November 20, 2025

O colonialismo português

 

A dívida moral que não pedimos
O colonialismo português não promoveu desenvolvimento em Angola. Ele produziu dependência. Dizer isto não é humilhar ninguém, é apenas descrever a realidade.

Elísio Macamo


As comemorações dos 50 anos de independência de Angola foram capturadas por um episódio sintomático da crise de imaginação política. No discurso solene, e com o Presidente português sentado a poucos metros, o Presidente angolano afirmou que o colonialismo português atrasou Angola. 

A frase, historicamente banal, tornou-se munição eleitoral em Portugal. André Ventura, candidato presidencial e líder do Chega, apressou-se em negar a responsabilidade colonial e apontou o atraso angolano à corrupção do MPLA. A televisão pública angolana, que na verdade é o próprio Governo, respondeu com ofensas que não dignificam nem a instituição nem o país, chamando Ventura de “mentecapto” e vaticinando um futuro sombrio para Portugal caso ele ganhe as presidenciais. 

O resultado é um diálogo de surdos entre um populismo que vive do ressentimento e um Estado que reage como se ainda não tivesse descoberto que a soberania se afirma pela serenidade.

A origem do imbróglio revela fragilidades profundas de ambos os lados. Do lado angolano, a verdade histórica do enunciado, nomeadamente a de que o colonialismo português atrasou Angola, colide com a realidade sensível dum país cuja trajectória pós-colonial ainda não produziu a autoridade moral e material que permita enunciar essa verdade sem ser imediatamente devolvida como acusação. A fragilidade económica, a desigualdade extrema, a corrupção sistémica e a persistente distância entre o Estado e os cidadãos dificultam o pleno exercício da soberania discursiva. (In)felizmente, em política internacional, não basta ter razão, pois são também precisos resultados. Quando estes faltam, as palavras, mesmo verdadeiras, tornam-se vulneráveis à caricatura. O colonialismo criou instituições extractivas, destruiu economias locais e infantilizou sociedades políticas inteiras. Não é preciso ser génio para reconhecer isto. Mas meio século de governo próprio também conta. A contradição não reside na frase do Presidente, mas no facto de Angola ainda não ter conseguido transformá-la em alavanca para a sua própria renovação.
Estou de acordo com o que este senhor diz até aqui (e muito do que diz depois) e nem sequer me parece polémico e também concordo com a sua análise do «indecentismo funcional de Ventura». O artigo é grande e só transcrevi estes excertos. O que não concordo é com esta observação de que Portugal vê como um insulto qualquer crítica ao colonialismo.
Do lado português, o desconforto é de outra natureza. Portugal, como muitas outras ex-potências coloniais, nunca resolveu simbolicamente o seu passado colonial. Qualquer referência crítica ao colonialismo é lida como insulto e não como constatação histórica. Ventura capitaliza esse ressentimento, oferecendo a sectores inseguros da sociedade portuguesa a fantasia moral de que Portugal foi apenas generoso, nunca violento, e que a ingratidão africana é uma afronta à sua identidade. www.publico.pt/
Na verdade, todas as pessoas com quem falo e muitas que leio, excepto os «retornados», não têm nenhum problema em reconhecer o colonialismo como um facto negativo de opressão de povos que desvaloriza a dignidade, a cultura e a agência das populações colonizadas. 

Não por acaso, os «retornados», aqueles que viveram nos países africanos numa situação de privilégio económico e social só por serem brancos da «Metrópole», aqueles que cresceram habituados a ver as populações locais como dependentes e numa escala social inferior, são os que mais se revoltam porque não conseguem tirar de si essa imagem do negro inferior.
Não tem que ver com o facto de serem negros mas de sempre terem tido, no âmbito do colonialismo, um estatuto inferior de maneira que os dois elementos se associam nas mentes desses retornados. É o mesmo processo dos homens de uma certa idade que cresceram a ver as mulheres sempre numa posição inferior, intelectual, política e economicamente e não conseguem ver ou posicionar-se fora desse «template». É um «template» absoluto. Ou os que associam Zelensky a um comediante de TV e portanto, não conseguem introduzi-lo na categoria de sério homem de Estado; ou, sempre se habituaram a ler Putin como estadista e não conseguem incluí-lo na realidade de ditador colonialista ganancioso e mafioso. É a mesma incapacidade de sair de quadros de categorizção enraizados na mentalidade desde a infância.

O que acontece é que em Portugal, desde o 25 de Abril, toda a História promovida, ensinada e divulgada é da extrema-esquerda e defende a ideia de que Portugal se reduz a um povo racista e colonialista, sem nenhuma virtude e, por isso, de cada vez que mais um livro ou opinião dessas sai nos jornais ou nas editoras, muita gente se levanta para negar que sejamos apenas isso. Não por não aceitarmos essa realidade de país colonizador e opressor, mas porque não aceitarmos ser apenas e somente isso.

Portanto, o que falta, como diz este articulista mesmo no fim do artigo, é maturidade. Equilíbrio. Uma história não-histérica, nem da extrema-esquerda que nega e tenta destruir tudo o que faz parte da civilização europeia, apesar de se usar dela como de pão para a boca, nem da extrema-direita que Ventura representa e que continua agarrada a um apostolado de valores cristãos absolutos.

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