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June 07, 2022

"Todos temos uma mancha de humanidade a pesar sobre a história."

 


Um quadro de Klee chamado Angelus Novus mostra um anjo parecendo que está prestes a afastar-se de algo que está a contemplar fixamente. Os seus olhos estão a olhar, a sua boca está aberta, as suas asas estão abertas. É assim que se imagina o anjo da história. O seu rosto está virado para o passado. Onde percebemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma única catástrofe que continua a empilhar destroços sobre destroços e os atira para a frente dos seus pés. O anjo gostaria de ficar, acordar os mortos e tornar inteiro aquilo que foi esmagado. Mas uma tempestade está a soprar do Paraíso; foi apanhada nas suas asas com tanta violência que o anjo já não consegue fechá-las. A tempestade impele-o irresistivelmente para o futuro, para o qual as suas costas estão viradas, enquanto a pilha de destroços à sua frente cresce para o céu. Esta tempestade é aquilo a que chamamos progresso".

     — Angelus Novus', de Paul Klee, comentado por Walter Benjamin

(post da Mª João Guerreiro no FB)



January 27, 2021

Hoje é o dia internacional da lembrança do holocausto

 


Porque lembramos que o mal existe e é mais comum do que se pensa e parece?


* colectivamente:

- por utilidade: se não aprendemos com os erros do passado como evitamos recair neles?

- por respeito: por todos aqueles que sofreram, morreram e perderam as famílias e a pátria.

- para reafirmarmos a nossa humanidade: nós somos os outros - somos as vítimas e somos os carrascos.


* individualmente:

 - por consciência: somos elos em cadeias de transmissão sociais e o que cada um faz conta para o resultado final.

- por vontade: nunca ser um elo na cadeia que farpa os outros.




August 12, 2020

Bertrand Russel em defesa do ensino e do lazer


Como podemos encontrar significado no lazer? O primeiro passo está na educação. As escolas e as universidades não têm valor apenas por nos prepararem para o mundo do trabalho, mas também porque nos preparam para o lazer. 
As artes, as humanidades e as ciências puras são frequentemente ridicularizadas como inúteis, mas alguém que lê sobre física ou filosofia por diversão, que pinta potes ou toca um instrumento, que escreve romances ou faz filmes, está equipado para encontrar significado na sua vida para além do local de trabalho. 

Russell argumentou que um objetivo central da educação é equipar a população com as competências, conhecimentos e hábitos necessários para desfrutar do lazer criativo. Isso obrigaria a uma reforma: o acesso ao ensino superior precisaria ser amplamente expandido, enquanto os currículos universitários e escolares deveriam enfatizar tanto as artes criativas e a busca da pura curiosidade quanto as competências empregáveis.

Isso pode soar idealista. Os educadores são constantemente chamados a demonstrar o valor económico de seus diplomas. No entanto, isso apenas demonstra outra doença de nossa sociedade, o complemento do culto ao trabalho: a suposição de que todo o valor deve ser medido em libras esterlinas. 

A crise atual já corroeu essa ideia: fanáticos à parte, percebemos que vale a pena sofrer um golpe económico para preservar a saúde. Afinal, é para isso que serve o dinheiro. A produção económica é um meio, não um fim. A saúde é verdadeiramente, intrinsecamente valiosa. Se valorizamos a saúde em si mesma, por que não reconhecer também o valor intrínseco do ensino? 

As escolas ensinam desportos às crianças e não consideramos isso inútil, embora a maioria dos alunos não se torne atleta profissional Da mesma forma, não insistimos que as escolas se concentrem nos desportos cujas habilidades são mais facilmente transferidas para o local de trabalho.

A educação desportiva é valiosa porque promove a saúde e a alegria do jogo. Se pensamos que as escolas e universidades devem promover a saúde física e que o jogo físico é um bem em si, por que não reconhecer que elas também devem preparar os alunos para o jogo mental e o florescimento intelectual? 

A sociedade que Russell imagina, a sociedade que investe em ociosidade significativa, é verdadeiramente revolucionária - não apenas porque as suas estruturas económicas foram reformadas, mas porque mudou a maneira como se entende e se valoriza. 

 Estamos acostumados a comparar o sucesso dos países em termos de PIB. Quando fazemos isso, devemos considerar uma sociedade um fracasso relativo se os seus cidadãos ganham em média £ 1.000 por ano menos do que os seus vizinhos, mesmo que tenham mais lazer, pratiquem mais desportos, façam mais caminhadas, leiam mais livros, ouçam mais música e pintem mais. Mas não estamos condenados a pensar dessa maneira. Devemos seguir o conselho de Russell e aprender a saborear os frutos do lazer.


