Há 12 anos que tenho este blog. Escrevo muito. Nestes anos todos aprendi que quem vem aqui ler, lê com os seus óculos e vê o que quer ver, sendo que muita gente interpreta o que escrevo como sendo contra si. Já aconteceu pessoas a certa altura não me falarem e eu achar estranho e ir ter com elas e perguntar o que se passa e ficar a saber que se ofenderam com qualquer coisa que disse aqui e que interpretaram como critica, quando não era para elas. Escrevo tanto sobre tanta coisa. Em geral resolvo isso, porque o meu feitio não é mandar bocas ou dizer as coisas nas costas ou às escondidas (ex: alguém vai já ficar a pensar que ao dizer isto estou a mandar uma boca ou a fazer uma crítica, o que não verdade, estou só a dizer o meu modo de funcionamento - toda a gente na minha escola, por exemplo, sabe que isto é verdade) e vou ter com as pessoas e digo o que tenho a dizer e essas coisas ficam esclarecidas.
Aqui há uns tempos li qualquer coisa que a Manuela escreveu e achei que era uma boca para mim. Fui logo ao WhatsApp perguntar-lhe, 'olha lá aquilo era para mim?' ao que ela respondeu, 'Claro que não! Estás parva, ou quê?' e pronto. E o contrário também já aconteceu. Isto para mim é o normal. Falar com as pessoas e explicar e esclarecer, é o que faço. Bem, a não ser que a pessoa não queira contacto... não vou perseguir ninguém. Mas pronto, isto para dizer que às vezes vejo claramente que alguém interpretou mal o que eu disse e depois tento esclarecer e ainda é pior porque quando as pessoas vêm à procura do que querem ver, do que já pensam ou do que já acreditam e vêm para confirmar preconceitos, depois é só isso que vêem. Isso está fora do meu controlo, como qualquer pessoa que tenha um blog ou uma coluna no jornal sabe muito bem.
Às vezes faço um teste nas aulas (em poucas porque é preciso que sejam um certo tipo de alunos e se não forem a experiência perde-se e é pior a emenda que o soneto) que é conhecido de muitos professores e de todos os psicólogos. Passo o vídeo de atenção selectiva (está lá em baixo para quem não o conhece).
Passo-o porque quando digo aos alunos que nós vemos, literalmente, o que esperamos, queremos ver e procuramos, eles não acreditam. É especialmente eficaz em turmas de bons alunos, com capacidade de concentração. O teste dura 50 segundos e consiste em duas equipas, uma de t-shirt branca e outra de t-shirt preta a passarem uma bola uns aos outros. Nós dizemos aos alunos para se concentrarem muito bem nos de t-shirt branca e contarem quantos passes de bola fazem. Os miúdos contam, páro o vídeo, pergunto quem contou, a maioria deles diz correctamente o número de passes e depois pergunto, 'quantos viram o gorila'. Resposta: 'gorila, qual gorila? Não havia nenhum gorila'. -ai havia, havia, um gorila enorme que a meio do jogo atravessa o campo de vista, pára, bate no peito e sai. 'Não pode ser, não pode ser'. Ok, então vou recuar e agora procurem o gorila. É claro: quando o gorila aparece no campo de visão é uma explosão de risos porque o gorila é enorme. Geralmente, em cada turma, há dois alunos que o vêem. São os alunos de pouca atenção e que se distraem facilmente. Os outros ficam incrédulos por não o terem visto. Bem, não o viram porque não o procuraram nem era isso que esperavam ver. Mas ele estava lá bem visível.
A percepção visual é selectiva e nós vemos o que procuramos ver. É o mesmo princípio do boato e da calúnia: depois de alguém lançar um boato ou calúnia sobre outra pessoa, de cada vez que a vemos, julgamos o seu comportamento e palavras com esse filtro e interpretamos tudo com esse afunilamento, procuramos os sinais que confirmam o que já acreditamos, de tal modo que não vemos os gorilas e tudo nos parece confirmar as t-shirts brancas.
Enfim, a certa altura, porque já lá vão 12 anos, assumi esse risco de ser aqui mal interpretada, às vezes nos antípodas do que digo e quero dizer. Parto do princípio que as pessoas que me querem bem, se têm dúvidas falam comigo e esclarecem as coisas.
