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February 21, 2022

Turquerie

 


Embora os mercadores europeus e os representantes de companhias vivessem em comunidades fechadas e contactassem pouco com os turcos em geral -mesmo nos negócios contratavam intermediários gregos, arménios ou judeus- não deixavam de influenciar, ao retornar aos países de origem, a percepção dos europeus acerca dos turcos. Nas roupas, por exemplo, que se tornaram um dos elementos mais importantes da turquerie

Também os diplomatas influenciaram a percepção dos europeus acerca dos otomanos. Ogier Ghiselin, senhor de Busbecq, embaixador imperial em Constantinopla,  de 1554 a 1562, não escondia a sua admiração pelos militares e administração otomanos: "Ninguém se distingue dos outros pelo nascimento e a honra é dada a todos conforme o seu dever cumprido". 

Busbecq ia acompanhado de um artista, Melchior Lorck, enviado pelo futuro Imperador Ferdinand I, o que não era inédito.


Sultão Süleyman por Melchior Lorck



Mulher da Nobreza turca



Nos primeiros tempos da Europa moderna, os veludos e damascos sumptuosos produzidos em Bursa e outras cidades do Médio Oriente eram usados para fazer trajes tantos seculares como eclesiásticos. A procura era tão grande que os tecelões de Veneza, Florença e Lucca começaram a imitar a produção e a adaptá-la ao mercado europeu. O próprio mercado Otomano importava as imitações europeias. Os tapetes eram tão valorizados que se usavam para cobrir mesas ou decorar as paredes. 

The Somerset House Conference, 1604, artista desconhecido


As cores fortes dos tapetes e os desenhos intrincados e complexos começaram a ser usados pelos artistas europeus nas suas composições cristãs de representação da Virgem com o Menino. No século XVII continuavam populares como se vê nesta pintura cuja mesa está coberta com uma carpete Ushak.

Hans Holbein the Younger usou um tapete deste no seu famoso retrato dos Embaixadores. 


A Europa estava tão fascinada com o vocabulário do design decorativo do Médio Oriente, especialmente o arabesco, que começou a aparecer em todo o lado: nos têxteis, nos metais, nos trabalhos em madeira, nas encadernações de livros. A técnica do papel marmorizado foi importada nessa altura. 

(do livro de Haydn Williams, Turquerie)




uma encadernação com papel martirizado




February 20, 2022

Turquerie

 


Enquanto uns se deleitavam com as suas fantasias outros condenavam-nas. Diderot condenava o luxo indolente e via na turquerie um sintoma da decadência da sociedade. Acabou por sair de moda com o espírito sóbrio da Revolução Francesa.

«O Picnic no Parque» (detalhe) por Christophe Huet (1750)

Durante muitos anos os Otomanos preferiram fazer diplomacia com as outras nações no seu território de Constantinopla mas depois do cerco de Viena e da paz de Karlowitz (1699) começaram a mandar embaixadores para as nações.

A grandeza e magnificência dessas delegações despertava a atenção de todos os curiosos, muitos a nunca antes terem visto um turco. Os turcos começaram a aparecer nas peças de teatro, nas óperas, nas novelas, nas pinturas, no mobiliário, nos objectos, na moda.


Figura de um Turco sumptuosamente vestido, num rinoceronte exótico, por Joachim Kandler - porcelana Meissen

Pavilhão em forma de tenda Otomana nos jardins de Leipzig por Johann Grohmann

A captura de Constantinopla em 1453 pelo sultão Mehmed II foi um momento chave na história europeia. Marcou o fim do Império Bizantino que, embora diminuído, tinha sido uma força política e religiosa durante mil anos ao mesmo tempo que afirmou o poderio militar do turco Otomano. Fez surgir o medo do alastramento da religião muçulmana na Europa. Depois de deixar os soldados pilhar a cidade durante três dias como prémio de lealdade, o sultão impôs a ordem e restabeleceu o comércio com os venezianos.

- cerco de Constantinopla, 1453, de Bertrandom de la Broquière; iluminura encomendada pelo duque da Borgonha à oficina de Jean Miélot, Lille, em 1455.

Bertrandon de la Broquière foi espião borgonhês e peregrino no Médio Oriente em 1432-33. O livro das suas viagens, Le Voyage d'Outre-Mer, é um relato detalhado e vivo das situações políticas e costumes práticos das várias regiões que visitou. Escreveu-o em francês a pedido de Filipe o Bom, Duque de Borgonha, com o objectivo de facilitar uma nova cruzada.

