March 31, 2021

Estive a ler o documento que chegou às escolas vindo do Ministério Público

 


... e que se refere aos princípios e finalidades que guiam a intervenção dos vários orgãos competentes, em crianças e adolescentes em risco, por um lado e delinquentes, por outro (embora não lhes chamem isto), bem como aos procedimentos a adoptar e seguir na comunicação às entidades competentes. Está bem feito o documento. Achei piada que frisam com veemência a importância da celeridade da comunicação com o maior número de informação possível acerca do caso. Vê-se bem que não conhecem o funcionamento das escolas e a veemência com que 10 organismos diferentes pressionam para a urgência de burocracias que consomem tempo infinito.

Isto da comunicação à CPCJ ao ao MP não é coisa fácil. É preciso falar com encarregados de educação, o que é logo a 1ª dificuldade; é preciso falar com o aluno em questão, o que por vezes é a 2ª dificuldade. Depois é preciso escrever relatórios pormenorizados do que aconteceu e se é um caso disciplinar ou de abandono temos que incluir todas as medidas que tomámos ao longo do ano, o que significa que temos de guardar registo de tudo. Depois passa pela equipa multidisciplinar da escola: mais papéis. Se são casos de delinquência, como agressão, bullying e ciberbullying, destruição de propriedade, etc. há que recolher testemunhos, fazer outros relatórios, falar com pais... isto tudo no meio do trabalho normal de aulas, reuniões, DTs, cada uma com a sua produção de papéis. Pode levar dois períodos inteiros a fazer-se.

Para mim, o que fazia sentido era o MP ter, em cada conselho, por exemplo, um ou dois funcionários, não sei se isto cabe aos procuradores... atribuído às escolas desse conselho a quem se pudesse recorrer. As escolas fazem trabalho próprio de procurador que não lhes cabe e penso que prejudica mais do que beneficia.

Se há uma agressão ou um roubo numa turma, os alunos são enviados para uma equipa na escola que trata do assunto. Acontece essa equipa querer agir como se fosse um juiz ou um detective de polícia. Chama os alunos envolvidos, nomeadamente os suspeitos, pergunta-lhes se foram eles. Eles dizem que não. Os pais aparecem a queixar-se dos filhos serem interrogados e a culpar outros. Os miúdos mentem e geralmente fica tudo enredado porque a escola é um lugar pedagógico e os professores não têm treino de procuradores para saberem conduzir entrevistas produtivas deste teor. Alguns conhecem os alunos porque já foram seus professores, ou são ainda e depois confundem-se os papéis sem nenhum mérito porque regra geral não se consegue saber quem fez o quê. O resultado é o aluno em questão sentir-se impune.

Aqui há uns anos na minha escola houve um caso chocante de um aluno contra uma professora que só teve resultados porque a professora em questão fez queixa no MP. Não fora isso e o aluno, que fez coisas muito graves, ainda se ficava a rir dela.

Uma coisa são pequenas infracções ao regulamento da escola e ao estatuto do aluno, geralmente dentro das aulas, que os professores podem e devem resolver logo, pedagogicamente; outra diferente, são actos criminalizáveis como roubos, agressões, bullying. Esses deviam ir directamente a alguém que tenha esta especialidade de lidar com esses crimes, que não somos nós. E para isso devia haver alguém no MP que fizesse a ligação às escolas e tratasse desses assuntos, quer dizer, a quem pudessmos recorrer directamente. Era mais célere e eficaz, coisa que agora não é, nem tem grande possibilidade de vir a ser, dadas as condições e a natureza da escola.




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