E porque é que desanimam? Porque revelam desconhecimento da situação (o que os faz tomarem decisões erradas) e expectativas irrealistas, da ordem do pensamento mágico.
Das Orientações do ME para as escolas, destaco apenas três:
"Professores devem atender às necessidades de cada aluno" - um professor normal tem 5 a 7 turmas, o que soma de cerca de 150 o 210 alunos, mas mesmo que tenha, por exemplo, 4 turmas estamos a falar de cerca de 120 alunos. Como é possível, durante uma aula de 90 minutos conhecermos as necessidades de cada aluno? Mesmo que não avançássemos no programa e estivéssemos toda a aula a tentar perceber as necessidades de cada um, não tínhamos mais que 3 minutos com cada aluno. Mesmo que consigamos perceber, com testes de diagnóstico, as necessidades de cada um, não é possível, no espaço de duas aulas por semana, às vezes só uma, atender às necessidades de cada um, porque as necessidades dos alunos não são como as dos doentes: a pessoa tem uma doença, o médico diagnostica, passa um medicamento, ou faz um tratamento e fica curada.
O ensino é mais como as sessões de psicanálise: levam muito tempo a processar e resolver porque é necessário reconstruir recursos básicos que estão enterrados debaixo de outros que os remediaram mal, é necessário que o aluno colabore na rectificação dos seus problemas e isso obriga a que os reconheça. Tudo isto requer investimento e tempo.
Por exemplo (um exemplo banal), o aluno não sabe estudar, não tem métodos de estudo, não tem autonomia, nunca fez um plano de trabalho, muito menos de estudo; nunca leu um livro em toda a vida, excepto os que teve que ler na aula, não sabe exprimir-se, nem por escrito, nem oralmente, faltam-lhe os conceitos/vocabulário (porque não lê) logo, não compreende as ideias mais básicas; não tem auto-disciplina; não tem critérios de rigor e é auto-indulgente; não sabe responder a uma questão que não seja de reprodução directa; não sabe fazer uma pesquisa, nem na mediateca nem na internet; desiste ao primeiro obstáculo porque lhe faltam os recursos mentais e psicológicos ; não sabe organizar duas ou três ideias numa resposta coerente; tem falhas básicas na construção de juízos lógicos; não tem uma atitude de aprendizagem; está habituado a trabalhar transcrevendo ou copiando. Isto é o banal, no 10º ano.
Como é que é possível alguém esperar que o professor possa corrigir todas estas necessidades/problemas, muitas delas a depender da própria atitude dos pais relativamente à educação dos filhos também se modificar, em 3 minutos uma ou duas vezes por semana, que é o que temos dado que as turmas estão a 28 ou 30 alunos. 3 minutos!
Como é que podemos ter respeito por pessoas que nos dizem, 'toma lá 100 pregos e vai construir uma ponte'?
Em turmas de 28 ou 30 alunos, só ao fim de dois ou três meses é que sabemos os nomes deles todos e as caras, tendo 6 ou 7 turmas ou mesmo 5 ou 4; e, mesmo assim, é porque temos todos estratégias para eles não perceberem que não sabemos os nomes e as caras deles. E isto é em tempos normais e não de pandemia...
Quando as turmas têm 16, 18 alunos, por exemplo, nós conhecemos os alunos muito mais rapidamente.
Há menos dispersão dentro da sala, geralmente é um grupo mais coeso, os alunos têm mais facilidade, menos acanhamento em participar sem serem chamados o que ajuda muito a perceber a situação de aprendizagem em que estão. Fazemos muitas paragens, porque há tempo, discutimos os assuntos, corrige-se e reforma-se o discurso oral no próprio momento, fazemos trabalhos que são acompanhados e corrigidos ali mesmo, porque há tempo para ir a 8 mesas numa aula. Enfim, é um mundo de possibilidades que com turmas de 30 alunos e horários de 7 turmas ou mesmo 6 ou 5 tornam impossível e só um cego ou alguém que esteja completamente a zero do que é ensinar crianças e adolescentes é que não percebe isto.
Aqui a seguir lemos que deve dar-se constante feedback aos alunos. Completamente de acordo. A questão é: para dar feedback constante é preciso avaliar constantemente, o que não é possível, dadas as condições acima descritas. Nem que trabalhássemos 24 horas por dia conseguíamos estar constantemente a construir avaliações para corrigir e dar feedback a 150 alunos ou 200 a não ser que se faça tudo à balda. Hoje em dia há escolas que vão ao ponto psicótico de obrigarem os professores a introduzir em plataformas todas as avaliações que fizerem a todos os alunos, ponto por ponto e com justificação de todos os pontos e os professores, muitos com 200 alunos, não fazem mais nada senão essas porcarias de loucos!
Finalmente leio que, mesmo com a presença dos alunos, deve privilegiar-se trabalho com plataformas digitais com vista a uma progressiva autonomia dos alunos. A autonomia não tem que ver com plataformas digitais. Um aluno pode ser muito expedito a usar o zoom e a responder a questionários online e não ter nenhuma autonomia de trabalho. A autonomia de trabalho não deriva do uso de plataformas digitais. Aliás, usar as plataformas digitais é uma coisa que eles aprendem num ápice; ser autónomo requer uma aprendizagem continuada e sustentada no tempo.
Estas instruções do género, 'toma lá 100 pregos e vai construir uma ponte', desmoralizam.
E já agora, senhor ME: mande pagar o que me devem, sff!
E, no meio disto tudo, onde é que fica o distanciamento social? Nem pensem que vou andar de carteira em carteira a ver o que eles estão a fazer!! Tenho de preservar a minha saúde!
ReplyDeleteSe estivesse um aluno por mesa podia fazer-se.
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