Não falo de pessoas a quem me refiro claramente e que já mais que uma vez me tentaram calar. Passados dois anos de ter o blog, alguém o fez desaparecer, porque eu criticava muito a Rodrigues, o Sócrates, os sindicatos... mas como o que está na internet nunca desaparece, a equipa pô-lo outra vez a funcionar. E depois disso outras vezes. Há pessoas que me detestam e se pudessem afastar-me definitivamente, era o que faziam. O pior de tudo, para essas pessoas, não é o ser crítica, mas ser uma mulher. Há imensos blogs de homens muito mais críticos e contundentes e alguns com uma linguagem de palavrões que eu não uso. Mas lá está, são homens, não mulheres. Onde é que já se viu tal coisa? Uma mulher a falar assim, a dizer o que pensa sem rodeios nem pedidos de desculpa? Se fosse homem percebia-se, porque os homens falam frontalmente, mas sendo mulher é uma coisa mesmo desagradável, agressiva. As mulheres não falam assim. Não sorri enquanto faz críticas... já uma vez me deram um artigo de jornal onde se defendia que as mulheres deviam sorrir em vez de fazer crítica porque seriam mais felizes... Alguém pensou que tenho um pensamento crítico porque não sei ser feliz... Portanto, é isso, incomodo. Não é essa a minha intenção, mas sei que é assim que sou sentida. Como um tremendo incómodo.
Não tenho intenção nenhuma de dar uma ideia de perfeição que não tenho ou de ser uma pessoa meramente contemplativa, um ser platónico puramente racional, uma filósofa impertubável, que não sou (nem uma coisa nem outra). Se calhar se o fosse -filósofa ou imperturbável- não tinha esta doença... nem me preocupo muito que vejam que sou um ser humano, que tenho uma vida emocional, que às vezes me dá para escrever coisas que até assustam os amigos e me ligam a perguntar o que se passa comigo que não pareço eu... o que se passa comigo...? olha, quando eu digo que sou anormal as pessoas acham que o digo como graça, para me fazer engraçada, mas não: é um facto e só me traz chatices que preferia não ter.
Não tenho assim tanta importância. Sou uma pessoa, estou viva (por enquanto), penso, digo o que penso, mas este blog não é a vida e não é a minha vida. É só um blog. Há aqui muita ficção, muitas ideias, estados de alma, reflexões, dramas... é um blog. Tenho muita coisa ao mesmo tempo na cabeça o tempo todo sem parar sobre muitos assuntos que me interessam profundamente e vou aliviando para aqui (e alivio-me das mazelas que surgem como sequelas dos tratamentos e da doença e que é preciso tratar logo - agora tenho uma úlcera na córnea... uma chatice que precisava imenso a juntar às outras...) Há quem escreva livros, pela mesma razão. Eu escrevo aqui. Há quem goste do blog. Obrigada, sinceramente, saber isso motiva-me muito. Há quem partilhe os meus pontos de vista, mas há quem não partilhe e me faça crítica. Isso para mim é tudo normal. A crítica feita com seriedade e frontalidade, é normal e desejável. Tenho horror à mesmidade, da mesma maneira que as águas dos canos de Aristóteles tinham horror ao vazio. 😀 Isto é um blog. Não é a vida. Outros é que o confundem com a vida, mas a vida é outra coisa. Sim, é verdade que estou no blog da mesma maneira que um escritor está no que escreve, mas nem o escritor se reduz aos livros que escreve nem eu me reduzo ao blog. Como agora estou aqui fechada em casa, passo muito tempo na internet, no blog, a ruminar (até fui buscar o cubo que já nem sabia onde andava), mas a vida é muito mais que isto. Isto é um blog.
Quem nunca viu este teste, naturalmente percebe que ele agora já não funciona, depois de o ter descrito e explicado.
Olha o cubo de Rubik. Sabes que nunca consegui resolvê-lo? Sou mesmo burrinha....🤣
ReplyDeleteEu fazia-o num ápice. Bem nunca fui profissional daqueles que entram em concursos e isso. Agora pus-me a fazer. Comecei a lembrar dos critérios para rodar as peças.
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