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September 13, 2023

Aniversários - Natália Correia

 


Natália Correia, uma poetisa portuguesa do século XX,  nasceu neste dia, há 100 anos. Nasceu na Fajã de Baixo, nos Açores. Os Açores têm dado muitos poetas e escritores ao país e à Língua Portuguesa, não sei ao certo porquê, mas tenho para mim que é por causa de todo aquele mar em azul profundo que acrescenta infinitude poética às ilhas.

Tenho cá em casa, comprada há muitos anos num alfarrabista, uma Antologia de Poesia Erótica e Satírica Portuguesa cuja selecção é de Natália Correia e, claro, também lá aparecem poemas seus. Aqui os deixo.






September 02, 2023

The Starlight Night

 


Look at the stars! look, look up at the skies!
O look at all the fire-folk sitting in the air!
The bright boroughs, the circle-citadels there!
Down in dim woods the diamond delves! the elves’-eyes!

  - Gerard Manley Hopkins



M78 Reflection Nebula in Orion 

August 31, 2023

Poesia ao entardecer



ANJO DA NOITE

“Dá-me a ilha de Samos como brinde de noivado”
Bengierd

E sendo o ser todo ser
eu, vetusta ou jovem lusa,
dei o meu olhar de claridade
à vastidão única das brumas
e só no coração uma saudade
era de havidos campos,
campos quase não vistos,
ó enamorado de minha formosura.

Sombria ou ruiva foi a cabeleira
o pouso da coroa em garras.
Abutre no alvor da minha fronte
cravando unhas de diamantes
assim em disse que as mulheres
não deviam usar trajes escarlates.
Talvez dez dias e oito noites passassem
nas distantes florestas de Lorvão.

E o meu reino era cinzento em culpas,
o meu legado agouro e mal.
Ó enamorado da minha póstuma formosura,
por que de mim tão pouco sabes?

  - Deborah Brennand


The Evening Angel
by Alexandre Cabanel
1848

August 20, 2023

"So brief an interval, so very brief”




At the noisy end of the café, head bent 
over the table, an old man sits alone… 
Yet it seems he was young just yesterday. 
So brief an interval, so very brief.” 

C.P. Cavafy



Andreas Georgiadis (b.1972), Portrait of Cavafy at an Advanced Age

August 08, 2023

Ariosto e Doré


Orlando, valoroso guerreiro, enlouqueceu de amor por Angélica e ficou furioso. Agora vagueia pela Terra destruindo tudo. A esperança de Carlos Magno é encontrar uma cura para a sua loucura.

Rinaldo ao sarraceno, desdenhoso,
gritou: — Desce, ladrão, do meu cavalo!
Tirarem-me o que é meu, deixar não ouso,
e a quem o quer faço caro pagá-lo;
nem contigo a esta dama dou pouso:
deixar-ta, seria grande resvalo.
Corcel tão bom, dama de tal cariz,
com um ladrão julgo que não condiz. —
— Estás a mentir ao chamar-me ladrão
(disse o outro, não menos sobranceiro);

      - Orlando Furioso de Loduvico Ariosto

- Carlos Fiolhais escreveu, há uns anos, um excelente artigo aquando da publicação da obra, Orlando Furioso, contado por Italo Calvino, pela editora Cavalo de Ferro. O artigo de Fiolhais pode ser lido aqui: ariosto-calvino. A própria obra referida pode ser lida aqui: storage/books/.pdf


Ilustração para «Orlando Furioso», Ruggiero e o Hipogrifo - Gustave Doré, 1879


August 06, 2023

"My name is Ozymandias, king of kings: / Look on my works, ye Mighty, and despair!"

 


I met a traveller from an antique land,
Who said—“Two vast and trunkless legs of stone
Stand in the desert. . . . Near them, on the sand,
Half sunk a shattered visage lies, whose frown,
And wrinkled lip, and sneer of cold command,
Tell that its sculptor well those passions read
Which yet survive, stamped on these lifeless things,
The hand that mocked them, and the heart that fed;
And on the pedestal, these words appear:
My name is Ozymandias, King of Kings;
Look on my Works, ye Mighty, and despair!
Nothing beside remains. Round the decay
Of that colossal Wreck, boundless and bare
The lone and level sands stretch far away.”

                 Percy Bysshe Shelley (1792-1822) - nascido neste dia


Ozymandias era o nome dado a Ramsés II e o poema de Shelley fala desta estátua quebrada dele, como alegoria do poder e da vã glória de mandar

August 04, 2023

"Não basta abrir a janela"

 


Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

“Poemas Inconjuntos”. In Poemas de Alberto Caeiro.


por Alan Smith
via Marysia

August 03, 2023

A Song Of Enchantment



A song of Enchantment I sang me there,
In a green-green wood, by waters fair,
Just as the words came up to me
I sang it under the wild wood tree.
(...)
Walter de la Mare

 


UY Moeng

July 26, 2023

The Attraction of Levitation





Olga Zima - Lago Baikal


THE ATTRACTION OF LEVITATION 
BY H. G. PAINE
*

"Oh, dear"! said little Johnny Frost,
Sleds are such different things!
When down the hill you swiftly coast
You’d think that they had wings;

But when uphill you slowly climb,
And have to drag your sled,
It feels so heavy that you’d think
‘Twas really made of lead.

