Quando comecei a ler este 'testemunho', pensei apenas que este senhor é mal pensante, que não sabe considerar as questões usando o pensamento, mas quando cheguei ao último parágrafo desenganei-me: é só mais um artigo de um extremista manipulador cujo objectivo é dizer que o governo de Montenegro é igual ao Chega. Chiça! É caso para dizer, já chega de tanta demagogia e extremismo.
Retirando a gordura de demagogia e falsidade que chega ao ponto de dizer que em Portugal os imigrantes "são sacos de pancada" e referindo-nos aos factos, o artigo fala de um imigrante ilegal que fez o pedido de residência e o pedido foi indeferido, por razão de ele estar sinalizado noutro país do espaço schengen, e foi, na altura, convidado a sair. Ele interpôs recurso para ficar e está à espera da decisão da AIMA.
Entretanto, como foi sinalizado por algo, noutro país do espaço europeu, está retido num Centro Habitacional, pois o juiz considerou que havia o perigo de ele fugir para outro país europeu e desaparecer no espaço schengen. Ao fim de mais de 2 anos no país ainda não fala português e precisa de intérprete.
O que está mal em todo este caso, são os serviços do Estado. A lentidão dos serviços e o não cumprimento dos prazos legais. Aqui, já deviam ter pedido ao tal país que o sinalizou que enviasse informações para que o juiz aqui possa tomar uma decisão. Mas isso não acontece só ao senhor do caso aqui citado, acontece a todos nós.
Este político do BE devia queixar-se, em primeiro lugar do governo de Costa, do qual fez parte, como camarada de geringonça e, portanto, cúmplice do enorme problema que hoje temos.
Foi esse governo Costacenteno, seguido depois por Medina, que cortou os serviços públicos, aprofundando os despedimentos de PPC e acabou com o SEF, deixando todos os serviços que lidavam com imigração e fronteiras, no caos. Depois, sabendo que não tinha funcionários nem serviços, sequer, para lidar com imigrantes, chamou para cá mais de 1 milhão de imigrantes num par de anos.
Isto é a total irresponsabilidade e incúria.
Sabia que isso ia afectar os serviços? Saber sabia, mas esteve-se nas tintas. Os amigos, como ele próprio dizia, recorriam a ele directamente para fazer bypass da burocracia que "é um inferno".
Agora temos este problema, em cima da tradicional lentidão dos serviços e da degradação que o governo Costacenteno impôs a todos os serviços públicos, da justiça à saúde, da educação às forças de segurança.
Os serviços já eram maus, mas fechá-los para livrar amigos ministros de encrencas, não terá sido a melhor solução.
Eu tenho uma empregada a dias, há mais de 25 anos. Quando ela veio para cá estava já há um ano no país e trabalhava sem contrato para outras pessoas. Passados 6 meses ou 1 ano de trabalhar na minha casa, pediu-me para fazer contrato, para poder pedir visto de residência e ter acesso a benefícios.
Fiz o contrato nos termos da lei e depois ela andou 4 anos até conseguir o visto. À época, para pedir o visto, tinha que ir-se a um consulado em Espanha. Aqui em Portugal não tratavam disso. Se se morava no Norte era em Vigo (acho) e quem morava para o Sul era em Huelva (?). Já não lembro ao certo das cidades, mas lembro-em que ela teve de ir lá duas vezes, porque entretanto findavam os prazos de decidirem e era necessário revalidar tudo. Para além disso era necessário entregar pedidos na inspecção do trabalho, nas finanças, na SS e sei lá mais o quê. Sei que, de vez em quando, ela pedia-me para assinar papéis para entregar aqui e ali.
Ao fim de uns três anos desta macacada, aparecem-me em casa, por duas vezes, espaçados por dois meses, dois inspectores das finanças que vinham ver se ela lá estava a trabalhar e só ao fim de 4 anos é que ela conseguiu o visto de residência, que tinha de ser confirmado ou revalidado de x em x tempo. Só ao fim de quase 6 anos de estar em Portugal é que ela pôde ir visitar a família ao Brasil. Nunca foi detida ou expulsa porque não tem cadastro nem tinha nenhuma sinalização contra ela em lado algum. Mesmo assim, foi esta complicação.
Isto é assim para toda a gente, menos para os amigos com cunhas.
Eu estou à espera que me chamem para a Junta Médica e como já passou o prazo e o atestado já caducou, já tive de andar em vários serviços públicos (de saúde, das finanças) a pedir e entregar papéis. O ex-ministro da educação, João Costa, desviou milhares de médicos das Juntas para perseguir professores.
Portanto, lamento informar este militante do BE daquilo que ele já está farto de saber mas finge que não sabe para poder vir fazer demagogia barata para o jornal: o país tem uma péssima gestão dos serviços públicos e tudo funciona tarde e muitas vezes mal e do lado das pessoas que precisam dos serviços há prejuízos económicos, sociais e de saúde mental.
