November 13, 2021
Também eu gostava de ter ouvido o Presidente da República dizer a verdade
Eu gostaria de ter ouvido o Presidente dizer precisamente o contrário do que disse: “O que se passou foi uma vergonha, que manchou o prestígio desta missão, das FA e do país. Não há perdão para o que fizeram.”
(...)
Há umas semanas, aqui no Expresso, Inês Serra Lopes assinou um extenso e definitivo trabalho sobre as arbitragens em que o Estado se envolve. Nada se passou entretanto, mas quem leu percebeu, se não o sabia já, que estamos perante um verdadeiro escândalo continuado, em que os contribuintes são assaltados e a honra da República gozada, à vista de todos. Abreviando e resumindo, é assim: se alguém é um cidadão ou uma empresa banal que tem um contencioso com o Estado, recorre ao foro adequado: o tribunal administrativo; mas se é uma grande empresa, daquelas que fazem contratos milionários com o Estado, então o habitual é que haja uma cláusula que prevê que, em lugar do tribunal administrativo, as partes recorram, em caso de conflito, a um tribunal arbitral. Forma-se então o dito tribunal arbitral, com um juiz escolhido pelo Estado, outro pela parte civil e outro, o presidente, escolhido pelos outros dois. Pormenor nº 1: tudo isto se passa em círculo fechado, melhor dizendo, em clube fechado, de não mais do que 40/50 membros de elite, advogados das grandes sociedades, professores de Direito — umas vezes são juízes do tribunal arbitral, ora nomeados pelo Estado, ora pela parte civil, outras vezes são advogados do Estado, outras da parte civil junto do tribunal, alternando entre si as posições livremente, com o único aparente critério de estarem disponíveis. Pormenor nº 2: nos tribunais arbitrais, o Estado é quase sempre condenado e, quando o é, as indemnizações que tem de pagar são sempre muito superiores ao que aconteceria num tribunal administrativo. Pormenor nº 3: os árbitros e os advogados são remunerados em função do valor da causa (que é sempre astronómica), e, às vezes, os árbitros até são remunerados em função da indemnização a que o Estado é condenado. Pormenor nº 4: há países civilizados, como a França, em que é vedado ao Estado aceitar arbitragens. E aqui pergunta-se: vai ficar tudo na mesma? Vai.
5Na SIC, (magnificamente) entrevistado por Débora Henriques, Paulo Rangel fugiu a todas as questões que não só devia como tinha obrigação de responder. Mas havia uma, que a jornalista tinha deixado para o fim e que não havia forma de lhe fugir: por que razão tinha votado contra o casamento dos homossexuais em 2008, na AR? Metendo os pés pelas mãos, Rangel lá acabou a dizer que, nessa questão, “todos tínhamos mudado de opinião”. Não é verdade, e peço desculpa por ter de trazer o meu exemplo pessoal à colação: antes disso, fiz um programa na TVI unicamente dedicado a defender o direito ao casamento homossexual. E não era nem sou homossexual, o que não me impediu de defender os direitos dos outros. Mas Rangel, que já era homossexual, embora ainda não tivesse saído do armário, não teve sequer a coragem de defender os direitos dos seus. Chama-se a isto carácter e não vejo razão para a política o dispensar.
6Perguntado por que razão cancelara as eleições internas, eliminando assim o risco de não ser ele a liderar o CDS nas legislativas, Francisco Rodrigues dos Santos respondeu que foi para evitar uma “peixeirada”. Anotem, pois: a democracia agora chama-se peixeirada.
MST
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