And all because an Englishman,
Sir Isaac Newton named,
Invented gravitation, and
Became unduly famed;

While if he had reversed his law,
So folks uphill could coast,
It seems to me he would have had
A better claim to boast.

Then coasting would all pleasure be;
To slide up would be slick!
And dragging sleds downhill would be
An awful easy trick!

July 25, 2023

"Tudo tem certo espírito secreto!"

 


Ah! Ninguém entender que ao meu olhar
Tudo tem certo espírito secreto!
Com folhas de saudades um objecto
Deita raízes duras de arrancar.
  
    - Cesário Verde




Lauritz Tuxen
Retrato do pintor dinamarquês, P. S. Krøyer, 1904. Óleo sobre tela. Museu de Belas Arte da Hungria.

July 13, 2023

Birds and Wintry Willow Tree

 

La forêt, qui frémit, pleure sur la bruyère ;
Le phalène doré, dans sa course légère,
Traverse les prés embaumés.

   Alfred de Musset


Birds and Wintry Willow Tree, by Kano Chikanobu, first half of the 18th century

July 12, 2023

"It is the flower/ Of risen life, no tomb can keep."



A flor do  nenúfar, mais conhecida por lótus, é comum na arte egípcia antiga. De cor azul ou branca, fecha-se à noite e reabre de manhã. Para os antigos egípcios, era vista como um símbolo de rejuvenescimento diário. Este pequeno e requintado broche de ouro foi encontrado numa escavação arqueológica de um importante centro da civilização hitita em Ortakoy, na Turquia. Datado do século XIV a.C., poderá ter sido uma prenda de um emissário diplomático egípcio a uma figura proeminente. Museu Corum. (RAWI - Revista do Património do Egipto)

Steps in the tomb, uneager visitors,
Cannot
Disturb the flower of silence.
So the chill
Museum air can never hurt this bloom.
(...)
It is the flower
Of risen life, no tomb can keep.
A sage once said the mind of God forgets
Evil that men remember; it remembers
The good that men forget.

Babette Deutsch

July 11, 2023

Nenhum mito regressa…


De terrena promessa
Feita aos olhos tentados e descrentes.
Nenhum mito regressa…

Torga


Sortelha, Sabugal


July 04, 2023

Venha, Oh criança humana

 


Venha, 
Oh criança humana
Para as águas e para a selva
Com uma fada, de mão dada
Pois o mundo está mais cheio de mágoa
Do que você pode entender.

— William Yeats


July 02, 2023

Deixa passar o vento


Deixa passar o vento

Sem lhe perguntar nada.

Seu sentido é apenas

Ser o vento que passa…


 Ricardo Reis. (Fernando Pessoa)



? A field of grass on a windy day

June 12, 2023

Lançar as redes aos sonhos

 

De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos.

Bernardo Soares, in Livro do Desassossego



Dan-ah Kim

June 08, 2023

"O espelho é uma chama cortada"

 


Herberto Helder, um poeta mergulhado no espelho



A poesia perdeu a sua violência



(frases escolhidas deste texto) 

A poesia perdeu a sua violência

Os censores puritanos perdem o objectivo da arte

Justin E. H. Smith

Jerome Rothenberg, de 91 anos, deu um contributo incomensurável à poesia americana nas últimas sete décadas. Nascido em Nova Iorque em 1931, entrou em cena pela primeira vez em 1959 com New Young German Poets, fruto involuntário do seu serviço militar na Alemanha ocupada pelo exército americano. Esta colectânea de traduções de Rothenberg incluía poemas de Paul Celan, o autor judeu de língua alemã de "Fuga da Morte", uma obra que refuta por si só o cepticismo de Theodor Adorno sobre a viabilidade da "poesia depois de Auschwitz": afinal, pode haver poesia depois de Auschwitz, mesmo que não gostemos do que vemos.

Mas a contribuição mais duradoura de Rothenberg viria uma década mais tarde, após uma mudança bastante radical do modernismo para o novo projecto da "etnopoética". Esta mudança levou-o a trabalhar na linha do antologista, nomeadamente ao compilar Technicians of the Sacred: A Range of Poetries from Africa, America, Asia, and Oceania (1968), recolhendo e partilhando o trabalho de tradições poéticas de todo o mundo, em vez de centrar o seu próprio trabalho de "autor único" como poeta. 

O trabalho antológico de Rothenberg é, ele próprio, uma variedade de poiesis, através da qual ele transmite à atenção dos leitores de língua inglesa um sentido muito mais profundo e vital do que a poesia poderia ser e do que a poesia foi durante muito tempo.