Portanto, vir dizer que os imigrantes em Portugal são "sacos de pancada" da polícia para agradar a Ventura, que é o dono do governo de Montenegro, é apenas ser desonesto, creio que com intenção populista ao melhor estilo de Ventura.
Testemunho sobre a vergonha que sintoJosé Soeiro, (ex-deputado do BE)
expresso.pt/opiniao
A história conta-se rápido e eu sinto muita vergonha pelo modo como, no meu país, instituições estão a tratar estas pessoas. Singh (vou usar este nome) trabalha há dois anos e meio numa empresa portuguesa de engenharia e construção, do norte do país. Tem um contrato sem termo, permanente. Paga todos os meses as suas contribuições para a segurança social, o seu empregador também. Constrói e requalifica estradas. Muitos de nós já percorremos certamente caminhos e autoestradas asfaltadas por ele.
Sexta-feira recebi o alerta por um amigo comum: o Singh estava “detido”. Como assim?, pensei. Por que razão? Quem me fez chegar a informação explicou que, quando a polícia o foi “buscar”, esclareceu que “não havia crime”, mas ele teria de seguir com as autoridades. Ficou preso no “Centro de Instalação” na rua Barão Forrester, no Porto. Ainda lá está.
Na segunda-feira, ao fim do dia, estive à porta do “Centro de Instalação Temporária”, em quase tudo semelhante a uma prisão para imigrantes, gerido pela PSP. Além daquele nome pomposo, o CIT tem outra designação orwelliana: “Unidade Habitacional de Santo António”.
O Singh não tem ainda autorização de residência, apesar de ter feito o requerimento na AIMA há mais de dois anos, de ter contrato sem termo e de pagar contribuições à Segurança Social desde fevereiro de 2023. Como tantos outros trabalhadores migrantes está “irregular”, mas não por sua responsabilidade.
(...) solicitou os documentos corretamente, mas o Estado, o mesmo Estado que o reconhece para receber as suas contribuições, não respeita os prazos que a lei portuguesa define para lhe responder e dar documentos. Esperou uma eternidade até ter uma primeira decisão, que chegou em março deste ano - e o pedido vinha indeferido.
Razão: ter uma menção no Sistema de Informação de Schengen (que não tem natureza criminal!). Do que as autoridades portuguesas se esqueceram foi de fazer o que a lei e o regulamento europeu obrigam: contactar o Estado que havia feito essa menção. O Singh apresentou os seus argumentos e o processo está em análise.
É preciso continuar a aguardar. E no entanto, o Singh foi privado da sua liberdade.
A “Unidade Habitacional” [onde está] pouco difere de uma prisão. Mesmo que os “presos” não estejam ali por crime algum. “O indivíduo é calmo e colaborante”, “apresentou o seu passaporte”, diz o relatório.
Teve direito a um intérprete, que não falava punjabi.
Como o Singh está irregular e houve um indeferimento, foi convidado a abandonar voluntariamente o país. Como apresentou recurso e disse que não pretendia abandonar Portugal, foi preso no Centro de Instalação.
Acontece que apresentar recurso e não abandonar o país não é motivo para ser detido: não constitui nenhuma ilegalidade mas apenas uma fase normal do processo. Então, qual o argumento utilizado pelo juiz? É o facto de haver “risco de fuga do país”. Preso por ter cão e por não ter.
Mas há mais: o juiz refere ainda, no seu despacho, a “utilização ilegal da sua força de trabalho pela empresa onde trabalha”. A empresa, sugere-se, poderia estar a utilizar “atividade de cidadão estrangeiro em situação ilegal”. Sucede que Singh não está numa situação ilegal, mas sim irregular por não haver uma decisão final da AIMA.
E a empresa não utilizou de forma ilegal a sua força de trabalho, na medida em que lhe fez um contrato, declarou o empregado ao Estado e à Segurança Social, paga mensalmente o salário e o subsídio de refeição, desde o início de 2023, e as contribuições relativas a este trabalhador.
Sinto uma profunda vergonha pelo modo como o Estado português está a tratar estas pessoas. Pela forma como estamos a humilhar quem não cometeu nenhuma falta e faz tudo para se regularizar. Pelo modo como as autoridades administrativas atropelam os mais básicos procedimentos. Como se pressiona as forças de segurança para terem comportamentos de milícia contra imigrantes.
(...)
Como se passou a um ambiente de criminalização política dos trabalhadores imigrantes, vulnerabilizados pelo seu isolamento, perseguidos pelas ilegalidades do Estado, feitos sacos de pancada de um governo que não tem soluções para combater a desigualdade. Sei que este é o país sonhado de Ventura, que triunfa ao impor ao governo-sombra de Luís Montenegro a sua agenda xenófoba.