September 01, 2023

"A paixão pela educação vai e vem, o desejável era mesmo um vínculo de amor!"




Esta professora do ISPA defende que devíamos fazer algum copianço, referindo-se às boas práticas da Finlândia. O problema é que nós já fazemos copianço há muitos anos, só que de países com más práticas: práticas de desinvestimento crónico na educação pública, desvalorização da profissão de professor, falta de técnicos, etc.

A Inglaterra, que tinha um excelente sistema de ensino, está com um problema grave de falta de professores e de decadência no ensino - ontem o ME respectivo anunciou que há escolas que não vão abrir por medo de derrocada, tal é o estado em que estão; o mesmo se passa em França e nos EUA (que já tiveram um sistema público de ensino muito bom) e o problema já se pegou à Suécia e à Alemanha. São as práticas destes países que copiamos. Depois defende-se por cá que o problema são os professores do ensino público e que se fosse tudo privado é que era bom, mas a realidade dos factos o que mostra é que na Finlândia, Canadá, Japão, Coreia do Sul e outros que estão na vanguarda da educação, segundo os dados da OCDE, o ensino público é que vai à frente. São todos países com investimento forte e positivo na educação pública. Não se fazem omeletas sem ovos. 
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A paixão pela educação vai e vem, o desejável era mesmo um vínculo de amor!


Ana Cristina Silva - Professora do Ispa - Instituto Universitário e escritora

É consensual! A qualidade da educação é indispensável para projetar um país no futuro e nunca houve Governo algum que o negasse. Não existe nenhum agente político que não defenda que os cidadãos devem ter igualdade de oportunidades do ponto de vista educativo e que a educação é um elemento-chave para a competitividade e o bem-estar dos cidadãos. Não existem grandes diferenças discursivas a este nível independentemente da posição no espetro político dos governantes. 
Ao longos dos anos, no entanto, a discussão tem-se estendido e baralhado no que respeita aos meios para concretizar esses objetivos e também sobre o que se entende por qualidade em educação, conceito este bastante suscetível a ambiguidades. Sem negar a evolução do país após o 25 de Abril do ponto de vista educativo, a turbulência no ano letivo transato e as ameaças de alvoroços futuros indiciam um sistema com notórias marcas de degradação. 
Há vários dados que evidenciam que a escola já não consegue ser o elevador social que foi noutros tempos. Professores envelhecidos, falta de professores, baixos salários, trabalho precário durante muitos anos, desvalorização social dos docentes, desmotivação, cansaço marcam a vivência quotidiana de muitos estabelecimentos escolares.

Melhorar a qualidade educativa das escolas e promover as aprendizagens nos alunos é algo que toda a gente pretende e neste contexto talvez não fosse má ideia espreitar as práticas de um dos países mais bem-sucedidos neste domínio: a Finlândia. 
Na Finlândia, são selecionados para a docência os melhores alunos. É mais difícil entrar num curso que prepara para a docência do que num curso de medicina. Os candidatos aos cursos de educação são avaliados em testes de competências académicas e atitudes face à profissão. O objetivo das suas escolas de formação de professores é formar docentes que sejam capazes de integrar dados de investigação mais recentes para sustentar decisões pedagógicas, numa lógica de compreensão dos processos implicados na aprendizagem e de contínua autorreflexão e auto desenvolvimento dos professores. 

O que significa, por exemplo, que na educação pré-escolar há uma ênfase na promoção da linguagem e da tomada de consciência de dimensões linguísticas por a investigação ter demonstrado como estas competências estão implicadas no sucesso da aprendizagem da leitura. O salário é excelente e a responsabilização dos professores está ao mesmo nível do salário, sendo que o foco do ensino é a aprendizagem e não os exames. E os professores são libertados das tarefas burocráticas e devendo o seu tempo ser orientado para as tarefas de ensino e de colaboração entre docentes. Na Finlândia não há falta de professores e esta política estará na base dos dados do PISA de 2019 que apontam este país como estando entre os cinco melhores nas competências dos seus alunos em leitura, conhecimentos de ciência e de literacia financeira. 
Um estudo de 2017, por seu lado, considera a Finlândia como o país que tem o melhor primeiro ciclo do mundo e o terceiro país do mundo em inovação -- sendo um país com um pouco mais de metade da nossa população.

