August 26, 2020

O cais das colunas e outras cenas

 



Hoje tive que ir a Lisboa a um médico e resolvi , já que lá ia, arejar um bocado. Eu e um amigo resolvemos jantar e fazer qualquer coisa. Combinámos encontrar na Praça do Comércio porque ele trabalha ali perto. Fui esperar no cais das colunas que é um dos meus sítios preferidos em Lisboa. É ali que simbolicamente Portugal se abriu ao mundo e uma centena de gerações partiu dali para se aventurar no desconhecido. O lugar está carregado de imaginação e história. Pois estava ali sentada a olhar o movimento do rio quando reparei que os pilares estavam cheios de inscrições, coisa que nunca tinha visto. Aproximei-me e vi claramente no pilar esquerdo o nome de Salazar no fim de um longo texto. Tirei esta fotografia ao pilar e depois fui ao outro e pareceu-me ver, no fim do texto, General... qualquer coisa.

Bem, cheguei agora a casa e vim à net investigar o mistério. Não é mistério nenhum, eu é que nunca tinha ouvido falar disto. Então, as colunas do Cais das Colunas que substituiu o Cais de Pedra, têm os nomes que lhe foram dados no Estado Novo, em 1939: Salazar e General Carmona. (Garcia Nunes in AML)

 

Segundo alguns autores as colunas podem ter inspiração maçónica e representar as colunas do Templo de Salomão, simbolizando o Ocidente e o Oriente, entre outros valores.


No pilar esquerdo, oriental, pode ler-se:

A SEGUNDA VIAGEM DO CHEFE DO ESTADO ÀS TERRAS ULTRAMARINAS DO IMPÉRIO: CABO VERDE, MOÇAMBIQUE E ANGOLA. XVII DE JUNHO - XII DE SETEMBRO DE MCMXXXIX A VIAGEM DO CHEFE DO ESTADO ÀS TERRAS DO IMPÉRIO EM ÁFRICA ESTÁ NA MESMA DIRECTRIZ DAS NOSSAS PREOCUPAÇÕES E FINALIDADE, É MANIFESTAÇÃO DO MESMO ESPÍRITO QUE PÔS DE PÉ O ACTO COLONIAL SALAZAR  (Luís Filipe A. Pereira in AML)

 



No pilar direito (ocidental) lê-se: 

AQUI EMBARCOU O CHEFE DO ESTADO PARA A PRIMEIRA VIAGEM ÀS TERRAS ULTRAMARINAS DO IMPÉRIO: SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE E ANGOLA. XI DE JULHO - XXX DE AGOSTO DE MCMXXXVIII COM A CERTEZA DE QUE FALA PELA MINHA VOZ PORTUGAL INTEIRO, PROCLAMO A UNIDADE INDESTRUTÍVEL E ETERNA DE PORTUGAL. GENERAL CARMONA (Luís Filipe A. Pereira in AML)




Há quem defenda que as colunas deviam ser restauradas e levadas para um museu e em seu lugar pôr outras com versos da Mensagem, por exemplo.

Enfim, muito interessante. Aqui nesta imagem que fui tirar ao 2º site referenciado, vê-se a inauguração dos pilares com os ditos cujos citados:



Acto 2:

Depois fomos comer a um sítio giro e dar uma volta a fazer tempo porque à noite tínhamos bilhetes para ir a um espectáculo de árias de ópera nos jardins do museu das janelas verdes. Isso só não estragou um dia bem passado porque foi cómico. Nem vou contar em pormenor, mas foi caro, as cadeiras daquele plástico fininho  mal se equilibravam no chão (ao fim de meia-hora já não sabia como me sentar) que tinha uma inclinação ao contrário, o tenor cantava árias líricas apaixonadas como se estivesse a dar gritos de guerra ou de pânico por ter perdido o cacilheiro da tarde, abanou tanto e com tanta força a mezzo-soprano [belíssima voz a dela] (no intervalo de andar constantemente a atirar-se para cima das mulheres aos beijos) que a mulher deve estar cheia de nódoas negras nos braços e no fim todos bateram muitas palmas e gritaram bravos. Nós olhávamos um para o outro com vontade de rir e eu dava graças por estarmos de máscara para ninguém me ver rir. 
O pianista acompanhador, Francisco Sassetti, tocou maravilhosamente. 
A mezzo, uma mulher elegante, levava um vestido vermelho tão apertado que se viam todos os músculos da barriga a trabalhar. Era como estar a ver o mecanismo de um piano por dentro. Distraí-me a observar o mecanismo dos músculos da barriga dela a contrair e descontrair com o canto e desconcentrei-me. No fim o tenor cantou músicas de zarzuelas  populares muito bem e percebemos que a vocação dele é a de cantor romântico de charme popular. 


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