O exame de Filosofia foi fácil mas tem, como já vem sendo hábito desde que o programa está tomado por uma certa corrente da Filosofia, questões que obrigam os alunos a tomar posição filosófica face a questões muito complexas.
Porque é que uma pessoa, um adolescente, ainda por cima, há-de ser obrigado a ter uma posição filosófica, a escolher e tomar partido por um lado de uma questão? Não é muito mais interessante que o aluno saiba analisar e problematizar uma questão em toda a sua complexidade do que escolher um lado e ficar refém de posições rígidas? Uma análise implica à mesma uma argumentação, mas não, necessariamente, no sentido de tribalizar a questão com posições a favor e contra e reduzir a resposta a receitas técnicas de argumentação.
Porventura o curso de Filosofia tem como fim os alunos saírem da escola com posições inequívocas, fechadas, sobre os assuntos da vida, pessoal e social, sobre as questões lógicas e as de acção?
Eu não incentivo os alunos a terem posições formadas sobre questões filosóficas que são as questões que hão-de enfrentar ao longo da vida. Os alunos não têm que ser a favor ou contra qualquer coisa/posição e parece-me até, que a sociedade está saturada de opiniões tribais reducionistas. O que me parece importante é que saibam analisar os problemas de vários pontos de vista e se mantenham abertos e críticos, porque são ainda muito novos, falta muita experiência de vida que enriquece o pensamento, se este se mantém aberto e capaz de analisar uma questão, para que mais tarde e com outra maturidade possam, se o entenderem, tomar posições.
De maneira que não estou de acordo com a tribalização do programa (até dá a entender que relativamente às questões filosóficas só existem duas posições, ou a favor ou contra, o que é errado) e a imposição de obrigarem os adolescentes a fingir que têm uma posição filosófica. Sim, digo fingir, porque a quase totalidade deles apenas repete os argumentos de uma teoria qualquer que estudaram, o que está certo, mas isso não corresponde a uma posição filosófica individual, apenas a uma escolha de argumentário - toma-se o partido de 'x' contra o de 'y', geralmente porque se está mais à vontade com a argumentação de uma posição do que de outra.
Por exemplo, no problema da ética, como os alunos acham o Kant difícil e Stuart Mill fácil, tomam partido pelo Stuart Mill. Isto não é ter uma posição filosófica.
------------------------
Do exame:
"15. Leia o texto seguinte.
Podemos ver-nos como eus independentes, [...] no sentido em que a nossa identidade nunca está ligada aos nossos propósitos e afetos?
Penso que não. [...] As pessoas particulares que somos são inseparáveis de uma certa família, comunidade, nação ou povo, de uma história e de uma república de que são cidadãs. Lealdades como estas são mais do que valores que me acontece ter. [...] Lealdades como estas permitem que eu tenha mais deveres para com algumas pessoas do que a justiça requer [...], não pela razão de ter feito acordos, mas em virtude dos [...] afetos e compromissos mais ou menos duradouros que, tomados em conjunto, definem parcialmente a pessoa que sou.
M. Sandel, «The Procedural Republic and the Unencumbered Self», in R. Goodin (org.), Contemporary Political Philosophy: An Anthology, Oxford, Blackwell, 2.a ed., 2006, p. 244. (Texto adaptado)
A teoria da justiça de Rawls é um dos alvos da crítica comunitarista apresentada no texto.
Concorda com esta crítica a Rawls? Justifique.
Na sua resposta,
−apresente inequivocamente a sua posição;
− argumente a favor da sua posição.
--------------------------
17.Será que uma ação só é moralmente boa se for motivada pelo dever?
Na sua resposta, deve:
−− clarificar o problema filosófico inerente à questão formulada;
−− apresentar inequivocamente a sua posição;
−− argumentar a favor da sua posição, mobilizando conceitos ou teorias relevantes; −− apresentar pelo menos um exemplo que ilustre a posição defendida.
------------------------------------------------
Depois, quando vamos ver os critérios de correcção da questão nº15. (embora os critérios não sejam completamente fechados) damos com este parâmetro (entre outros) que tem implícito conhecimentos de Psicologia sobre a construção da Identidade que os alunos no 11º ano, o ano em que estão a fazer este exame, não têm. Aliás, só têm aqueles que no 12º ano escolhem a disciplina de Psicologia. E a questão da construção da Identidade é muito complexa e polémica:
No caso de o examinando concordar com a crítica a Rawls apresentada no texto:
Parece-me que não há necessidade deste enredos -uma coisa é permitir que o aluno tenha uma posição, outra é impor que a tenha- que são sintomáticos do tipo de sociedade de tendência tribalista actual.