Aquilo a que hoje chamamos "poesia" é sobretudo uma forma de arte estiolada. A poesia, durante grande parte da história da humanidade, não era palavras numa página, pois não havia páginas e as palavras não eram concebidas como tendo uma dimensão visível. A poesia também não era apenas palavras faladas, mas essas palavras eram um componente de uma forma artística total que também incluía movimento, gesto e, muitas vezes, ritmo e melodia. O seu objectivo era realinhar o humano com o cósmico, afirmar a inserção da nossa experiência terrena mundana numa ordem muito mais vasta que também inclui os animais, os elementos, os céus, os antepassados e os deuses.

O desmantelamento final desta forma de arte total ocorreu em paralelo com a profissionalização das disciplinas científicas e com o processo de secularização ao longo dos últimos séculos. No entanto, mesmo na sua forma moderna reduzida, uma das coisas que a poesia ainda aspira normalmente a fazer, o melhor que pode, é explorar o sentido do sagrado.

A linguagem da poesia, talvez especialmente a da poesia "arcaica", é tipicamente condensada a partir de toda a realidade translinguística vivida pelo bardo que a canaliza, e tentar reconstruir essa realidade noutra língua como se o ser inteiramente constituída por palavras fosse deturpar (talvez inevitavelmente) a obra original. 

Por esta razão, Rothenberg defende, e pratica, aquilo a que chama "tradução total": a representação, em forma gráfica, de todos os elementos possíveis das tradições poéticas de outra cultura, incluindo os elementos que normalmente não entendemos como linguísticos.

O brilhante poeta e crítico mexicano Heriberto Yépez, co-editor de Eye of Witness: A Jerome Rothenberg Reader (2013), observa com acuidade que "[p]ure Myth não pode existir num mundo depois de Hollywood". 

A aspiração de toda a poesia é em direcção ao eterno.

A voz poética de Jerry é igualmente convincente em A Big Jewish Book, onde procurou demonstrar porque é que invertendo a frase de Adorno, "depois de Auschwitz só há poesia" - a função primária da poesia durante a maior parte da história humana tem sido a de processar ou gerir a violência incessante da nossa realidade vivida.

Esta tese não é certamente original para mim. O grande classicista austríaco Walter Burkert especulou, de forma célebre, que as origens da cultura humana residem em rituais de expiação destinados a contrariar a mácula cósmica que advém do derramamento de sangue de animais na caça. Muita da poesia arcaica parece surpreendentemente presa a fenómenos tão vívidos como a visão das vísceras de um veado a jorrar do seu ventre quando é aberto pela faca de um caçador. Porquê insistir em tais coisas? Talvez porque a violência exige a poesia; ou, dito de outro modo, a poesia, correctamente entendida, preocupa-se sobretudo com a violência.

Nick Cave recorda "a emoção de descobrir um novo tipo de poesia [arcaica australiana] que era "um pouco violenta, profundamente surrealista, sexual e também não irónica, explicitamente concebida para rituais, orações, transformações e este tipo de coisas, que eram realmente muito desprezadas por grande parte da poesia moderna que eu lia. Refiro-me à poesia moderna anti-espiritual e irónica".

A vida torna-se menos agitada à medida que envelhecemos, e o fosso entre a nossa experiência quotidiana e o registo heróico em que passámos a nossa juventude parece aumentar. Enquanto escritores passamos o tempo sentados sem fazer nada.

O grande Norman O. Brown, autor de Life against Death (1959) e criador do termo "perversidade polimorfa", insistiu em entrevistas que não havia nisso contradição, que graças à vivacidade da sua imaginação, ele era capaz de satisfazer todos os seus impulsos transgressivos sem sequer se levantar da sua secretária. 
E é isto que os puritanos censores da esquerda e da direita não percebem quando se trata do lugar da violência na arte: não é uma "porta de entrada" para o real, nem uma aprovação do sofrimento humano. É antes um reconhecimento lúcido da violência fundamental das coisas (mesmo que, per impossibile, tornássemos todos os seres humanos dóceis, continuaríamos a ser constantemente esmagados pela natureza) e da profunda necessidade humana de chegar a um acordo com esta condição através do livre jogo da imaginação.

Também esta generosidade, parece-me, tem um espírito rothenberguiano. Tem a ver, penso eu, com o reconhecimento do nosso lugar na longa cadeia de uma tradição, o que é outra forma de dizer o reconhecimento da nossa dívida para com os antepassados, de modo que só podemos abordar o trabalho criativo com humildade e admiração. 

Como esta tradição é mitopoética, o espírito canalizado tem em conta toda a gama da experiência humana e, por isso, torna-se muitas vezes violento. 

A poesia propriamente dita é a forma de arte total, da qual todas as outras formas de arte modernas se separaram. É a forma de arte que se confronta com a violência das coisas, e que continuamente volta a pôr em ordem o nosso mundo despedaçado.

A paradise of poets