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July 15, 2023

Mudar o esquema social ancestral da sub-representação das mulheres




Tribunal Constitucional não respeita paridade

Teresa Pizarro Beleza e Helena Pereira de Melo

Durante séculos as mulheres não puderam votar. Nem representar o Estado como diplomatas ou juízas ou agentes do Ministério Público, pertencer às Forças Armadas, decidir da vida das suas famílias ou determinar a sua própria nacionalidade ou a dos seus filhos. 
Um dos argumentos aduzidos para o efeito era o de o Estado ser do sexo masculino, sendo de elementar bom senso que as portadoras de cérebro cor-de-rosa não participassem na eleição dos titulares de órgãos de soberania, nem incarnassem a entidade "Estado" em qualquer posição de responsabilidade e chefia. 

Hoje as mulheres têm plena capacidade eleitoral ativa e passiva. São deputadas, ministras, presidentes de câmara, como são magistradas judiciais ou do Ministério Público, diplomatas ou militares de qualquer patente e decidem das suas vidas de forma muito mais autónoma. A paridade foi legalmente assegurada em 2006 nas listas das candidaturas à Assembleia da República, ao Parlamento Europeu e aos órgãos eletivos das autarquias locais, incluindo as juntas de freguesia. Foi alargada em 2017, passando a abranger as autoridades administrativas independentes com função de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo e, em 2019, no que respeita à representação equilibrada entre homens e mulheres no pessoal dirigente e nos órgãos da Administração Pública.

Estranhamente, porém, a composição do Tribunal Constitucional continua a não obedecer ao princípio da representação paritária, não obstante a designação dos seus juízes resultar da votação de uma lista de candidatos pela Assembleia da República ou do Colégio de Juízes por esta eleito, o que lhe confere um acentuado pendor político, fácil de constatar nas morosidades ultimamente ocorridas no processo de cooptação de novos juízes e no de eleição do seu mais recente presidente.

A não-existência na vigente Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, do critério da paridade entre homens e mulheres na composição deste tribunal, especificamente competente para administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional, tem gerado um inegável "teto de vidro" na plena participação das mulheres neste órgão de soberania. 

Desde a adoção, em 1982, da sua Lei Orgânica, o Tribunal Constitucional ainda não teve uma única mulher a presidi-lo. O número de conselheiras tem sido sempre inferior, nos últimos 40 anos, ao de conselheiros. A composição atual do tribunal é bem expressiva dessa ausência de paridade: 9 juízes homens e 3 mulheres. A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas alertou recentemente o presidente da Assembleia da República para este facto e para a necessidade de se consignar, na lei, o princípio da representação paritária no que concerne à composição deste tribunal.
(...)
Numa sociedade que leve a sério a defesa dos direitos de todos e a tarefa fundamental do Estado de assegurar a promoção da igualdade entre mulheres e homens, constitucionalmente imposta, é imperativo que se altere a Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, no sentido da introdução do critério de paridade entre homens e mulheres na sua composição. 
Há mulheres professoras de Direito Constitucional e magistradas da judicatura ou do Ministério Público que reúnem, em condições de igual ou superior mérito aos de muitos homens, os requisitos legais indispensáveis para serem juízas no Tribunal Constitucional. Não é aceitável a sua sistemática desvalorização, ao longo dos últimos 40 anos, face aos seus pares homens, nem a ausência de escrutínio público dos conselheiros cooptados, que podem revelar-se nem sempre intransigentes defensores dos Direitos Humanos das mulheres, em particular das suas liberdades sexuais e reprodutivas.

Teresa Pizarro Beleza é professora Catedrática Jubilada da Nova School of Law.
Helena Pereira de Melo é professora associada com agregação
da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa

January 31, 2023

Onde andam os tais Ds?

 


Terça-feira, 31.01.23

Juiz Presidente de Lisboa Substitui Grevistas

      Nesta última sexta-feira (27JAN), a revista Visão apresenta uma notícia que intitula assim:

      “Juiz presidente da Comarca de Lisboa fintou greve geral no “Ticão” com requisição a outro tribunal”

      De acordo com a mencionada publicação, Artur Cordeiro, o juiz que preside o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, terá ordenado, na passada sexta-feira, uma requisição de Oficiais de Justiça do Juízo Local para substituir os Oficiais de Justiça do Juízo Central de Instrução Criminal, vulgarmente conhecido como “Ticão”.

      De acordo com fonte sindical, citada pela revista, o Oficial de Justiça que substituiu os colegas em greve foi chamado para uma diligência de um processo mediático, relacionado com o Banco Espírito Santo (BES).

      Estando todos os Oficiais de Justiça daquele Juízo em greve, substituir qualquer um por outro que ali não presta nem prestava serviço à data do aviso prévio da greve, faz com que haja uma clara violação do direito à greve.

      A greve que decorre todas as tardes, por tempo indeterminado, vem ocorrendo por todo o país, todos os dias, sem que haja notícia de qualquer violação tão flagrante e tão abusiva quanto a que a Visão traz a público.

      “Ao ordenar a requisição de elementos de outros serviços, o juiz presidente da comarca – que não respondeu aos contactos da Visão – cometeu, segundo fonte sindical, uma ilegalidade, porque está a tentar contornar o direito à greve dos Oficiais de Justiça, quando, como disse a mesma fonte, “Ainda por cima, não está em causa um processo urgente”.

