February 07, 2023

A vida dos outros e porque não voltará a haver uma oportunidade destas II

 


Esta entrevista à Hanna Arendt está cheia de insights de uma pensadora que viveu de perto a decaída das democracias na ditadura, na tirania e no totalitarismo.
Ela fala na importância de pensar e da dificuldade em saber fazer surgir nos outros (que têm medo do medo e, por isso, têm medo da liberdade) esse desejo de pensar. Pensar de maneira crítica significa ser hostil às convicções comuns e regras daí derivadas. Pensar é perigoso mas não pensar é ainda mais perigoso. 
Fala dos tempos actuais, em que não temos que ser herdeiros de um qualquer testamento [político] e de podemos ir buscar ideias a todos quantos pensam, sejam de que quadrante político forem - concordo muito com ela (embora a minha concordância não lhe acrescente nada, naturalmente).

Enuncia as características que distinguem as tiranias e as ditaduras, dos regimes totalitários, sendo a principal a arbitrariedade e o desinteresse pelos direitos do outro: no regime totalitário, o inocente é preso para cumprir um papel numa qualquer dinâmica da história [ou da ideologia]. Ela cita uma frase de um pensador da China de há séculos que diz que um homem que obedece não merece por isso mais respeito que o que se opõe [ao regime] e, diz Arendt, esta é a marca do totalitarismo, o total domínio do homem pelo homem. 

Porém, o regime totalitário surge quando a maioria dos regimes europeus já está sob ditaduras e tiranias. A ditadura, no sentido original do termo, não é uma tirania, mas uma suspensão da lei, devido a uma crise, que pode ser uma guerra civil [ou uma epidemia?]. A ditadura é limitada no tempo e a tirania não.

O que me parece importante neste momento em que estamos e que esta entrevista realça, é não deixar que as democracias europeias resvalem para ditaduras que podem evoluir para tiranias, como está a acontecer na Rússia ou para regimes iliberais que depois evoluem para ditaduras. É preciso proteger todos os vizinhos da Rússia que querem a democracia e estão a lutar para não serem absorvidos num império decadente, despótico e tirânico. E é por isso que tem de se aproveitar esta guerra com este presidente e este povo ucraniano que vive um quotidiano de tortura e morte em nosso benefício, porque talvez não volte a haver uma outra oportunidade de fazer a balança europeia pesar de modo duradouro para o lado da democracia e, dessa maneira, influenciar grande parte do mundo. A China e o Médio Oriente, que tem várias tiranias, estão a observar, à espera do resultado, para dar os próximos passos.


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