(excerto com tradução minha)

August 07, 2020

Beirute - Às vezes é difícil uma pessoa não sentir-se alienada deste mundo

 

Uma explosão num armazém com nitrato de amónio no meio do porto de Beirute foi ouvida em Chipre, matou imediatamente 100 pessoas e deixou 300 mil sem casa. Fora os que ficaram feridos e os que vão passar fome ou morrer por falta de medicamentos ou por terem perdido todos os seus pertences. Sabe-se agora que toda a gente que tem lugar nos cargos de poder sabia do perigo há muitos anos e ninguém fez nada. Isto foi um armazém. Quantos navios e submarinos andam aí pelos mares carregados de dispositivos nucleares? São 'armazéns' ambulantes que, se têm um acidente ou são alvo de um ataque, destroem, não um porto mas cidades inteiras. Matam, não 100 pessoas mas dezenas de milhar e deixam vastas áreas inabitáveis por décadas. No entanto, ninguém faz nada. Seria de supor que, quanto mais se conhece o poder maléfico das armas convencionais, biológicas e nucleares, mais cuidado se teria com elas, mas não é isso o que acontece. O que acontece é a voragem corrupta dos que estão no poder (não escol mas escória) aliar-se à voragem das grandes corporações e viverem para destruir o amanhã de todos nós e dos nossos filhos e dos filhos dos nossos filhos. Não há muito que uma pessoa possa fazer no seu raio limitado de acção e por vezes é muito difícil não nos sentirmos alienados deste mundo.


Warehouses storing medicines and vaccines in the port of Beirut were damaged in Tuesday’s monster blast. (AFP)

PARIS: With some 300,000 people left homeless by the massive explosion in Beirut, and fears of food and medicine shortages, MSF on Thursday likened the humanitarian fallout to that of Lebanon’s civil war.

Akiki said his group, along with other organizations such as SEAL and Life Lebanon, have set up Beirut Emergency Fund 2020, which will raise much-needed money and channel it to safe and reputable organizations in Lebanon.

December 17, 2019

A educação: a questão metafísica e a arte




Há uns bons anos tive um dia uma discussão com um sobrinho que queixava-se de ter que aprender literatura na escola. Estava no fim do secundário e dizia que, tendo escolhido um curso na área das ciências, não tinha que aprender Camões, Pessoa, Eça, etc., uma vez que não ia 'usar isso para nada'. Só precisava de saber escrever.

Tentei explicar-lhe que a educação não se reduz a ferramentas para uma profissão, que forma também a pessoa porque a vida é mais que ter uma profissão, que os bons escritores dão-nos visões e experiências importantes para a vida, que as palavras são o conteúdo da riqueza da nossa paisagem interior, emocional e intelectual... enfim, nada o convenceu porque estava cimentada nele a ideia de que a escola tem a função exclusiva de formar para se ser um profissional e cidadão útil.

É muito comum os alunos fazerem-nos estas perguntas? Para que tenho que estudar filosofia, se quero ser biólogo, ou saber o Gil Vicente se quero estudar gestão ou saber de paisagem agrícola se vivo na cidade? Crescem a ouvir dizer que há cursos que deviam acabar porque não têm interesse para a economia, a ver as disciplinas serem reduzidas consoante têm utilidade para a economia e a vê-las reduzidas a técnicas.

A culpa disto é do Darwin, como costumo dizer. É claro que a culpa não é dele mas a teoria dele introduz a ideia de função na explicação da realidade. Tudo que existe e se desenvolve é [uma técnica] em função de um ganho evolutivo qualquer. Nada existe por si, tudo existe em função de, se não é útil desaparece.

Esta ideia foi transformada em paradigma explicativo de todo o real, não por ele, mas pelos seus seguidores, como é costume acontecer às teorias que têm grande poder explicativo e abrangente e, tornou-se uma ditadura mental que a tudo se impõe.

Por exemplo, na arquitectura, uma disciplina aparentemente tão distante da biologia, os edifícios foram-se tornando, aos poucos, totalidades funcionais e perderam os elementos [in-úteis] meramente decorativos que costumavam embelezá-los, como ainda vemos nos edifícios antigos.

Na Filosofia a moda é reduzi-la a técnicas funcionais. Como se alguém pudesse ter um espírito crítico ou um pensamento fecundo por saber técnicas de lógica e argumentação.

É um dos grandes erros da educação, esse de querer reduzir todas as disciplinas a uma formação técnica e funcional. Nem prepara as pessoas para a vida, que é muito mais que o exercício de uma profissão, nem sequer para ser um bom profissional pois exercer uma profissão não é repetir e aperfeiçoar uma técnica como bem vemos pelos políticos que são muito bons na contabilidade mas péssimos a pensar o interesse humano n arquitectura social ou como os médicos que são muito bons tecnicamente mas não percebem nada das pessoas que têm que tratar, etc.

Os primeiros vestígios que temos da humanidade são: a arte, deixada nas paredes e, a questão metafísica acerca do sentido da existência, a que os primeiros humanos responderam com a religião como se infere pelos túmulos, registos de preocupação com a preservação do corpo, dos objectos e utensílios da vida para uma outra vida depois desta.

Não existe nenhuma civilização desde que existem humanos, que saibamos, sem arte e sem a questão acerca do sentido, do propósito da existência.
Acho que isso devia dizer-nos algo acerca das necessidades humanas e de a educação não dever reduzir-se a técnicas para fomentar o crescimento económico. Disciplinas consideradas acessessórias são, na verdade, uma parte fundamental da experiência de se ser humano. Se é que a educação se assume como formação de humanos e não de máquinas exploráveis.