MP não é magistratura “indisciplinada”, não pode haver “intocáveis”, Costa não é suspeito. O balanço da entrevista a Rosário Teixeira
Numa altura em que o Ministério Público está debaixo de fogo, aquele que é o investigador criminal mais conhecido do país aceitou dar uma rara entrevista. Recusa a ideia de que a sua magistratura é uma “casa desarrumada, ingerível ou indisciplinada”, sugere que se Costa fosse suspeito teria de ter sido constituído arguido quando foi ouvido e diz que, embora o MP possa ter consciência das possíveis consequências políticas das suas diligências, não pode deixar de as fazer porque senão haveria situações e pessoas “intocáveis”.
O mais conhecido dos procuradores portugueses – responsável, por exemplo, pela investigação a José Sócrates na Operação Marquês – deu uma rara entrevista esta quinta à noite, à SIC, numa altura em que o Ministério Público tem estado debaixo de fogo e a procura de um novo perfil de Procurador-Geral da República já foi anunciada pela ministra da Justiça.
Chamado a comentar as declarações recentes da ministra Rita Alarcão Júdice, que defendeu que é preciso “alguém para arrumar a casa” dentro do Ministério Público, Rosário Teixeira comentou que interpretou essa afirmação no sentido em que o Governo procura alguém com um “perfil novo” e não “pela existência de uma casa desarrumada, ingerível ou indisciplinada”.
O procurador que conduziu a Operação Marquês ou o processo Monte Branco recusa totalmente a ideia de que o Ministério Público esteja à rédea solta. “O Ministério Público não é uma magistratura indisciplinada. Há uma ideia que tem passado de que cada um pensa pela sua cabeça e que cada um faz o que quer e que tem uma rédea solta para o fazer. Não é isso que corresponde à verdade, não é essa a ideia que tenho de dentro da casa.”
Questionado sobre as circunstâncias do processo da Madeira e, sobretudo, da Operação Influencer – que levariam à demissão do primeiro-ministro, à queda de uma maioria absoluta e a eleições antecipadas – , Rosário Teixeira defendeu que o Ministério Público “não tem interesse em derrubar governos nem faz parte das suas funções gerar essas consequências políticas”: “O que aconteceu nesses casos é que simplesmente houve diligências de recolha de prova” e essas diligências “geraram essas consequências que não foram pretendidas pelo próprio MP”
E o Ministério Público não tinha consciência desses possíveis danos? Essa “consciência”, defende o procurador do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), “não pode impedir que o Ministério Público deixe de atuar”. “Se tem necessidade de fazer diligências para recolha de prova, o Ministério Público não deve estar restringido. Porque senão haveria situações que seriam intocáveis, que nunca poderiam ser exploradas”, acrescentou.
Rosário Teixeira também não poupou nas críticas aos críticos do Ministério Público, nesta entrevista à SIC, emitida esta quinta-feira no Jornal da Noite. “Muitas vezes dizem que o Ministério Público é cada um para seu lado e que é algo que está incontrolado mas depois esses mesmos críticos vêm dizer que há uma consciência política dentro do MP, e até já aproximaram o MP de determinados partidos políticos. Isso é uma incongruência total, porque ou estão à rédea solta e cada um para o seu lado ou estão todos conluiados para fazer um frete político. Nem é uma coisa nem é outra.”
Ainda sobre o tópico Operação Influencer, o procurador foi questionado sobre como olhava para o facto de António Costa ter sido ouvido a seu pedido e nunca mais ter sido chamado ao processo. Rosário Teixeira explicou que num caso de tráfico de influência pode haver uma terceira pessoa e que seja preciso perceber se essa terceira pessoa interveio ou não na decisão. “Isso pode demorar algum tempo porque pode precisar da apreciação de detalhes, mas está aí a diferença entre ouvir uma pessoa como suspeito ou não ouvir como suspeito”.
Para o magistrado, não restam dúvidas de que neste momento António Costa não é suspeito na Operação Influencer, porque se o fosse teria sido constituído arguido. “É preciso que fique claro que o próprio Código diz que de cada vez que um suspeito for ouvido num determinado processo tem de ser ouvido como arguido. Ora, se a pessoa é ouvida no processo e não é ouvida como arguida eu tiro daí a conclusão de que não é suspeito, porque senão já estávamos a violar o Código de Processo Penal. O estatuto de arguido é sempre um estatuto de proteção e ele nem sequer foi atribuído”, explicou.
E é legítimo que um governante esteja sob escuta durante quatro anos? Para o procurador o ponto da questão não é se se trata de um governante ou de não um governante, mas da matéria que está a ser investigada. “Há situações em que se está a analisar um determinado negócio ou uma determinada estrutura societária e esta está de tal maneira em constante evolução que eu não consigo encontrar um momento em que ela para de evoluir. Às vezes são negócios que demoram tanto tempo a montar…”
Ainda assim, o procurador que diz que os megaprocessos são indesejáveis mas “impostos pela própria realidade” – há megaprocessos porque há mega realidades -, admite que as escutas telefónicas são um dos setores que podem sofrer adaptações legislativas. “Existe um dispositivo que diz o que deve ser eliminado por não ter relevância para a prova, e o que contenda com segredos médicos, profissionais, de estado, com a intimidade da vida privada, e que não tenha a ver com o objeto do processo.” Porém, assume, “é um dos sectores que pode ser melhor definido em termos legais”.
E é legítimo que um governante esteja sob escuta durante quatro anos? Para o procurador o ponto da questão não é se se trata de um governante ou de não um governante, mas da matéria que está a ser investigada. “Há situações em que se está a analisar um determinado negócio ou uma determinada estrutura societária e esta está de tal maneira em constante evolução que eu não consigo encontrar um momento em que ela para de evoluir. Às vezes são negócios que demoram tanto tempo a montar…”
Ainda assim, o procurador que diz que os megaprocessos são indesejáveis mas “impostos pela própria realidade” – há megaprocessos porque há mega realidades -, admite que as escutas telefónicas são um dos setores que podem sofrer adaptações legislativas. “Existe um dispositivo que diz o que deve ser eliminado por não ter relevância para a prova, e o que contenda com segredos médicos, profissionais, de estado, com a intimidade da vida privada, e que não tenha a ver com o objeto do processo.” Porém, assume, “é um dos sectores que pode ser melhor definido em termos legais”.
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