social, de psicólogo, de gestor, de contabilista, de juiz , etc.; não interessa que uma grande porção deles ganhe o salário mínimo e venham sendo 'desaumentados' ano após ano, ao contrário desta juíza (os juízes foram o grupo profissional mais aumentado nos últimos dez anos: mais de 30%) que pode muito bem contratar babysitters para tomar conta dos filhos ou pô-los numa dessas fancy colónias de férias. O que interessa é que o Estado tem mais 100 mil professores que podem ser esquematizados para ela não ter que se preocupar com os filhos que quis ter.

Deixo aqui uma firma muito boa de babysitters para todos que podem contratar não virem para os jornais queixarem-se e pedirem que resolvam esse assunto dos professores terem direito a férias: https://babysisters.pt (aviso já que a empresa é de uma sobrinha por afinidade, para não me virem chatear)

May 19, 2022

Isto é só rir...

 


Este senhor está há sete anos no governo a marimbar-se para a falta de professores e agora vem armado em preocupado, mas a fazer mais do mesmo. O que ele quer é mexer para controlar mais ainda do que controla. Toda a gente sabe que não há falta de professores, o que há é falta de um governo com pessoas com cabeça que queiram tratar os professores de maneira justa, o que passa por pagar o que é justo e devido. Porém, para isso, seria necessário ter um ME com pessoas decentes e competentes. 




January 23, 2022

Bater nos professores é uma espécie de desporto nacional

 


JMT, como de costume, quando se põe a falar das escolas, fala do que desconhece. Calculo que fale a partir do caso de um filho ou filha de alguém que conhece e depois generaliza a apelar ao escândalo... e fala em iliteracia digital, em mentalidade  burocrática, em os professores alegarem privacidade para não serem filmados, em não quererem levar os portáteis para a escola, para não dar aulas e diz que nas escolas privadas tudo se passa às maravilhas e encontraram soluções para os alunos com covid.  

JMT gosta de dizer coisas... 

Em 1º lugar: os alunos doentes com covid-19, na maioria dos casos, estão doentes - dores de cabeça, sensação de ter o corpo todo dorido, cansaço, alguns têm febre. Não estão em condições de assistir a nenhum tipo de aulas. Estão na cama com medicamentos a descansar. Não sei como é que JMT pensa que as escolas particulares põem os doentes sem sintomas. Deve ser alguma magia...

Em 2º lugar, os alunos que estão em confinamento sem sintomas ou por coabitarem com alguém infectado, podiam, de facto, assistir às aulas se houvesse câmaras nas salas, o que não há. Não tem nada que ver com as parvoíces que ele diz. Em um grande número de escolas nem sequer há rede informática a cobrir a escola, computadores ou projectores nas salas de aula. 

Ao contrário do que ele diz, nós usamos muito a tecnologia digital. Por exemplo, em vez de imprimir papel, como se fazia dantes no trabalho normal, levamos os materiais numa pen e projectamos. E se são fichas para trabalhar, enviamos para o email dos alunos ou partilhamos na drive e abrem a ficha no telemóvel ou no tablet. É claro que, se a cobertura de rede informática das escolas não fosse de pobrezinhos, os alunos todos acediam à rede da escola nas salas de aula, a partir dos seus telemóveis, porque há muito documento que não podemos enviar com antecedência e enviamos na aula. Porém, ter internet que permita descarregar documentos e outras coisas, custa uma fortuna que a maioria dos alunos das escolas públicas não pode pagar. Estou a fazer uma formação. Um colega, na última sessão, a propósito de uma cena que não interessa, dizia, 'ah, eu faço isto porque no colégio onde estou a dar aulas só tenho alunos de excelência. Não tenho dos outros'. Pois, JMT não percebe a importância de se chamar Ernesto, por assim dizer...

