E por acaso era o dia de anos da minha mãe.
Isabelle Menin
A minha mãe, que sentia muito o Pessoa, ofereceu-me este livro que toda a vida vi à sua cabeceira. Está muito usado já, mas eu cuido dele com carinho. Ofereceu-mo porque sabia que eu tinha uma relação com os livros e, muito particularmente, tinha fome de certo tipo de autores, como este poeta. Aliás, deu-me também as obras completas de Dostoievsky porque me viu lê-las de fio a pavio aí aos 16 anos. Mas isso é outra história. Esta edição da Aguilar é do ano do meu nascimento, o que para mim tem significado, mesmo sabendo que é uma coincidência. Sartre é que falava disso de nós escolhermos pequenas coisas para dar relevância de modo a fazermos uma narrativa ao nosso gosto. Aceito. Não faz mal. Ela deu-me este livro no início do Outono de 1999, aí uns seis meses antes de morrer. Disse-me que estava na hora de passar o livro e queria que eu ficasse com ele. Isso também é outra história, mas difícil de contar. O livro vinha com santinhos a marcar as páginas dos poemas (um dos santinhos é da minha 1ª comunhão) em que ela mais se via, calculo eu. Ainda lá estão todos, não tirei nenhum do sítio, nem digo a ninguém que isso parece-me uma violação de privacidade. Também já comecei a marcar.
Outro dia falava com a minha irmã. A minha mãe teve uma vida difícil, sobretudo depois de ficar viúva com 7 filhos todos a estudar. Devíamos ter dito mais vezes -muitas vezes- que percebíamos o valor e força dela. Lembro-me de discutir um dia com ela nesses anos e ser mesmo estúpida. Enfim... a vida, o que tem de pior é também o que tem de melhor: de repente, do nada, acontecem as coisas mais extraordinárias que nem imaginávamos ou conhecemos pessoas extraordinárias que nem sabíamos que existiam. Tudo se perde num dia mas tudo também se pode ganhar num dia.
Estes poemas mais abaixo foram escolhidos ao acaso.