Showing posts with label Martin Heidegger. Show all posts
Showing posts with label Martin Heidegger. Show all posts

September 26, 2023

Recomecei a leitura e a tradução

 


A leitura desta biografia de Heidegger e a tradução do livro de Allison acerca do Idealismo Transcendental de Kant que tinha interrompido em Agosto  na altura da praia. Heidegger, fiquei a saber por esta biografia, era um indivíduo a necessitar de validação, não do ponto de vista intelectual -desde muito cedo falava dos assuntos com muita segurança- mas do ponto de vista de imagem. Heidegger era de uma pequenina cidade e o seu pai era sacristão. Tinha um ar rústico. Muitas vezes em que ia a outra cidade participar numa conferência, quando chegava, apesar do seu nome ser já muito conhecido, pensavam que era o zelador do edifício e coisas do género. Tinha um grande ressentimento relativamente a pessoas de outra classe social e aparentava ter um certo desprezo por essas pessoas. Também não era muito popular entre os filósofos porque tardava em publicar a continuação de Ser e Tempo, a filosofia dele era uma coisa que não se percebia bem, como uma linguagem obscura e deixava sempre no ar uma incerteza acerca dos seus projectos para a filosofia. Não sei até que ponto essa necessidade de validação não o levou àquela cegueira com o nazismo.





August 02, 2023

Hannah Arendt - 1933



Lembrei-me disto porque fui dar com esta frase de André Breton de 1924 (do 'Manifesto do Surrealismo'), Tout est près. Les pires conditions matérielles sont excellentes. Les bois sont blancs ou noirs. On ne dormira jamais. Ora, 1924 foi o ano em que Hanna Arendt começou um affair com Heidegger, como nos informa a biografia de Safransky, que uma amiga me deu ontem e comecei agora a ler (numa tradução de Lya Luft, em português do Brasil) e 1933 é o ano em que Heidegger é eleito reitor da Universidade, filia-se no partido nazi e faz aquele discurso inaugural infame. Já li a biografia de Hugo Ott, mas é sobretudo política, enquanto esta de Safransky é uma biografia intelectual e é considerada a melhor biografia de Heidegger. Tanto para ler e saber e o tempo a passar...



Hannah Arendt's 1933 
German passport photo

December 05, 2022

Thinking and poeticizing

 

"Philosophy will not be able to effect an immediate transformation of the present condition of the world. This is not only true of philosophy, but of all merely human thought and endeavor. Only a god could save us. The sole possibility that is left for us is to prepare a sort of readiness, through thinking and poeticizing, for the appearance of the god or for the absence of the god in the time of foundering [Untergang] for in the face of the god who is absent, we founder. "(Heidegger)

 - Only a God Can Save Us. Interview (23 September 1966), published posthumously in Der Spiegel (31 May 1976), as translated by Maria P. Alter and John D. Caputo in The Heidegger Controversy : A Critical Reader (1991), edited by Richard Wolin.


July 25, 2022

Perspectiva

 


Imaginemos a terra na imensidão obscura do espaço no universo. Proporcionalmente não passa de um minúsculo grão de areia com um quilómetro de extensão e o resto é vácuo. Em sua superfície vive, rastejando em profusão um punhado entorpecido de animais pretensamente astutos, que por um instante descobriram o conhecimento. E o que significa o espaço de tempo de uma vida humana no curso de milhões de anos? Mal uma pulsação do ponteiro de segundos, um sopro de respiração. Dentro da totalidade do ente não há razão para se privilegiar este ente, que se chama homem e ao qual pertencemos por acaso.

