A escola pública, como diz Élisabeth Badinter, é um local onde todos os dias os alunos se juntam nas aulas e durante aquele período de tempo ensaiam uma sociedade igualitária, nos assuntos que discutem, investigam e apreendem e no modo como o fazem, porque a sua origem e condição social estão de fora dos processos educativos em que todos participam nesse espaço. Igualitária, não no sentido de serem todos iguais, mas no sentido de terem acesso a direitos e oportunidades na sociedade a que pertencem.
A escola privada é uma segregação social. E, se há 50 anos se punham os filhos nos colégios privados, sobretudo por motivos de religião (a maioria dos colégios particulares eram de ordens religiosas), hoje-em-dia põe os filhos nos colégios privados aqueles que querem resguardá-los da sociedade desfavorecida e criar-lhes (ou reforçar-lhes) condições de direitos e oportunidades especiais, através de relações sociais favoráveis. Por isso muitos governantes que falam pela escola pública põem os filhos em colégios particulares para garantirem, na medida do possível, as ligações sociais que possam fazê-los avançar na hierarquia social.
Não há muito tempo li uma opinião sobre aquele aluno que entrou abaixo dos critérios de seleção na Universidade Católica, no curso de Medicina, porque o pai doa muito dinheiro a essa escola. Nessa opinião defendia-se essa cunha com o argumento de ser evidente que as grandes escolas/universidades são grandes por terem muito dinheiro para contratarem os melhores professores e terem as melhores condições.
Em Portugal, defendem-se simultaneamente duas ideias contrárias entre si como verdadeiras: que a escola pública pode sempre fazer mais com menos (se não o faz, é porque os professores não prestam) e, ao mesmo tempo, que a escola privada precisa de muito dinheiro para garantir os seus padrões de qualidade elevados. Uma parte grande da sociedade, inclusive, infelizmente, aqueles que mais precisavam de uma escola pública forte e de qualidade, aceitam estes argumentos de segregação social.
Ao mesmo tempo que se defende que a escola pública deve, por um lado, ser gerida como uma empresa -com objectivos, professores contratados e despedidos por perfis particulares (como se os valores da escola pública fossem locais) mas, por outro lado, pratica-se a violação das regras do mercado. Se uma empresa não tem trabalhadores e quer trabalhadores de qualidade, oferece melhores condições, melhor salários, etc. Na escola pública, quanto mais falta de professores há, mais se pioram condições oferecidas e vão-se buscar pessoas desadequadas para o trabalho - sem formação, quer académica quer profissional. Portanto, das duas uma: ou os responsáveis não percebem a lógica do mercado que dizem querer defender nos colégios e empresas privadas ou percebem-na perfeitamente e trabalham intencionalmente para a segregação social.
Vemos o mesmo estar a acontecer na saúde e no ensino superior. Os professores do ensino superior vivem sobrecarregados de burocracia e obrigação de publicar a um ritmo irracional, numa competição do género empresarial que contraria os propósitos da instituição que é a universidade. Daí que haja tanta fraude nas publicações e que o valor do diploma universitário esteja em queda livre e que as famílias queiram os filhos nesta ou naquela universidade, não porque sejam melhores, mas porque é lá que andam os filhos das pessoas com quem se querem relacionar para as futuras cunhas e avanços sociais.
Temos tido, desde há dezenas de anos, primeiros ministros e ministros da educação que trabalham, consciente ou ignorantemente (mas o resultado prático é igual) para a segregação social, em vez de trabalharem para a equidade social. Talvez pensem que, se a maioria da população viver em privação, sobra mais dinheiro e oportunidades para os seus familiares e amigos, mas isso é um engano, pois o que acontece é que empobrece a sociedade como um todo, como se vê pelo índice económico, social e cultural em que nos encontramos - uma ladeira que parece só ter sentido descendente.
As coisas ainda vão piorar muito na escola pública e, por arrasto, nas possibilidades do país, dado que este ME é uma pessoa de teorias da modas que não sabe pensar por si mesmo e ainda por cima tem mentalidade feudal, uma combinação destruidora - um decalque da Lurdes Rodrigues que tanto prejuízo causou à escola pública.
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