Kundera defende que "o que define a Europa central não são as fronteiras políticas (sempre inautênticas, impostas por invasões, conquistas, ocupações) mas as grandes experiências comuns que juntaram os povos (...) e nas quais subsistem uma comunhão de tradições", mas que essa experiência cultural comum está a desaparecer. Onde estão, pergunta, os grandes representantes espirituais da Europa: escritores, pintores, filósofos e outros vultos culturais?
Onde dantes se discutia ao jantar o último livro de um escritor, a peça de teatro de outro o artigo de um poeta, passou a discutir-se o último capítulo da novela da TV. Onde está a Europa? No passado, as revoltas centro-europeias foram preparadas por esses guias espirituais da literatura, poesia, teatro, diz ele, não pelos mass media e, acrescentaríamos, as audiências da TV. É por isso que os russos, ao ocuparem a Checoslováquia se preocuparam em destruir, em primeiro lugar, a cultura checa, para atingirem de uma vez só a oposição, a identidade e os valores próprios dos checos, enfim, o 'Eu' checo.
Que premonição, hein? Vemos isso a acontecer em directo na TV na invasão russa da Ucrânia e o modo como os ucranianos resistem heroicamente a essa aniquilação da sua identidade (o objectivo também do rapto de milhares de crianças ucranianas enviadas para campos de re-educação) e rejeitam a sua colonização. E foi por um triz que a Europa os reconheceu como uma nação própria com direito a existir, para além dos negócios e comércios entre as grandes nações.
Este é um livro muito bom que vale muito a pena ler - e pensar, com ele, que estamos num momento único para criar condições de voltarmos a ter uma Europa com uma alma comum, digamos assim.
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