A Europa enfrenta uma crise demográfica?Análise de Ishaan Tharoor
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Para a extrema direita da Europa, as tendências em todo o continente apontam para uma catástrofe: As taxas de natalidade estão a diminuir, as populações estão a envelhecer e comunidades inteiras estão a encolher. Os nacionalistas de direita lamentam as agendas liberais, o feminismo e conspirações supostamente sinistras para substituir os europeus brancos por migrantes estrangeiros.
Mas o quadro é mais complicado e desigual dentro do continente, com o declínio muito mais acentuado em certos países do que noutros - especialmente aqueles cujas economias vacilantes incentivam a emigração dos jovens e qualificados. [está a falar de Portugal]
Os especialistas acreditam que as tendências demográficas na Europa exigirão mais migração de outros países, independentemente das objecções da direita anti-imigração.
Abordei estas questões durante uma entrevista com Dubravka Suica, uma das vice-presidentes da Comissão Europeia. A sua pasta tem um enfoque combinado na demografia e na democracia. (...) Sobre esta última, ela lidera uma iniciativa conhecida como a Conferência sobre o Futuro da Europa, uma série de debates e discussões trazendo cidadãos comuns de todo o continente que já moldou uma nova política em Bruxelas.
A entrevista foi editada para maior clareza e brevidade.
TWV: Quais são os desafios demográficos que a Europa enfrenta?
Suica: Um terço dos agregados familiares europeus são famílias monoparentais, sejam jovens ou pessoas mais velhas. Nos últimos 50 anos, a esperança de vida europeia aumentou em média mais 10 anos, o que é um grande feito mas ao mesmo tempo um grande desafio para os sistemas de pensões e para os sistemas de cuidados de saúde. Estamos a envelhecer e temos de encontrar a forma de equilibrar isto, sabendo o que se passa em diferentes partes do mundo, na América Latina, em África. A Europa é completamente oposta.
Diria que as tendências constituem uma crise?
Suica: Não diria que se trata de uma verdadeira crise demográfica. Estamos a utilizar diferentes ferramentas para ajudar a tornar a Europa e a economia e a vida social da Europa sustentáveis. Estamos a investir na política de coesão [financiamento da UE para projectos de criação de emprego e de desenvolvimento sustentável]. Em segundo lugar, estamos a utilizar a IA e a robótica. E terceiro, estamos a gerir a migração legal, sem a qual não conseguiríamos ter mercados de trabalho sustentáveis. Gerir a migração legal significa que aqueles que têm direito a asilo, têm o direito de vir. Aqueles que não têm direito, têm de voltar.
Também gerem a Conferência sobre o Futuro da Europa, um grande exercício de "democracia deliberativa". Qual é a ligação entre esse esforço e a sua agenda demográfica?
Suica: Qual é a ligação entre democracia e demografia? Os cidadãos são facilmente influenciados pelos populistas e começam a acreditar neles. E é por isso que temos de nos aproximar dos cidadãos, temos de estar no terreno. E, claro, não sou só eu, mas todos os políticos a diferentes níveis.
Vê então o seu papel como uma censura ao populismo de extrema-direita?
Suica: Não diria isso de maneira tão crua. O meu papel é aproximar-me dos nossos cidadãos e mostrar a todos e a cada um dos europeus que ele ou ela podem influenciar a elaboração da política europeia. Mostrar que ouvimos e seguimos o que os cidadãos nos dizem e isto é algo muito corajoso. Nenhuma democracia no mundo jamais tentou fazer algo semelhante, pelo menos em tão grande escala. Claro que algumas pessoas nas zonas rurais e noutros lugares por vezes sentem-se deixadas para trás porque vivem onde não há infra-estruturas, não há serviços. E começam a culpar a democracia.Estamos a tentar combater a interferência estrangeira, combater a desinformação. Ao mesmo tempo, estamos também a combater as tendências anti-democráticas de dentro e temos de ensinar aos nossos cidadãos, aos nossos filhos desde muito cedo, como ser cidadãos responsáveis. Isto não vai acontecer da noite para o dia.
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Vejamos:
- Esta vice-presidente pensa que o populismo é uma política que só afecta a extrema-direita. Os outros cidadãos, inclusive ela, são seres humanos que nascem imunes ao populismo. Vêm logo marcados para ser de esquerda anti-populista.
- Ela repete o populismo dos governantes (eu sei o que o país pensa; só eu sei o que é melhor para o país; o povo não percebe nada de política; só eu tenho conhecimentos dos problemas; o povo tem de ser dirigido; nós é que temos de dizer a verdade ao povo; os que estão contra mim são destrutivos e pessimistas, etc.) pensando que está a ser inovadora;
- Não é capaz de compreender que, se em sítios rurais onde havia tudo agora não há nada e as pessoas são deixadas ao deus-dará, sem estruturas de apoio nem serviços, isso é, de facto, uma grande falha da democracia e não um acaso, uma inevitabilidade ou um populismo - mais ainda, não percebe que esses acontecimentos que afectam negativamente a vida de tantos, têm responsáveis: os governantes que decidem as políticas, nos quais ela se inclui. No seu discurso ninguém é responsável pela situação de exclusão de tantos milhões de pessoas e tudo se deve ao populismo (Salazar chamava-lhe, o
reviralho)
- Finalmente, assume-se como grande educadora do povo e diz que temos de ensinar as pessoas, logo desde muito crianças, a ser cidadãos responsáveis.
Lemos isto e parece estarmos a ouvir o salazarento a dizer que as crianças têm de ser educadas a ser bem comportadinhas, com as emoções no lugar certo (não queremos nenhum espírito rebelde) e cidadãs obedientes.
Hence: disciplina de cidadania ideológica. Cidadania que o próprio não pratica. O que está dentro da sua (e do primeiro-ministro) lógica interna: o chefe manda e pratica o chicote e os outros praticam a obediência. E quem não aceitar esta ordem é populista de extrema-direita.
E é esta gente que nos governa... e dizem às claras estas intenções, próprias daqueles ditadores que se pensam os grandes educadores do povo e engenheiros sociais e estão na origem de grandes desastres políticos e sociais.