Estamos com a Ucrânia mas não com a AS

 

Vamos por partes. O Plano de Paz de Zelensky parece-me pacífico. É mais um grito: vão-se embora daqui, levem os vossos terroristas, devolvam o que roubaram e ponham os assassinos na cadeia. Nem sequer fala em indemnizações pela destruição sistemática e total da Ucrânia que a Rússia pratica todos os dias desde há um ano e meio.

O plano tem 10 pontos e é este:

1. Segurança nuclear e contra as radiações, centrada no restabelecimento da segurança em torno da maior central nuclear da Europa, Zaporizhzhia, na Ucrânia, atualmente ocupada pela Rússia.

2. Segurança alimentar, incluindo a proteção e a garantia das exportações de cereais da Ucrânia para os países mais pobres do mundo.

3. Segurança energética, com destaque para as restrições de preços dos recursos energéticos russos, bem como para a ajuda à Ucrânia no restabelecimento das suas infra-estruturas eléctricas, metade das quais foi danificada pelos ataques russos.

4. Libertação de todos os prisioneiros e deportados, incluindo os prisioneiros de guerra e as crianças deportadas para a Rússia.

5. Restabelecer a integridade territorial da Ucrânia e a Rússia reafirmá-la de acordo com a Carta das Nações Unidas, que Zelenskiy disse que "não está sujeita a negociações".

6. Retirada das tropas russas e cessação das hostilidades, restauração das fronteiras estatais da Ucrânia com a Rússia.

7. Justiça, incluindo a criação de um tribunal especial para julgar os crimes de guerra russos.

8. Prevenção do ecocídio, necessidade de proteção do ambiente, com destaque para a desminagem e o restabelecimento das instalações de tratamento de águas.

9. Prevenção da escalada do conflito e criação de uma arquitetura de segurança no espaço euro-atlântico, incluindo garantias para a Ucrânia.

10. Confirmação do fim da guerra, incluindo um documento assinado pelas partes envolvidas.

Outra coisa diferente e que devia ser iniciada agora mesmo, aproveitando a oportunidade desta união de países, é começar-se a pensar numa Fórmula de Paz, preventiva, para o mundo inteiro. A guerra na Ucrânia e a união de tantos países já se fez sentir na reacção ao golpe militar na Nigéria por parte de outros países africanos. Já entendem o golpe como um assunto não apenas interno mas global. Mas adiante. 

O que não gosto mesmo é que esta conferência de paz seja feita num país que é uma ditadura feroz, que não tem o menor respeito pelos direitos humanos, que mantém as mulheres escravizadas e se ri da justiça em geral. Ainda decapitam pessoas. Acho um mau começo e espero que a Fórmula de Paz venha a ser assinada formalmente num país mais respeitador dos direitos dos outros, mesmo que nesta confer~encia se faça o principal. Estas coisas não são indiferentes, quer dizer, começar uma iniciativa de paz e justiça no meio da maior hipocrisia.

Compreendo que a Ucrânia não está em posição de reivindicar outra disposição mas outros países estão e deviam ter evitado isto. Percebo que interessa ter a AS do lado de cá e não do lado dos russos e que há a questão do petróleo, mas se não se mudam os pragmatismos que induzem à guerra e à violação dos direitos humanos agora, em que há uma liga de países muito grande a pender para o lado da lei contra o lado do mais forte e bruto, quando o farão? Seria terrível se perdêssemos esta ocasião em que o esforço colectivo pesa mais que os individualismos.

Today is another active day for our international efforts. Our team is working in Jeddah, Saudi Arabia, at the meeting of advisors to the leaders of the states on the Peace Formula. In total, 42 countries are represented there. Different continents, different political approaches… pic.twitter.com/a6L7NOMQUz

— Володимир Зеленський (@ZelenskyyUa) August 5, 2023