'Descentralização, autonomia e flexibilidade' - palavras repetidas ad nauseam pelo primeiro-ministro e pelos senhores que tutelam a educação mas que são mero fogo de artificio.
Como acho que ficou claro no post anterior, os professores têm cada vez menos autonomia e margem de manobra para desenvolverem a sua pedagogia, a relação com os alunos, metodologias mais afinadas e uma avaliação diferenciada.
A autonomia de que se fala é, na prática, mais poder para os directores, não para os professores. E o que vão fazer os directores? Aquilo que agrada à tutela, nomeadamente ao SE de quem têm medo. E o que é que agrada à tutela? Fogo de artifício: formações para professores (como se tivéssemos poucas...), oficinas de escrita e de matemática, clubes e coisas desse género.
Eu não sou contra haver clubes, muito pelo contrário, ou haver 'oficinas' de escrita. No entanto, não é aí que os alunos aprendem e recuperam aprendizagens, quero dizer que os clubes e oficinas são um complemento e não um substituo do trabalho com os professores das disciplinas. Os clubes e oficinas servem para os alunos reforçarem aprendizagens de modos múltiplos e diversos dos das aulas; servem um propósito de socialização que implica negociação com pares e professores, para desenvolver expediente, autonomia, desenvolver a afectividade, interesses próprios extra-curriculares, etc.
Onde os alunos aprendem o currículo oficial é nas aulas. Podem ser aulas muito diferentes das tradicionais e, muitas são, mas é onde estão sob a tutela de um professor que lhes orienta as aprendizagens, que tem uma visão coerente do currículo, da melhor maneira de o abordar consoante as características da turma, da avaliação, dos pontos fracos da turma que devem ser mais trabalhados, dos fortes que podem ser explorados, etc. As aulas têm uma continuidade no tempo que serve para os professores e os alunos se conhecerem num contexto formal de aprendizagem.
As aulas de apoio e os clubes também servem para reforçar, mas não para substituir o professor.
A maior causa de stress na profissão de professor está na relação com os alunos. Um professor investe muito, emocionalmente, nos alunos. Sabe que as aulas resultam bem, ou não, dependendo muito da relação de respeito e confiança mútua entre os alunos e o professor.
Portanto, a medida mais eficaz no sucesso escolar e na recuperação de aprendizagens é a redução do número de alunos por turma e o número de turmas/alunos por professor. Há professores com mais de 400 alunos... Uma turma de tamanho razoável, permite ao professor ter uma relação mais próxima dos alunos, conhecer melhor cada aluno, ter tempo para diversificar as avaliações, a metodologia de aula, falar com os pais, fazer visitas de estudo, etc.
Porque razão não se reduz o número de alunos por turma e o número de turmas por professor? Porque não tendo o professor autonomia nenhuma, como acho que ficou claro no post anterior, a tutela não vê razão para isso.
Em vez disso escolhe-se dar mais poder aos directores para fazerem 'coisas' que sejam do seu agrado e do agrado dos amigos e que dêem nas vistas - e que sirvam para os amigos terem sempre boa avaliação.
O problema é que os alunos não precisam de fogo de artifício, precisam de sedimentação, fundamentos fortes para poderem construir conhecimentos e não é com esta organização de escolas e de currículos que isso se consegue.
Mais uma vez: virem falar dos professores desenvolverem o pensamento crítico dos alunos, a vontade de estudar, a perseverança, o pensamento estruturado, a aquisição de técnicas e etc., está em clara contradição com a prática que impõem nas escolas.
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