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October 22, 2023

Num mundo de validação exacerbada de emoções e sentimentos

 


O mundo Ocidental, nos últimos 200 anos, tinha-se habituado a procurar consensos através de entendimentos racionais, de onde a ética não estava ausente. 

Mesmo que os países entrassem em guerra uns com os outros, as pessoas em geral sabiam os limites éticos das acções e, por isso, tentavam esconder os crimes e negavam-os publicamente: os nazis tentaram esconder o holocausto, Estaline negava as purgas ao seu próprio povo, os europeus tentavam esconder os crimes do colonialismo, etc. 

O movimento de racionalização que talvez tenha suportado a ideologia do colonialismo, foi o mesmo que mais tarde a condenou. Contudo, o mundo ocidental actual, num desejo de se afastar dos processos racionais, que são os que nos aproximam uns dos outros, valorizou até ao limite a subjectividade das emoções e sentimentos. Hoje-em-dia, toda uma área de conhecimento pode ser abafada se uma pessoa se sentir ofendida nos seus sentimentos pessoais e íntimos. 

Estávamos acostumados a educar, a recalcar e a redireccionar de modo socialmente aceitável os sentimentos e emoções de ódio, raiva, violência, vingança, etc. que todos temos de vez em quando como expressões de frustração (mas que controlamos e não usamos para agir), com o objectivo de encontrar consensos que permitissem a vida social, colectiva. Porém, esta educação actual para a validação exacerbada de emoções e sentimentos sem nenhuma revisão racional, leva a que as pessoas sintam que é legítimo e desejável expressar e desenvolver todos os seus sentimentos de fúria e ressentimentos, mesmo em modos que quebram a possibilidade de entendimentos sociais colectivos. Daí que tenham perdido o pudor de exibirem publicamente os seus sentimentos e desejos de morte e vingança. 

É claro que, quanto mais valorizam os seus sentimentos e emoções individuais, menos os processam racionalmente e menos serão capazes de serem independentes de ideologias manipuladoras desses sentimentos e emoções. Para a validação de sentimentos e emoções, os factos são irrelevantes. Os factos e os princípios éticos, porque a pessoa sente o que sente, mesmo que os seus sentimentos sejam contrários a uma ética comum de convivência possível. Só que, dado que a democracia é um sistema político que valoriza a discussão, o exame racional das crenças, o debate das ideias e o consenso sobre plataformas comuns de suporte da vida colectiva, essa validação exacerbada de emoções e sentimentos mina a possibilidade de consensos.

Estes dois vídeos e a fotografia entre eles, são exemplos da sobreposição dos sentimentos individuais à ética comum. A ética comum é que possibilita que comunidades culturalmente díspares do planeta se sentem juntas na mesa das NU, à volta de uma carta de direitos fundamentais a respeitar. A ética comum é o que possibilita que uma maioria de países nesse Conselho, pressionem outro(s) a agir eticamente. 

Quando as emoções subjectivas valem mais que os consensos racionais temos isto:

- no 1º documento, uma russa diz sem pudor que é preciso matar os ucranianos e endoutrinar os seus filhos para não crescerem a odiar os russos que mataram "milhões de ucranianos";

- no 2º documento, uma norueguesa apela publicamente, sem pudor, à matança das crianças judias e representa-as como lixo;

- no 3º, um motorista de uma carruagem de metro, em Londres, incentiva os passageiros a apelar à libertação da Palestina, não pensando que pode haver judeus a viajar na carruagem e que a sua iniciativa pode pô-los em perigo - ou pensou mas como as suas emoções individuais são medalhas que exibe ao peito como condecorações, age sob o seu poder, desprezando o interesse colectivo.


 

Esta fotografia é de uma manifestação pró-palestiniana em Varsóvia. O Visegrad24 identificou a jovem que aparece na fotografia com um cartaz a apelar à morte de crianças judas. É Marie Andersen, uma estudante de medicina norueguesa na Universidade de Medicina de Varsóvia.


August 07, 2022

O absurdo da guerra

 


O absurdo é a razão lúcida a notar os seus limites.



M42 Great Orión Nenula by Hubble telescope #NASA

July 07, 2020

Vivemos numa época filosófica - aproveite-se



Heraclito dizia que o logos — a razão que governa o mundo, digamos assim — habita os seres humanos, mas na maior parte permanece adormecido.

Uma maioria de pessoas vive apressada, esgota-se nas acções-rotinas do dia-a-dia, nos afazeres, no consumo, nas metas e objectivos próximos, nos projectos em curso, nos prazeres e desejos imediatos, no quotidiano da vida sem mais. Vive adormecida. De repente, a pandemia criou uma situação-limite, de vida e de morte, que obrigou a parar e nessa paragem a razão acordou, liberta do quotidiano desenfreado e começou a ponderar sobre: a urgência da vida, as prioridades (família, as pessoas), a relação com o meio ambiente, a relação com os outros animais, a relação com o trabalho, o valor da ciência, a garantia de verdade, o valor da educação, o vazio do consumismo, a dignidade humana, a responsabilidade ética para com os outros, a procura de verdade no meio do excesso de informação, a ética política, a necessidade dos outros, a inter-conexão de todos, a solidão, o equilíbrio e a brevidade da vida.

Todas estas questões são agora discutidas em todo o lado, desde as redes sociais aos meios de comunicação, todos os dias. Ora, o que são estas questões senão questões filosóficas? É nas situações de ruptura com o quotidiano que as questões filosóficas se impõem e a razão acorda. Que se seja capaz de mudar as agulhas das linhas por onde correm os comboios da vida comum antes que a razão se adormeça de novo.