Muitos professores levam os portáteis para a escola, ao contrário do que ele diz, mas se não há utilidade em levá-los, não levamos. Por exemplo, na semana que passou oito alunos de uma turma que tenho ficaram em confinamento. Se houvesse uma câmara na sala de aula, podia enviar um link por zoom e eles assistiam às aulas, mas como não há, é indiferente que leve ou não leve o pc - aliás, as salas têm computador. Nós não damos as aulas parados, sentados à secretária. Andamos de um lado para o outro, escrevemos no quadro, há interacção como os alunos: como é que um ecrã de um portátil consegue apanhar isto...? Anda um aluno na sala em pé atrás de mim a apontar o portátil para mim, para o quadro quando lá escrevo ou para os alunos que vão intervindo na aula?

Não há câmaras na salas... qual é a alternativa? Vejamos, um professor tem 5 turmas, o que perfaz 20 horas de aulas. Sai das aulas e vai repetir as 20 horas de aulas para os alunos que estão em casa? 40 horas de aulas...? Há falta de professores nas escolas. E porque é que há falta? Porque o rebanho passa o tempo a bater nos professores, cobarde e ignorantemente, e eles fogem a sete pés das escolas.

JMT faz parte do rebanho que passa o tempo a dizer mal da escola pública e a defender que se gasta muito dinheiro com a escola, mas depois quando não há condições porque não se investiu, diz que a culpa é dos professores. 

Continuem assim, que vai tudo bem. 


December 18, 2021

Porque faltam os professores por todo o lado?

 


Porque são mal pagos e mal tratados pelos Brandões e Costas deste mundo que ganham muito fazendo pior que zero, pois fazer zero era não prejudicar, o que já não era mau.

Isto é nos EUA. Um clube de hóquei resolveu angariar fundos para professores dado saberem quão mal ganham. E como o fez? Como uma diversão para o público, no intervalo de um jogo, despejando dinheiro no chão. 

O que faria se fosse candidatar-se a um trabalho de professor e lhe mostrassem estas imagens para explicar como tencionam pagar-lhe? Pois, é isso. É assim que se trata as pessoas a quem se exige uma formação superior, especializada e anualmente actualizada, para que eduquem os jovens de um país para serem os melhores profissionais e cidadãos. Aliás, deve ter sido muito pedagógico para os alunos, verem os professores a terem que rastejar por meia dúzia de dólares.


December 01, 2021

O RMD diz muitos disparates e quanto mais fala mais se enterra

 


Isto mostra o nível medíocre dos programas de comentário das nossas estações de TV. São 'mentideros', com coscuvilheiros de má língua.

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Texto de RMD:

“Caro Coordenador do STOP 

André Pestana Silva

Chegou-me nota da minuta que alguns dos vossos associados têm feito circular por conta da intervenção que fiz no “último apaga a luz” da passada sexta-feira.

Como imagino que não tenha visto o programa todo permita-me uma breve explicação (na verdade longa porque não tive tempo de a fazer mais curta). A começar pelo contexto. O tema era a anunciada necessidade de contratar 34 mil novos professores. O meu ponto é que a contratação de novos professores não resolve os problemas do sistema educativo. Fui mais longe e afirmei que o sistema era “absurdo”. Tratei então de dar alguns exemplos práticos do absurdo do sistema. Figuras institucionalizadas e formalizadas que não fazem sentido. E que são ainda mais disparatadas quando nos damos ao trabalho de traduzir o jargão técnico para “batatas”. Exercício que (confesso) me diverte, mas que, muitas vezes, choca os interessados. A simplificação da linguagem tem este efeito. Mas tem a vantagem de desnudar o ritualizado à sua essência.

Na prática, acusam-me de ter “mentido” e “caluniado” a “classe” em três casos concretos: o caso das faltas, o caso do horário zero e o caso dos concursos. Também me acusam de não perceber nada da matéria. O que é absolutamente verdade, uma vez que, quanto mais conheço, menos percebo. 

Mas vamos ao caso das faltas.

O regime de faltas está superlativamente definido no estatuto do docente (secção III). No art.º 102 lê-se que o professor pode faltar, sem justificação para tal, por conta de férias. Uma falta, sem justificação, é uma falta injustificada. Podemos depois brincar com as palavras. Dizendo, como eu ouvi, que o artigo que permite que os professores faltem, sem justificação, justifica a falta. Mas é isso mesmo. É brincar com as palavras. No final do dia é mesmo uma falta injustificada. Institucionalizada, formalizada e reconhecida no estatuto do docente. Como disse no programa os alunos também têm essa estranha prerrogativa. Em linguagem mais “colegial”, uns e outros podem “baldar-se” sem justificação. O facto de poderem fazê-lo “até ao limite de sete dias”, em vez de doze, como referi, não atenua nem mitiga o absurdo. Ainda para mais porque procurei e não consegui encontrar qualquer outra profissão onde tal coisa seja possível.

