October 04, 2025

Rachel Ruysch - Pintar uma sensação

 



Ruysch, pintada por Michiel van Musscher


Rachel Ruysch (1664-1750), uma pintora do Século de Ouro holandês e a primeira mulher a ser admitida na sociedade artística de Haia, foi uma grande inovadora que iluminou as maravilhas do mundo natural.

Os seus ramos de flores eram encantadoramente desordenados, impregnados de uma aparente casualidade que escondia a habilidade na sua execução, mas foi nos seus bouquets florais que o seu talento realmente brilhou. 

O seu conhecimento enciclopédico sobre flores revelava-se na forma como retratava a sua aparência e comportamento, capturando a textura das suas pétalas e estames e a maneira como desabrochavam e murchavam em composições magistrais que deixavam os seus concorrentes na sombra.

A inclusão de espécies exóticas diferenciava-a dos seus pares. Dos cerca de 12 vasos florais que pintou, ainda bastante nova, no final do século XVII, quatro focavam-se exclusivamente em espécies importadas das Américas, África e Ásia. 

O seu conhecimento e acesso a estas espécies devem-se provavelmente ao seu pai. Em 1685, ele tinha sido nomeado professor de plantas nativas no jardim botânico Hortus Medicus, em Amesterdão, e parece natural que a tivesse levado lá.

O Hortus Medicus foi um dos vários jardins, tanto públicos como privados, cujo surgimento coincidiu com a expansão do comércio colonial na segunda metade do século XVII e ofereceu acesso sem precedentes a novas espécies de plantas. Possuía uma das mais ricas coleções de plantas nativas e exóticas da Europa, bem como as maiores estufas da Holanda, dedicadas ao cultivo de espécies provenientes dos territórios coloniais.

Natureza morta com trombeta-do-diabo, um cacto, um ramo de figueira, madressilva e outras flores num vaso azul apoiado numa saliência (1690-95) - colecção privada

Esta pintura apresenta várias flores e espécimes de plantas que estavam a começar a ser cultivadas nas estufas holandesas. No centro está uma trombeta-do-diabo branca, uma planta que floresce à noite, originária do México e da Ásia. Ruysch foi uma das primeiros a retratar esta flor exótica e reproduz as suas pétalas brancas dobradas com detalhes requintados. É ladeada por uma capitaneja amarela, também do México, e pela videira-trombeta vermelha da América do Norte. No canto superior esquerdo, pode-se ver um cacto espinhoso, outro espécime mexicano que só chegou ao Hortus Medicus da colónia holandesa de Curaçao em 1890. (por Cath Pound)

Gostava muito de mergulhar nesta pintura ao vivo. É extremamente sensual e evocativa. Sempre que a olho, o primeiro impacto é o de uma sensualidade do fresco nocturno do Verão. Faz-me recuar a um tempo de há umas décadas em que ia passar dias a casa de amigos no litoral alentejano -quando aquilo era selvagem e deserto- e naquelas noites de Agosto atravessávamos a mata de pinheiros num passeio até à praia, onde desembocávamos logo à saída da mata com o mar prateado em frente. A sensação dos pés nus na areia fina e fresca da noite e a visão dos lírios brancos rasteiros que apareciam espectrais à luz da lua na mata. Até consigo sentir o cheiro desse fresco nocturno que exala da mata de pinho. 

Uma grande variedade de animais e insetos pode ser encontrada nas naturezas mortas de Ruysch — borboletas, besouros, gafanhotos, abelhas, vespas, formigas, libélulas e lagartos habitam as suas obras. 

Rachel Ruysch pintou mais de 250 obras (enquanto criava 10 filhos) e a sua reputação, em vida, estava ao mesmo nível que a dos outros grandes mestres holandeses. As suas pinturas tinham muita procura, sobretudo por todos os que se interessavam por botânica e entomologia do Novo Mundo. Teve sempre o apoio do pai e, mais tarde, do marido, também pintor.

Hoje-em-dia, como as Naturezas Mortas sairam de moda, digamos assim, há menos interesse pela sua obra mas eu, sendo uma fanática de Natureza Mortas, adoro as obras dela e gostava muito de estar em Boston, onde decorre uma retrospectiva das suas obras - li algures.

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