Toda a gente me diz isso. E não falo da questão, saudável, de se preocuparem em ter uma vida própria para além do trabalho. Falo de ganharem o dobro do que algum vez hei-de ganhar, mas pensarem que isso é um direito que lhes assiste e que não vem com a obrigação de cumprir o contrato de trabalho. Podem não atender o telefone a um cliente porque são oito da noite - embora a flexibilidade faça parte do seu contrato e seja muito bem paga, entendem a flexibilidade apenas na parte de poderem entrar tarde no trabalho ou sair mais cedo. E dizem ao chefe, que pode ser o dono da empresa, a sua opinião sobre tudo e um par de botas, acerca da empresa, em qualquer sítio e altura. Até pode ser numa reunião com clientes. LOL Passam o tempo a queixar-se e tudo é uma ofensa aos seus direitos. E se alguém lhes diz alguma coisa respondem logo que é opressivo e mais não sei quê.
Aqui há uns anos uma colega professora que esteve um ano lá na escola -era o primeiro ano que trabalhava como professora- perguntou-me, 'Olha lá, fui convocada para uma reunião do grupo disciplinar. Achas que tenho que ir?' LOL Claro que tens que ir e se não vais tens falta. 'Que chatice -dizia ela- ainda por cima a delegada do grupo quer ter uma reunião só comigo para me dar trabalho. Porque é que tenho que fazer o que ela quer?' Porque estás a trabalhar sob contrato numa instituição que tem uma organização definida com hierarquias estabelecidas. E tens interesse em saber o que o grupo anda a fazer, trocar experiências, tirar dúvidas, etc. 'Mas eu sou de opinião que não tenho que ser obrigada a falar com uma pessoa de quem nem gosto e ir a reuniões que não me interessam' LOL Então fala disso na própria reunião ou na reunião geral de professores. Foi uma conversa surreal, mas típica desta nova geração.
A minha taxista tinha um indivíduo novo a quem dava serviço às vezes porque tem excesso de trabalho e ele é bom no trabalho. A certa altura ele pediu para ir trabalhar para ela. Quando ela lhe disse o trabalho que faz e ele tinha que fazer, ficou chocado. 'Fazer serviço à noite? E de madrugada? Ir para o aeroporto a essa hora? Ou para Espanha e só voltar passados dois dias? Eu a partir das seis quero ir para casa ver a minha mulher e os filhos. E ao fim de semana também não quero trabalhar. E vou sempre almoçar a casa'. LOL Um dia levou-me a um hospital e no caminho contou-me isto e eu ri-me. E diz ele, 'Está a rir-se? Mas a professora trabalha à noite?' LOL Noites, fins de semana, férias - sempre que é preciso. Tenho prazos para entregar os trabalhos, fazer avaliações, fazer as pautas. Se não o fizer não saem as notas. Ficou chocado, disse-me que acha mal e que ele não faz isso. Ele vê o negócio dela a prosperar imenso de ano para ano, mas não tem noção do que isso implica em termos de horários de trabalho e não está disposto a trabalhar o que é preciso. Mas queria o trabalho na parte de ir ganhar bastante bem.
Muitos miúdos que andam pelos vinte e tal anos e estão a começar a trabalhar não têm noção da vida e parece que pensam que o mundo lhes deve alguma coisa. Isto é uma coisa geracional. Passou-se do exagero oposto para esta falta de sentido das responsabilidades.
Na 1ª semana de aulas gastei tempo a explicar aos alunos do 10º ano a importância da metodologia. Mostrei-lhes como se faz um plano de estudo semanal que não seja pesado e permita ter as matérias sempre em dia. Desenhei no quadro: 2ª, 3ª, 4ª... sábado, domingo. 'SÁBADO E DOMIGO?' LOL. sim, se tiverem que apresentar um trabalho numa 2ª feita têm que trabalhar nesse fim-de-semana. Ou se tiverem um teste grande na 2ª. É uma excepção mas pode acontecer, de maneira que não podem considerar o fim-de-semana uma espécie de dia sagrado. Por outro lado, se um dia tiverem aulas de manhã e à tarde, nesse dia já não vão estudar, a não ser excepcionalmente. Diz logo um aluno: 'o professor de matemática mandou um trabalho de casa no dia em que temos aulas de manhã e à tarde. Podemos não fazer?' LOL Bem, poder pode, mas é do seu interesse fazer. No dia seguinte retire a parte do estudo da matemática ao plano, uma vez que já estudou neste dia fora do plano. Adapte. Mas quer dizer, achou logo que podia queixar-se de ser uma vítima de qualquer coisa...