[...] we can’t know the exact words Moctezuma spoke to Cortés. It’s all an exercise of the imagination.
Peguei no romance de Álvaro Enrigue sobre o encontro de espanhóis e astecas porque estava curioso com o título. Em espanhol, o livro chama-se Tu sueño imperios han sido - uma frase emprestada de um poema de beleza barroca que significa "os teus sonhos foram impérios". A sua tradução inglesa intitula-se You Dreamed of Empires, que se transforma, para o meu ouvido, em algo diferente.
O encontro entre Hernán Cortés e o imperador Motecuhzoma Xocoyotzin, ou Moctezuma, foi semelhante ao encontro de duas espécies alienígenas.
Os espanhóis, como vencedores deste choque de civilizações, escreveriam mais tarde narrativas coroando-se a si próprios como os contendores superiores. Enrigue apresenta-nos duas sociedades que nos parecem muito distantes da nossa sensibilidade moderna, uma das quais - o império asteca - tem sido frequentemente reproduzida de forma pouco cuidada, com a sua complexidade desvanecida.
Esta complexidade interpõe-se entre nós e o passado. Por exemplo, usei a palavra "Azteca" num parágrafo acima para facilitar o reconhecimento, mas como o romance de Enrigue deixa claro, não existiu tal coisa como um "Império Azteca" - um termo que foi cunhado séculos depois da chegada dos espanhóis. Em vez disso, Cortés deparou-se com um conjunto de cidades-estado, três delas unidas numa poderosa confederação, a Tríplice Aliança. A joia da coroa destas três cidades, Tenochtitlan, era governada pelos Tenochca e era o reino de Moctezuma.
No México, o passado nunca está realmente terminado e os rancores são transportados ao longo dos séculos. Foi assim que o nome Malinche, que designava a intérprete e amante/escrava de Cortés, se tornou sinónimo de ódio a si próprio.
Cortés tinha dois intérpretes: a odiada Malinche - uma mulher de Olutla, hoje Veracruz, que tinha sido vendida como escrava e falava nahuatl e maia - e Gerónimo de Aguilar, um frade espanhol naufragado que também foi escravizado e aprendeu a falar maia.
A genialidade de Enrigue reside na sua capacidade de aproximar os leitores do emaranhado de sacerdotes, mercenários, guerreiros e princesas, acrescentando-lhes uma pitada de humor mordaz.
Os espanhóis que se deparam com a corte de Moctezuma ficam horrorizados com o fedor dos sacerdotes cobertos de sangue de sacrifícios humanos, enquanto os assíduos cortesãos de Moctezuma se queixam de que os homens cheiram a excrementos e a cães. Os sacerdotes têm nomes intermináveis, como Aquele que solta a chuva de palavras e governa as canções para que não sejamos como as flores e as abelhas que duram apenas alguns dias. O imperador passa os dias pedrado com cogumelos, cobiçando os cavalos dos estrangeiros como um adolescente petulante e crescido demais. Cortés não se apercebe de que os cortesãos lhe chamam "El Malinche", como se ele fosse uma extensão da sua intérprete e não o contrário. Afinal, são as palavras dela que eles entendem, não as dele. A tradutora Natasha Wimmer capta com mestria todo este capricho.
Certamente algumas pessoas se queixarão da representação ficcional de Enrigue. O seu conhecimento desta época é meticuloso, mas toma liberdades, permite anacronismos, insere narrativas metaficcionais e parece divertir-se imenso a fazê-lo.
No final, alguns significados perdem-se sempre na tradução, mas se não aconteceu assim, devia ter acontecido.
Moreno-Garcia
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