December 22, 2019
do Natal e das coisas que importam
Durante muitos anos, quando éramos miúdos, o Natal era uma época mesmo especial. Sendo muitos irmãos, toda a época de Natal era uma excitação. Às vezes passávamo-lo com outra família de amigos dos pais que ainda tinham mais filhos de modo que, sobretudo nesses anos, a noite de Natal era uma coisa caótica e mágica. Fazia-se uma árvore de Natal com um pinheiro gigante.
A certa altura passámos nós a ser os pais e a organizar o Natal para os filhos e fazíamos com que fosse uma noite especial para os miúdos. À medida que iam nascendo mais miúdos e a família crescia o Natal passou a ser um stress. Os miúdos eram dezenas, nós dávamos presentes a todos, e ainda a pais, irmãos, amigos, cunhados...
Começava a planear o Natal um mês antes. Desenterrar o caderninho com a lista de pessoas a quem dar presentes, os nomes dos miúdos, a idade, o que tinha dado no ano anterior. Depois era pensar na comida que era preciso fazer porque a noite de Natal tinha que alimentar umas dezenas de pessoas.
Isto tudo calhava, como agora, na altura das avaliações do 1º período. Montes de testes para ver, notas para calcular, reuniões para preparar... no meio de todo o trabalho ia fazendo, paralelamente, listas mentais do que era preciso comprar no supermercado e quando. Depois era preciso pensar no que dar de presentes e ir escrevendo no caderninho porque tinha pouco tempo para isso e quando saia para os comprar já tinha que saber o que ia comprar e onde e no caso de não encontrar o que queria, qual era a alternativa. Isso era uma tarefa que ia fazendo em Novembro e Dezembro aos poucos mas depois havia dois dias, quando entrava de férias, lá para dia 21 ou 22 de Dezembro em que gastava seis ou sete horas de trabalho nisso. Por dia.
Quando o meu filho era já mais velho vinha comigo e fazíamos o trabalho a dois, tipo empreitada. Depois passava um dia a fazer embrulhos ( o escritório ficava caótico com papel e embrulhos por todo o lado) e a comprar comida e no outro dia inteirinho a fazê-la. Trabalhava mais de oito horas por dia para o Natal. Os homens, pelo menos nessa altura, tinham um Natal descansado e nós, as mulheres, é que fazíamos o Natal.
Depois a noite de Natal era entre o giro e o stress porque os miúdos eram pequenos, eram muitos, ao fim de meia-hora pareciam selvagens, todos desarranjados, a suar das correrias escada acima, escada abaixo (tal como nós fazíamos quando éramos miúdos), em cada momento havia uma confusão ou alguém caía ou chorava ou fazia birras de cansaço e sono ou tinha fome, de modo que tinha que estar-se sempre com um olho neles. Depois, sendo nós muitos e toda a gente gostando de discutir ideias e política e sei lá mais o quê, era uma confusão e uma barulheira. Os miúdos adoravam.
No dia a seguir ao Natal nem me levantava da cama. Dormia todo o dia. Levava dias a recuperar do Natal. De ano para ano isto custava cada vez mais.
Agora não é nada assim. Já há muito tempo. Somos menos. Os miúdos cresceram e uns vão passar o Natal com as famílias dos/as namoradas ou casados e os irmãos também. Ninguém se stressa. Toda a gente e não apenas as mulheres, tratam de arranjar qualquer coisa. Se estou em dia de me apetecer cozinhar, faço-o com prazer e calma, se não, compro qualquer coisa. Não me chateio com isso. Compro meia dúzia de presentes, geralmente livros. A noite de Natal é para estar com a família porque o que importa são as pessoas.
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