Fátima e Pedrógão foram as freguesias contempladas, mas em ambos os casos a iniciativa deu para o torto.
Quando os militares do SEPNA (Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente) da GNR abriram o curral da Junta de Freguesia de Pedrógão, no alto da Serra de Aire, em Novembro último, depararam-se com meia dúzia de animais mortos. Eram o que restava do projecto de Conservação de Habitats Naturais na Serra de Aire e Candeeiros, iniciado pela Quercus em 2011, com financiamento da União Europeia. Paulo Simões, presidente da Junta de Freguesia de Pedrógão, relatou a O MIRANTE a sucessão de acontecimentos que levou a este “triste” desfecho.
Há dias que tentava contactar o pastor para combinar a visita da veterinária às instalações. Inicialmente houve várias desculpas, depois o pastor deixou de atender as chamadas. Paulo Simões enviou um funcionário da junta ao local. Ali deparou-se com um estábulo fechado, com ar de abandono e sem sinal de animais por perto. Foi então que o presidente da junta chamou o SEPNA e o veterinário municipal para o acompanhar ao estábulo e ver o que se passava. Era suposto estarem ali perto de 50 cabeças de gado, um número ainda assim muito inferior ao protocolado inicialmente com a Quercus.
Paulo Simões explica que muitas cabeças se foram perdendo entre 2011 e 2017, altura em que o estábulo ficou concluído e em que Joaquim Cardoso subiu a serra com cerca de 70 animais. Aquando da assinatura do protocolo, a Quercus comprou o rebanho de Joaquim Cardoso, com cerca de 100 cabeças, e completou-o com outras 100. Joaquim exploraria o rebanho economicamente e o compromisso era mantê-lo naquela região da serra. Joaquim Cardoso foi o pastor “imposto” pela Quercus e ninguém se opôs, porque resolvia outro problema, o das queixas dos vizinhos de A-do-Freire, onde vivia e mantinha os animais sem o mínimo de condições de higiene. Mas durante os seis anos que demorou a construção do estábulo muitos animais foram morrendo.
A insistência de Paulo Simões para saber quantos eram os animais, como estavam de saúde e se tinham as vacinas em dia acabou com a paciência de Joaquim Cardoso que, “de um dia para o outro”, decidiu abandonar o projecto e entregá-lo ao amigo Pedro Ricardo Filipe, com os mesmos termos contratuais.
Parecia ser a pessoa indicada. Era mais novo e tinha energia. Limpou o estábulo e nunca foi detectado qualquer problema. “O que terá acontecido para não me atender e desaparecer com os animais é um mistério. Diz que os animais fugiram...”, desabafa o autarca. Quanto a agir judicialmente, Paulo Simões refere que está a avaliar os custos envolvidos num processo desta natureza.
Assunto divulgado em Julho
O assunto foi relatado na última Assembleia de Freguesia de Pedrogão. A CDU questionou Paulo Simões e, diz, não tendo obtido respostas convincentes optou por colocar um cartaz no Pedrógão onde levanta questões como o porquê da morte dos animais e para onde foram os bens cedidos para o projecto (além do estábulo, uma moto 4, uma cisterna móvel e um aparelho de ordenha). Também Helena Pinto, vereadora do Bloco de Esquerda na Câmara de Torres Novas, levantou o assunto na reunião do executivo de 21 de Julho exigindo explicações “completas e rápidas”.
O financiamento para o estábulo foi feito pela União Europeia e contou com uma ajuda da Câmara de Torres Novas de 10 mil euros. O gasto da junta, de acordo com Paulo Simões, resume-se a cerca de três mil euros utilizados na compra de gado para reforço do rebanho aquando da troca de pastor. Segundo o autarca, a junta ficou agora com um património imobiliário que deve rondar os 50 mil euros e ao qual não sabe que destino dar. Uma coisa é certa: “Está fora de questão comprar outro rebanho”.
Questionado sobre os restantes bens afectos ao projecto, o autarca confirma que a moto 4 ficou na posse da junta e refere que a cisterna móvel estava à guarda do segundo pastor. O aparelho de ordenha era uma estrutura metálica simples e já estaria danificado.
Cabras não eram sapadoras
O objectivo do rebanho era controlar os carrascos, medronhos e matos em geral que crescem nestas serras, de forma a preservar plantas mais frágeis como algumas orquídeas. “Não há uma única linha em todo o processo que refira o termo sapadoras”, conta o presidente da Junta de Pedrógão.
O projecto com um orçamento total de mais de 400 mil euros, financiado pela União Europeia em 75%, era dividido em dois pólos, um do lado norte da serra, em Fátima, e um do lado sul, no Pedrógão. Previa dois rebanhos, com cerca de duas centenas de efectivos cada, e dois estábulos. Em Fátima o projecto avançou rapidamente porque já havia uma estrutura que foi aproveitada pela junta de freguesia, mas também aí o desfecho foi trágico. Os animais acabaram por morrer de doença.