Mas a coisa não fica por aí. Diz o artº94, nº5, “É considerado um dia de falta a ausência a um número de horas igual ao quociente da divisão por cinco do número de horas de serviço docente que deva ser obrigatoriamente registado no horário semanal do docente.” A coisa é bastante obscura, mas presumo que permita que o professor falte injustificadamente a aulas desde que seja num número de horas inferior “ao quociente da divisão por cinco do número de horas de serviço docente”. Também estou à procura de outras profissões que tenham tal coisa prevista. Quando encontrar, aviso.

Onde é que isto é importante? No exemplo que damos aos alunos. Digo eu, que não sou especialista e não percebo nada da matéria.

Vamos ao caso do horário zero.

Disse no programa que havia professores com horário zero. Que não davam aulas. Aprendi (mais tarde) que horário zero é a expressão comum. A coisa tem o nome técnico “docentes sem componente letiva” (decreto-lei 20/2006). Sendo que “componente letiva” é “dar aulas”. Portanto, um professor “sem componente letiva” é um professor que não dá aulas. Isto para a esmagadora maioria das pessoas. Menos para aqueles que conseguem discutir que um professor pode ser professor mesmo que não dê aulas. E a coisa está institucionalizada e formalizada. Como está institucionalizada e formalizada aquela outra coisa bizarra da “componente não letiva” do professor. Que corresponde à parte do horário de trabalho em que o professor não tem que está a dar aulas porque estão a fazer outras coisas de igual importância. Para resumir: um professor dá aulas, mas não obrigatoriamente. Para quem não é “especialista” é uma situação, no mínimo, estranha. Note-se que no ensino superior tal coisa não existe. As escolas (universidades) conseguem organizar-se sem a necessidade de formalizar esta ideia de que os professores não podem dar mais de x´s horas de aulas por semana.

Onde é que isto é importante? Porque o tema era a falta de professores e a necessidade de contratar 34 mil novos profissionais para reforçar os quadros. Acontece que, reduzindo a dita componente não letiva e eliminando o horário zero talvez não tivéssemos tantos alunos sem aulas. Digo eu, que não sou especialista e não percebo nada da matéria.

Finalmente o caso dos concursos.

O mais bizarro de todos os casos. Ao contrário do ensino superior onde as escolas (universidades) têm autonomia para abrir concursos para as suas vagas e onde o critério é o mérito, o restante ensino público está obrigado a um concurso nacional onde o critério é o tempo de serviço. Vai daí o meu raciocínio, que alguns não perceberam, mas é mais simples do que parece. Vamos a isso: idade é mais tempo de serviço, mais tempo de serviço é maior graduação, maior graduação é mais vencimento, mais vencimento é maior desconto para o sindicato. Logo: quanto maior o desconto mais hipóteses de ficar à frente no concurso.   

Onde é que isto é importante? Porque afasta os melhores ou obriga quem entra no sistema a percorrer dezenas de quilómetros para conseguirem trabalhar. Digo eu, que não sou especialista e não percebo nada da matéria.

Para terminar digo que o Estatuto da carreira docente e o concurso foi sendo “aperfeiçoado” ao longo de anos pela máquina de professores do Ministério da educação. Ignorar o papel da vintena de sindicatos da educação nas longas jornadas negociais, ao longo de dias e noites, nas últimas décadas, para que este seja o resultado final. As inúmeras maratonas negociais, com televisões à porta dos edifícios da 5 de outubro, era minimizar ou reduzir a pó o notável papel dos sindicatos no resultado que hoje nos é colocado à frente: faltam 30 mil professores para dar aulas (ou para ter componente letiva, como preferir).