      E ainda que estivesse em causa um processo urgente, a greve não tem qualquer tipo de serviço mínimos, nem para processos urgentes; nada, pelo que a greve é sempre para ser realizada, aliás, como muito bem fizeram os Oficiais de Justiça que ali desempenham funções e, como muito mal fez aquele que aceitou fazer a diligência, não tendo aderido à greve de imediato.

      Já aqui o dissemos vezes sem conta, mas vamos repetir outra vez: Qualquer Oficial de Justiça, seja sindicalizado neste ou naquele sindicato ou em nenhum, pode aderir às greves em curso e pode fazê-lo em qualquer momento.

      Por exemplo: a greve de todas as tardes tem início às 13H30, mas a essa hora está o Oficial de Justiça a trabalhar, não tendo aderido à greve, até que, subitamente, seja lá por que motivo for, pelas 15H00 decide aderir à greve. Não há nenhum problema e serão registadas duas horas de greve.

      Todos devemos ser compreensivos por quem decide não fazer greve, nunca ou muitas vezes, mas numa situação abusiva de substituição dos colegas em greve, essa machadada e essa traição tem de ser evitada, pelo que seria sensato que tivesse entrado imediatamente em greve perante a abusiva solicitação ou ordem, como, aliás, se vai fazendo por todo o país.

      O colaborador ou o colaboracionista não é um verdadeiro Oficial de Justiça.

      O mecanismo das greves é muito simples: primeiro o sindicato apresenta o Aviso Prévio de Greve e nele indica os serviços mínimos que julga necessários ou refere que não há necessidade deles. A entidade empregadora aceita a greve tal como está enunciada ou, não aceitando apresenta os seus serviços mínimos. O sindicato pode aceitar essa indicação ou não. Não havendo acordo é convocada uma comissão (ou tribunal) arbitral que representa as partes e é esta comissão quem passa a ter a competência legal para fixar serviços mínimos e mais ninguém nunca – cfr. artigo 398.º e ss. da Lei 35/2014, de 20 de junho.

      No caso da greve de todas as tardes, não foram fixados nunca serviços mínimos, pelo que não existem e ninguém os pode agora indicar, nem, muito menos, tentar substituir-se à entidade empregadora, ao sindicato ou à comissão arbitral. Ninguém nunca!

      Quer isto dizer que se não há serviços mínimos, não há mesmo e ninguém os pode fixar, podendo todos os Oficiais de Justiça aderir à greve sem qualquer restrição. De igual modo, aqueles que aderem à greve não podem ser substituídos, nem pode ser indicado, seja lá quem for e para o que for, para assegurar os inexistentes serviços mínimos – cfr. artº. 535º do Código de Trabalho.

      Recordemos que a ordem, a pressão ou qualquer outro tipo de procedimento destinado a levar um trabalhador a não aderir à Greve é algo proibido – cfr. artigo 540.º do Código de Trabalho.

      Verificando-se a violação do disposto nos n.ºs 1 ou 2 do artigo 535.º ou no n.º 1 do artigo 540.º, ambos do Código do Trabalho, tal violação é punida com pena de multa até 120 dias – cfr. artigo 543.º do mesmo diploma legal.

      Apesar de durante o período normal de trabalho todos poderem substituir todos, colaborando no que fizer falta para cumprir a obrigação estatutária da “normalização do serviço”, durante o período de greve, os Oficiais de Justiça só podem substituir outros que trabalhem na sua mesma secção ou Juízo. Convém aqui referir que se num Juízo Local Criminal houver várias unidades de processos e juízes (J1, J2, J3, etc.), ainda que se encontrem em espaços físicos diferentes, o Juízo é sempre o mesmo e os lugares de juízes (J1, J2, J3, etc.) não são independentes, pertencendo ao mesmo Juízo. E esta é a única interpretação possível para a substituição, ou seja, não há áreas jurisdicionais, vizinhanças das unidades processuais, boas-vontades e tanto mais.

      De todos modos, reafirmamos que, a ocorrer qualquer tipo de pressão para a substituição, provinda da magistratura, da presidência ou dos cargos de chefia, só aceita tal pressão quem quiser, uma vez que pode negar-se a tal ilegalidade ou, sem mais, a todo o momento, entrar em greve.

      Não é admissível que qualquer Oficial de Justiça sofra desse tipo de “bullying”; de submissão perante uma entidade que o desrespeita e desvaloriza, ao mesmo tempo que faz quebrar a solidariedade entre colegas.

      Por fim, recordar que todos os abusos ou as suas meras tentativas, devem ser denunciadas, desde logo aos sindicatos, sem prejuízo de outras divulgações, pois tais abusos não só não devem ficar impunes, como, antes do mais, devem servir de aprendizagem para os abusadores.

      Que ninguém fique à espera que, de repente, lhes caia do céu o discernimento, a compreensão e, ou, a solidariedade. Não vai cair; é necessário fazer acontecer; fazer cair e, para isso, pode ser necessário empurrar.

      ATUALIZAÇÃO: Relativamente a este assunto, em nota informativa, o SOJ refere o seguinte:
      «O Sindicato dos Oficiais de Justiça apresentou queixa, hoje mesmo, dia 30-01-2023, na PGR, do ato que terá sido praticado pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca de Lisboa em que se determinava a substituição de Oficiais de Justiça grevistas. Cabe agora à PGR apreciar a matéria.»