July 21, 2022

«Pothus»




Falando de Platão, Gadamer escreve, em A Relevância do Belo

É em virtude do belo que somos capazes de adquirir uma lembrança duradoura do verdadeiro mundo ... Platão descreve o belo como aquilo que brilha mais claramente e nos atrai para si, como a própria visibilidade do ideal. No belo pré-sentido da natureza e da arte, experimentamos esta iluminação convincente da verdade e da harmonia, o que nos obriga a admitir: "Isto é verdade".

Para Platão, o belo representa, de uma maneira sensível, um ideal e inspira o desejo
 [Pothus*] desse reino em que este ideal é real.

"A experiência do belo, e particularmente do belo na arte, é a invocação de uma ordem potencialmente inteira e sagrada das coisas". (Gadamer)

O belo é um símbolo, onde 'o particular representa um fragmento de ser que promete completar e tornar inteiro o que lhe corresponde... ou, de facto, o símbolo é aquele outro fragmento que sempre foi procurado para completar e tornar inteiro a nossa própria vida fragmentária. 

As experiências de beleza são associadas à sensação de que por trás das aparências de separação, perda, conflito e morte - o aparecimento da tragédia - existe uma realidade em que estas formas de imperfeição são curadas e resolvidas. Este sentido, tomado a sério, é um sentido religioso (embora não necessariamente teístico), pois levanta a possibilidade de um tipo de optimismo que é mais religioso do que secular por se basear numa visão não das condições de existência factual, presente ou futura, mas de uma realidade que supostamente transcende estas condições. 

Nietzsche sugere que a ilusão do fenómeno (considerando a obra de arte) consiste principalmente na sua aparência de permanência e que o seu carácter enganador se deve ao facto de que a representação finita não é reconhecida como tal, mas tende a ser confundida com o verdadeiro ser.
Por exemplo, a bela forma apolínica é falsa, não só porque eterniza o fenómeno, mas também porque as superfícies suaves e imaculadas simulam que uma entidade pode ser sem imperfeições. Consequentemente, a aparência de qualquer fenómeno mente: o que 'diz' ser (a forma apolínica 'diz', unidade, ser, beleza e perfeição), não é. Em suma, "a verdade é feia" e possuímos arte para não perecer da verdade.

Sonia Sikka in, On The Truth of Beauty: Nietzsche, Heidegger, Keats (excertos)

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* Pothos, do grego, Πόθος (era um dos erotes) - é o anseio pelo que está fora de alcance, pelo ideal como luz orientadora, por um lugar onde o 'eu' cintila. Pothos é a atracção agridoce e intimativa do instinto em direcção àquilo que escapa, é uma fome de transcendência, de unidade, de totalidade, de completude. 

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