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February 02, 2020

À laia de desabafo



A maioria das pessoas, mesmo médicos, mesmo médicos oncológicos, não percebe o que é viver com a doença oncológica.

Estava aqui a dar uma vista de olhos pelos jornais e revistas  e vi este título, 'A imortalidade não é impossível' e pensei cá para mim, mas quem é que quer viver centenas de anos? Chiça! Deixa cá ver o que é que isto diz. A meio do artigo dou com esta frase:

Hoje, a taxa de sobrevivência para o cancro está acima dos 50%, em geral, e em alguns cancros ronda os 90%, como nos casos dos da próstata e da mama. No dos testículos, é praticamente 100 por cento. Por outro lado, o cancro do pulmão e o do pâncreas continuam com números muito baixos.  (LR em, 'A imortalidade não é impossível')

Para qualquer lado que nos voltemos há notícias e afirmações sobre a doença. Uma pessoa está muito bem na sua vida a tentar abstrair-se das estatísticas que nos dão três anos de vida ou pouco mais e de repente põe os olhos numa frase destas e é imediatamente atingido por uma vulnerabilidade que se sente, fisicamente, como uma tremenda angústia no estômago. Imediatamente fiquei consciente de um sintoma que tenho tido este mês e que pode não ser nada mas que pode ser alguma coisa. Imediatamente me veio à cabeça a última consulta com a médica oncologista, o resultado do exame que tem uma coisa que pode não ser nada mas que pode ser alguma coisa e que me obriga a ir fazer novos exames médicos que nunca fiz, conhecer médicos novos que me vão mexer, virar, picar, ofender... alguns tratar como se fosse uma coisa e não uma pessoa com sentimentos...

Eu até acho que lido bem com a doença, quer dizer, tenho uma atitude positiva, não estou centrada na doença. Os meus alunos, este ano, a maioria não sabe que tenho a doença, o que significa que não se notam alguns impedimentos que tenho. Talvez alguns saibam porque são filhos de colegas e um ou outro por outra razão, mas em geral, faço a minha vida sem estar obcecada com isto e estou muito mais vezes bem disposta que mal disposta. Aliás, nem costumo estar mal disposta. Depressões e outras coisas afins que as pessoas ganham com esta doença, não as tive. Não está na minha natureza. No entanto, é difícil estar sempre a ler estas estatísticas. Porque uma coisa é sabermos que vamos morrer, outra muito diferente é pensar que é já ali à esquina.

Não procuro estas informações ou estatísticas: ou vou dar com elas assim nas notícias ou há médicos que mas atiram à cara. Enfim, é preciso uma boa dose de filosofia, e acho que a tenho desenvolvido, para me desligar das coisas e das pessoas que me fazem mal. 

Isto era só um desabafo. Esta palavra, 'desabafo' é muito expressiva. Uma pessoa está carregada, a sentir o peso de algo que abafa e tira esse abafo e fica mais leve :) É isso. Uma das razões de ter um blog é mesmo destressar, tirar os abafos 🙂 enfim, vou vestir-me e sair e apanhar sol 🙂


November 06, 2019

Divagações acerca duma capa de revista




Porque estamos tão cansados?

O Platão tinha muita razão. Se não tivéssemos corpo e fossemos só alma racional a vida era muito mais simples, sem este corpo emocional que gera o sofrimento... E o sofrimento serve para quê?
Não acredito nada naquela ideia de Nietzsche segundo a qual o que não nos mata torna-nos mais fortes. Torna é uns mais duros, outros mais cínicos e a outros destrói-os. Também gera a arte que depois nos consola do mesmo sentimento que a gerou. "Lemos para sabermos que não estamos sós"

Hoje encontrei uma colega em sofrimento. Ela precisava de tirar aqueles abafos todos que a sufocavam. Calei o meu. Calamo-nos todos. Na minha vida mental quotidiana, onde passo grande parte do tempo, a vida é simples e cheia de tranquilidade. Mas depois olho para fora e é como esta imagem com os fios dos gadgets todos enleados e eu sem saber que fio pertence a quê e fico cansada da paz nunca chegar e de cada passo em frente que me custa os medos me atirar lá para trás.
Porque estamos tão cansados? Porque as cidades são duras e o corpo é mole.












Hoje é um dia que chama a poesia. Esta música indolente e triste mais os abafos que não tinha e juntei aos meus.





Uma criança de 4 anos pergunta, 'Quando os humanos estiverem todos mortos, até ao último, será que a noite e o dia continuarão lá?' Ainda não chegou à meia dúzia de voltas ao sol e já o pensamento começa a ensinar ao corpo o sofrimento.