   — Martin Heidegger, in Introdução à Metafísica. Editora Tempo (esta obra publicada em 1953 foi uma conferência de H. de 1935)



do Webb

December 23, 2020

Nem pessimismo nem optimismo

 


Nem Pessimismo, Tampouco Otimismo 

“Quando a tecnologia e o dinheiro tiverem conquistado o mundo; quando qualquer acontecimento em qualquer lugar e a qualquer tempo se tiver tornado acessível com rapidez; quando se puder assistir em tempo real a um atentado no Ocidente e a um concerto sinfônico no oriente; quando tempo significar apenas rapidez online; quando o tempo, como história, houver desaparecido da existência de todos os povos; quando um desportista ou artista de mercado valer como grande homem de um povo; quando as cifras em milhões significarem triunfo — então, justamente então — reviverão como fantasma as perguntas: para quê? Para onde? E agora? A decadência dos povos já terá ido tão longe, que quase não terão mais força de espírito para ver e avaliar a decadência simplesmente como… — decadência. Essa constatação nada tem a ver com pessimismo cultural, nem tampouco, com otimismo… O obscurecimento do mundo, a destruição da Terra, a massificação do homem, a suspeita odiosa contra tudo que é criador e livre, já atingiu tais dimensões, que categorias tão pueris, como pessimismo e otimismo, já haverão de ter se tornado ridículas.”
Martin Heidegger, in Introdução à Metafísica. 1953

November 25, 2020

Heidegger - Existência e liberdade

 


O sujeito, então, quando assume, por decisão antecipatória – e isso nada tem a ver com suicídio - a perspectiva de que a possibilidade da morte é a única inexorável, torna-se livre da dispersão casual de projetos inautênticos, para que os demais projetos possam ser escolhidos autenticamente. A existência autêntica é a aceitação da própria finitude, enfrentando a possibilidade da morte, percebida, não de forma intelectiva, mas por sentimento de angústia. 

A existência inautêntica é a tentativa de escapar da angústia da morte por meio de uma vida banal de forma que, segundo Heidegger, o medo é angústia da morte que decaiu no mundo. O medo é a banalização, fraqueza de um dasein não seguro de si, retratando tranquuilidade indiferente diante da morte.(REALE; ANTISERI, 1990b).

Para Heidegger, o tempo é êxtase, o que, no seu sentido etimológico, significa “estar fora”. O passado é o retorno às situações para aceitá-las e o cuidado com as possibilidades que surgem dele; o futuro, projetar-se-adiante em-vista-de-si mesmo, é pretender-se; o presente é preso às coisas. Os três encontram significado no futuro, ou seja, no homem “fora de si”. Os fenómenos do rumo a, retro e junto, ou seja, fora de si, em si e para si – futuro, passado e presente são denominados êxtases da temporalidade. (REALE; ANTISERI, 1990b).

O tempo inautêntico visa à preocupação com o êxito, com o sucesso, enquanto o futuro, como viver para a morte, sendo tempo autêntico é desprovido de mundaneidade. O passado autêntico, por sua vez, é a não aceitação passiva da tradição, confiar nas possibilidades oferecidas e reviver a possibilidade do homem que já existiu. O presente, por último, é o instante que, quando autêntico, o homem decide seu destino e repudia a vida inautêntica.

Para Heidegger, isso tudo tem as consequências de compreender a significação de tempo usada no pensamento comum e científico, como databilidade e medição temporal científica, é tempo inautêntico, voltado à mundaneidade; a existência angustiada, quando autêntica, faz com que o homem viva os factos mundanos de seu tempo, mas com consciência de afastamento; a historicidade do dasein resulta na
historiografia. (REALE; ANTISERI, 1990b).

Anaximandro, Parménides e Heráclito entendiam a liberdade como “[...] um des-velar-se do ser, como provaria o sentido etimológico de aletheia, em que lantháno, velar, é precedido de privativo”. Ao contrário, Platão rejeitou a verdade como não ocultamento. (REALE; ANTISERI, 1990b, p. 590-591).

O Ocidente pagou o preço por essa decisão A partir do exposto, pode-se compreender a proposição heideggeriana sobre autonomia e liberdade. 

Thomas Ranson Giles assevera que a[...] própria autonomia do Ser-aí não significa outra coisa senão a resolução de ser aberto a todas as possibilidades autênticas e características da existência e, finalmente, ser para a morte. Isso só se torna possível se o Ser-aí puder fazer um acto de reflexão sobre si mesmo, sobre as suas autênticas possibilidades. [nota minha: a influência de Hegel é notória] [...] O Ser-aí liberta o existente do seu ocultamento transcendental e dá-lhe o ser, isto é, o seu significado. (GILES, 1989, p.108-110).

