January 12, 2024

Por causa do PS “quantas mães choraram, quantos filhos em vão rezaram, quantas noivas ficaram por casar”




Revisitação


João Luís Mota de Campos
subscritor do Manifesto por uma Democracia de Qualidade

Pode parecer surreal que treze anos decorridos sobre a assinatura em 17 de Maio de 2011 do memorando de entendimento com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI (vulgo, Troika) assinatura protagonizada pelo então Governo PS de José Sócrates, depois das eleições de 5 de Junho de 2011 ganhas pela AD com ampla margem, tenhamos de revisitar estas questões – dolorosas – para analisar as mais recentes convolações políticas do PS.

Neste último fim de semana o PS elegeu o seu novo líder, Pedro Nuno Santos, e despediu-se em apoteose do seu anterior líder e ainda primeiro ministro, António Costa. Do que resultou dos discursos de ambos é que o “diabo é a direita” e o PS tem de andar a corrigir os erros que a “direita” cometeu no período da Troika entre 2011 e 2015. Um mimo…

Das coisas que o PS se esquece e que, portanto, é necessário relembrar, avultam duas ou três: o congelamento ou redução dos salários da função pública e das progressões nas carreiras; a redução das pensões de reforma acima de determinados limiares; a privatização – de que a esquerda tanto se queixa – de determinadas empresas que eram públicas e passaram para a esfera privada.

Primeiro ponto a relembrar é que foi o Governo PS quem lançou Portugal na rota da bancarrota. É verdade que o drama dos deficits orçamentais excessivos e a necessidade de os financiar, não atingiu só Portugal; também a Grécia, a Irlanda, a Itália e até a França tinham deficits excessivos.

No caso português, a nossa impreparação e as despesas orçamentais desreguladas de que Sócrates lançou mão para vencer as eleições de 2009, num momento em que a crise financeira era já muito aguda, foram a causa directa da necessidade do pedido de ajuda.

Em poucas palavras, estávamos a gastar amplamente mais do que podíamos e a diferença entre os gastos e a receita era coberta por empréstimos da banca internacional. A partir do início de 2011 a banca perdeu completamente a confiança no Estado Português e os termos dos empréstimos tornaram-se progressivamente usurários, até se tornarem insuportáveis. Foi preciso pedir ajuda externa, que nos foi concedida ao abrigo de um plano de redução drástica da despesa pública e da introdução de reformas estruturais.

O espectro da bancarrota pairava sobre nós e não havia outras opções.

Quem pediu ajuda, aceitou as respectivas condições e assinou em nome do República, foi o PS. Convinha que os actuais membros desse partido, muitos dos quais eram à época membros do Governo de José Sócrates, tivessem memória – ou vergonha. Mas na falta da memória deles – ou de vergonha – tenhamos nós memória

Foi o PS que negociou e aceitou a redução dos salários da Função Pública, o congelamento das carreiras e da contagem dos tempos de serviço, a redução das pensões de reforma, mil e uma medidas de drástica austeridade para pagar os desvarios de seis anos de Governo PS.

Foi o PS que aceitou que uma série de empresas públicas teriam de ser privatizadas para pagar dívida com o fruto dessas privatizações.

Foi o PS que aceitou que os desembolsos da ajuda negociada dependiam de conclusão positiva das avaliações trimestrais a que a República ficou sujeita, que teriam lugar ao longo dos três anos de duração do programa de ajustamento (avaliações da exacta execução do programa de ajustamento); foi o PS que aceitou que se os objectivos não fossem cumpridos ou se tornasse expectável o seu não cumprimento, seriam adoptadas medidas adicionais de ajustamento.

Tudo isto o PS negociou e aceitou. Não havia outra solução devido à situação de bancarrota em que o PS nos tinha lançado. Só para lembrar.

Entre outras medidas, ficou estipulado e previsto que seriam privatizadas uma série de empresas do universo empresarial público: “3.31. O Governo acelerará o programa de privatizações. O plano existente para o período que decorre até 2013 abrange transportes (Aeroportos de Portugal, TAP, e a CP Carga), energia (GALP, EDP, e REN), comunicações (Correios de Portugal), e seguros (Caixa Seguros), bem como uma série de empresas de menor dimensão”.

Espanta sobremaneira e é quase nauseante que, decorridos 13 anos, haja gente no PS que venha assacar ao Governo de Passos Coelho, apoiado pelo PSD e CDS a culpa destas privatizações.

A técnica de infecção da opinião pública pelo PS vai ao ponto de instrumentalizar o Tribunal de Contas, que perdeu todo o meu respeito, para o pôr a dizer que a privatização da ANA padeceu do mal de ser apressada! Em Maio de 2011 o Governo PS negociou e aceitou que a ANA seria privatizada até 2013; o governo de salvação nacional da AD privatizou a ANA de acordo com os ditames do Memorando de Entendimento em Setembro de 2013.

Sobre estes factos, o homem que queria pôr as pernas dos banqueiros alemães a tremer e que foi ministro das Infraestruturas no Governo Costa vários anos, Pedro Nuno Santos (PNS), atirou: “a privatização da ANA foi um péssimo negócio para o Estado. Foi a privatização mais danosa para o interesse público” porque “estamos a falar de uma empresa que desde que foi privatizada conseguiu realizar em receitas mais de 1.000 milhões do que esperava inicialmente”. (Jornal de Negócios, 18-1-2020).

Se não fosse para chorar, era para rir. PNS queixa-se de que a ANA foi privatizada (!) e que isto correu muito mal, porque na mão dos privados deu muito mais dinheiro do que teria dado nas mãos do Estado, por acaso, o Estado socialista a que ele pertence.

Mas o PS – e mais uma vez, PNS, o desmemoriado – também fustigam a privatização dos CTT. Deve ter sido outro erro… um erro que eles puseram no memorando da troika e que, lá posto, era para cumprir ou substituir por outra medida de efeito equivalente (qual? Mais reduções de pensões?).

A falta de vergonha já se tornou numa marca registada do PS. O que vimos este fim de semana obriga a revisitar o “local do crime”, crime de bancarrota e de imenso prejuízo para o interesse nacional, do qual 10 milhões de portugueses foram as vítimas e de que o perpetrador se vem agora queixar.

Por causa do PS “quantas mães choraram, quantos filhos em vão rezaram, quantas noivas ficaram por casar” quanta gente teve de emigrar, foi para o desemprego, viu a sua vida a andar para trás sem remédio, anos perdidos, esperanças desfeitas, futuro sem horizontes!

Que os mesmos que nos causaram este imenso mal tenham o atrevimento de vir falar nele para culpar outros é coisa tão desavergonhada que verdadeiramente me espanta, mesmo da parte dos socialistas. Mas aqui fica registado o meu espanto com tamanha falta de respeito por todos nós.

(1) Em 8 de Abril de 2011, os Ministros do Eurogrupo e do ECOFIN emitiram uma declaração esclarecendo que o apoio financeiro da UE (mecanismo europeu de estabilização financeira – european financial stabilisation mechanism — EFSM) e da zona euro (facilidade europeia de estabilidade financeira - european financial stability facility — EFSF) seria providenciado na base de um programa político apoiado num condicionalismo rigoroso e negociado com as autoridades portuguesas.

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