O copianço é um termo desonroso em educação, mas não seria mau para Portugal haver algum copianço de certas linhas orientadoras aqui descritas. Já se sabe que somos um país pobre, com crónica falta de dinheiro desde que nos faltou o ouro do Brasil, mas há que fazer escolhas. Queremos ou não ter uma educação de qualidade? Então temos de investir a sério. Além disso, é igualmente importante orientação e competência. Só para dar dois exemplos. 

Um estudo de Isabel Leite de 2021 na área da aprendizagem da leitura demonstra a existência de várias falhas nas nossas escolas na formação de professores neste domínio, tendo em conta as investigações mais recentes sobre a aprendizagem da leitura. Um dia destes assisti num congresso a uma comunicação sobre um futuro estudo relativo ao impacto da formação contínua dos professores. Parece que não existem dados consistentes. Ou seja, a formação de professores é obrigatória para a progressão na carreira, mas as mudanças promovidas por essa formação estão no segredo dos deuses. Assim, não vamos lá!

6 comments:

  1. Professores envelhecidos: há aqui sempre esta questão do idadismo a atrapalhar o sucesso da Educação no burgo...

    Relativamente à formação de professores, de facto, os «melhores» não querem sê-lo (agora, parece que nem os piores). E também é verdade que muito boa gente é professor e não sabe ler nem escrever, isto é, dá erros linguísticos de todo o tipo, porém isso não é culpa dos próprios, mas em primeira instância das instituições que os formam e aprovam como qualificados para o exercício da profissão.

    Sobre a leitura em si, como pode ensiná-la quem não a pratica? O mesmo se pode dizer da escrita, por exemplo... Antes de grandes ambições, comecemos pelas coisas básicas.

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    1. O problema dos professores envelhecidos está em que têm menos horário lectivo e mais doenças crónicas, logo, mais períodos de ausência. E é preciso sangue novo e ideias novas.
      Dizer que muitos professores não sabem ler nem escrever é um exagero.
      É verdade que há cursos universitários que se gabam de não ligar 'às letras' como dizem, numa demonstração de ignorância profunda e, naturalmente isso afecta os seus estudantes, alguns futuros professores, mas em geral isso não é assim.
      Um professor que escreve milhares de palavras constantemente de vez em quando dá erros - muitas vezes de distracção, de cansaço... alguns de falta de leitura, é verdade.
      No nosso país os professores não têm nenhum benefício ou desconto nos impostos ou o que seja pelos livros que compram, pelas formações que fazem, pelo acesso à cultura em geral. Nada.
      É tudo à nossa custa.
      O governo não quer saber. Literalmente não quer saber das escolas, dos alunos e dos professores. Todos os políticos mesmo que parasitas são valores a defender, todos os funcionários públicos são custos a abater.
      E a questão da leitura há-de ser cada vez pior porque os governantes incitam ao uso de telemóveis para tudo e o fim dos livros e da leitura literária que substituem por notícias de jornal e revistas idiotas. Não é aí que se aprende a gostar de ler.

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    2. Mas também têm um «cabedal» de experiência, de calo, que é fundamental para temperar com a tal inovação. Ainda assim, se me atribuírem uma reforma razoável, vou-me embora do ensino já amanhã.

      Não, não se trata de erros motivados pelo cansaço, trata-se de não usar a língua no seu todo corretamente. Desculpe, mas isso vê-se perfeitamente nas atas. 90% delas são uma vergonha linguística. Estou a extrapolar, obviamente, a partir do meu universo de referência, o que vale o que vale, como é evidente.

      A questão da tecnologia é outro drama e/ou tragédia que estes saloios do nosso governo estão a fomentar apenas para parecerem progressistas e adiantados mentais.

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  2. A Lurdes Rodrigues cavou a sepultura da profissão e este Costa matou o ensino e está a fazer o enterro. #Santosdacasa

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