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September 15, 2022

Agora a maioria interpreta os acontecimentos com uma única lente

 


Fui dar com uns tweets de uma professora universitária a dizer que havia pouca diversidade entre os que estão na fila para ir ver o caixão da rainha Elizabeth II e que isso se deve às críticas contra o colonialismo inglês. Fui pesquisar acerca da etnicidade dos ingleses: quase 86% são brancos (Inglaterra e País de Gales); dos que restam, cerca de 10% são asiáticos -indianos, sobretudo- e os outros, negros do Caribe e de África. Portanto, é normal que com estes números, a maioria dos que se vêem sejam brancos. Fui espreitar a BBC para ver as filas. Por acaso vêem-se regularmente indianos e vêem-se, embora menos, africanos ou gente do Caribe. Tendo em conta que os últimos anos de imigração inglesa são de refugiados da Síria e outros países do Médio Oriente, isto é, pessoas que chegaram ao RU há três ou quatro anos, é normal que não tenham nenhuma ligação especial à monarquia e nenhum interesse em despedir-se da rainha. De maneira que não vejo aqui nestas filas de pessoas que vão prestar uma última homenagem à sua rainha, nenhuma demonstração de colonialismo. Não quer dizer que o RU não tenha esse problema para resolver, nomeadamente com alguns países que querem deixar de ter o monarca inglês como Chefe de Estado, mas não vejo aqui neste acontecimento particular provas de colonialismo ou de crítica ao colonialismo. Hoje em dia o mais fácil é reduzir todos os acontecimentos a colonialismo ou algo assim. Agora que existe essa lente -que é real- há quem só consiga olhar através dela.


September 07, 2022

Para ver é preciso mais que ter olhos




Sofi Oksanen

@SofiOksanen


Estou grata à #Ucrânia, porque:

- Há 20 anos que escrevo sobre colonialismo da Rússia e as suas consequências. Eu defino-me como uma autora pós-colonial, mas sempre que disse isto, os jornalistas ocidentais em geral não compreenderam o que queria dizer: não ligavam a história da ocupação da Estónia pela URSS a colonialismo. Desde Fevereiro que não tenho de explicar isto.

- Tornou visível a questão da energia como arma. Embora a Rússia a tenha usado durante séculos, os países ocidentais simplesmente não a viam.

- Tornou visível a apropriação cultural russa. Até o Google definia como russos, Repin e Gogol, que são ucranianos. O Ocidente não compreendia que fosse um problema, embora soubessem que a apropriação cultural é um instrumento para fazer com que o colonialismo pareça "justificado" ou "natural".

- Tornou visível o colonialismo russo. Nos Estados Bálticos, já assistimos à ascensão dos ventos coloniais quando Putin subiu ao poder. Mas o Ocidente era surdo às nossas palavras a este respeito.

- Tornou visível a retórica nazi russa e finalmente parece que os países ocidentais compreendem que para a RU, ser nazi é sinónimo de ser, não-russo. Nos Estados Bálticos, temos sido chamados nazis pelos russos desde 1940. Mas o Ocidente era totalmente surdo a isto e, quando a Rússia nos chamou nazis, o Ocidente começou a procurar nazis nos nossos países, embora devessem estar à procura de nazis no Kremlin.

Vou terminar por agora com um facto "curioso": os actores bálticos tiveram sempre a «honra» de representar os nazis no cinema soviético.