E isso é injusto para quem passou tantas horas, dias e noites a negociar e a deixar a sua marca indelével no ECD e no Concurso. Segundo li, são 281 professores destacados para atividades sindicais e que preferiram sacrificar a “componente letiva” dos seus alunos para defenderem os interesses dos seus colegas com estes maravilhosos resultados.

Também digo que me responsabilizo pelo que disso. Sempre. E não me chocam as palavras (pouco simpáticas) que a turba me tem dirigido. Pelo contrário. Fico à disposição para esclarecer o que disse ou debater o tema com quem entender, no formato que quiser.

Cordialmente,

Rodrigo Moita de Deus”.

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Resposta do Coordenador do S.TO.P. a RMD:

“Comentador Rodrigo Moita de Deus,

Como me dirigiu publicamente (incluindo na sua página pessoal do Facebook) um texto, que colocaremos na íntegra no site do S.TO.P., solicito que publique também na íntegra esta minha resposta.

Antes de mais quero esclarecer que ouvi com muita atenção, e por diversas vezes, tal foi a minha incredibilidade, toda a sua intervenção sobre os professores no programa “O último apaga a luz”, de 19 de novembro. 

O S.TO.P. já esclareceu publicamente a total falta de fundamentação de muitas das suas afirmações graves contra os professores, por isso vou debruçar-me essencialmente ao texto que me dirigiu.

O Rodrigo Moita de Deus (RMD) escreveu no início desse texto:

“A simplificação da linguagem tem este efeito. Mas tem a vantagem de desnudar o ritualizado à sua essência.”

Simplificação da linguagem, algo que os professores estão habituados a fazer, em particular, quando tentamos adaptar-nos ao nível de linguagem dos nossos alunos mais jovens, não tem nada a ver com deturpação, algo que após exposta desnuda a seriedade de quem a pratica.

SOBRE AS FALTAS

Em determinada parte do texto o RMD escreveu:

“definido no estatuto do docente (secção III). No art.º 102 lê-se que o professor pode faltar, sem justificação para tal, por conta de férias. Uma falta, sem justificação, é uma falta injustificada. “

Primeira correção: Ao contrário do que escreveu, no Estatuto da Carreira Docente no artigo 102º. nunca se lê “que o professor pode faltar, sem justificação para tal, por conta das férias”.  Mas não lhe peço para acreditar no que lhe digo, mas na verdade dos factos, verificando in loco no Estatuto da Carreira Docente: https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/decreto-lei/2012-117105579-117110995

Aliás, como é que um professor poderia faltar “sem justificação para tal” por conta das férias se, no mesmo artigo, refere que o professor deve pedir com 3 dias de antecedência autorização por escrito ao seu órgão de direção?!

O RMD depois escreve:

“Em linguagem mais “colegial”, uns e outros podem “baldar-se” sem justificação. O facto de poderem fazê-lo “até ao limite de sete dias”, em vez de doze, como referi, não atenua nem mitiga o absurdo. Ainda para mais porque procurei e não consegui encontrar qualquer outra profissão onde tal coisa seja possível.”

Diz que procurou e não encontrou, mas não é difícil encontrar outras profissões em que se possa faltar por conta de férias não 7 dias (como os professores), mas até 13 dias. E ainda por cima nessas profissões, além de poderem faltar por conta das férias, praticamente o dobro dos professores, podem pedir autorização ao seu superior hierárquico, com apenas 1 dia de antecedência (ao contrário dos professores que devem fazê-lo com 3 dias de antecedência). 

Uma vez mais, verifique a verdade dos factos in loco na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (artigo 135.º):

https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/lei/2014-57466875-57517688

SOBRE OS “HORÁRIOS ZERO”

O RMD “Disse no programa que havia professores com horário zero. Que não davam aulas. Aprendi (mais tarde) que horário zero é a expressão comum. A coisa tem o nome técnico “docentes sem componente letiva” (decreto-lei 20/2006). Sendo que “componente letiva” é “dar aulas”. Portanto, um professor “sem componente letiva” é um professor que não dá aulas. Isto para a esmagadora maioria das pessoas. Menos para aqueles que conseguem discutir que um professor pode ser professor mesmo que não dê aulas. E a coisa está institucionalizada e formalizada”.

