Historiador franco-alemão, filólogo e helenista, Heinz Wismann é um pensador que encarna o espírito europeu.
Facto e sentido. O papel da linguagem na experiência de um mundo partilhado.
"Todas as línguas naturais têm a dupla dimensão do dizer e do querer dizer. Com efeito, se o discurso nasce da necessidade de objetivar a nossa relação com a realidade, a sua função denotativa é complicada por uma sobredeterminação conotativa, que reflecte o ponto de vista do locutor.
Isto explica por que razão a maior parte das palavras que utilizamos para designar factos são inicialmente metáforas que lhes conferem um significado subjetivo e objetivo. Para evitar esta ambivalência, que alimenta a imaginação poética, a filosofia começou a desenvolver uma linguagem conceptual destinada a garantir a coerência lógica da sua argumentação.
As ciências seguiram o mesmo caminho, desenvolvendo terminologias ad hoc capazes de formalizar os seus enunciados fundamentais para evitar qualquer risco de equívoco. Este processo culmina nas ciências naturais, que adoptaram uma ferramenta semântica emprestada da matemática pura.
O resultado é uma situação problemática, caracterizada pelo divórcio entre o discurso da ciência e o discurso sobre a ciência.
Enquanto a primeira é utilizada no interior de campos disciplinares, dando prioridade à sua relevância interna, a segunda faz parte do horizonte mais vasto de uma linha de raciocínio que tematiza o conhecimento enquanto tal.
Quando uma determinada ciência pretende dar respostas que se aplicam a todas as questões científicas, torna-se cientismo; e quando a epistemologia geral ignora a diversidade da investigação actual, torna-se ideologia.
Para contrariar estas derivas simétricas e preservar a ideia de uma partilha efectiva de conhecimentos, é necessário repensar o destino das línguas à luz da experiência da tradução".
Heinz Wismann, Ler nas entrelinhas. Nas pegadas do espírito europeu (Albin Michel, 2024)
Heinz Wismann, Ler nas entrelinhas. Nas pegadas do espírito europeu (Albin Michel, 2024)