February 02, 2020
Educar para pensar
O jornal SOL de ontem traz um artigo grande sobre o projecto da Eutanásia que vai à aprovação no Parlamento e outro que é uma opinião do Gentil Martins. Comprei-o para levar para duas turmas do 10º ano, para lerem. Estou a orientar um trabalho de argumentação nas turmas do 10º ano acerca de temas polémicos, naturalmente.
Parece-me muito importante, em termos de formação pessoal e social, que os adolescentes sejam capazes de perceber a legitimidade das posições opostas às suas, que sejam capazes de as argumentar pacificamente e aceitar pontos de vista críticos dos seus. Alguns não têm sequer posição face aos temas e é uma maneira de os pôr a aprender e a reflectir em assuntos que são os da sua vida, actual ou futura.
É um trabalho que tem uma parte de dissertação escrita, com um guião que lhes dei, critérios de pesquisa e de avaliação e depois tem uma parte oral que consiste na discussão do tema. Os temas escolheram-nos eles de uma lista que sugeri. Cada tema é trabalhado por dois grupos que depois discutem as duas posições opostas, a favor e contra. Eu só avalio, não intervenho, a não ser que alguém comece a ser agressivo ou assim, mas isso nunca aconteceu, nestes anos todos. Já aconteceu um par de vezes um dos grupos faltar e deixar os colegas sem adversário para argumentar e aí argumento eu contra esse grupo.
Eu tento que aqueles que têm uma posição definida (ou que assim o pensam porque da minha experiência eles pouco sabem dos assuntos e muitos mudam de opinião ou ficam sem opinião definida depois de fazer e discutir o trabalho) escolham argumentar a posição oposta à sua, para desenvolverem essa capacidade de perceber a legitimidade do argumento do outro mas isso é difícil e a maioria não quer. Demasiado passionais para terem esse controlo emocional.
Um dos temas que escolheram foi a eutanásia, e é por isso que comprei o jornal.
O artigo do Gentil Martins tem tantas falácias de argumentação, mas tantas, que apetecia-me pegar nele como exemplo, porque é o assunto que agora estamos a trabalhar. Mas não posso. Dado que é um dos temas que vai ser argumentado e que uma das posições é contra, como a dele, não posso ir dar argumentos aos que são a favor e influenciar a argumentação.
Já vi alunos argumentar, a eutanásia, a IVG, as experiências médicas em animais, as corridas de touros, a possibilidade de paz perpétua ou a inevitabilidade da guerra, o direito a divorciar-se dos pais, a pena de morte, o direito aos downloads ditos ilegais, a proibição de jogos e programas violentos até uma certa idade, o direito a não fazer exames, o direito a usar armas para defesa pessoal, a violência estar, ou não, ligada à pobreza... há turmas que fazem discussões muito boas, preparam-se muito bem e têm dezenas de argumentos, gráficos, tabelas, estatísticas... e os miúdos quando se preparam bem são tão engraçados a argumentar. Levam aquilo a sério. Eu também levo aquilo tudo a sério.
Tive uma ideia -que surgiu há um par de meses a ler um artigo- para um trabalho que nunca fiz com os 10º anos que tem a ver com a questão da filosofia política de John Rawls, mas não sei se tenho tempo para fazê-lo. Acho que já vou um bocadinho atrasada. Tenho que recuperar. Mas se conseguir, pelo menos numa turma e se for bem pensado e bem feito é uma coisa fantástica. Não vou dizer o que é para não dar azar 🙂
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