Nem a Muito Custo
O caro leitor sabia que anda a pagar fortunas a Estados estrangeiros em coisas ironicamente chamadas SCUT"s - sem custo para o utilizador? Sabia que sustenta essas maquias porque o Estado Português, através de uma casta política corrupta, selou contratos com privados que lucram e lucram enquanto nós nos arruinamos e estamos cada vez mais na cauda da Europa? Sabia que todos esses esquemas persistem? Sabia que não há meios de fiscalização nem tão pouco para fazer justiça mesmo quando as quadrilhas são apanhadas? Sabia que tudo vai continuar na mesma? Ou pior?
Pois é. Esta semana, mais uma prescrição que livrou antigos governantes de responderem em tribunal. Desta vez, num caso de parcerias público privadas (PPP), no qual o Ministério Público constituíra Mário Lino, Teixeira dos Santos e António Mendonça como arguidos, demasiado tarde para agora poder responsabilizá-los por abuso de poder ou corrupção. Passaram 11 anos desde o arranque da investigação.
As PPP são um cancro - assegurou-se aos concessionários privados uma renda garantida, zero risco, que pode ir até aos 18%. De resto, estas concessões a grupos como o Mello, Espírito-Santo ou Mota Engil tornaram-se tão apetecíveis que acabaram por ser vendidas a fundos estrangeiros. Lembre-se que em 2021, o Eurostat atribui às SCUT um valor total de 5 mil milhões de Euros mas o Estado assume encargos futuros de mais de 12 mil milhões.
Sucede que esta prescrição caiu que nem ginjas no Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2020 do Tribunal de Contas onde este aponta a falta de veracidade e o défice de informação sobre as PPP, denunciando também a inconsistência recorrente entre estimativa e execução dos contratos. Trata-se de um capítulo de leitura indigesta - "a avaliação do cumprimento das finalidades essenciais das PPP continua por reportar, a inconsistência recorrente entre estimativa e execução nos encargos líquidos continua por explicar, os factores apontados para a desproporção entre encargos públicos e investimentos privados subsistem por quantificar, a previsão de encargos líquidos futuros continua insuficiente e a previsão de investimentos privados futuros permanece por reportar". Aliás, tudo longe dos padrões nacionais e internacionais, como se indica. E tudo mais de um quarto de século volvido sobre o debute. Mas o que ainda dói mais é que se reconhece que o Ministério das Finanças não dispõe de recursos para identificar o universo de PPP (o que inclui a verificação do cumprimento dos requisitos legais de cada contrato) e menos ainda para assegurar o seu controlo. Pois é - não há meios e também não há estratégia.
E porquê? Bom, muitos ex-governantes passaram da gestão da coisa pública para a gestão das empresas construtoras. E é por isso que, embora se justificasse, plenamente, a extinção dos contratos, tudo tem piorado. No final de 2019 António Costa até alterou a respectiva lei - é o Conselho de Ministros e não os ministros das Finanças e o sectorial a decidir sobre o lançamento de uma nova PPP; o projeto é decidido caso a caso ( mais discricionariedade); e dispensou-se a análise custo-benefício, impossibilitando o escrutínio das contas. Enfim, eis um dos mais poderosos canais de corrupção e de sangria dos cofres públicos. Veio para ficar. Impune.