Para manter o favor do Sultão para os canais comerciais venezianos, o governo de Veneza enviou um artista de proa para a corte do Sultão como embaixador cultural - Gentile Bellini, que produziu medalhões com o retrato do Sultão, uma representação idealizada da sua identidade distorcida pela propaganda anti-otomana.

Enquanto lá esteve, Bellini produziu um número de desenhos dos habitantes de Constantinopla.


- Medalha do Sultão Mehmed II, por Gentile Bellini

Janízaro sentado por Gentile Bellini








(do livro de Haydn Williams, Turquerie)

February 19, 2022

Turquerie

 


Este termo designa a visão que os europeus tinham, no século XVIII, do universo dos turcos Otomanos e as variadas formas em que essa visão se manifestou.

Consola (uma de um par) de um fabricante francês de 1780 - talha dourada e mármore

turquerie é mais um reflexo do meio cultural europeu que o concebeu que uma representação do suposto objecto - dentro de certos limites, a turquerie podia ser aquilo que o artista quisesse.

Embora o seu objectivo primeiro fosse o de provocar divertimento e deleite, por vezes tinha o carácter mais simbólico de enfatizar o status e a magnificência. A turquerie não é um estilo, mas um tema e foi em França que esse trema mais floresceu e durante mais tempo.

Depois da captura de Constantinopla pelos turcos Otomanos em 1453, a Europa entrou em choque. Para galvanizar a oposição, propagandistas trabalhavam no sentido de demonizar o «Turco» e, apesar do seu sucesso, não conseguiram matar a curiosidade dos europeus pelos conquistadores.
- Galeria dei Lavori, Florença

Este interesse era parcialmente satisfeito pelos relatos de viajantes que tinham visitado os domínios dos Otomanos com ilustrações dos seus trajes.

Uma edição italiana de, "Os Quatro Primeiros Livros de Navegações e Peregrinações Orientais" de Nicolas de Nicolay, publicada em Veneza em 1580 foi uma das fontes usadas por Jacobo Ligozzo para a série de aguarelas representando trajes do Império Otomano. Estes por sua vez inspiraram florentinos da Galeria dei Lavori, em Florença.
Embora as imagens fossem muitas vezes fantasiadas dado o acesso limitado dos europeus a certos níveis da sociedade Otomana, a sua influência foi considerável.
O grande medo do turco na Europa foi diminuindo depois do fracasso do cerco de Veneza em 1683. Consequentemente, o estereótipo do «Turco feroz» amenizou-se num ser mais amigável. Os europeus tornaram-se fascinados pelo mundo Otomano, em particular aquilo que Lady Mary Montagu chamou, "os refinamentos da voluptuosidade indolente". Obras literárias como as "Mil e Uma Noites", cujos primeiros volumes apareceram numa tradução francesa de 1704, alimentaram a ideia do «Oriente Encantado», da mesma maneira que os bailes de máscaras, as figurinhas de porcelana e as tendas de jardim. O mundo Otomano ser assim sugerido em vez de imitado era considerado uma virtude pois, como disse Carmontelle, " só os sonhos nos encantam".

- do livro de Haydn Williams, Turquerie.

Uma edição das Mil e Uma Noites que herdei da minha mãe - o primeiro presente que o meu pai lhe deu quando namoravam, segundo me disse. Infelizmente só tenho volume um e nem sei quantos volumes esta edição tem ou tinha.





Aviso à navegação

 

Vou obcecar-me com um tema que não interessa quase a ninguém e talvez encher o blog do assunto.


Turquerie, é o nome dado ao fascínio europeu, no século XVIII, pelos Otomanos, o que se traduziu na adopção de usos, modas e ambientes orientais à maneira do Império Otomano.

Intriga-me o facto de nunca alguém ter feito uma história do imaginário ou, dos imaginários, que me parece importante para a compreensão dos contextos culturais e mentalidades que impregnam toda a vida, desde a privada à pública. Ou talvez já alguém tenha feito e eu é que não sei. 

Transportados, em imaginação, até aos palácios de Constantinopla. (gentleman's magazine, October 1768)

- do livro de Haydn Williams, Turquerie.


Jacques de Lajoue II - Garden with Eastern Figures