Mais uma vez falseou a realidade, não existem professores com horário zero. Todos os professores (incluindo os que refere como “horário zero”) têm naturalmente um horário a cumprir, as mesmas 35 horas semanais que todos os outros trabalhadores da função pública. E mesmo assim continuam a desempenhar tarefas muito importantes para as escolas, dando apoios a alunos, coadjuvações com outros docentes, dinamizando grupos de trabalho, atividades extracurriculares (AEC), clubes, aulas de substituição, trabalho na biblioteca, etc.

Posteriormente também refere (sublinhado meu):

 “Como está institucionalizada e formalizada aquela outra coisa bizarra da “componente não letiva” do professor. Que corresponde à parte do horário de trabalho em que o professor não tem que está a dar aulas porque estão a fazer outras coisas de igual importância. Para resumir: um professor dá aulas, mas não obrigatoriamente. Para quem não é “especialista” é uma situação, no mínimo, estranha. Note-se que no ensino superior tal coisa não existe. As escolas (universidades) conseguem organizar-se sem a necessidade de formalizar esta ideia de que os professores não podem dar mais de x´s horas de aulas por semana”.

Mais uma vez, o Rodrigo volta várias vezes a faltar à verdade, ainda por cima dando a ilusão que detém uma certeza absoluta. No entanto poderá verificar que no artigo 71.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária (sublinhado meu):

“1 – Cada docente em regime de tempo integral presta um número de horas semanais de serviço de aulas ou seminários que lhe for fixado pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição de ensino superior, num mínimo de seis horas e num máximo de nove, sem prejuízo, contudo, do disposto no artigo 6.º”.

Ou seja, mais uma vez, ao contrário do que o RMD afirmou perentoriamente, não só existe um limite de horas letivas semanais (9 horas) para os docentes universitários, bem como este é em número muito inferior ao do ensino não superior. Também nesse estatuto está definido trabalho para o docente universitário para além das aulas no ponto 3 do mesmo artigo 71.º :”Para além do tempo de lecionação de aulas, o horário de serviço docente integra a componente relativa a serviço de assistência a alunos, devendo este,  em regra, corresponder a metade daquele tempo”.

Se quiser, verifique a verdade dos factos in loco no Estatuto da Carreira Docente Universitária (artigo 71.º): https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/decreto-lei/1979-72873110-72981999

SOBRE OS CONCURSOS

O RMD escreveu:

“Ao contrário do ensino superior onde as escolas (universidades) têm autonomia para abrir concursos para as suas vagas e onde o critério é o mérito, o restante ensino público está obrigado a um concurso nacional onde o critério é o tempo de serviço. Vai daí o meu raciocínio, que alguns não perceberam, mas é mais simples do que parece. Vamos a isso: idade é mais tempo de serviço, mais tempo de serviço é maior graduação, maior graduação é mais vencimento, mais vencimento é maior desconto para o sindicato. Logo: quanto maior o desconto mais hipóteses de ficar à frente no concurso”.

O seu raciocínio não é simples, mas sim deturpador da realidade. Facilmente poderá verificar que há professores com maior idade que têm menor graduação profissional (e vice-versa). Se o que escreveu fosse minimamente verdade permitiria a um professor com poucos anos de serviço (com avaliações no mínimo de bom), por ser sindicalizado, ultrapassar, nos concursos, um outro professor, não sindicalizado, com muitos anos de serviço (e com avaliações no mínimo de bom) e isso é totalmente falso, inclusive, desafio-o a dar um caso concreto que seja.

Naturalmente os critérios e os próprios concursos docentes não são perfeitos e, como é público, o S.TO.P. tem feito críticas e propostas construtivas (mas não aceites). No entanto, os critérios e os resultados são totalmente públicos e todos podem escrutinar e reclamar.

