Hoje li estes dois títulos no DN: o 1º induz a ideia de que temos jovens muito escolarizados mas não qualificados. Dá-se o exemplo dos vendedores. Na capa, diz-se que faltam trabalhadores qualificados em todas as áreas, mas em especial nas tecnologias. Mas também faltam pessoas formadas e mão-de-obra sazonal. Ou seja, faltam pessoas em todas as áreas: formadas, não formadas mas qualificadas, trabalhadores sazonais, vendedores. Faltam pessoas. E porque faltam pessoas?
Indústria e construção perdem 81 mil pessoas. Será que me passou alguma coisa ao lado? De que indústria estamos a falar? Por acaso ainda temos indústria, tirando o calçado e o têxtil? Não se 'deslocalizou' e abateu toda a indústria? Os trabalhadores não vão atrás do trabalho? Os trabalhadores não desapareceram da face da Terra. Se querem ver onde estão os trabalhadores qualificados da indústria, vão até à Alemanha. Há muito, muitos anos que exportamos trabalhadores. Qualificados, não qualificados, sazonais, formados... enfim, tudo e mais alguma coisa. Porque haveria de haver mais vendedores ou trabalhadores sazonais em Portugal? Quem é que quer fazer a escolaridade para ganhar 800 euros? Vão para a Suíça para a hotelaria, ganhar 3000 euros.
Em Portugal, os governantes não entendem que governar seja a sua prioridade. A prioridade é ganhar eleitores para a próxima eleição. Entende-se, por uma questão de interesse, que não é necessário avaliar as políticas dos governos a não ser de 4 em 4 anos, de maneira que não há mecanismos de vigilância e avaliação e, quando os há, são imediatamente infiltrados por elementos partidárias que controlam os seus resultados.
Em todos os estudos se fala na importância da educação, seja para o desenvolvimento do país, seja para a justiça social que, por sua vez, é um dos grandes atrativos para que a tal mão-de-obra formada e qualificada queira ficar no país.
Ora, como sabemos, o governo tem a educação como um instrumento de poupança (Alunos do Ensino Especial sem acesso aos apoios previstos) e não temos professores, nem políticas educativas desse nome. O que temos são princípios doutrinários de engenharia social deste ministro, seguidor das fantasias perniciosas de BSS.
Na semana passada, andava à procura de um texto de Nozick que tinha lido algures e fui dar com um artigo de Almerindo Janela Afonso (fpce.up.pdf).
Não sei quando o artigo foi escrito porque não está datado, mas debruça-se sobre as políticas educativas e neoliberais dos anos 80 e 90 do outro século, que em sua opinião, estão na origem de todos os males actuais.
O artigo cita muito BSS e as suas «epistemologias do sul» e fala muito sobre a necessidade de perda de direitos das pessoas, em virtude da colecta de impostos estar nos limites, e de como se tem feito esse trabalho a partir de estratégias a que chama de quase-mercado. Não se privatiza tudo, mas semi-privatiza-se para se poder diluir a fronteira entre o público e o privado e, assim, o Estado escusar-se às suas responsabilidades de maneira subtil.
Também fala muito contra a avaliação sumativa, de classificação estandardizada e de selecção e glorifica a avaliação formativa como emancipadora como se os exames retirassem capacidade de emancipação e fizessem parte de uma sociedade de educação colonizadora - palavras do autor.
Como refere Boaventura de Sousa Santos (1991: 27-37), dos três princípios (Estado, Mer- cado e Comunidade), o princípio da Comunidade é o «mais bem colocado para instaurar uma dialéctica positiva com o pilar da emancipação, e restabelecer assim a vinculação da regulação e da emancipação». Concorre para isto, continua este autor, o fato de o princípio da Comunidade conter «virtualidades epistemológicas» que o tornam um eixo importante neste redimensionamento entre regulação e emancipação porque, entre outras razões, alguns dos seus elementos constitutivos (como o prazer, a participação e a solidariedade) têm sido focos de resistência à invasão da racionalidade cognitivo-instrumental da ciência e da técnica. Assim, a Comunidade pode tornar-se «o campo privilegiado do conhecimento-emancipação» se este for concebido como trajetória que leva o indivíduo de um estado de ignorância a um estado de saber que pode designar-se por solidariedade (um conhecimento que «progride do colonialismo para a solidariedade»); e se a solidariedade for «o processo, sempre inacabado, de capacitação para a reciprocidade através da construção de sujeitos que a exercitem» ou «sujeitos capazes de reciprocidade». Por isso, é necessário romper com o «conhecimento-regulação» que transformou o outro em objeto para, de uma forma radicalmente nova, passar a «constituir o outro numa rede intersubjectiva de reciprocidades». Trata-se, portanto, de um «conhecimento-emancipação que avança do colonialismo para a solidariedade, pela criação de relações sujeito-sujeito estabelecidas no seio de comunidades interpretativas».
Neste parágrafo final, o autor (pessoa de importância na sociologia educativa nacional), assume que quer uma utopia que pensa ser realizável, de 'altos' padrões (que linguagem científica?) de qualidade cientifica e democrática nas escolas.
Todavia, o debate em torno das políticas educativas nestes últimos anos em Portugal revela que, apesar do espírito do tempo, não há unanimismo quanto a visões do mundo, continuando a ser possível inscrever na agenda política perspectivas educacionais progressistas e emancipatórias. É nesse sentido que pode ser pensada (como utopia realizável) uma avaliação formativa que articule os interesses do Estado e da Comunidade, vise altos padrões de qualidade cientifica e democrática na escola básica, valorize a autonomia profissional dos professores e recupere para o processo pedagógico novas formas de participação, de solidariedade e de reciprocidade. (Almerindo Janela Afonso in fpce.up.pdf)
Veja-se este texto: o princípio da Comunidade é o «mais bem colocado para instaurar uma dialéctica positiva com o pilar da emancipação, e restabelecer assim a vinculação da regulação e da emancipação.
E porque razão o aluno, se for objecto de regulação (provas, exames) não pode ser entendido como sujeito? Onde está a contradição? Nós, povo, não somos objecto de regulamentos e de regulação, de legislação reguladora? E por isso perdemos o estatuto de sujeitos pensantes e emancipados ou o Estado deixa de nos ver como parceiros na construção do país? Porque é que uma coisa é vista como contrária à outra? Desde quando a regulação nas escolas (os exames) têm de ser: ou formativas e solidárias, logo, emancipadoras ou selectivas, logo, colonizadoras?
O aluno passar a «constituir o outro numa rede intersubjectiva de reciprocidades». Desde quando o aluno, por ter uma avaliação reguladora ou estandardizada, a par da formativa, deixa de fazer parte de uma rede inter-subjectiva de reciprocidades?
Este textos e discursos das TLEBS, vistos de fora, parecem dizer coisas profundas e inteligentes, mas basta olhá-lo mais de perto para se ver um enredo de vacuidades, contradições e imprecisões. Conheço pessoas que falam assim para esconderem a vacuidade do seu pensamento.
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