Afirma Martin Heidegger a respeito da liberdade, em sua obra intitulada “Sobre a Essência da Verdade”, que a [...] essência da verdade é a liberdade. 

No pensamento de Heidegger, só há liberdade quando o homem decide por uma vida existencial autêntica que se processa segundo a perspectiva no estar junto como ser-no-mundo. Pode-se defender que, para Heidegger, a autonomia, no sentido negativo, está no homem ser capaz de não se enveredar nas possibilidades inautênticas existenciais a fim de que se preserve de vivenciar experiência banal, anónima e fraca, pautada pelo domínio do medo. 

No sentido positivo, a autonomia é o homem constituir-se, ontologicamente, como ser diverso dos outros animais, no sentido de ser capaz de experiência autêntica.

A liberdade relaciona-se com a autonomia, no que concerne ao desvelamento de sentido do ser chamado por Heidegger como, verdade

Ser livre é desprender-se de tudo o que impede uma vida autêntica, não optando pela efetivação das possibilidades que levam à banalização existencial.

Igualmente, o homem, como dasein, apresenta-se livre, quando escolhe parar de sobrepujar o sentido do ser, as suas decisões que fortalecem o jugo do medo. A liberdade ocorre pela atitude humana de abrir mão dos empecilhos existenciais quanto a sua relação com o ser e passa a “ouvi-lo” para compreender seu sentido.

No sentido positivo, a liberdade é a decisão de agir conforme a consciência de que o homem é ser-para-a-morte, de modo a direcionar suas forças para efetivação de possibilidades autênticas. No contexto do ser-no-mundo, como dasein, que é experiência como possibilidades, o homem, no sentido ontológico, depara-se com a liberdade existencial, por viver a oposição à morte como encerramento das demais possibilidades. Significativamente, o homem é dasein, ser-no-mundo, livre, quando, em significação existencial de sentido do ser, é autónomo em relação à morte, não porque deixa de receber a sua influência como a mais aguda possibilidade.

Diversamente, torna-se autónomo em relação à morte, pela tomada racional de decisão de, a partir da angústia que sente em função da morte, ter oportunidade de deixar de ser escravo perante a inexorabilidade de sentido do encerramento da possibilidade, a fim de que possa vivenciar as escolhas autênticas. 

Nesse contexto, o homem é autónomo ao decidir por existência de sentido autêntico. Destarte o dasein somente compreende-se como livre quando se rende à verdade existencial de sentido do ser como fonte válida de projecto de vida.

A possibilidade de aferição compreensiva sobre o significado de liberdade, a autonomia e vida autêntica somente é possível quando se compreende que toda a possibilidade de sentido existe a partir de significados já pré-existentes no mundo, pois o homem é ser-no-mundo. Dessa forma, qualquer sentido possível para o dasein depende de uma pré-orientação significativa de sentido em face de um significado pré-existente no mundo. A possibilidade de interpretação de sentido, o próprio dasein é ser de sentido, está encerrada num círculo hermenêutico.


Gualter de Souza Andrade Júnior1. excertos


October 24, 2020

A existência humana



(...) no sentido de que o Dasein, lançado no meio do Ente, enquanto livre, executa uma incursão no Ente, que sempre é histórica e, em última instância, contingente. Tão acidental que a forma mais elevada de existência do Dasein só se deixa reconduzir sobre os pouquíssimos e raríssimos momentos de duração do Dasein entre vida e morte; [tão acidental] que o homem existe apenas em pouquíssimos momentos da agudez [Spitze] de sua possibilidade, e de resto, porém, move-se no meio do seu Ente.
— HEIDEGGER, Martin. Disputa de Davos entre Ernst Cassirer e Martin Heidegger. Cadernos de Filosofia Alemã | v. 22; n. 1 |, p. 173, 2017. Universidade de São Paulo. Tradução de André Rodrigues Ferreira Perez.

August 07, 2020

Citação deste dia



Para os que só têm sentido para o próprio e particular, a vida é somente vida. A morte é, para eles, morte e nada mais. Na realidade, porém, o ser da vida é, ao mesmo tempo, morte. Tudo que começa a viver, já começa a morrer, a caminhar para a morte, de sorte que a morte é também vida.

–– Martin Heidegger. Introdução à Metafísica