Seguidamente, RMD escreveu também:

“Para terminar digo que o Estatuto da carreira docente e o concurso foi sendo “aperfeiçoado” ao longo de anos pela máquina de professores do Ministério da educação. Ignorar o papel da vintena de sindicatos da educação nas longas jornadas negociais, ao longo de dias e noites, nas últimas décadas, para que este seja o resultado final. As inúmeras maratonas negociais, com televisões à porta dos edifícios da 5 de outubro, era minimizar ou reduzir a pó o notável papel dos sindicatos no resultado que hoje nos é colocado à frente: faltam 30 mil professores para dar aulas (ou para ter componente letiva, como preferir)”.

Como facilmente confirmará, o S.TO.P. é o sindicato mais recente da área da Educação (com apenas 3 anos) com importantes diferenças com os sindicatos tradicionais nomeadamente o único com mandatos consecutivos finitos para os seus dirigentes. Por isso, naturalmente, não podemos ser responsabilizados pelo que os outros sindicatos/federações têm feito nas últimas décadas (o S.TO.P. nunca assinou nenhum acordo com o ME, nem assinará sem antes auscultar democraticamente os docentes). No entanto, apesar de discordar de certos acordos entre o ME e os sindicatos/federações docentes, é manifestamente exagerado dizer como disse no programa que “quem faz as regras são os professores e os sindicatos”.

Apesar do RMD considerar os professores em Portugal “miseráveis” (como chegou a dizer abertamente no mesmo programa quando o S.TO.P. ainda não existia), e que supostamente 3 milhões de pais teriam uma péssima impressão dos professores, afirmo, fundamentadamente que, por muito que lhe custe, a maioria dos portugueses continua a considerar a profissão docente como uma das mais confiáveis.

Mais uma vez, verifique a verdade dos factos in loco em estudos e não meramente em números lançados para o ar sem qualquer fundamento.

Sondagens das profissões que os portugueses mais confiam:

Em 2008 – https://www.publico.pt/2008/01/25/portugal/noticia/professores-sao-profissao-em-que-portugueses-mais-confiam-e-a-quem-dariam-mais-poder-1317684

Em 2019 – https://expresso.pt/sociedade/2019-01-17-Bombeiros-medicos-e-professores-os-profissionais-em-que-os-portugueses-mais-confiam-1

 O RMD quase no final, escreve:

“Também digo que me responsabilizo pelo que disso. Sempre. E não me chocam as palavras (pouco simpáticas) que a turba me tem dirigido. Pelo contrário.”

Compreendo que, para se vitimizar, seria mais fácil tentar construir uma narrativa de que estaria a ser alvo de uma incompreensão de uma classe, fruto de uma suposta reação corporativa. No entanto, por muito que lhe custe, as suas afirmações no referido programa não deixaram perplexa apenas a classe docente.  A própria Provedora do Telespetador da RTP, Ana Sousa Dias, afirmou sobre o programa em questão (sublinhado meu):

“Também eu fiquei perplexa com as afirmações do participante do programa Rodrigo Moita de Deus. As opiniões dos participantes em programas só a eles próprios podem ser imputadas mas, neste caso, foram invocados “Factos” que são falsos.” E “Um programa de debate na televisão do serviço público não pode ser uma “conversa de café” inconsequente.”.

Não se pode confundir liberdade de expressão e diferença de opinião (que respeito) com liberdade para caluniar.

RMD, admito que chega a ser constrangedor verificar que alguém que fala semanalmente na televisão possa veicular tantas e tão graves afirmações não fundamentadas que, além de deturparem a realidade, influenciam clara e negativamente a imagem dos professores. Das duas uma, ou o RMD mente deliberadamente, ou é tão incompetente/”baldas” que nem sequer se dá ao trabalho de verificar minimamente o que afirma como verdadeiro.

O RMD termina, escrevendo:

“Fico à disposição para esclarecer o que disse ou debater o tema com quem entender, no formato que quiser.”

Basta que o RMD avise com 10 dias de antecedência (indicando o dia/hora quando tiver disponibilidade) que arranjarei um espaço, para que possamos debater as questões que foram levantadas por si no programa.

Por último, tenho que reconhecer que há algo que referiu várias vezes no seu texto que sou obrigado a concordar 100% consigo, quando assume que “Digo eu, que não sou especialista e não percebo nada da matéria.”. 

Atentamente,

André Pestana – Coordenador do Sindicato de Todos os Professores (S.TO.P.).”