Coração de Dom Pedro I chega ao Brasil em clima de acirramento político
O coração do monarca, que morreu em 1834, aos 35 anos, ficará no Brasil até 8 de setembro. Ao longo de três semanas, será exposto no Palácio do Planalto e no Itamaraty.
Os brasileiros são obcecados por dois Pedros sem os quais o Brasil não seria o Brasil: Pedro Álvares Cabral que descobriu o Brasil para os portugueses e Pedro I que descobriu o Brasil para os brasileiros.
Os símbolos têm um grande poder na experiência humana. Evocam e desencadeiam emoções, memórias e experiências que estão escondidas em níveis sub-conscientes. Não me refiro a símbolos como um emoji, mas a símbolos ligados à experiência da nossa identidade como indivíduos e como membros de grupos colectivos como a nação/pátria ou a religião, por exemplo.
A bandeira portuguesa ou o hino convocam a manifestação de um certo tipo de sentimentos/comportamentos que sentimos serem portugueses - seja lá o que isso for, mas esses símbolos podem ser a única maneira de exprimirmos a experiência de 'ser português'. Outras experiências indefiníveis também têm poucos canais para se exprimirem, para além de certos símbolos que as trazem ao de cima.
Sabemos que esses símbolos são também motivadores. Vemo-lo todos os dias na maneira como os ucranianos se motivam para resistir aos russos: certas imagens do presidente foram fixadas para serem símbolos de união, assim como a frase, 'Slava Ukraini' que todos conhecemos ou as cores azul e amarela da bandeira da Ucrânia, os girassóis, etc.
Portanto, os símbolos também representam a união com o grupo e no caso presente do Brasil, muito dividido politicamente, como aliás diz a notícia, o coração do fundador do Brasil independente é um símbolo poderoso de união.
As relíquias têm algo de estranho e algo de poderoso que é o facto de terem resistido, natural ou artificialmente, à dissolução da morte e adquirirem um significado não profano. Não é por acaso que os líderes, dos faraós a Lenine, foram mumificados: era para serem adorados como deus vivos. Sacralizados.
Um coração, sobretudo um coração, mais do que outro orgão, é um símbolo poderoso emocional de vida. Basta pensar nas pessoas que têm um coração transplantado e no efeito profundamente emocional que esse coração tem nos familiares do dador, quando esse coração já é apenas uma relíquia do seu ente querido.
De maneira que não surpreende que os brasileiros tenham devoção ao seu fundador, símbolo da sua existência como povo e ao seu coração, símbolo de união entre todos e a um plano espiritual da existência que lhes dá significado e orientação.
Aqueles que pensam que tudo é ridículo nestes símbolos são os que mais se deixam manipular por eles, justamente por estarem ainda não-conscientes do seu poder no coração dos homens.
Estou com todos os que não se mexem para ver um coração de certeza todo esbranquiçado pelos conservantes e que nada acrescenta. Desinteressa-me que seja de um rei particular e parece-me que não seja relíquia. Parece-me movimento a mais. Pertenço, pois, aos não conscientes do poder desse coração. É a vida.
ReplyDeleteEu também não iria ver tal coisa. A mim até o frango cru quando tem aquela pela amarela mete nojo, quanto mais... mas não é disso que falo, falo de símbolos e do poder que têm nas pessoas.
ReplyDeleteTemos opinião diversa quanto a símbolos. Essa idolatria que faz deslocar gente para ver um velho coração tão outro de si (ainda bem que não é de comer, estaria rançoso e podre), faz-me pensar em atraso cultural. A simbologia ligada a este apêndice e o poder que acaso possa ter (mas qual poder?), lá está, soa-me a atraso e cheira a mofo. Prefiro-lhe a lenda de outro Pedro, o crú ou justiceiro, que mandou arrancar o coração pelas costas aos traidores que mataram a sua Inês. Era pelo menos isto que fixávamos e gostávamos de contar uns aos outros na antiquíssima primária.
ReplyDeleteÉ isso. Os símbolos são coisas sem importância nenhuma. Ainda hoje o presidente da Ucrânia esteve um ror de tempo a falar da bandeira do país e todos os ucranianos se vestiram com aquelas blusas rústicas tradicionais. são todos uns atrasados culturais.
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